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Parte Goral ~ lowing fl Estade Atal das Medides Provistrias RODRIGO SANTOS NEVES Mestre am Direito pela Universidade Candide Mendes (UCAM-R}, Memoro Associado Efeti- vo da Academia Brasileira de Oireito Civil (ABDC); Procurador Municipal, Professor Université io, Advogaci militante no ES. RESUMO: 0 principio da separagdo de poderes impie a distribuigdo de atribuigdes do exercicia do poder soberano entre 6rg4os distintos do Estado, de moda a possibilitar a diluigéaga saberania para se garantir 2 liberdade dos individuos. Assim, a procugao normativa por parte de Poder Executive deve ser vista sempre como excepcional, em especial quando as normas que emanam desse Poder inovam na ordem juridica, criando direite e obrigacdes aas individuos. Esse artiga tem a finalidede de discutir as justificatives, os limites e o regime juridico das medidas provisdrias editadas pelo Pre- sidente da Reptibtica, ce modo a compatibilizar sua produgao com o Estacio Demacratico de Direite. PALAVRAS-CHAVE: Estado de Direite; medidas provisdrias: separacac de poderes: democracia. ABSTRACT: The principle of separation of powers requires the distribution of assignments of the exercise of sovereign power between different state organs, so as to allow the dilution of savercignty, to ensure the freedom of individuals. The normative production by the executive branch should always be seen as exceptional, especially when the 1ules that emanate from that Power innovate in the legal system, creating rights and abligations for individuals. This article aims to discuss the rationale, scope and legat status of provisional measures issued by the President of the Republic, in order to match their production with the democratic rule of law. KEYWORDS: Rule of Law; Interim measures; separation of powers; democracy. SUMARIO: 1 Colocacéa do tema: 2 Origem e conceito; 3 Matérias proibidas de veiculagdo por medidas provisorias; 4 Requisitos materiais; 5 Legitimidade da edigéo de medidas provisérias; 6 Procedimento de conversao das medidas provisorias em lei; 7 Eficacia das medidas provisérias; 8 Consideragdes finais; Referéncias. 1 COLOCAGAO DD TEMA Um Estaco democratico de Direito exige o respeito 4 Constituigao € 4 lei, de forma a privilegiar a discussdo dos assuntos politicos do Pais nas mais diversas instancias. Nesse contexto, o principio da separagao de po- deres tem crucial importancia. Foi por meio dele que os Estados modernos limitaram 0 poder dos soberanos, para a garantia da liberdade dos cidadaos. O referido principio impée a divisdo das fungdes do Estado em 6rgios distintos, para que se impossibilite que um mesmo 6rgdo ou pessoa legisle, P RUG A 93 ~Jau-Fevi2015 — PARTE GERAL—DOUTRIBA nn execute as leis e julgue os conflitos entre os cidaddos ou ents Estado. Diante disso, embora se reconheca que existem atividades atipicas em cada um dos Poderes, a atividade normativa do Che: der Executivo deve ser entendida como uma atividade excepcional. N&o se trata, aqui, de qualquer norma juridica produzida pelo Poder Executivo, tais como decretos, regulamentos, portarias etc., que so normas juridicas secundarias. O presente artigo aborda a produgdo normativa veiculada por medidas provisérias, que so normas juridicas criadas fora da estrutura do Poder Legislativo que, no entanto, possuem forga de lei. do Po- Embora a regra seja a da legalidade (art. 5%, 11, da CR/1988), as me- didas provisorias, por terem forca de lei, podem inovar na ordem juridica, criando obrigagGes e direitos aos individuos. © cuidado que deve ser tomado é exatamente em se transformar uma medida de carater excepcional em regra. A edicao de medidas provisérias deve ser uma atribuicdo a ser exercida juntamente com a atividade legisla- tiva do Congresso Nacional, mas néo em sua substitui¢o. Para a analise do tema, o presente artigo traga um breve histérico das medidas provisérias e de figuras assemelhadas que © Direito brasileiro ja experimentou, além da busca da natureza juridica e do conceito dessa espécie normativa. Mas, como a airibuig&o de edi¢do dessas normas ndo é uma atividade tipica do Poder Executivo, o constituinte estabeleceu limites materiais para essa atividade. Alguns temas nao podem ser tratados por medida proviséria, que so objeto de reserva legal. Além disso, questo importante que foi tratada foi a dos pressupostos ou requisitos para a edigao das medidas provisdérias: relevancia e urgéncia. Embora possam parecer temas entregues & discricionariedade do Presidente da Repdblica, deve-se questionar a possibilidade (ou nao) de controle dos Outros 6rgaos de poder sobre esses elementos, em especial se o Poder judi- cidrio pode interferir nessa questao. i ‘ A Constituicgao da RepUiblica (CR/1988) estabelece que o Presidente da Repiiblica pode expedir essa espécie normativa. Mas, seria possivel que - governadores e prefeitos editassem medidas provisdrias? Esse assunto tam- “. _bém ser tratado neste artigo. Ponto relevante é 0 procedimento de converséo da medida provis6ria em lei. Como funciona, quais siio as etapas e quais as suas consequéncias? i i; tl I i i ARDC f° 93 — Jen-Fesf2015 — PrnTE GERAL — DOUTRIA Além disso, este artigo se preocupou com a producio dos efeitos das medi- das provisérias na ordem juridica. Este trabalho nao tem por finalidade esgotar o tema, mas to somente reabrir o debate académico sobre essa importante e perigosa espécie nor- mativa. 