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SOCIOLOGIA PROBLEMASE PRATICAS. N°, 19, pp. 98-105 Moderno e Pés-Moderno Definig6es e interpretagdes socioldgicas* Mike Featherstone** Qualquer referéncia ao termo "pés-modernismo’, expde-nos, de imediato, 20 risco de sermos acusados de aderir a um movimento popular, de perpetuar ainda mais, uma moda intelectual frivola ¢ sem significado. Um dos problemas reside om que 0 termo est, simultancamente, na moda, € o seu contetido & dificil de defini. Como confirma o"Modern-day Dictionary of Received Ideas", “tal palavra ndo tem significado. Use-a 0 mais frequentemente posstvel’ (The Independent, 24 de Dezembro, 1987). Hé4 cerca de uma década, em Agosto de 1975, um outro jornal anunciava que o "pés-modernismo esta morto" € que o *pés-pas-modernismo € agora a questao" (Palmer, 1977:364). Se 0 p6s-moder- nismo 6 uma moda efémera, entao, alguns criticos estao certos acerca de quem € 0 responsavel pela sua proeminéncia: os tedricos de hoje em dia, pagos para fazcr o levantamento do campo a partir da orientacio bibliografica dos seus cestudos politécnicos ou universitérios, so obrigados a inventar movimentos por causa das suas carrciras -¢ nao menos que as mineiras e pescadores, dependem delas, Para quanto mais movimentos cles possam arranjar nomes, tanto maior ser4 o seu sucesso (Pawley, 1986). Para outros criticos estas estratégias no constituem, apenas, movimentos internos ao campo intelectual ¢ académico; les sao claros indicadores ¢ barémetros "da doenga que afecta 0 coragio da cuitura contemporanea’. Por isso nao € dificil compreender esta tendéncia cultural ¢ estética agora conhecida por P6s-modernismo - na arte € arquil tura, mésica ¢ cinema, drama e ficgao - como um reflexo da presente vaga de reaccao politica que varre 0 mundo Ocidental (Gott, 1986). Mas parece dema- siado simples ver 0 p6s-modernismo como um reflexo reaciondrio e mecnico das mudancas sociais e acusar os académicos e intelectuais de cunharem 0 termo como parte dos seus jogos de distincdo, Embora certos eriticos jornalts- ticos e para-intelectuais utilizem o termo de uma forma cinica ou depreciativa, cles confirmam que 0 pés-modernismo tem impacte suficiente para interessar “Texto da confertacia apresentada no ISCTE em 12 de Junho de 1989, a convite da revista, Sociologia - Problemas e Praticas ¢ da Revista Crtica de Ciéncias Sociais. Trata-se da versio revista de um artigo publicado no nimero especial da revista Theory, Culture and Society ‘sobre Pés-Modernismo (volume 5, n° 2-3), Junho de 1988. Tradugio de Vitor Pena Ferreira ** Dept. Admin. & Social Studies, Teesside Polytechnic, Middlesbrough, Cleveland, U.K, Mike Featherstone uma vasta audiéncia de classe média. Poucos outros termos académicos recen- tes, podem reclamar ter beneficiado de tal popularidade. Ele nao é, contudo, um termo académico por isso ganhou impeto através dos “movimentos’ artisticos, atraindo também um amplo interesse ptblico devido a sua capacida- de para falar sobre algumas mudangas culturais com que nos deparamos actualmente, Antes que possamos analisar os significados através dos quais 0 conceito é transmitido e divulgado, precisamos ter uma nogio clara sobre a ordem de fendmenos que, geralmente, se incluem sob a capa do conceito pos-moderni mo. Devemos, portanto, ter em atengao 0 grande interesse, € até mesmo a excitagao que ele provocou, igualmente, dentro ¢ fora do meio académico, ¢ interrogar-nos sobre o ambito dos objectos culturais, experiéncias e priticas que 0s te6ricos apresentam ¢ rotulam de pos-moderno, antes de podermos decidir sobre a pureza da sua filiacao politica ou, simplesmente, rejeité-lo como sendo, meramente, um pequeno movimento pendular. Em primeiro lugar, a ampla diversidade de campos, artistico, intelectual e académico, nos quais 0 termo pés-modernismo tem sido usado, € espantosa, Temos a misica (Cage, Stockhausen, Briers, Holloway, Tredici, Laurie Ander- son); a arte (Rauschenberg, Basclitz, Mach, Schnabel, Kiefer; alguns inclui riam também Warhol ¢ a "pop art" dos anos 60 € outros Bacon); a fic¢do (Slaughterhouse Five de Vonnegut, ¢ os romances de Barth, Barthelme, Pyn- chon, Burroughs, Ballard, Doctorow); o cinema (Boby Heat, The Wedd Blue Velvet, Wetherby); o drama (The theatre of Artaud); a fotografia (Sher- man, Levine, Prince); a arquitectura (Jencks, Venturi, Bolin) a teoria ¢ eritica literdrias (Spanos, Hassan, Sontag, Fielder); a filosofia ( Lyotard, Derrida, Baudrillard, Vattimo, Rorty); a antropologia (Clifford, Tyler, Marcus); a socio- logia (Denzin); a geografia (Soja). Muitos dos proprios nomes incluidos cexcluidos da lista apresentar-se-do, sem davida, profundamente controversos para alguns. Tomando a ficgao a titulo de exemplo, Linda Hutcheon (1984:2) considera que alguns desejariam incluir aqui os romances de Garcia Marquez e mesmo de Cervantes sob o titulo de pos-modernismo e outros gostariam de referir-se a eles como neo-barrocos. Scott Lash, escrevendo sobre o tema pretenderia ver a Dada como pés-modernismo avant la letire (Lash, 1988). Ha aqueles que trabalham ¢ escrevem ignorando a existéncia do termo € outros ainda que o procuram desenvolver, promovendo-o activamente. Contudo, pode argumentar-se que uma las fungdes do interesse no pds-modernismo por parte dos criticos, para-intelectuais, intermediarios culturais e académicos, tem sido a difusdo do termo junto de amplas audiéncias em diferentes contextos nacio- nais e internacionais (este é um dos sentidos em que se pode falar de globali- zacao da cultura); € aumentar a rapidez de intercdmbio ¢ circulagdo do termo entre os varios campos académicos ¢ artisticos, os quais querem agora, ¢ devem, dar maior atencdo aos desenvolvimentos nas suas reas vizinhas. Neste sentido, € possivel que um acordo mais amplo quanto ao significado do termo possa, eventualmente, surgir, assim os comentadores em cada campo particular 0 ModernoeP6sModemo 8S achem necessdrio para recapitular ¢ explicar a historia complexa eas utilizagoes do termo com vista & educacao de novas audiéncias académicas. Trabalhar no sentido de uma apreciagao preliminar sobre o significado do p6s-modernismo ¢ dtil para conseguir identificar a familia dos termos derivados de "pés-moderno" ¢ estes podem ser compreendidos melhor se comparados com os derivados de "moderno” Moderno Pés-Moderno modernidade pos-modernidade modernizar pés-modernizar modernizagao pos-modernizagio modernism pés-modernismo Se 0 "moderno" e 0 "pés-moderno" so os termos genéricos, é desde logo evidente que o prefixo "pos" significa o que vem depois, um corte ou ruptura com o moderno, o qual se define por contraponto aquele. Contudo, 0 termo pés-modernismo baseia-se, sobretudo, numa negacao do moderno, um aban- dono, ruptura ou distinciamento perceptiveis face as caracteristicas determi- nantes do moderno, com forte énfase no sentido do afastamento relativo entre ambos. Isto faria do pés-moderno um termo relativamente mal definido, dado que estamos apenas no limiar de uma alegada transformagio € nao na posigo de ver 0 pés-moderno, de forma completamente independente, e que pode ser definido, compreensivelmente, por direito proprio. Tendo isto presente, veja- ‘mos em mais pormenor aquele conjunto de pares. Modernidade - Pés-modernidade sugere o significado épocal dos termos. A modernidade ¢ definida geralmente como tendo surgido como Renascimen- to ¢ foi definida em relagdo & Antiguidade, como no debate entre Antigos ¢ Modernos. Na perspectiva da teoria sociolégica Alema dos finais do século XIX principios do século XX, da qual deriva em grande parte o nosso sentido comum do termo, a modernidade é contraposta a ordem tradicional ¢ implica a progressiva racionalizagdo e diferenciagao, econémica ¢ administrativa do mundo social (Weber, Tonnies, Simmel): processos que fizeram nascer 0 moderno Estado capitalista-industrial e que foram vistos frequentemente numa, perspectiva marcadamente