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Joo Pedro Jacques Tipografia Pos-Moderna 3 edigao Ne aes oe <9 x colegio baseDesign \ OP Bio aio baseDesign Loos que stor quest ecorrents¢cmtemporinens do esgn, em enfoqesintrdutonisetatcas, para aan a atviade dente efonece ao prossiona ao extadante Infrmagdee para o eur contextlzado de sua profs. {©1998 Joo Feo Jacques, A reproducao deste livro, na integra o em parte, é a maior contribuigéo que voc pode dar para que nds, brasileitos, detxemos novamente de ter uma bibliografia sobre design. ‘Vendas também via Internet ou portelefone Evelvassmcamo toed peblidoepes A Eom poses dus yrtlfo valine sed npar ele Cresem ge pare hp Pencong vines eel len (12253097. ‘pia crcoe corene Pelee est 0 82, ‘np abun One epeerem a asa ip ‘Sapo dsepss ou cetasod pedi ne Pasig, 2222327 compas reaizadas dietamente com 2 2A8 do dilto a 3g soore 0 preca de capa, de acordo com promogées lias por Yeo lnstado. Conia em Zab.com br PIN seis Timpresso no Brasil, ried ie Brasil ona fnte d Deparsmeta Noi éoLivo Jacques, loro Pedi. “Tinogitia pé-modera Jobo Pedro Jacques. -Riode Janeiro 2AB, 2002 ef. 2p. 10,5 em x 15.5, (baseDesizn) ISBN 85.46695-106 Tac ii 1’ Design. 2 Desenbo indusual 3 Tipograti. 4. Prticaipgtsiea- Layout 5. Comunieagio visu. Talo. I. See cop 686.22, lade Basiléia ea formacao da tipografia do Pacifico . ‘A estitcn new wave 64 Calflora dor anor 80 Apel Greta San Francia Schoo) \cenério pos moderno: _attipografia na década de 90 . Emigre nos anos 1990 Fure © Brody Dinid Carson Osdominios digitais: tipografia e desconstrucao .. Bibliografa. Acultura visual alcancou um nivel tao gran- de sofisticago que, num universo dominado o constante fluxo de informagio como onos- passa a ser fundamental entender como e is elementos caracterizam a construgao das igens. As artes gréficas, assim como outras jes visuais, tm passado por uma série de formagdes tdo répidas quanto assustado- . Os estilos e atitudes dos iltimos anos dife- m bastante daqueles que eram corriqueiros ha décadas. A linguagem gréfica hoje parece ser confu- ‘e pouco especifica, Mas nio seria este um re- exo do tempo em que estamos vivendo? E como eomunicacao visual, tradicionalmente um io de organizacao da informagao, chegou a ‘este estado? Realmente, a natureza bisica do design per- nanece inalterada: dar ordem a informaggo, for- t g wn) ¢ F Experimento tipografico. Zuzana Licko, 1985 mar idéias e dar expressio e sentimento aos ar- tefatos que integram a experiéncia humana. Mas, provavelmente, como ja imaginava na década de 50 0 designer holandés Wim Crouwel, os meios eletrénicos alteraram profundamente a manei- ra de os individuos entenderem e atuarem na so- ciedade. Logo, o design gréfico teria que dar con- tadettais transformacdes na sensibilidade do pi- blico. A tipografia, em sua condigAo pés-moder- na, caminha pelo solo pouco firme da ambigiii- dade, das imagens indefinidas, das formas im- perfeitas mal acabadas. De fato, ndo ha mais a Gistingdo entre o que € tipografia e o que sio imagens, formas e cores, pois a gigantesca mas- sa de dados na qual 0 mundo est imerso nao diz respeito a uma necessidade de limpeza das formas, mas sim de um aprofundamento de suas Joke Pere Jacques (28,2002) é questdes mais elementares. A tipografia pos-mo- derna nao é um mero resultado da introdugao do computador como gerador de imagens; ¢ pro- guto de um contexto social e cultural que requer ‘uma nova sensibilidade para lidar com um uni- ‘yerso mergulhado numa quase palpavel trama de textos e imagens. Eexigido do comunicador visual, para atu- ar como vozativa dentro deste sistema, um gran- de entendimento das questées relacionadas & cultura, & comunicaco, & sociedade ¢ a0 meio ambiente. Deste modo, na era da midia