2 ORIGEM E CONCEITO E importante, antes de um estudo das medidas provisérias, analisar outras figuras semelhantes. Isso porque as referidas medidas provisdrias, ao menos no nome, séo uma novidade da CR/1988. S A Constituicao de 1937 estabelecia, em seu art. 180, a competéncia do Presidente da Reptiblica de editar decreto-le sobre toda matéria de com- peténcia legislativa da Unido. Assim, & época, o Presidente da Repiiblica atuava de forma a substituir a atividade legislativa do Poder Legislativo de forma plena. Com a promulgacao da Constituigaio de 1946, nao havia mais a referida competéncia ao chefe do Poder Executivo, Em mais um regime ditatorial brasileiro, foi outorgada uma nova Constituigéo em 1967, que estabelecia o seguinte: Art, 58. O Presidente da Repdblica, em casos de urgéncia ou de interesse ptiblico relevante, ¢ desde que nao resuite aumento de despesa, podera ex- pedir decretos com forca de lei sobre as seguintes matérias: 1 — seguranea nacional; il - finangas publicas. Parégrafo Unico. Publicado o texto, que terd vigéncia imediata, 0 Congres- So Nacional o aprovara ou rejeitard, dentro de sessenta dias, no podendo emendé-lo; se, nesse prazo, n’o houver deliberacdo 0 texto seré tide como aprovado. O texto do paragrafo tinico concedia muito poder ao chefe do Poder Executivo, uma vez que instituiu uma aprovaco tacita do decreto que fosse aprovado dentro de 60 dias. Com a edic&o da Emenda Constitucional n? 1, de 1969, a referida Constituigdo passou a prever, ao invés de um decreto com forga de lei, um decreto-lei'. Posteriormente, com o advento da CR/1 988, desapareceu o 1 "Art. 55, 0 Presidente da Repdblica, em casos de urgéncia ou de interésse plibiico relevante, e desde que néo hhaja aumento de despesa, poderd expadir decretos-leis sdre a3 seguintes matirias: | — seguranca nacional; U1 finangas pébices, inc'usive normas tributarias; e Ill - criacdo de cargos piblicas e fixacdo de vencimentos, § 1° Publicado o texto, que teré vig@ncia imediata, 0 Congresso Nacional o aprovard ou rejeitard, dentro AUC N° 93 — Jeo-Fex/2115 — PABTE DERAL— QUUTRINA.... 87 decreto-lei e surgiram as medidas provisorias. Essas normas gozavam de forga de lei e tinham aplicagdo imediata por um periodo de 30 dias, sendo imediatamente submetidas ao Congresso Nacional, que podia converté-las em lei, ou rejeita-las. Se apds esse perfodo nao houvesse manifestagao do Congreso haveria a rejeicao tAcita do texto. Como as deliberagées originarias do Congresso j4 tomavam a sua pauta, muitas medidas provisorias nao eram votadas, 0 que provocou a pra- tica de reedigSes de medidas provisérias. Em outras patavras, publicava-se uma nova medida proviséria com 0 mesmo texto da que havia perdido a eficdcia apés seu exiguo prazo de 30 dias. A situagao foi institucionalizada pela pratica, e as medidas provisérias ja indicavam o néimero de reedicées. Por exemplo, a MP 1.000-36 era, na verdade, a MP 1.000, na sua trigésima sexta reedi¢ao, Isso ocorreu até a promulgacao da Emenda Constitucional n? 32/2001. Ha que se investigar a natureza juridica da medida proviséria. Seria um ato adminisirativo? Como ato administrative, 0 ato normative deve se submeter aos principios que regem a Administragao Pablica esculpidos no art. 37, caput, CR/1988, entre eles o da legalidade. Ora, a Lei Maior estabe- lece no art. 62 que o Presidente da Republica poderé adotar medidas provi- s6rias, com forca de lei. Se a medida provisoria tem forga de lei, ela no se submete aos ditames legais. Além disso, 0 ato administrativo tem o ambito de atuacao muito limitado, pois somente alcanca aqueles que mantém rela- cionamento com a Administragao Publica. £ a medida proviséria vai muito além disso, pois atinge, além do Poder Péblico, uma infinidade de pessoas, mesmo enquanto afastadas da Administragao Publica. Seria entéo uma forma de delega¢ao legislativa? Parece-nos que a res- posta também deve ser negativa. Isso porque a delegacao legislativa exige matéria especifica e uma delegacao espectfica de uma atribuicao que nao é originariamente do chefe do Poder Executivo?. Na delegaco legislativa, © produto 6 uma lei delegada, enquanto que, na medida proviséria, 6 um ato normativo que tem forga de lei. Na delegacao legislativa, a competéncia legislativa é do Congresso Nacional, enquanto que, na medida proviséria, a competéncia é originaria do Presidente da Republica (art. 84, XXVI, da de sessenta dias, ndc podendo emendé-lo; se, nesse prazo, nao houver deliberagdo, o texto seré tide pot aprovado, § 2° A rejeigia do deeseto-tei ngo implicaré a nulidade dos ates praticadas durante a sua vigencia”. (Constiwuigdo de 1967, com a Emenda Constitucionat de 1969). 