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81 As Ferrovias de Minas Gerais no século dezenoye" Peter L. Blasenheim** Abstract: ‘The Zana da Mata Minera, arichcoifee exporting region ina poor province, contained nearly sixty percent of Minas’s total railroad grid of 1606 kilometers in 1884. Thisarticle, which ‘examines the Matannlroad boom, focuses on the intra-an¢ inter-regional dyracs thal explain the rise and fall ofthe Leopoldina, Minas’s mast importat private railroad. It sheds light on ‘railroad finance, the relationship between coffe and rails and the polities of rails in Minas and ‘Brazil inthe late nineteenth century. Key Words: Railroad, Zora da Mata (Minas Gersit) Resumo ‘A Zona da Mata mineira uma rica rgido exportadora de café em uma pobre provincia, detinka eproximadamente 60% do total da rede ferovidria de 1006 kin em 1884, Esteattigo, 20 ‘examinar o boom das ferovias na Zona da Mata, focaliza a dintmica inrae inter regional que explica aascensio.e queda da “Leopoidina”. mais importance ferroviaprivada de Minas. Una ‘enfase especial ¢ dada is fnangas da rodovia, is rlaghes entre café e estrada de feroe A politca ferrovidria em Minas eno Brasil ro final do século XIX. Palavras-chave: Ferrovias, Zona da Mats, ‘O crescimento de um sistema de transporte em Minas Gerais, prin- cipalmente a construgéo de um rede ferrovia na préspera regio cafeeira da provincia, a Zona da Mata, nos iltimos tempos do Império, é um eapi- * Astigo originalmeate publicado a0 Journal Office: Instimte of Latin American Studies, 26, 1994, Cambridge University Press. Tradugdo- Anthony Lennasd ** PoterL. Blasenheitn ¢ Catedrtico de Historia. no Colorado College, Colorado Springs a wet Meee tulo importante da hist6ria do estado . Um estudo das ferrovias na Mata ¢ ‘em Minas revela muito sobre a politica e © poder e influéacia de certos ‘grupos, sobretudo fazendeitos e fazendeitos-politicas. Conflitos sobre con- ccessies ferrovidrias provocaram muita rivalidade dentro da Mata, mas to- dos os mineiros concordaram que 0 transporte era a questo mais impor- tante da época. Enquanto isso, os Muminenses ¢ paulistas estavam mais Preocupados com a crise trabalhista?. Hoje podemos ver que o transporte no é a chave para 0 entendimento do desenvolvimento de Minas, pelo T Dette dr econominJeMnasto scalo XIX eo lagar dazona cafeeirs da Mita sels fo ‘bjew de muita discusso ene histriadores de Minas cn anos reentes, Vérostabalcs eshuncaramaieia adicionl que acccnomia, com aexcegto derepibdinimica caeciea da [Nats vhaestgnando-se apésfinderesatminas de curoe damsntes do centro de Minas em ‘meaios do sécuo XVII Na ealdade, aecenomia miter, basezda na aricltarae pecuiia, mine exis além da exporagio dca cresceu con regularidde we bem que lentamen- teduranteo século XIX, Ora at que oatres produtos que no café dependiam de marcados domestics da provincia cu de mercado extereos coatinaa ser uma questo polémica. Ver Roberto Borges MARTINS, “Growing in Silence : The Slave Economy of Nneterth-century Minis Gera, Brai”("Crescenéo em Sileacio : A Economia Escravista de Minas Gerais d0 ‘Séeulo XIX") ssertay ond pubicadade PhD, Vanderbilt University, 1980; Anica Viana MARTINS FILHO e Reboto Borges MARTINS, "Shiver na Non ExportEconomy: Nine century Minas Geri Revisited” ("A Fucravidio numa Economia de Ndo Expetas80a8 Mi zis Geri do século XIX revisindas.”), Hispanic American Histoneal Review, vol, 63 (gest 1983) pp, 537-68 e os comentirios seguintes; Robert W. SLENES, © Mikilos de Poreas eDiamantes: A Economia Bscravsta de Minas Gerais do sécul XI UNICAMPa” 17 Cuno 1985); Douglas Cole LIBBY," Transfrrtagi Trabalho em ua ‘Economia Excravista: Minas Geras ro século XIX" , Sto Paulo, 1988; Libby, “Proto- Industnalization inStave Socety: The Case of Mitas Gerais” (“Proo-Industrilizagdo numa Sociedade Escravia:O Casode Minas Geral"), Journal of Lata Ateican Studies, ol. 23, 15°1 1991), pp. 35. A questio principal é queos imposes cobrados dv exponages de cae du Mata peraram 756 Jasrecstasde Minas nadécads de 1890 2. Mes esd ds imprensa da Mita na décata de 1880 mostra qoo we evreveu mais sobre © transpore do que sobre a crise tnbahisa emerpente. Ver por exemploO Pharol de Iz de Fora, o jomal mais imporants da regito nesta dézada, ea Gazeta do Juz de Féra que era