anti-moderna. ‘Consequentemente, falar em pés-modernidade é sugerir uma mudanga de 6poca ou ruptura com a modernidade que envolve a emergéncia de uma nova totalidade social com os seus préprios principios de organizagao. E este tipo de mudanga que tem sido detectado nos escritos de Baudrillard ¢ Lyotard e, até certo ponto, de Jameson (Kellner, 1988). Baudrillad e Lyotard encabecam ambos 0 movimento na direcgdo da era pés-industrial. Baudrillard (1983), sublinha que as novas formas de tecnologia e de informagao se tornam centrais na transformacao de uma ordem social produtiva para uma reprodutiva onde as simulagGes ¢ os modclos, erescentemente, organizam o mundo, de tal modo que a distingao entre o real ¢ a aparéncia se confunde. Lyotard (1984) fala de sociedade p6s-moderna, ou era p6s-moderna, através da qual explica as trans- formagSes no sentido de uma ordem pés-industrial. O seu interesse espectfico sio os efeitos da “informatizagao da sociedad” sobre o conhecimento ¢ argu- menta que a perda de sentido, na pés-modernidade, nao deve ser lamentada porque aponta para a substituicao do saber narrativo por uma pluralidade de jogos de linguagem, ¢ do universalismo pelo localismo. Contudo, Lyotard, como muitos dos que utilizam aqucla familia de termos, muda por vezes 0 registo de um termo para o outro € troca-Ihes 0 uso, preferindo, ultimamente, enfatisar que 0 p6s-moderno deve ser visto como parte do moderno. Por exemplo, em "Rules and Paradoxes and Svelte Appendix’, escreve que "o pés-moderno é, provavelmente, um termo inadequado porque transmite a ideia de uma "perio dizagao" historica. Ora *periodizar" é ainda um ideal "classico" ou "moderno’. P6s-moderno designa, simplesmente, um "cardcter" ou melhor, um "estado de espitito” (Lyotard, 1986-87:209). O outro ponto que interessa salientar Acerca do termo pés-modernismo tal como o usa Lyotard em The Postmodern Con- dition é que, onde fala sobre as mudangas no conhecimento que acompanham ‘0 movimento para a sociedade p6s-industrial, ele concebe isto como tendo lugar ainda no Ambito do capitalismo, reforcando o argumento dos eriticos segundo 0s quais 0 movimento para a sociedade p6s-moderna ¢ insuficiente- ‘mente teorizado no trabalho de Lyotard (vidé Kellner, 1988). Embora 0 movi- mento seja assumido em alguns pontos, torna-se mais facil evitar as acusagies, de estar a fornecer uma explicagao metanarrativa do movimento para a pos- modernidade € do eclipse das metanarrativas, ao insistir numa nogdo mais difusa de "cardcter’ ou "estado de espirito’. Frederic Jameson (1984) tem um conceito de periodizacao do pés-moderno mais definido, e embora se mostre relutante em concebé-lo como uma transformacao epocal, o pés-modernismo € certamente a dominante cultural, ou a l6gica cultural, do terceiro grande estddio do capitalismo, o capitalismo tardio, que teve as suas origens na cra do pos 2* guerra mundial, A invocagio por Lyotard de um cardcter ou estado de esptrito pas-moder- no aponta-nos para um segundo significado do par modernidade pés-moder- nidade. A utilizagao francesa de modernizar aponta-nos para a experiéncia da modernidade em que esta é vista como uma qualidade da vida moderna produzindo um sentido de descontinuidade no tempo, uma ruptura com a tradigao, o sentimento de novidade e sensibilidade relativamente & natureza cfémera, transit6ria ¢ contingente do presente (Vidé Frisby,1985a). E neste sentido de ser moderno associado com Baudelaire que, tal como Foucault (1986:40) defende, transmite uma celebragao irénica do presente: 0 homem moderno ¢ 0 homem que tenta, constantemente, inventar-s¢ a si proprio. E esta tentativa de dar sentido a experiéncia da vida nos novos espagos urbanos ¢ & cultura consumista nasecnte, desenvolvida na segunda metade do século XIX, que dé impeto as teorias da vida quotidiana moderna nos trabalhos de Simmel, Kracauer e Benjamin discutidos por David Frisby (1985b) em Fragments of Moderno ¢ Pés-Moderno o7 modernity. A exper da modernidade