digital, cle pode ajudar a definir e ampliar os meios de expressio eletrénica, numa estrutura forte e di- nimica, consciente de suas mudangas e n0 co- mando de seu futuro. Tipogioia posmoderna 5 A Escola de Basiléia e a formagao da tipografia pés- moderna Na virada dos anos 60 para os 70, em plena era do International Style, comegou a emergir na Basel Allgemeine Gewerbeschule, berco da tipografia suica da década de g0, uma nova lin- guagem gréfica que alterou decisivamente o ce- nario mundial das artes gréficas. A partir dos trabalhos desenvolvidos por Wolfgang Weingart, a tipografia pés-moderna tomou forma e earac- teristicas fundamentais, presentes em diversos Projetos gréficos até os dias de hoje. Weingart entrou para a Escola de Basiléia como estudante, mas abandonou-a depois de trés semanas, por considerar seu ensino dema- siadamente dogmatico. Contudo, os professores Emil Ruder e Armin Hofmann reconheceram seu Joie Pedro equ (28,2002) TO {to e permitiram que ele trabalhasse na es- ja. Em 1968, Hofmann ofereceu a ele um car de professor para alunos estrangeiros, no Pro- rama de Estudos Avancados. Tendo julgado o estilo ditado por Ba muito refinado e pouco expressivo, Weingart bstituiu a disciplina racionalista pela ressividade reminiscente de designers mo- mnos, como El Lissitzky e Piet Zwart. Ble re- tou o angulo reto como prineipio organizacio- ‘nal, ao desprezar as malhas que dividiam a su- perficie de forma matemstica. Preferiu estabe~ Jecer um arranjo de elementos baseado num pensamento subjetivo e intuitive, Nao endenta- ‘ya os paragrafos e mudava o peso dos tipos no meio de uma palavra; distorcia a tipografia, des- figurando-a até torné-la bem dificil de se ler; justapunba imagens e texturas, criando rufdos visuais -— concepedes tradicionalmente vistas ‘como erro, Weingart procurava mostrar que ni existe diferenca entre tipografia e elemento gré- fico, pois ambos devem ser tratados tipografi- camente, O que este designer alemao sentiu foi o can- sago do piiblico quanto a falta de espirito e de atitude nos trabalhos gréficos tradicionais. Ele ia Tporefe pésmoderna a queria despertar os outros artistas para esta sen- sibilidade, que considerava fundamental como a propria vida, chocando-os tipograficamente, ‘Sua linguagem visual foi amplamente apresen- tada na revista Typografische Monatsblaitter, publicada pela escola, ¢ logo esta nova sensibi- lidade encontrou solo fértil em outros designers. Muitos destes seus alunos levaram de volta para seus pafses este novo vocabulério de formas ¢ atitudes. No final dos anos 70, a Basel Allgemeine Gewerbeschule jé havia assimilado este novo vi- sual. Nele, a imagem deveria carregar mais expressividade e expandir o significado do tex- to, criando um novo contexto, relacionado a0 universo do humano ede cada audiéncia em par- ticular, Além de sempre poder langar atitudes desafiadoras, mantendo a dindmica da comuni- cago visual e seus significados. Jodo Peer Jacques (248, 2002) "2 inda do Pacifico estética new wave da fornia dos anos 80 0 clima liberal e de prosperidade econdmi- da California do in{eio dos anos 80 serviu 10 um terreno fértil para a nova onda de pro- 1¢do gréfica que se desenvolveu nesta época. ituada bem distante de Nova York, sede da van- srda moderna do pés-guerra, 2 California foi eenitio de muitos dos trabalhos essenciais xra 0 desenvolvimento da tipografia pés-mo- jerna. Nomes como April Greiman, Rudy VanderLans, Zuzana Licko e Michael Vanderbyl revelaram um novo enfoque no uso do espaco ‘tipogréfico. Em tempo, este difundiu-se por ou- tras partes dos Estados Unidos, bem como do resto do mundo. Tipograia posmederne [5 April Greiman April Greiman foi aluna de Wolfgang Weingart no inicio da década de 70, na Basel Allgemeine