2 Aacmissdo ce uma competéncia delegada de forma técita seria indefensavel, porque a delegagéo leg's!ativa Pressupse 2 delimitag&o cos temas 2 serem tratados, bem como o tempo em que a referida competéncia Poderé ser exercida, 0 que nfo & 0 casa da medida proviséria. Nesse sentido, ver SOUSA, Leomar Barros Amorim de. A predugéo normstiva da poder executivo: medidas provistrias, leis delegadas ¢ regulamentos. Brasilia: Brasilia Juridica, 1999, 9. 98. 68 vommicnso nnnremman G N99 — Jan-F04/20§ — RATE GERAL— DOUTRINA CR/1988). Na detegacdo legislativa, a competéncia se exaure apds a pratica do ato, enquanto gue, na medida proviséria, a competéncia é permanente. Sobre o tema, adverte Friedrich Miiller: Os intimidantes exemplos da histéria constitucional mais recente do Brasil deveriam ser motivacao suficiente para interpretar e aplicar cuidadosa e so- briamente 0 art. 62 como direito constitucional positivo plenamente vigen- te. Disso resulta com toda a clareza 0 seguinte: as medidas provisérias ndo. sao leis — nem a partir do 6rg8o que as emite, nem com vistas a sua prépria natureza juridica> Em verdade, a medida proviséria é ato normativo preca¥io do chefe do Poder Executivo, que goza de forga de lei, de eficdcia imediata, subme- tido a um controle pelo Legislative a posteriori, Essa atividade, embora possa parecer incompativel como a ideia de separa¢do de poderes, na verdade é perfeitamente possivels, diante da ne- cessidade de trazer para a sociedade solugao aos problemas que se apresen- tam. Nas palavras de Eros Grau: [...] 0 emergir da capacidade normativa de conjuntura, via da qual se pre- tende conferir resposta & exig&ncia de produgdo imediata de textos norma- tivos, que as flutuagdes da conjuntura econdmica esto, a todo o tempo, a impor [...J Evidente que esse poder-dever ha de ser ativado em coeréncia N&O apenas com as linhas fundamentais e objetivos determinados no nivel constitucional, mas também com o que dispuser, a propésito do seu desem- penho, a leis Como o mercado tem a caracteristica da instabilidade e de mudancas rapi- das, 0 Estado deve possuir mecanismos eficientes que consigam manter um relative equilfbrio na economia, de forma que consiga implementar as po- Iiticas pablicas previamente estabelecidas, em que os mecanismos normati- vos tradicionais (leis) niio so satisfatdrios para a regulacdo da economia6, S MATERIAS PROIBIDAS DE VEICULAGAD POR MEDIDAS PROVISORIAS As medidas provis6rias séo um instrumento importante para a ad- ministragdo da nacido, tendo em vista que determinadas acdes devem ser 3 MULLER, Friedrich. As medidas provisérias no Srasil diante do Pano de fundo das experiéncias atemas. In: nt Gres Roberto; GUERRA FILHO, Wills Santiago (Org). Dirile consttucionel: estugos em homensaema 3 Paulo Bonavices. So Paulo: Maineiros, 2001. p, 336 NEVES, Rodrigo Santes, Fungéo normative e agéncias reguladoras: umva contribuig8o de teora dos sistemas 2 reguleeao juridica de economia, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 99. S Cf. GRAU, E108 Roberto. O aiteite posto # 0 aireita pressuposta, 2. ed, Sé0 Paulo: Malheiros, 1998, p, 232, © NEVES, Rodrigo Santos. Op. cit. 9. 99, AOE N° 93 ~ Jan-Feuj2015— PARTE GERAL — QQUTRINA, nen nena cr] en tomadas de imediato e precisam de autorizagao fegislativa. No entanto, a autorizagiio prévia.do poder constituinte para que 0 Presidente da Repabli- ca edite normas com forga de lei ndo € 0 mesmo que “assinar um cheque ‘em branco”. Em outras palavras, embora o chefe do Poder Executivo possa editar medidas provisérias, com forga de lei, alguns assuntos nao podem ser tratados por este tipo de norma. £ certo que as medidas provisérias nao se confundem com as feis de- legadas, isso porque este tipo normativo requer uma autorizagao expressa do Congresso para a sua edi¢do sobre assunto especifico € o seu texto nao 6 apreciado pelo Congresso posteriormente. No entanto, como se tratam as duas espécies normativas de atos legislativos do Poder Executivo, pode-se dizer que ha semeihangas entre elas. Determinados atos sao privativos das Casas do Congresso Nacional, ou determinadas matérias esto abrangidas pela reserva legal. Ou seja, de- terminados ato ou determinados assuntos somente poderdo ser tratados por 6rgdos genuinamente legislativos’. O § 1° do art. 68 estabelece assuntos que no poderdo ser objeto de delegacao legislativa®, entre eles os atos priva- tivos de quaisquer das Casas do Congresso Nacional, matéria reservada 4 lei complementar, matéria relativa A organizagao do Poder Judiciario e do Ministério Publico, a carreira e a garantia de seus membros etc. Por isso, 0 § 12 do art. 62 estabelece as matérias que nao podem ser veiculadas via medida proviséria, como se vé: E vedada a edi¢do de medidas provisérias sobre matéria: |=relativa a: a) nacionalidade, cidadania, direitos politicos, partidos politicos ¢ ¢ eleitoral; b} direito penal, processual penal e processual civil; ©) organizacdo do Poder Judiciério e do Ministério Pablico, a < garantia de seus membros; d) planos plurianuais, diretrizes orgamentérias, orcamento e crea. nais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, $ 3°) ee 7 Neste sentide cf, CLEVE, Clémerson Merlin. Atividade fegislativa do poder executive. 