constitui também o assunto do livro de Marshall Berman, AU that is Solid Melts into Air no qual observa as perspec- tivas ¢ Tinguagens que acompanham 0 processo de modernizagio, associando- as sob 0 termo "modernismo". Berman discute a sensibilidade moderna que se manifesta numa ampla série de figuras literdrias ¢ intelectuais desde Rousseau € Goethe no século XVIII até Marx, Baudelaire, Pushkin ¢ Dostoevsky no século XIX. A parte a utilizago confusa do modernismo tomado como totalidade da experiéncia e cultura que acompanhou © processo de modernizacao, Berman muitos outros que tentam, actualmente, delinear a experiéncia equivalente da ps-modernidade focam uma nogao particularmente restritiva de experiéncia: aquela que surge nas fontes litersrias c é assim designada pelos intelectuais. Contudo temos de levantar uma objeccao sociolégica & autoridade intelectual- literdria na interpretagdo do quotidiano ou na demonstracao que faz sobre a vida quotidiana das pessoas comuns, Com certeza que alguns intclectuais podem ter compreendido bem a experiéneia dos choques e convulsdes da modernidade, Contudo, necessitamos passar da modernidade ou p6s-moder- nidade como experiéncia subjectiva (relativamente restricta) para dar énfase as priticas actuais, e actividades que tém lugar na vida quotidiana dos varios grupos. Certamente que a descrigao da experiéncia subjectiva pode ter sentido no mbito das praticas intelectuais, c em certas praticas de algumas audiéncias especificas educadas para interpretar estas sensibilidades, embora a pretensao de formular afirmagoes mais vastas necessite de cuidadosa fundamentagao. ‘Como exemplo da alegada experiéncia da p6s-modcrnidade, (ou pés-mo- dernizar) podemos referir a descrigao de Jameson (1984) sobre o Bonaventure Hotel de Los Angeles. Jameson d4 uma interpretagao fascinante da experiencia dos novos hiper-espacos da arquitectura pés-moderna que, segundo ele defen- de, forgam-nos a desenvolver © nosso sistema sensorial ¢ fisico. Contudo ficamos com poucas ideias acerca de como os individuos com diferentes universos culturais ("backgrounds") vivenciam de facto, 0 hotel, ou melhor ainda, como incorporam a experiéncia nas suas praticas quotidianas. Talvez que para interpretar esta experiéncia como p6s-moderna, eles precisem de prineipios orientadores para dar sentido as coisas de que nao se dao inteira- mente conta, ou veém através de cédigos inadequados. Assim se queremos compreender a produgao ¢ interpretacao sociais da experiéncia da pos-moder- nidade, precisamos de encontrar um lugar para o papel dos agentes ¢ interme- didrios culturais que tém um interesse em criar pedagogias pés-modernas para a educacio dos varios pablicos. O mesmo se pode dizer de duas outras caracterfsticas da cultura p6s-moderna identificadas por Jameson: a transfor- magao da realidade em imagens e a fragmentagao do tempo numa série de perpétuos presentes. Aqui podemos servir-nos de um exemplo que envolve ambas as caracteristicas: os "média" que tendem a ocupar um lugar central em muitas discusses sobre a sensibilidade pos-moderna (pense-se, por exemplo, no mundo de simulagio de Baudrillard, onde "a TV é 0 mundo’). Contudo ke Featherstone apesar de alegado pluralismo ¢ sensibilidade perante 0 Outro de que falaram alguns te6ricos, encontramos escassa discussao sobre a experiéncia actual ¢ as praticas de ver televisdo por parte dos varios grupos em diferentes contextos. Pelo contrario, os tedricos da pos-modcrnidade falam frequentemente de um espectador tipico do frenético canal MTV (video-clips) que se move através de diferentes imagens a tal velocidade que é ineapaz de encadear entre si os significados numa narrativa comprecnsivel, divertindo-se simplesmente com a intensidade e sensacao multifrénicas do nivel mais superficial das imagens. A comprovagio do grau de generalizagao destas praticas, e de como sao integr das, ou influenciam, os encontros quotidianos entre as pessoas mutuamente relacionadas, esta