Gewerbeschule, na Suiga. Fixou-se em Los Angeles em 1976, onde desenvolven uma linguagem gréfica propria. Levando as experiéncias da Escola de Basi- Iéia ainda mais adiante, Greiman criou um novo sentido de profundidade na superficie plana do papel. Através da sobreposicao de formas, simu- lagdo de perspectiva, pinceladas gestuais e som- bras projetadas, ela conseguia criar sensagdes de espaco ¢ profundidade. Juntamente com uma mistura de texturas, ruidos, cores fortes, foto- grafias e texto, surgia uma nova e inusitada pal- sagem tipogratica April Greiman foi um dos primeiros profis- sionais a ineorporar 0 computador em seu pro- eesso de trabalho, com o lancamento do Macintosh, em 1984. Esta ferramenta, ento re- jeitada pelos designers da época por seus entio ainda precdrios recursos resultarem em layouts grosseiros, permitiu que ela explorasse, através de sua estrutura, um campo absolutamente iné- Gito: as tipografias bitmap, as texturas rand6- micas de impresoras matriciais, as imameras Joe Pero Jacques (2AB,2002) iv ibilidades de justaposicio e layering de tex- e imagens. E, também, 0 uso destes recursos ficado em conjunto com as téenicas conven- nas, Estes processos desenvolvidos ao longo dos 10s 80 foram fundamentais para a dissemina- da linguagem grifica do new wave califor- 10 para toda a América € 0 resto do mundo. i Greiman quem fez a conexio entre os expe- "imentos de Basiléia e 0 efervescente cenério ti- \grdfico californiano da década de 80. San Francisco School partir de 1980, San Francisco ganhou des- que como grande centro de produgao de de- sign de vanguarda. Designers como Michael Vanderbyl, Michael Manwaring e Michael Cronin, entre outros, delinearam um estilo de Tinguagem que dava coeréncia ao trabalho rea- lizado na Bay Area, Formada em contraposigio A tradicional New York School, foi estabelecida a San Francisco School. Seu vocabulério visual exprimia sentimen- tos da época, como um inspirado otimismo, um ‘marcante senso de humor ¢ wma paleta de cores Tuminosas ¢ tons pastéis. O design pés-moder- Tipegrae pésnederne 5 no da Bay Area atribuia papéis simb6licos aos elementos graficos, para que estes assumissem um maior envolvimento com o conteiido das mensagens. Textos, texturas, linhas pontilhadas e perspectives axonométricas eram empregadas na reformulagio de produtos até entao padro- nizados por clichés. Mesmo tendo um vocabuldrio grafico co mum, estes artistas desenvolveram enfoques € estilos préprios, ao contrério da pasteurizagao do International Style. Um bom exemplo é Michael Vanderbyl e seu didlogo com 0 estilo ‘Memphis italiano. Apesar do sucesso financeiro ¢ o reconheci- mento que alguns destes estiidios obtiveram, muitos optaram por permanecer em pequenas proporcées. E vérios designers preferiram limi- tar-se & posigdo de designer-chefe, sem assumir escritérios préprios. Emigre ‘A Bay Area de San Francisco foi ainda 0 lu- gar onde revelaram-se os trabalhos produzidos pelo Emigre Graphics. 0 estiidio tornou-se um dos mais importantes da atualidade e é liderado Joo Pedr Jacques (28,2002) ve itizen Citizen. Fonte, Zuzana Lieko, 1985, r Rudy VanderLans, de origem holandesa, ¢ ana Licko, eslovaca, A maioria de suas cria~ es foi divulgada pela revista Emigre, criada gelo proprio grupo. Surgida em 1984, a revista Emigre logo teve 9 computador Macintosh inclufdo em seu pro- 0 de produgao. Através dele, Zuzana Licko i capaz. de explorar as possibilidades da tec~ logia digital para a criagdo de fontes. Seu prin- ipio era o de trabalhar com o novo meio de for- 2 a tornar visivel o resultado extraido de sua strutura, ndo tentar impor uma estrutura ‘ogena a maquina. Rudy VanderLans, responsavel pela apre- ‘sentacio gréfica da revista, utilizava um méto- do absolutamente intuitivo