2. ==. Revista dos Tribunais, 2000. p. 180-183. 8 “Art. 68. As [eis dotegadas serfo elaboradas pelo Presidente da Reptiblica, que devard soc a9 Congresse Nacional. § 1° Nao sero objeto de delezagao os atos de competéncia exc! Nacional, os de comnpeténcia privativa da Camera dos Deputados ou do Senado Federal 2 Je! complementar, nem a legislagko sobre: | — organizagSo do Poder Judicidrio ¢ do Minsté carreira e.a garantia de seus membres; |! — nacionalidade, cidacania, direltes individuals, poli SI — planos plurianuais, diretrizes orgamentérias e orcamentos". (CR/L9S8) ADC W° 83 —Jan-Fevj2075 — PARTE BERAL— OGUTRINA il — que vise a detencdo ou sequestro de bens, de poupanga popular ou qualquer outto ativo financeiro; It reservada a iei complementar; IV — ja disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congress Nacional e pendente de sangio ou veto do Presidente da Republica.’ AS matérias relacionadas no inciso | sao hipdteses de reserva legal. Sao assuntos que somente poderdo ser tratados por lei formal aprovada pelo Congresso Nacional. A possibitidade de o chefe do Poder Executivo editar medida proviséria com forca de lei deve ser vista como algo excepcional. Por isso, 0 constituinte estabeleceu que determinados assuntos Somente po- derao ser tratados por lei e nao pelo referido tipo de norma. No que sé refere as normas orgamentarias, é possivel a edic&o de medida proviséria para abertura de crédito extraordinario para pagamento de despesas im- previsiveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comogio interna ou calamidade puiblica (art. 167, § 3%, da CR/1988). A hipétese prevista no inciso II visa evitar 0 que aconteceu no Go- verno Collor, em que as cadernetas de poupangas da populacao brasileira foram confiscadas pelo governo por um longo periado e, depois, restitufdas a0s poucos apés longo perfodo. O inciso III impossibilita que matéria reservada & lei complementar seja objeto de medida proviséria. A regra para o tratamento normativo é a lei ordinaria. Somente quando a Constituigdo estabelece expressamente a matéria seré tratada por fei complementar. Embora nao haja hierarquia nor- mativa entre lei ordinaria, lei complementar e medida provisdria, existe um ambito de aplicagao de cada uma delas. As medidas provisérias poderéo ser editadas quando a matéria puder ser tratada por lei ordindria. Mas as leis complementares tém um quérum de aprovagiio mais rigid. Assim, quando © constituinte estabeleceu que determinadas maiérias deverao ser tratadas por lei complementar, é porque ele deseja que o assunto seja mais bem dis- Cutido (aprovado por maicria absoluta). Destarte, mesmo que se edite uma medida proviséria de matéria reservada 2 lei complementar e se aprove o projeto de convers%o em lei complementar por maioria absoluta de cada casa do Congresso Nacional, ainda sim o texto sera inconstitucional, por vicio na origem. A hipétese do inciso IV é uma consequéncia logica do processo legis- lativo. Nao pode ser objeto de medida proviséria matéria tratada (da mesma 9 Cf art. 62, § 1°, da CRIGEB, ADC 4" 83 — Jan-Few2615 — PARTE GERAL—DOUGRIA..... forma} em projeto de lei j4 aprovado pelo Congresso, pendente apenas a sanco presidencial. Ora, se o Presidente da Republica quer que um texto que ja foi aprovade pelo Congresso Nacional entre em vigor, basta sancio- nar, promulgar e publicar 0 texto do projeto aprovado, e nao editar medida proviséria. 4 REQUISITOS MATERIAIS Uma questZo que deve ser observada é a que se refere aos requisitos materiais para a edicdo das medidas provisérias. Isso porque o Presidente da Repdblica, quando as edita, exerce funcao atipica do Poder Executivo. Por isso essa atividade deve ser entendida como excepcional, sob pena de usurpacéio da competéncia do Legislativo. Assim, 0 constituinte estabeleceu requisitos materiais para que as me- didas provisérias fossem editadas no art. 62, caput, da CR/1988, que sdo a relevancia e a urgéncia. Parece redundante uma norma juridica tratar de matéria relevante. Isso porque toda matéria tratada em uma norma juridica é juridicamente relevante. Assim, o dispositivo constitucional nao se refere a esta relevancia, mas sim de uma relevancia especifica. No caso das medidas provisdrias, a relevancia do tema deve estar relacionada com o atendimento ao interesse piblico™. Neste sentido, a relevancia da matéria veiculada em medida pro- viséria deve ser extraordinaria”, para provocar essa competéncia igualmen- te extraordinaria do chefe do Poder Executivo!?, O Decreto n® 1.937/1996 estabelecia, em seu art. 22, que “somente sero apreciados pela Presidéncia da Republica projetos de medida provi- soria se caracterizado estado de necessidade legistativo decorrente de cir- cunstancia fatica ou situagao juridica de dificil previséo”. Em seu § 12, 0 dis- positivo conceituava o estado de necessidade legislativo como a “exigéncia ou indispensabilidace de tomada de providéncia de indole legislativa cam efeito imediato sob pena de se verificarem prejuizos de order adr va, econdmica, social ou de seguranga publica”. Este decreto estabelecia parametros mais objetivas racdo da chamada relevancia. Infelizmente, o Decreto + marco de 2002, estabelece regras sobre a produgac 10 TAVARES, André Ramos. Curso de direito constituetonal, 9. e¢. mesmo sentico: CLEVE, Clamerson Meriia. OP. clt., p. 274. 