manifestamente por fazer. Por conseguinte, embora as refe~ réncias cruditas as experiéncias caracteristicas da pés-modernidade sejam importantes, necessitamos trabalhar com dados mais sisteméticos, sem confiar nas interpretagbes dos intelectuais. Com efeito, devemos concentrar-nos nas priticas culturais actuais nos mutaveis equilibrios de poder dos grupos envolvidos na produgio, classificagao, circulagio ¢ consumo dos bens pés-mo- dernos, algo de que nos ocuparemos a seguir na nossa discussdo do pos-mo- dernismo. Modernizacao - Pés-modernizacao: A primeira vista ambos os termos parecem, infelizmente, colocar-se no meio da discussao entre modernidade - pés-modernidade, modernismo - pés-modcrnismo. O termo modcrnizagéotem sido normalmente usado na sociologia do desenvolvimento para apontar os efeitos do desenvolvimento econdmico na estrutura social tradicional ¢ nos valores.A teoria da modernizacao € igualmente usada para referir os estédios de desenvolvimento social baseados na industrializagdo, o crescimento da ciéncia ¢ da tecnologia, © moderno Estado nacdo, 0 mercado capitalista mur dial, a urbanizacio e outros elementos infra-estruturais (nesta sua utilizagao tem fortes afinidades com o primeiro sentido de modernidade discutido aci- ma).£ geralmente assumido, via um determinado modelo de base-superestru- ura, que certas mudangas culturais (a secularizagao © a emergéncia da identidade moderna, centradas em torno do desenvolvimento auto-centrado) resultardo do processo de modernizagao. Se nos voltarmos para a pos-mode nizagio € claro que uma descrigéo detalhada concomitante dos processos sociais especificos ¢ mudangas institucionais esté, ainda, por teorizar. Tudo o que temos € a possibilidadc de derivar 0 termo daquelas utilizagdes da pos-mo- dernidade que se referem a uma nova ordem social € as transformagies de 6poca mencionadas acima, Por exemplo, a descrigao de Baudrillard (1983) de um mundo simulado pés-moderno baseia-se na suposigao de que o desenvol- vimento da produgao de mercadorias associado com a tecnologia de inform: caovenhaa conduzir ao"triunfo de uma cultura significante" que invertao curso do determinismo de mancira a que as rclagdes sociais fiquem saturadas de signos de transformagio cultural, até ao ponto de nao se poder falar mais em Moderno ¢ P6s-Moderno, 99 classes ou normatividade ¢ scmos confrontados com 0 fim do social’. Baudril- lard, nao usa contudo, 0 termo "pos-modernizagao’. © termo, tem, ainda assim, 0 mérito de sugerir um processo com graus de implementagao, em vez de uma nova ordem social ou tolalidade completamen- tc acabadas, Um contexto significativo para a utilizagdo do termo pos-moder- nizacao € 0 campo dos estudos urbanos e aqui podemos referir os trabalhos de Philip Cooke (1988) ¢ Sharon Zukin (1988). Para Cooke, a pés-modcrnizagao € uma ideologia e um conjunto de praticas com efeitos espaciais que (em sido notérios na economia Briténica desde 1976. Zukin pretende também usar a pos-modernizagio para analisar a estruturagao das relagoes sécio-espac através dos novos padrées de investimento e produgio na indtstria, scrvicos, mercados de trabalho ¢ tclecomunicagoes. Contudo, enquanto Zukin vé a p6s-modernizacao como um processo dindmico comparivel A moderniza quer ela quer Cooke estdo reluctantes em ver nesta a indicagao de um novo estado da sociedade, ambos considerando que cla tem lugar no ambito do capitalismo, Isto tem o mérito de focar tanto os processos de produ: de consumo, e bem assim, a dimensao espacial de préticas culturais especificas da renovacio do centro ¢ zonas ribcirinhas da cidade, o desenvolvimento dos centros artisticos e culturais urbanos, e o crescimento de uma classe ligada aos servigos ¢ cada vez mais prestigiada que acompanham aqueles. Modernismo - Pés-modernismo: Tal como com o par modernidade - p6s-modernidade encontramo-nos de novo confrontados com uma variedade de significados. Comum a todos eles 6 a contralidade da cultura. No sentido mais