e coloquial para a distribuigio livre da informagao. Assim, recor- ‘ria & sobreposicao de textos ¢ imagens ¢ a justa- Tpogrefia pirmederna " posigdo de texturas e rutdos, Desenvolveu ain- daa nogao de malha gréfica organica, segundo ‘a qual a diagramacio ndo obedece a regras pré- definidas, mas se adapta a cada nova situagao apresentada na pagina - de acordo com o tema do texto, sua dimensZo, sua interagio com as fotos e os demais elementos graficos etc. Somente a partir de 1988 a revista Emigre passou a ser dedicada exclusivamente as artes graficas. Dai, varios designers convidados pas- \ saram a criar o visual das paginas, com VanderLans, acentuando 0 ineditismo vi sual da revista. Sem temer a quebra de tabus € nogGes tradicionais de comunicacdo, 0 estidio Emigre se dedicou exclusivamente as possibili- ades ilimitadas da nova tipografia. juntamente Joe Pedro Jesus (AE Te jorte da tipografi new wave europeu Na Europa, a tipografie pés-moderna foi snvolvida em centros espalhados por todo 0 tinente. Na Holanda, o esttidio Hard Werken resentou novas formas de manipulagao do ign editorial. Misturando e justapondo ele- 3tos vernaculares com formas classicas da ti- gratia, 05 projetos do Hard Werken faziam 0 itor interagir com as obras através de um tra- smento tipografico livre e despojado. Na Itélia, em 1981, o grupo milenés Mem- is langou uma estética que influenciou todo 0 sual dos anos 80. Liderado pelo - na época, jé msagrado - designer e arquiteto Ettore sass, 0 grupo tinha interesse na mistura dos dutos da cultura pop com os artefatos e or- sntos do mundo clissico. Nesta visio, a fun- Teare posrmoderna 3 do era secundéria & imagem iednica das formas. O artista grafico do grupo, Christoph Radl, lan- ‘gou uma atitude experimental, marcada pelo fas- einio por texturas, padronagens, formas geomé- teas exageradas ¢ cores berrantes, na qual a forma - e nfo mais a fungdo - era a razdo de ser dos projetos, ABCOEFCHIIALIN MULL CTA) tne: wo Fonte, Neville Brody, 1984. Criada para a revista The Face Neville Brody Provavelmente uma das fontes que mais apontou tendéncias na década de 80, o designer londrino Neville Brody recebew inicialmente inspiragdes do movimento punk, que havia es- tourado em 1977. O punk pregava o desrespeito as normas através de slogans do tipo we don’t care e do it yourself. Esta nova postura contri Jodo Pedro neque (28,2002) 70 iu decisivamente para dar confianga a dy de forma que, no inicio dos anos 80, injetasse uma nova vitalidade no design fico. Trabalhando primeiramente para gravado- independentes, Brody colocou em pratica seu ijeto pessoal de reintroduzir marcagdes hu- nas na arte comercial - 0 seu new tribalism. ele, a comunicagao de massas suprimira, se que completamente, o elemento humano, ia linguagem grifica pretendia 0 oposto, tor- do - como ele explicava - 0 pitblico consei- te de suas atitudes e criando um design para lar, e nfo para ocultar. Porém, foi através da revista The Face que dy ganhou fama mundial. Ao lidar de uma '2 mais pessoal com a tipografia, ele dese- 30u para a revista uma série de fontes marea- jente geométricas. Suas formas emblemati- causaram um impacto muito forte no mun- das artes graficas. Brody viu a revista como objeto dimensionado no tempo e procurou, wvés da desconstrugio das formas, observar processo orgénico de mudanea de significado 3s seuis elementos constitutivos. Embora tenha adotado um estilo mais sim- immoderee Th ples e elegante ao fim dos anos 8o, ja na revista Arena, Neville Brody reafirmou em seu traba- Iho The death of typography, de 1986, a necessi- dade do abandono da tipografia moderna. Ele anunciou a entrada desta disciplina num novo campo de formas e atitudes. HOLIDAYS Hell Balitorial para a revista The Face. Neville