11 MULLER, Friedrich. As medidas provisérias no Rrasil diante In; GRAU, Eras Roberto; GUERRA FILHO, Wiis Santiaga (Ot 12 SOUSA, Leomar Barras Amorim de. Op. cit, p. 98. 72 ROC N93 — Jan-Feu/2015 — PARTE GERAL —DOUTRINA, dente da Reptiblica, em substituiggo ao decreto anteriormente citado, nao conceituando a relevancia, nem falando sobre o estado de necessidade le- gislativa, fato que nao impede o controle a posteriori. Quanto a urgéncia, devem ser feitas algumas consideracées. Sabe- -se que © constituinte utilizou a expressdo urgéncia em dois momentos na producao normativa, A primeira foi para justificar a edigao de medida pro- viséria (art. 62, caput), a segunda para se adotar o procedimento legislativo suméario, a pedido do Presidente da Republica (art. 64, § 19). Embora a expresséo utifizada seja idéntica, deve-se entender que ela possui significados distintos nos dois dispositivos constituciongis. No pro- cesso legistativo sumArio, 0 Presidente da Republica solicita tramitagao em regime de urgéncia. Neste caso, a Camara dos Deputados e o Senado Fe- deral ter4 o prazo de até 45 dias para votarem o projeto de lei, sob pena de trancamento de pauta até votacdo final (art. 64, § 22, da CR/1988). Havendo emendas do Senado ao texto aprovado pela Camara, esta tera o prazo de 10 dias para votar 0 projeto. Assim, no processo legislative sumario, se tudo der errado, um projeto de lei é aprovado em até cem dias. Assim, a urgéncia prevista no art. 62, que legitima a edicdo de medida proviséria, deve ser tamanha que nao possa esperar este exiguo espaco de tempo. Caso contrrio, a utilizagao da medida provisdria seria abusiva’, A urgéncia deve ser caracterizada pela imprevisibilidade da situagao fatica Criada. Se tal situagdo fosse prevista, seria possivel a adogao dias vias ordi- narias para a criagdo de norma legal'*. E lamentavel a edigdo de medida proviséria que contrarie este precei- to, como, por exemplo, a Medida Proviséria n° 207, de 13.08.2004, poste- riormente convertida em Lei n° 11.036/2004, que estabelece, em seu art. 2°: “O cargo de Natureza Especial de Presidente do Banco Central do Brasil fica transformado em cargo de Ministro de Estado”. Concordamos com Jeferson Moreira de Carvalho, para quem a edicdo da referida medida proviséria foi abusiva’®. Que urgéncia ha na transformagao do cargo de presidente do Banco Central em ministro de Estado? Qual é 0 interesse pdbtico que foi tutelado'*? Parece-nos que a matéria poderia ser tratada por lei. No entan- 13 TAVARES, André Ramos. Op. cit, p. 1307. 14 Neste sentido: CLEVE, Clamerson Merlin, Op. cit., p. 176-177. 15 CARVALHO, Jeferson Moreira de. As medidas provisdrias, 0 art. 2° de EC 32/2001 e os prazos constitucionais. Revista de direita canstitucianat e internacional, Séo Paulo, 2. 15, n. 61, p. B18, outJdez, 2007. 16 _ Na exposigao de motivos da referida medida proviséria, houve as seguintes justificativase "1. No atual contexto ce globatizagao da economia, com a participacdo cada vez mais efetive da autoridade monetiria do Pats 10 cendrio nacional e internacional, 0 cargo de Presidente do Banco Central do Brasil assume, cada vez mais, Felevancia estratégica, tanto no cendria politico quanto no plano institucional, em razdo da complexidade ‘ADE 11" 93 — Jan-Feuf2015 — PARTE GERAL—DOUTRIMA... to, o STF, ao julgar as AcGes Diretas de Inconstitucionalidade rs 3 3.290, entendeu pela improcedéncia do pedido, considerando greenc> os requisitos. O controle sobre esses quesitos deve ser feito pelo Congresso Nacio- nal (pela comiss&o mista e por cada uma das suas casas). Isso porque esta- belece o art. 49, Xt, o seguinte: “E da competéncia exclusiva do Congresso Nacional: [...] Xi —zelar pela preservacao de sua competéncia legislativa em face da atribuic¢do normativa dos outros Poderes”. E possivel que o Judiciario exerga o controle sobre esses quesitos, mas apenas em cardter excepcional. Esse é o entendimento do préprio STE”, A respeito do tema, porém, a doutrina diverge. HA entendimento doutrinario que se trata de controle politico, nao cabendo ao Judiciario exercer este tipo de controle. No entanto, Clémerson Merlin Clave" afirma que cabe ao Ju- diciario verificar esses requisitos. O STF ja decidiu sobre o tema da seguinte forma: Medida proviséria: excepcionalidade da censura jurisdicional da auséncia dos pressupostos de relevancia e urgéncia a sua edigdo: raia, no entanto, pela irriséo a afirmago de urgéncia para as alterages questionadas & disci- plina legal da aco rescisoria, quando, segundo a doutrina e a jurisprudén- cia, sua aplicagao & rescisdo de sentencas jé transitadas em julgado, quanto auma delas ~ a criagao de novo caso de rescindibilidade — é pacificamente inadmissivel e quanto & outra — a ampliacdo do prazo de decadéncia — 6 pelo menos duvidesa.”