restrito, 0 modernismo aponta para os estilos que associamos aos movi- mentos artisticos surgidos com a viragem do século ¢ que t¢m dominado os varios campos artisticos até h4 muito pouco tempo. Figuras frequentemente citadas s4o: Joyce, Yeats, Gide, Proust, Rilke, Kafka, Mann, Musil, Lawrence ¢ Faulkener na literatura; Rilke, Pound, Elliot, Lorca, Valery na poesia; Strind- berg ¢ Pirandello no drama; Matisse, Picasso, Braque, Cezanne e os movimen- tos Futurista, Expressionista, Dada ¢ Surrealista na pintura; Stravinsky, Schoenberg ¢ Berg na misica (vidé Bradbury e McFarlane, 1976). Existe um consideravel debate sobre até aonde procurar as origens do modernismo no século XIX (alguns gostariam de remontar até & vanguarda boémia de 1830). As caracteristicas basicas do modcrnismo podem resumir-se a: uma auto-cons- ciGncia ¢ reflexao estéticas; a rejeigao de uma estrutura narrativa em favor da simultancidade ¢ da montage; uma exploragao do paradoxal, ambiguo e incerto na natureza ilimitada da realidade; ea rejcicio da nogo de uma personalidade integrada em favor de uma énfase no sujeito des-estruturado & des-humanizado (vidé Lunn, 1985:34ss). Um dos problemas com a compreen- so do pos-modernismo no campo das artes € que muitas destas caracteristicas so apropriadas para as varias definigGes de pos-modernismo. O problema com este termo, como com os outros termos relacionados que temos discutido 100 Mike Featherstone situa-se em torno da questo de saber quando um termo definido por oposigao ‘comeca a signilicar alguma coisa substancialmente diferente? Segundo Kobler (1977) © Hassan (1985) 0 termo pés-modernismo foi primeiramente usado por Fredcrico de Onis nos anos 30 para indicar uma reacgdo menor ao modernismo. O termo tornou-se popular por volta dos anos (60 em Nova Torque quando foi usado por jovens artistas, escritores ¢ criticos tais como Rauschenberg, Cage, Burroughs, Barthelme, Ficlder, Hassan © Sontag para se referirem a um movimento para além do"exausto” modernismo académico (high modernism) que foi rejeitado devido a sua institucionalizacao no muscu € na universidade. Ele ganhou uma utilizacao mais ampla na arqui- tectura, nas artes visuais ¢ perfomativas € na misica dos anos 70 ¢ 80, tendo-se entio rapidamente transmitido de um lado para o outro entre a Europa ¢ os Estados Unidos, tal como a procura de explicagbes ¢ justificagdes te6ricas do pOs-modernismo na arte, se (ransformou para incluir discusses mais amplas sobre a p6s-modernidade ¢ atrair ¢ produzir um interesse em tedricos tais que Bell, Kristeva, Lyotard, Vattimo, Derrida, Foucault, Habermas, Baudrillard Jameson (vidé Huyssen, 1984). Entre as caracteristicas centrais associadas com © p6s-modernismo nas artes estao: o esbatimento dos limites entre arte ¢ vida quotidiana; 0 colapso das distingoes hierarquicasentre aalta culturac acultura popular ou de massa; a promiscuidade estilistica favorecendo o ecletismo ¢ a mistura de cédigos; a parédia, o pastiche, a ironia, odivertimento ea celebracao da face nao profunda da cultura; o declineo da originalidade/génio do produtor artistico e premissa de que a arte apenas pode ser repetigao. Existe também uma ampla utilizagao dos termos modernismo € pés-mo- dernismo que se referc a complexos culturais mais vastos, i. €. 0 modernismo como cultura da modernidade, ¢ 0 p6s-modernismo como a cultura emergente da pés-modernidade. Danicl Bell (1976) adopta esta posigao na qual vé a premissa cultural fundamental da modernidade, o ideal do individuo auténomo ¢ auto-determinado que deu origem ao empresério burgués no dominio eco- némicoe & procura artistica do individuo livre (0 qual encontra a sua express4o no modernismo) no dominio cultural. Para Bell 0 modernismo é uma forg: corrosiva, libertando uma cultura adversa que em conjugacao com a cultura hedonista do consumo de massas subverte os valores burgueses tradicionais ¢ a ética Puritana, A andlise de Bell bascia-se na nocao de disjungao entre os