Brody, 1884. Joi Pedro Jacques (248, 2007) 22 6, neo-deco e vernacular: resposta de Nova York Em meados da década de 80, em Nova York, jergiu uma nova vertente do design pés-mo- no. Descartando o que consideravam a anti- \da voz da New York School, estas novas vo- colocaram a cidade novamente em evidén- ia no cenario das artes gréficas. Um movimen- , por muitos chamado retré, teve af definidos primeiros elementos. Em pouco tempo, es- Ihou-se pelo mundo. Na década passada, os designers passaram desenvolver um interesse maior pela historia sua atividade e a procurar entendé-la (ou re- tendé-la). O design retré baseava-se num inibido e eclético interesse nos estilos euro~ ‘peus da primeira metade do século e na fascina- 0 pelas tipografias decorativas dos anos 20 € Tpegrafe pesmodeina Fe) 30. 0 termo retré, originalmente francés, refe- tia-se as palavras retroactive e retrograde, que implicam numa revalorizagao do passado e a0 no mais em uso. Jé 0 termo vernacular, que re- centemente tem recebido novas conotacées, ca- racterizava projetos que parafraseavam os ele- mentos gréficos mais lugar-comum, presentes em pegas como caixas de fésforos, cards de baseball e ilustragdes pouco refinadas de déca- das anteriores. © desenvolvimento destes estilos, que se confundem e so também conhecidos como neo- deco, em referéncia a re-utilizagao do vocabulé- tio Art Deco, nasceu ¢ foi disseminado por meio de um pequeno grupo de artistas gréficos. Entre estes, Paula Scher, Louise Fili e Carin Goldberg, Eles exploraram formas visuais de maneiras ouco ortodoxas - indo desde a Secession de Vi- ena até as tipografias decorativas da Europa do entre-guerras. Pesquisando e publicando fontes entao fora de catdlogo e empregando-as largamente em seus trabalhos, especialmente Scher e Fili con- tribufram para a grande difusdo do design retr6 na América, A escola foi reforcada, ainda no fi- nal da década, pelas produgées de Charles Spencer Anderson, que criava refinadas par6di- . grficas sobre expresses cléssicas do moder~ nnismo. O retré influenciou positivamente 0 de- sign sob varias formas, estabelecendo um profi- ‘uo didlogo com os designers ¢ os estiidios da California, como Emigre, e da Europa, como Neville Brody, entre outros que compartilhavam o interesse pela linguagem gréfica das décadas de 1920 a 1950. Tpegrafe paemoderna 75 Um cenario pés-moderno: a tipografia na década de 90 O design da tiltima década do séeulo pode ser interpretado como resultado da passagem da expressio tipografica de condigo moderna para pés-moderna. Além disso, a chegada ao design do microcomputador e da editoragao eletrénica concederam a tipografia uma fluidez propria do universo virtual e além das barreiras fisicas, Uma enorme facilidade de manipulagio poten- cializou a liberacdo de qualquer preceito te6rico rigido. Com isto, a tipografia foi removida do campo exclusivo dos especialistas e jogada no mundo dos designers comuns. Os resultados deste fendmeno refletem-se nas artes graficas dos anos 80. Dai, prinefpios fundamentais - como a legibilidade, por exemplo - foram em- purrados para fronteiras cada vez mais distan- Joie Pedro Jacques (28,2002) Te tes, medida em que foi se aprofundando ¢ in- sificando o debate na area. 0 objetivismo racionalista da neutralidade das formas, associado ao conceito de more is less, perdeu sua supremacia. 