? Em outra oportunidade, o STF mais uma vez exerceu 0 controle judi- cial sobre medida proviséria em descompasso com o mandamento consti- tucional, nas palavras do Ministro Marco Aurélio de Mello: ] Acresce, ademais, o descompasso entre o instumental, a medide cro- viséria, porquanto editada para viger por perfodo de trinta dies. eo tratado — 0 de isengdo. Este no se coaduna, no que almela o esti! a relevancia des fates da vida econémica. 2. 0 Presidente do Banco Car: atribuigdes prdorias co cargo, toma decisdes de elevada complexides: situag6es juridicas, em virtude da gestao das politicas mecrceconémi de grande repercussao na ordem econdmica. 3. A reievancia das m: do Presidente co Banco Central do Brasil, cujas atribuigdes compres: complexidade, a formulacéo da politica monetiria co pais @ a inter forma da legistago ce regancia, sugere a nevessidade de cx Parece-nos Que a urgéncia no foi evidenciada, o que sugere 2: 17 "LL verficagdo pelo Judiciério dos requisites de relevéncia eu: & possivel em cardter excepcional, quande estiver patente o ax: do Poder Executivo”, (STF, RE 550652 AgRe/SC, 2°, Rol. Kt 18 CLEVE, Climerson Merlin, Op. cit., p. 175. 19 STF, ADI 1753 MO/DF, Plendrio, Rel. Min, Sepillveda Pertence, Beare medics amcor areca ae oar sate Sar CSA: woIBC W? 83 ~ Jan-Fauj2015 - PARTE GERAL—DOUTRINA espécie, a implantagao de inddstrias, a investimentos, com a incerteza de- corrente da reguiamentagao precaria e ef€mera da matéria, com a latente possibilidade de inversdo do quadro.?° Na hipdtese de o Congresso Nacional nao exercer o referido con- trole de forma adequada, podera o Poder Judiciario (STF), como guardizo da Constituigao, exercer o referido controle, para que se evitem abusos ao poder normativo (excepcional) do Presidente da Reptiblica. 5 LERTIMIDADE DA EDIGO DE HEDIDAS PROVISORIAS A Constituiggo da Repdblica (CR/1988) estabelece que*tompete ao Presidente da Reptiblica a edicado de medidas provisérias. E evidente que as matérias tratadas pelas medidas provisérias editadas pelo Presidente da Repdblica serao aquelas afetas 8 competéncia legislativa da Unido. Como vivemos em uma Federacio, fica evidente que, como os entes da Federacao gozam de autonomia politica, cada Unidade da Federacao — ho caso brasileiro Unido, Estados, Distrito Federal e Municipios — detém compeléncia legislativa. Essas competéncias, para que haja conflito de leis No espago, sdo coordenadas para reparticdo de competéncia estabelecida na CR/1988, nos arts. 21 a 24. Além disso, a CR/1988 estabelece que os Municfpios t&m compe- t@ncia para legislar sobre assunto de interesse local, além de suplementar a \egislagao federal ¢ estadual, no que couber. Quanto aos Estados-membros, ficou-lhes reservada uma competéncia residual, competindo-lhes legislar sobre os temas que nao foram atribuidos & Unido nem aos Municipios. Diante da competéncia legislativa dos Estados e dos Municipios, é possivel, pelo principio da simetria (arts. 25, caput, ¢ 29, caput, da CR/1988) que o chefe do Poder Executivo dos Estados e dos Municipios possa editar medidas provisérias, desde que haja previsdo expressa nas suas respectivas constituigdes estaduais e leis orgAnicas municipais. § PROCEDIMENTO DE CONVERSAO DAS MEDIDAS PROVISORIAS EM LEI O cheie do Poder Executivo ~ 0 Presidente da Republica — editara a medida proviséria que produzira efeitos imediatamente com a sua publica- ¢40 no Diario Oficial", devendo submeter imediatamente 0 projeto de lei 20 STF ADI 2348-9, Piendrio, Rel. Min, Marco Aurélia, D1 07.12.2000, 21 0 § 2° do art. 62 estabelece uma excegdo a procucaa de efeitos imediains da medida proviséria. aa ROC M? 83 — Jan-Fuwf201% — PARTE GERAL — DOUTRINA.... tS 1 de conversio da medida proviséria em lei a cada uma das Casas do Con- gresso Nacional. O texto seré encaminhaclo primeiramente 4 Camara dos Deputados”? e, depois de aprovado por esta Casa, ao Senado Federal. Na Camara, o projeto ficara a espera de detiberacao por 45 dias. Sera composta comissdo mista de deputados e senadores para apreciar tanto os requisitos constitu- cionais da edicao das medidas provisérias quanto os efeitos financeiros da sua adogao. Apés sua apreciacao, 0 projeto sera encaminho ao Plenério da Casa. Apés este prazo, a pauta de trabalhos ficaré trancada, isto é, 0 Plena- tio fica obrigado a julgar os projetos de conversdo das medidas provisérias em lei antes de qualquer outra matéria. Assim, se 0 projeto ja estiver na CAmara dos Deputados por 45 dias, no 46° dia ele entrara em regime de urgéncia, com o trancamento da pauta até sua deliberagdo. Vamos supor que, apds deliberac4o positiva da Camara, no 50° dia, 0 projeto seja enca- minhado ao Senado. Este projeto de conversdo de medida proviséria em lei trancara imediatamente a pauta do Senado, que devera votar o projeto para que se possa retomar as deliberagdes ordinarias. Esse procedimento tem trazido certo desconforto para o Senado Fe- deral, tendo em vista que, em virtude da demora da