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1 Aprender a Resolver Problemas e Resolver Problemas para Aprender MARIA DEL PUY PEREZ ECHEVERRIA e JUAN IGNACIO POZO" Introdugio: a solugio de problemas como contetdo da Educagto Bisica, A solugio de ‘problemas como ema habilidade geral. A solugso de problemas como tum processo cespesfico:diferencas entre especialstas e prinipiantes INTRODUGAO: A SOLUGAO DE PROBLEMAS COMO CONTEUDO DA EDUCAGAO BASICA Claxton (1984) relata um episédio engragado ocorrido com um professor em ‘um bairro periférico de uma cidade norte-americana, que perguntou a um meni- no negro quantas pernas tém 0 gafanhoto. Ao que parece, a crianga olhou triste- mente para o professor e respondeu: “Tomara que eu tivesse os mesmos proble- ‘mas que o senhor!”. Fica claro, como mostra esta anedota, que o termo problema pode fazer referéncia a situagoes muito diferentes, em fungao do contexto no qual, ‘ocorrem e das caracteristicas e expectativas das pessoas que nelas se encontram envolvidas, Todos 0s professores acabam aprendendo que os problemas que expéem aos seus alunosem salade aula podem diferir consideravelmente dos que eles propri- (98 se colocam fora da classe. F mais, o que para nds pode ser um problema rele- vante e significativo pode resultar trivial ou carecer de sentido para nossos al nos. Obviamente, eles nao tém os mesmos problemas que nés. E,no entanto, um dos objetivos explicitos da Educacao Basica, tanto no 1° como no 2° Graus, € fazer com que os alunos nao somente se coloquem determinados problemas mas que cheguem, inclusive, a adquirir os meios para resolvé-los. * eprtument de acobgia Basic, Face de Pricloga da Universidade Autom de Mai 14 A Solugio de Problemas Na reforma do Sistema Educacional reconhece-se a necessidade ea impor- tancia da solugdo de problemas como contetido curricular da Educacs0 Basica Na verdade, ofato de proporcionar aos alunos habilidades e estratégias para a solugdo de problemas fica reconhecido no somente como o objetivo parcial de cada uma das diversas reas do Ensino Fundamental e do Ensino Médio mas, Inclusive, nesta ima etapa, zeconhece-se como um dos objtivos gerais que de- Veriam ser alcancados no final do periodo de Educagio Basica. Assim, de forma cxplicita,o objetivo geral n° 4 do Diseno Curricular Base (DCB) (Projto Curricular Basico) da Fducasdo Secundétia Obrigatéria (ESO) citatextualmente que, a0 final da Educagao Basica, deve-se conseguir que o aluno “elabore e desenvolva estraté- fias pessoais de identifcacdo e solugdo de problemas nas prineipais reas de co- Ihecimento, através da uilizagdo de alguns habitos de raciocinio objetivo, siste- matico e rigorosc, € que as aplique espontaneamente a situacdes da Vida cotidia- ra” (p.78). Dessa forma, a solucio de problemas deveria constituir um contetido neces- sitio das diversas dreas do curriculo obrigatério, Obviamente, dentro da cassifi- ‘acto dos contetdos educacionais na Reforma (ver, por exemplo, Coll Pozo, Sarabia Valls, 1992) a solugto de problemas estaia mais relacionada aaquisicao de pro- ‘edimentos ficazes para a aprendizagem, sendo um procedinento definido como “tum conjunto de agBes organizadas para a consecusao de uma meta” (DCB da 50, p. 1-42). Orientar o curriculo para a soligio de problemas significa procu- rare planejarsituagbessuficientementeabertas para induzie nos alunos uma bus- tae apropriagio de estratégias adequadas nao somente para darem resposta a perguntas escolares como também as da relidade cotidiana, Sem procedimentos Eicazes -sejam habilidades ou estratégias -o aluno no poders resolver proble- ‘mas. Por exempl um tipico problema matemético pode consistirem decidir qual de dois times de basquete é mais eficiente no arremesso a cesta: 0 Seatile Supersonics, que converteu 23 clos 40 aremessos tentados, ou o Atlanta Hawks, aque encestou 28 das suas 47 tentativas. Sem habilidades adequadas de célculo Droporcional o aluno ser incapaz de resolver este problema, ‘De certa forma, essas habilidades — um conhecimento de caréter procedimental — constituem o nicleo do saber necessério para resolver este pro- Blema, Mas seria errado reduzir a solugio de