0 more into less, do artista gréfico Edward Fella parece mais apropriado, Ao contrério da voz autoritéria da tipografia moderna, que permitia uma nica li- nha de leitura (e expressamente fazia questio disso), 0 objetivo passou a ser o de promover miiltiplas leituras e interpretagdes, provocar 0 leitor a tomar papel ativo na construgao da men- sagem. Esse novo objetivo, porém, tem seu pre- go: requer do designer, mais do que um exerci cio de estilo, uma aguda percepcio das possibi- lidades de leitura de seus projetos’e dos textos que eles veiculam. Emigre nos anos 1990 Apartir de 1990, 0 estudio Emigre, além de fornecer as fontes desenhadas por Zuzana Licko, também passou a publicar tipos desenhados por artistas de toda parte do mundo. Com isto, tor ‘now disponivel uma biblioteca cada vez maior de fontes idiossinerdticas, em geral desprezadas pelos grandes fornecedores. Emigre pode reco- Tipstrefia pésimoderne 27 nhecer nestes trabalhos no um banal desprezo pela tradi¢ao, mas sim a necessidade de busca de novas formas e proporgoes. Foram disponibilizadas, e divulgadas atra- vés da revista Emigre, fontes como a Template Gothic, de Barry Deck, que exploravam a mistu- ra de elementos vernaculares com a tecnologia digital. Na lista, estéo ainda artistas como Jonathan Barnbrook, Jeffery Keedy, John Downer, Frank Heine ea propria Zuzana Licko, que empregavam recursos que vao dos estilos classicos aos vernaculares. Devido a enorme di- fusio das fontes Emigre pelo mundo, seu papel AaBbCcDd EeFFGgHhliJjKkLIM mNnOoPpQaRrSsTt UuVwWWwXxYyZz Template gotive, Fonte, Barry Deck, 1990 Joo Pero jacques (QB, 2002) 78 foi decisivo na consolidacio dos pequenos for ‘necedores tipograficos digitais como elementos de renovagao e fundadores de um novo padrao de mercado. A revista Emigre também se dedicou a ex- plorar mais intensamente o tema da legibili- dade. Estes trabalhos ganharam notoriedade ampliaram sua influéncia, tanto no mainstream do mereado como no proprio en- sino de design, tornando efetivamente o es- tiidio Emigre uma referéncia essencial para a tipografia pés-moderna, Fuse e Brody No inicio da década de 1990, Neville Brody passou a se dedicar full'time & exploragéo das possibilidades oferecidas pelo computador. Para ele, este meio é 0 terreno no qual deve ser construida uma nova e necessaria concepeao de linguagem. As répidas mudangas tecnoldgicas dos tiltimos anos demandam uma completa reformulac&o dos preceitos e préticas no design, Este projeto foi colocado em prética com 0 Tangamento da revista Fuse. Dedicada exclusi- vamente A tipografia digital experimental, ela procura promover um diélogo sobre o atual es- Tpogeaia pérmederne 29 gio Decoder. Fonte, Gerard Unger, 1991. Criada para Fuse 2 tado da tipografia e seus efeitos sobre a comu- nicacao. Em suas edigdes sao publicadas séries de fontes inspiradas em temas pré-determina- dos, para uso e mesmo modificagio de suas for- mas pelos usuarios. Recebendo contribuicdes de nomes como Erik Spiekermann, Phil Baines, Rick Valicenti, David Carson e Tobias Frere- Jones, entre dezenas de outros, Fuse tem divul- gado a mais arrojada e diversificada produgao tipogréfica da atualidade ‘Trabalhando no desenvolvimento de intime- ros projetos visuais para uma série de clientes a0 redor do mundo, Brody aprofundou e sofisti- cou bastante sua linguagem visual. Sua produ- Jo 80 Pedr Jacques (2AB,2002) 70 ‘do recente se caracteriza justamente por trazer para a tipogratia digital as formas e concepgdes que o tornaram uma figura referencial no design dos anos 80. David Carson Ap6s abandonar a sociologia, David Carson iniciou sua earreira como designer de projetos editoriais na virada dos anos 80 para os 90, na Calif6rnia. Criando um visual fluido € de gran- de dinamismo para a Beach Culture Magazine, ele conseguiu capturar e retransmitir a atmos- fera e as atitudes recentes da cultura do surf. Todavia, Carson foi aclamado mundialmen- te pelos resultados que obteve na revista Ray R AYGUN, Log. David Carson, 1994. Revista Ray gun, namero 18 Tpegrafe poe moderne 31 Gun. Dispondo de ampla liberdade de criacio, seus trabalhos marcados por uma extrema ou- sadia puderam ser