deliberagdo da Camara dos Deputados, a pauta do Senado quase sempre é trancada, por causa dos projetos de conversdo de medidas provisérias que entram na Casa apds o prazo dos primeiros 45 dias. A medida provisoria, uma vez editada, produzira efeitos por 60 dias, sendo prorrogados por mais 60 dias, caso ainda nao tenha sido convertida em lei. Cabe registrar que o prazo de sessenta dias é 0 prazo de producao de efeitos da medida proviséria. O prazo de 45 dias 6 para que cada casa do Congresso delibere sobre sua conversao em lei, em rito normal. Se, porém, passarem os 120 dias de eficacia da medida proviséria sem que haja delibe- ragao das Casas do Congreso, a medida proviséria perdera os seus efeitos. Nao se trata, aqui, de revogacdo da medida proviséria pela deliberagdo das casas do Congresso, mas apenas a perda de s Ha que se fazer uma necesséria distingao, tendo em vista gue, s¢ 22 Art, 62, caput, da CR/1988. 23 §8°do art. 62 da CRISES, 24 § 6% do art. 62 da CRI1988. 25 £7? doar. 62 de CR/L98B. 76 ROC N® 93 —Jton-Few2t5 ~ PARVE GERAL—DOUTRINA revogacao da medida provis6ria pela falta de sua aprovagao no Congresso, a@ norma porventura por ela revogada nao tornaria a vigorar. No entanto, como a medida proviséria deixa de produzir efeitos, a perda de sua eficacia provocaré a repristinagao de uma norma revogada pela medida proviséria, Ou seja, se a medida proviséria, que revogou deter- minado dispositivo de uma lei, deixa de produzir efeitos, a norma que antes fora revogada pela medida provis6ria agora volta a vigorar. E por conta disso que o § 3° do art. 62 prevé a possibilidade de o Con- gresso Nacional editar decreto legislative, no prazo de 60 dias apés a rejei ¢40 ou perda da eficdcia da medida proviséria, para disciplinar as relacdes jurdicas decorrentes da medida provis6ria rejeitada. Portanto, por meio de decreto legislative, o Congresso poderia manter os efeitos da medida pro- vis6ria sobre as relagGes juridicas que se formaram durante a sua vigéncia. Na hipétese de 0 Congresso nao editar 0 decreto legislative de que trata o § 3°, as relac6es juridicas constituidas durante a vigéncia da medi- da proviséria permanecerao por ela regidas, como estabelece o § 11 do art. 6276 Na hipotese de rejeic¢ao expressa da medida proviséria, ou sua rejei- ao tacita (com a perda da eficdcia pela falta de deliberacdo), nao podera ser editada “nova” medida proviséria com o mesmo texto durante a mesma sessdo legislativa””. No passado, antes da edigao da Emenda Constitucional n? 32, havia uma pratica de reedigao de medidas provisérias. A época, caso a medida proviséria nao fosse aprovada pelo Congresso, o chefe do Execu- tivo editava nova medida proviséria com 0 mesmo texto daquela que nao havia sido ainda aprovada pelo Legislative. Com a nova regra, tal pratica nao mais ocorre. No entanto, se 0 projeto de conversao em lei for aprovado, seguird para a Presidéncia da Repdblica para sangio, promulgacio e publicacao, tornando seu texto definitivo. Se, porém, o texto aprovado na Camara dos Deputados sofrer quaisquer alteragdes no Senado, o texto devera retornar a Camara para revisdo e, depois, ser remetido & Presidéncia da Republica para sangado. 26 ‘Art. 62.1...) § 11. Nao editado 0 decreta legislative a que se refere 0 § 3° al8 sessenta dias apés a rejeigée ou petda de aficdcia de madida provisdria, as relagdas juridicas constituicas e decorrentes de alos praticadas durante sua vigdscia conservar-se-&0 por ola regicias.” 27 Sessio legislative é 0 periado anual em que se reinem a Camara das Deputados e 0 Senado Faderal para 0 desermpenho de suas funcdes. ‘ROC WP 93 — Jan-Fou2016 = PARTE GERL— SCUTRINA... cat Como ja foi dito, é possivel, no momento da conversiio da medida proviséria em lei, que se facam algumas alteragdes no seu texto original. Neste caso, 0 texto original permaneceré em vigor até que o projeto apro- vado seja sancionado ou vetado o projeto, nos termos do art. 62, § 12, da CR/1988. TEFICACIA DAS MEDIDAS PROWISORIAS As medidas provisérias produzem efeitos, em regra, a partir de sua publicagdo no Diario Oficial. No entanto, em alguns casos, as referidas nor- mas somente produzirdo efeitos no ano seguinte a sua edicdo e conversdo em lei. O § 2° do art. 62 estabelece que, na hipdiese de medida provisdria que institui ou aumenta os tributos, ressalvadas algumas excecGes, somente produzira seus efeitos no ano seguinte a sua edi¢ao, se for convertida em lei até o Gitimo dia do ano em que foi editada®*, A referida limitagao se deve ao principio da anterioridade tributaria (art. 150, JIL, b, da CR/1988), que impossibilita que tributos sejam criados ou aumentados no mesmo exercicio financeiro e, por conseguinte, surpre- endam os contribuintes. A regra nao se aplica ao imposto de importacao de produtos estran- geiros, ao imposto sobre a exportag4o, para o exterior, de produtos nacio- nais ou nacionalizados, ao imposto sobre produtos industrializados, ao im- posto sobre operacées de crédito, cambio e seguro, ou relativas a titulos ou valores mobiliarios nem aos impostos extraordinarios institufdos