problemas ao desdobramento de procedimentos aprendidos a exaustio? Pode set que o aluno sea capaz de tzer — Este € 0 nicleo procedimental — uin eéleulo proporcional, mas que nio o faga neste caso, por divezsos motives. Um primeiro motivo pode ter relagio com as ititudes do aluno diante dessa aprendizagem concreta. Pode acontecer, como ‘no caso do menino negro e o gafanhoto, que tal pergunta nao represente para tle um verdadeiro problema, ou porque nao se interessa por basquete, ou por- {que, mesmo tendo interesse por basquete, essa nao seja para ele uma pergunta Significativa ou, especialmente, porque nao esteja disposto a propor-se um problema —ou seja uma pergunta que precisa de uma resposta —com respei- {oa algo que no seja oseu problema. Ensinar a resolver problemas ni consis- te somente em cotar os akunos de habilidades eestratégias ficazes, mas tam- bem em criarneles o habito e a atitude de enfrentar a aprendizagem como um problema para o qual deve ser encontrada uma resposta, Nao é uma questio Issn Iai Pozo (org) 15 de somente ensinar a resolver problemas, mas também de ensinar a propor pro- blemas para si mesmo, a transformar a realidade em um problema que mereca ser questionado e estudado. Assim, como exige 0 objetivo educacional antes mencionado, a aprendizagem da solucio de problemas somente se transfor- ‘mar em auténoma e espontinea se transportada para 0 Ambito do cotidiano, se for gerada no aluno a atitude de procurar respostas para suas préprias per- guntas/ problemas, se ele se habituar a questionar-se ao invés de receber so- mente respostas jé elaboradas por outros, seja pelo livro-texto, pelo professor ou pela televisio, O verdadeiro objetivo final da aprendizagem da solugao de problemas é fazer com que o aluno adquira o habito de propor-se problemas e de resolvé-los como forma de aprender. ‘Mas a solucio de problemas no vai exigir somente procedimentos adequ: dos e determinacias atitudes ou disposic6es. A solugao de problemas tampouco & alheia ao terceiro tipo de conteddos, os tradicionaisfitos e concetes, Pode ser que ‘outro motivo pelo qual o aluno nao se mostre capaz de fazer o céleulo proporcio- nal exigido seja o stu desconhecimento do basquete e de suas regras, com o que, num dado momen‘o, nao poderia atribuir significado aos dados propostos pelo problema e, por conseguinte, nao poderia compreendé-Io. Assim, por exemplo, se pedimos a alunos de 13-14 anos que coloquem em orciem cronologica uma sé de datas correspondentes a diferentes eras ou calendirios (gregoriano, mugulma- no, judeu, ete.) podemos chegar & conclusdo de que os alunos nao realizam as operagies adequacas, nao porque sejam incapazes — basicamente exige-se so- mente somar e subirair — mas porque nio entendem o significado da tarefa, por do terem conhecimento de uma representagio adequada do tempo hist6rico (Cartetero, Pozo e Asensio, 1989). ‘Nao 6, portarto, um déficit procedimental, mas conceitual, que impede a solugio da tarefa. Cs procedimentos, sejam habilidades ou estratégias, aplicam-se a alguns contetidos fatuais e conceituais que, se nao forem compreendidos pelos alunos, impossibililam que estes concebam a tarefa como um problema, Em ou- tras palavras, sem compreensio da tarefa os problemas se transformam em pseudoproblemas, em meros exercicios de aplicagio de rotinas aprendidas por repetigao e automatizadas, sem que o aluno saiba discernir o sentido do que esta fazendo e, por conseguinte, sem que possa transferi-lo ou generalizé-lo de forma auténoma a situagees novas, sejam cotidianas ou escolares. Conseqiientemente, 6 importante, antes de comecar a analisar as estratégias e processos envolvidos na solugio de problemas, estabelecer com a maior nitidez, possivel a distingao entre tum exercicio repetitive e um problema. Do exercicio ao problema Podemos partir de uma definicdo ja classica deproblema, que o identifica com “uma situagao que um individuo ou um grupo quer ou precisa resolver ¢ para a qual nao dispoe de um caminho rapido e direto que o leve & solucio” (Lester, 1983), Esta definigZo, com a qual parecem concordar a maioria dos autores, quer

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