veiculados e ganharam ex- pressio mundial. Imagens e grandes blocos de texto sofreram distorcdes e foram misturados, criando a cada pagina composigdes imprevisi- veis - semelhantes, de fato, a outros seus con- ‘tempordneos que nfo dispuseram do mesmo al- cance de piiblico, Valendo-se desta linguagem, Carson pretendeu restaurar ao mundo da misi- ca, objeto da revista, a relacdo tétil e visual do design com o piiblico ~ algo que fora perdido com a introdugdo do CD e suas capas de formato pa- dronizado. Depois de abandonar a Ray Gun, David Carson permianeceu dedicando-se a desenvolver projetos editoriais - entre eles, a reformulagio do projeto grafico da revista brasileira Trip, nos fins de 1997. Ele procura uma linguagem gréfi- ca onde texto e imagem tém o mesmo valor, eri- ando misturas de referéncias de dados vernacu- lares e do universo digital. Joo Pedro Jacques (248, 2002) 32 tipografia e desconstrucao O design grafico atual toma partido da flui- dez ¢ da virtualidade da midia digital. Seus re- sultados podem ser totalmente dependentes dos meios eletrénicos ou 0 reflexo desta nova liber- dade sobre meios tradicionais. Para alguns, a disciplina da tipografia desfruta agora de um parafso digital, no qual os textos podem ser com- postos em tipos pessoalmente configurados, que respondem de maneira tio idiossinerética quan- to a propria caligrafia do autor. A tipografia pés-moderna posiciona-se con- ‘tra a neutralidade na comunicagio, argumentan- do que nenhuma tipografia por si mesma é leg’ vel. Como afirma Zuzana Licko, é a familiarida- de com determinada fonte que pode torné-la mais legivel. As tipografias da era digital sio Tipsteata plrmaderne 33 pessoais e subjetivas - sua diversidade deve li- bertar seus leitores e permitir que muitas vozes se fagam ouvidas. O objetivo expresso é 0 de pro- mover miiltiplas leituras, provocando 0 obser- vador a ter participagao ativa na construgao da ‘mensagem. A ambigiiidade é exaltada, em favor de uma expressio proviséria, tornando dinami- co 0 processo de interpretagao da obra. Para designers como Neville Brody ou Jeffery Keedy, criar fontes para uso pessoal assegurar que cada trabalho tenha sua propria identidade, seu tom e sua voz, sendo assim pos- sivel desenvolver para cada caso um comenté- rio s6cio-cultural. Outros, como Barry Deck, uti- Vizam 0 computador para reavaliar 0 nao-artis- tico, o desagradavel e 0 ready-made - valorizan- do a tipografia por suas falhas e imperfeigdes, que representariam mais fielmente um mundo imperfeito, de pessoas imperfeitas. Katherine MeCoy ¢ P. Scott Makela, entre outros interes- sados na teoria filosofica e literdria do descons- trugdo, buscam a quebra e a exposi¢ao da lin- guagem visual manipulativa dos varios nfveis de significago envolvidos num trabalho grafico, possibilitando ao leitor descobrir e experimen- tar as complexidades ocultas na comunicagéo. Jodo Pedro Jacques @2AB, 2002) 34 ‘Ou, numa abordagem mais simples, como fazem David Carson ou 0 estiidio Why Not Associates, procurar emocionar, divertir ou enfurecer o lei- tor através do princfpio do type as entertainment. Sao amplas as perspectivas para que a tipo grafia provoque nossa capacidade para o pensa- mento intuitivo, a percepeao simulténea e 0 es- timulo ao intelecto, Mais do que uma moda ou exercicios de estilo, ha a possibilidade de am- plificagio do sentido do texto, criando um con- texto cultural e de dinmica de informagao. Num 86 tempo, pode-se explorar a capacidade de fa- Tar a cada audiéneia em particular e conceder espago a multiplas vozes - e ai, autores, desig- nérs graficos ¢ piblico podem encontrar uma relago satisfatéria entre mensagem e expressio tipografica Tpetrafe posmaderne 35

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