em caso de guerra externa, tendo em vista sua natureza extrafiscal. Em outras palavras, as excegdes ao principio da anterioridade tribu- taria, previstas no § 22 do art. 62, possibilitam que as medidas provisdrias produzirao efeitos imediatos, pois sua finalidade é regular a economia do Pais, 0 que necessita de decisdes rapidas para atender 4 conjuntura econs- mica existente. Outra particularidade deste tipo normativo é seu prazo de produck: de efeitos, Embora tenham forga de lei, as medidas provisorias, como ¢ pr: prio nome ja sugere, produzem seus efeitos por um curto lapso temporal (60 dias), que podern ser prorrogados por mais 60 dias, caso ainda nao tenham sido convertidas em lei pelas casas do Congresso Nacional. Esse prazo, no 28 “Art, 62. {1 § 2° Medida proviséria que impiiqu a0 Ou miajoragac de impostos, exceto os previstos ngs arts, 153, 1, I, IV, Vj © 154, Tl, 36 produziré efeitos no exercicio financalto seguinte se houver sido sonvertida em iel até o Gitimo dia Gaquele em que foi editada.” (CR/L988) B JADE N? 83 — Sen-Feu/2045 — PARTE BERAL —DOUTRINA entanto, fica suspenso na hipdtese de recesso parlamentar®. Ou seja, se uma medida provis6ria jé produziu os seus efeitos por 10 dias ¢ se inicia o recesso parlamentar, no dia em que retornarem os trabalhos do Congresso a medida provis6ria tera contados 11 dias de efeitos. 8 CONSIDERAGOES FINAls A medida proviséria € ato normativo precario do chefe do Poder Exe- Cutivo, que goza de forga de lei, de eficacia imediata, submetido a um con- trole pelo Legislativo a posteriori, Por se tratar de uma competéncia normativa extraordindria, 0 Pre- sidente da Repdiblica no pode normatizar via medida proviséria sobre qualquer matéria. A normatizacao de alguns assuntos é vedada via medida Proviséria, para se promover seguranca juridica para a sociedade. Entre os assuntos vedados esto as matérias reservadas A lei complementar, efetivo das forgas armadas, matéria penal etc. A edicao de medida provisoria se justifica para o provimento de me- dida de natureza urgente e relevante, ou seja, que seja necesséria uma atua- Gao instantanea do Poder Publico, que nao possa esperar o processo legisla- tivo ordinario. No entanto, a relevancia ea urgéncia podem ser controlados pelos outros Poderes, como uma forma de equilibrar as forgas politicas. Em regra, o Poder Legislativo atua diretamente no controle politico dessa atri- buicdo do Presidente da Reptiblica, quando a medida é submetida ao Con- Bresso Nacional, no processo de conversao da medida proviséria em iei. De modo obliquo e excepcionalmente, o Poder Judiciario exerce controle de constitucionalidade sobre as medidas provis6rias quanto a esses quesitos, mas somente quando a violacao do mandamento constitucional for nitido, segundo entendimento do STF. Além do Presidente da Reptblica, pelo principio da simetria {arts. 25, caput, e 30, caput, da CR/1988), se houver previsdo na constitui- Go estadual ou na lei organica municipal, podem os chefes daqueles entes federativos editar medidas provisérias. As medidas provisérias produzem efeitos a partir de sua publicagao no Diario Oficial pelo periodo de 60 dias, podendo ser prorrogados por mais 69 dias, quando, se nao houver manifestacao do Congresso, perder a sua eficécia. 29° Ch § 4° co art. 62 da CRI9BB. ROC H 83 — Jan-Fou2615 ~ PARTE GERAL — DOUTRINA.... A edicao de medidas provisorias pelo chefe do Poder Executivo deve ser vista como medida excepcional, sob Pena de haver a usurpagao da com- peténcia do Poder Legislativo, em clara violagao do principio da separacao de poderes. REFERENCIAS CARVALHO, Jeferson Moreira de. As medidas provisérias, o art. 22 da EC 32/2001 e os prazos constitucionais. Revista de direito constitucional € internacional, S30 Paulo, a. 15, n, 61, p. 112-122, out/dez. 2007. CLEVE, Clemerson Merlin. Atividade legistativa do poder executive. 2. ed. S50 Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito Pressuposto. 2. ed. S40 Paulo: Malhei- ros, 1998. MULLER, Friedrich. As medidas Provis6rias no Brasil diante do pano de fundo das experiéncias alemas. In: GRAU, Eros Roberto; GUERRA FILHO, Willis Santiago (Org.). Direito constitucional: estudos em homenagem a Paulo Bonavides. Sao Paulo: Mathei- ros, 2601. NEVES, Rodrigo Santos. Funcao normativa e agéncias reguladoras: uma contribuigao da teoria dos sistemas a regulago Juridica da economia. Rio de janeiro: Lumen Juris, 2009. NOVELINO, Marcelo. Manual de direito constitucional. 8, ed. S40 Paulo: Métedo, 2013. PADILHA, Rodrigo. Direito constitucional. 3. ed. Sao Paulo: Método, 2013. SOUSA, Leomar Barros Amorim de. A Produgao normativa do poder executivo: medi- das provis6rias, leis delegadas e regulamentos. Brasilia: Brasilia Juridica, 1999, TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 9. ed. So Paulo: Saraiva, 2011. Como fazer a referéncia a este artigo: NEVES, Rodrigo Santos. O estado atual das medidas provisorias. Revista Sintese direito civil e processual civil, Sao Paulo, ano 13, n. 98, p.64-79, Jan./fev. 2015.

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