Publicadh no inicio da década de 1880. Isto io significa que os matensts ignoraram a sonsequéncias longo prazo da aboligdo gradaivae um populagioescrarsta derescete “Tatramesta questo na imprensa, ra Assembéiae no famoio Congresso Agricol ocorido 10 Rip de Janeirocm 1878, Ver, por exemplo O Impurial (Juz de Fora), 22dejulto de 1970 Pil; 14 de stembro de 1882, 1; 16de aovembro de 1883, p.1; 7 de mao de L884; Annaes «de Assembléa (1884) 2; (1888), p. 632; Congresso Agricola Calleso de Decunentos Rio, 1878, pp 132-4, 152-5, 12-3; Ana Lia Duarte Lanea,“A Transformosic do Trabalho” (Campinas 1988), pp 44,56, 71; PetrEISENBERG, "A Mentlidade dos Fazendeis no Con- _peseo Azrcolade 1878", em lost Amand LAPA, Moda de Producto e Reale Brasileira atop Nozes 1580, p. 167-194, Vé-seclramente desta foots que os matereseram ben ‘menos etusidsticosemiclaio a soluesimigracinalstas qe os fazendciros do este de SP ‘estavar mais prevcupades commatenas de seguar controlar ¢edacara rto-de obra livre Iwasa Els cfenam dos outros fzendeirs do cenvo-sul segunda mpremia da Mala. na sea espostaretarada emenosintensaa crise que os fazendrits ours rgioes ds 70 ca. ao tendeasugerie que excravidio em maisvidvel aa Mata do que naproviciado Rioou S40 Paulo, taker devido A dspontilidade de ssonvecno centre de Minas: Vr Rebeat W, SLENES, "Notes and Comments” ("Anctagbes¢ Comentros”) apt Martins Filho e Mains, "Savery ina Non export Economy *("Eseaviddo numa conomiade NSe Expoag3o".p. 578. OCS vin el ite eto 2.0.39 AD Ase Mes Gee dnve 8 ‘menos nfo até o ponto que na época era considerado ser. Fatores esoléy. cs, condigdes trabalhistas e o principio da crise nacional de superprodu- ‘s80 em 1896 afetaram mais as variagbes nas exportagSes de eafé do que as ferrovias. Porém, os fazendeiros de café da rica Mata e outros minciros des egies menos présperas sempre atribulam as ferrovias as vantagens oriun- das do desenvolvimento econdmico. ‘As mfseras facilidades de transporte existentes em Minas em mea- des do século XIX explicam a euroria que saudou a primeira estrada pavi- ‘mentada (1861) ¢ a primeira ligagdo ferrovidria (1876) entre Juiz de Fora, ‘a capital regional da Mala, c a cidade do Rio ¢e Janeiro. Até essa época, pessoas e cargas eram transportadas por mula passando por tilhas fngre- ‘mes. Antes de 1861 a viegem de 215 quilémetros entre Juiz de Fora ¢ Rio de Janciro levava quatro dias. “Por toda a parte”, escreveu um fazendeiro, “agueixa eraa mesma: aeconomia regredia ou estacionava e a causa deste atraso era 0 estado miseravel em que se encontravam as estradas." Esta situago mudou draméticamente no final da dScada de 1870, quandoo sul centro da Mata foram ligadas por ferrovia cidade do Rio de Janeiro, As exportagies de café quase que dobraram entre 1875 ¢ 1880, lum aumento que as fazendeiros atribuiram & locomotiva. A maioria des ferrovias da Mata foram construidas com capital particular, mas o governo provincial estimulcu o crescimento garantindo aos investidores um retor no de 7% no seu cepital ou concedendo subsidios a companhias bascades ce quilometragem. Emborao governo provincial sem recursos financeires teaha feito um esforgo muito fraco para estimular a economia de Minas, seu compromisso de apoio as ferrovias da Mata era verdadeiro + ‘A raiz deste compromisso estava a crenga compartlhada por todos ‘os mineiros que as ferrovias estimulariam o crescimento econémico em todaa provincia integrando as regides e estimulando as exportagies. Visto {ue a Mata jd tinha algo de valor para vender, mineiros de todas as zonas cconcordaram que o bom senso obrigava a provincia a promover um siste- ‘ma de transporte na regizo cafeeira primeiro (figura 1). Os Matenses afir- ‘mayam isto enféticamente e os outros mineiros concordavam de mé vonts- de. Quase 60% da rede total de 1006 km da provincia estava localizada ma Mata em 1884, embora a Mata. constituisse apenas 5% da superficie de ‘S Einlla VIOTTT DA COSTA Di Senzala di Caldnia (Sto Pat, 1966),p 160. Vertanbém tard BURTON, Exploraionsin the MigMands of Brazil | Exploagies nos Plaats do rai] Londres, 1865), pp, $9; Celso ALABELLA DE CASTRO, *Printvasestnss ra Zonada Maa“, Estado de Minas (Belo Herizente) 24 de jensco do 1960 95.3.9. “Manoel Kasier de Vaseneelos PEDROS, "Zona Slencion da iorigrifiamieire AZo a Mata’, Revista do Instituto stvico ¢ Geogréfice Brasileiro (daqui em dane ctado ‘como RIFGB 257 Rio, on. -dez. 1962),p.135:0 Phare (Juz de Fora), 28de ever 1983, p. 1: Fetodo Povo (uirde Fon), 09 de novembro, p2. 