trés, dominios, politica, cultura ¢ economia, pelo que nao faz sentido procurar um modelo de base-superestrutura no seu trabalho, no qual uma transformagio econdmica, ou na ordem sécio-econémica, tal como a passagem para a socic~ dade p6s-industrial daria origem a uma nova cultura do p6s-modernismo, Melhor ainda, 0 p6s-modcrnismo ¢ visto como uma acentuagao das tendéncias antinomicas do modernismo conjuntamente com o descjo, 0 instinto eo prazer desprendido, para conduzir a logica do modcrnismo as suas consequéncias extremas, exacerbando as tensdes estruturais da sociedade e a disjuncao entre aqucles dominios (Bell, 1980). Jameson (1984) também utiliza 0 p6s-modernis mo para se referir 4 cultura no scu sentido mais amplo ¢ fala de p6s-moderni Moderno ¢ Pés-Moderno 101 ‘mo como uma légica cultural ou dominante cultural, que conduz a transforma- io da esfera cultural na sociedade contemporanea. Enquanto Jameson mostra alguma relutancia em adoptar a perspectiva da periodizagao que assume uma mudanga de direcgao ¢ transformagao abruptas de todos os aspectos da cultura, cle segue Mandel (1975) ao relacionar os estidios do modernismo com o capitalismo monopolista ¢ 0 p6s-modernismo com o capitalismo tardio do pos II Guerra Mundial. Isto sugere que ele utiliza uma forma do modelo base-superestrutura, Contudo cle prossegue também,em parte, 0 mesmo caminho de Baudrillard, sem se Ihe referir, ao defender que 0 p6s-modernismo se baseia no papel central da reprodugao na “descentrada rede global" do moderno capitalismo multinacional, que conduz a uma "expan- sao prodigiosa da cultura por toda a esfera social, até ao ponto em que tudo na nossa vida social..., pode dizer-se, se tem tornado “cultural” (Jameson, 1984:85- 87). Ha um outro ponto nos trabalhos de Bell ¢ Jameson que deve ser levantado antes de continuarmos a considerar o uso do pos-modernismo como chave de mudangas culturais fundamentais, assim como da possivel expansao do signifi- cado da cultura nas sociedades ocidentais contemporaneas. John O'Neill (1988) tem defendido que tanto Bell como Jameson adoptam uma reacca nostalgica face ao pos-modernismo, € unem-se contra o p6s-modernismo na sua "procura de uma ordem’ no seu desejo de renovar a unidade social ameagada, pela via da religido (Bell) ou da utopia Marxista (Jameson). Ambos tem 0 mérito ou o defeito, dependendo do ponto de vista, da pretenso totalizante: deserever © pés-modernismo nos seus graus de rela disjungao com a ordem social contemporanea. Ambos querem avaliar negati- vamente © pés-modernismo, tem-the aversao, um tipo de resposta que nao passou despercebido aos criticos que saudaram 0 espirito democratico, diver- tido € pluralista do p6s-modernismo, e pretendem ver em “Jameson ¢ por associacao, em Bell um lamento nostailgico da perda de autoridade da aristo- cracia intelectual sobre a populagao (vidé Hutcheon, 1986-7; During, 1987). Para aqueles que saudaram 0 pés-modcrnismo como um modo de andlise critica revelador de ironias, inter-textualidades, ¢ paradoxos, as tentativas para imaginar uma teoria do sociedade pos-moderna, ou da pés-modernidade, ou para delinear o papel do pos-modernismo na ordem social, so essencialmente, esforgos vaos de totalizacao e sistematizagio, Com efeito elas constituem metanarrativas autoritérias que esto prontas para uma divertida desconstru- cdo. Os criticos, so, por exemplo, rapidos a apontar esta aparente inconsistén- em The Postmodem Condition, de Lyotard. Kellner (1988), por exemplo argumenta que a propria nogao de pés-modcrnidade em Lyotard impoe uma metanarrativa, pelo que nao é possivel ter-se uma teoria do pés-moderno sem cla, Deve acrescentar-se que Lyotard (1988) tem sublinhado, ultimamente, a necessidade de afastar 0 que ele considera ser uma interpretagao erronea do seu livro como um exemplo da razao totalizante, Para aqueles que assumem com seriedade as implicagdes do pos-modernismo como um modo de teoriza-

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