4: Fraicico IGLESIAS, Pala esondmics do governo provincial miner, 1835-1889 Rio, 195), pp.163-4, 197 0015 rode ben tear wd 20 29810 ‘Minas. Ocasionalmente am representante de Centro ou do Sul reclamava da concentrajdo das ferrovias de Minas numa pequena area. Mas as outras regides yotavam consiantemente a favor das concessOes destinadas & Mata, 1a esperanga que as receitas provinciais geradas pela exportagiio de café um dia pagasiam por ferrovias para zonas_ menos produtivas, ‘Trilhas, estradas para carrocas e rodovias Os transportes desenvolveram Ientamente mesmo depois que 0 café chegou & Mata porque 0 governo provincial nao tinha meios de financiar srandes projetos de construcio ¢ a iniciativa privada faltava no inicio do Império. Mas em 1836, Antnio José de Silva Pinto, 0 futuro Bario de Rerioga e 0 principal fazendeiro de Juiz de Fora, ganhou um contrato do ‘governo provincial para ampliar a Estrada Nova. atritha colonial que liza- ‘a 0 centro de Minas & costa, de Juiz. de Fora até a fronteira fluminense Embora as inclinagées ¢ 0 leito estcito da estrada limitassem seu uso a ‘mulas, a Estrada Paraibuna de Silva Pinto teve um impacto imediato sobre Juiz de Fora. Se bem que primitivo, a estrada fez desta povosgio © ponto de éembargue para 9 café do interior da Mata e um eentto comercial Juiz. de Fora foi 0 mercado para as 150,000 mulas que chegaram na Mats entre 1852 € 1862. Enquanto Silva Pinwo patrocinou financiou o projeto, Henrique Guilherme Halfeld, um engenheiro alemao imigrante, o desen- volveu. Igualmente fazendeiro, Halfeld casou-se com a filha da familia Dias Tostes, donos da concessao original de terras em Juiz de Fora. Este ‘modelo viria a ser comum na Mata: os fazendeiros capitalizavam projetos rodoviirios ¢ feroviérios que engenheiros ligados & elite dos fazendeiros depois executavan’, Sou =Sut Cenre= Cento Figura (a, Para tule ve pégnsspuirte Mato GROSSO espinrro ‘SANTO KO PAULO RIO DE JANEIRO (Estado) Figur. Mata(a)nazona decaf doceno-sul do Brash) em Minas Gerais Fonte ‘itt da Cosa p20-Flescher, p29, Pioneiros da Mata oriental também queriam ligar suas fazendas & Provincia do Rio ¢ ao Centro de Minas, Francisco Leite Ribeiro, que fun- ‘dou Mar de Espanha na década de 1810, estabeleceu comunicagdes diretas por trlhae tarea entre Mar de Espanha e a Provincia do Rio em 1823. Na \década de 1840, cle abriu outra tilha ligando Mar de Espanha, $0 Jodo Nepomuceno Rio Novo 2 capital provincial de Ouro Preto, e planejava, uma estrada para carrogas de Mar de Espana até Feijdo Cru, antecessor de Leopeldina, Mancel José Moateiro de Castro, primeiro Bardo (¢ fundador) de ‘Leopoldina, lideroa a campanha por um sistema de transporte mais efict- cente € extenso na Mata criental apds a morte de Leite Ribeiro. Em 1867, legislaiva provincial prometeu a Monteiro de Castro apoio financeiro para uma estrada que ligasse Leopoldina ¢ Mar de Espanha com Porto Novo no rio Paraiba, mas o projeto munca fol financiado. Enfurecidos, os fazendei- 10s de Leopoldina formeram um plano para separar-se de Miras e juntar- se 8 Provincia do Rio a qual esperavam ser mais favordvel 2 aliviar 0 “en- ‘garrafamento” de transporte* 5, Gera Hale, Hennque Gaile Fernande Hale: Fandador da cidade de ze Fora (ide de Pera, 970), B29 IGLESIAS, p 156 OCU seh, a don nh 2.03 9 S10 86 hat tne Outro fazendeiro da Mata, Mariano Précopio Ferreira Lage, de Juiz, e Fora, construiu a primeira estrada pavimentada de Minas, a Estrada Unido Industria, que ligava Juiz.de Fora ao seu mercado do Rio. Procopio, ‘que foi responsdvel pela ampliagao e manutengao da Paraibuna, ganow uma concesso da Assembléia Provincial em 1852 para construir uma ro- dovia de Juiz de Fore até Petrpolis, entreposto paraas exportagdes de café dda Maia transportadss através do porto do Rio, O contrato também incluia planos para uma extensio ao Rio das Velhes no centro norte de Minas e ramais para as cidades da Mata préximas. Em 1853, Procépio fundou uma companhia para construir a esirada, Fazendeiros locais investiram 243,

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