Você está na página 1de 12
28 PRESSUPOSTOS MATERIAIS MINIMOS DA TUTELA PENAL Seco I A DIGNIDADE PENAL DO BEM JURIDICO todo o bernestarposivet ara a malora ~ Baceata, Dos dels e dos penas Jé esti estabelecido que ndo € qualquer bem juridico que obterd a qualificagao de bem juridico-penal. Isto, conforme se ver ao longo des- te primeio capitulo, dependerd de uma série de caracterfsticas a serem fixadas no bem que se pretende tutelar. Antes, porém, de se adentrar 20 tema que trata da dignidade juridica do bem, faz-se importante precisar, num Estado democritico de qual o Ambito possivel de interfe- réncia do Estado na condugio da vida do cidadao. Busca-se concluir tais, reflexes com fundamento nos princfpios que norteiam a quest que se desenvolverd na seqténcia. 1. Principio da intervenco minima O principio da intervencao minima pode ser estudado sob trés pers- pectivas reciprocamente complementares. Na primeira, é dado destaque 0 compromisso, decorrente dos valores e principios constitucionais, de que a utilizacdo do direito penal fique circunscrita as situagdes que nio possam ser resolvidas por outros meios ao dispor do Estado ~ ou seja, quando o direito penal torna-se estritamente necessério, em termos de utilidade social (principio da necessidade). Desta forma, a pena s6 é ad- mitida quando nao hé outro mal menor passivel de substituf-la. Do manu- seio deste principio decomre, ainda, que somente bens de elevada valia devam ser tutelados pelo penal. Isto porque a utilizagdo de recurso {io danoso a liberdade individual somente se justifica em face ao grat de importincia que o bem tutelado assume. Aqui surge a preocupagio com a dignidade do bem juridico, dado que o direito penal s6 deve atuar na MERECIMENTO DE TUTELA PENAL 29 defesa dos bens jurfdicos imprescindfveis & coexisténcia pacifica dos ho- proporgao que justifique a intervencao penal. E por io da ofensividade que estas questdes sao desenv te podem ser etigidas & categoria de obstruam o satisfat6rio conviver em: “onde se verifiquem lesbes insuporté livre realizagao e desenvolvimento da personali- 3. p. 65). Portanto, incomodagées de pequena ‘monta, ou que causem diminutos dissabores, so consideradas como des- providas de relevancia penal, ficando, em razo disto, a sua resolugdo rele- gada a outros mecanismos formais ou informais de controle social smédio do princt- s. Assim, somen- efetivamente, esta forma, o principio da intervengio minima “pode significar tanto a abstengdo do direito penal de intervir em certas situagbes (seja em iariedade/fragmentariedade’ assume” (Toron, 1996, p. 40) Eeesse carter fragmentério, que interessa a categoria merecimento de pena, cujo elemento dignidade penal do bem juridi cipio da exclusiva protecdo de bem juridico, 0 que seré trabalhado em seguida, enquanto a ofensividade da conduta é vista a partir do prinetpio da ofensividade, objeto de investigacao da préxima seca 1.1. Principio da exclusiva protecao de bens juridicos a protegao de bens juridicos decorre da con- cepcio minimalista do diteito penal. Somente bens de extrema valia & Os aspects ligados & subsiiaredade serio tratados no préximo ca or pertencerem ao tema que Id serd desenvolvido (necessidade de tut penal. | 30 PRESSUPOSTOS MATERIAIS MINIMOS DA TUTELA PENAL para a coexisténcia do individuo & que poderao ser objeto de lei penal. Tsto porque, sendo o direito penal o instrumento mais poderoso de que se vale o Estado no combate a violéncia, e porque a sua utilizacao encerra, inexoravelmente, também, uma violéncia, é de forma muito comedida que ele deve ser chamado a atuar. principio da exclusiva protegio de bens ju fungao basica do direito penal, a qual icos configura a egundo Quintero Olivares, nas justo e harménico entre a func de protecdo da sociedade e a de prote- Gao dos direitos fundamentais da pessoa. Portanto, o direito penal cum- pre uma fungdo de garantia, concretizada no asseguramento de certos valores reputados de grande transcendéncia social. Tecnicamente se as Em raziio da existéncia deste prinefpio, esto fora do aleance do to penal inimeros ben: tanto individuais como sociais. Desta forma, quando da tarefa legislativa de criminatizago de condu- tas, deve-se ficar atento, no sentido de obedecer as seguintes orienta- consubstanciadas por principios historicamente construidos e j& ente aceitos, e que se inserem na concep¢ao modema do Estado. 1.1.1 Prine{pios do pluralismo e da subcultura 0 Estado democritico nao se encontra legitimado a impor, pela Seu objetivo, mais modesto, é fazer poli- te érdua, j4 que uma socie~ sta supde a concorréncia de diferentes valores. Circulam diversas concepedes de justica, decorrentes de variados preceitos éticos. A coexisténcia democratica de todos os grupos sociais s6 se faz possivel ‘com a rentincia a imposigbes coativas de exigéncias resultantes de for- mulagées éticas, como a de ju Ena Con: e que devem ser buscados os valores elementares da comunidade, inclufda a possibilidade de confli- , de alteracao de modo de convivéncia e do proprio direito. A esséncia do valor constitucional est na declara¢ao do valor democracia, bem que 6 tem compromisso consigo proprio, ciente de que todos os outros so -MERECIMENTO DE TUTELA PENAL 31 cambidveis. O perdurar de um sistema ju inclu‘do o direito penal, 1ndo pode se estender além da existéncia de um consenso social mfnimo fas que, nem sempre, agra- entretanto, embora possa ial da lei e, via de consequiéncia, significar uma menor aceitagao s uma menor eficécia da norma, também expressa as naturais divergén- cias de opi jo que se estabelecem no seio de uma sociedade aberta & Desta forma, estas dissensies devem ser aceitas como ex- ‘mesmo de uma sociedade pl jzacdo de uma conduta como delituosa é recur- so que se deve limitar ao que fira um consenso amplo ¢ com 0 qual 0 ‘geral das pessoas possa se conformar. A liberdade individual nao pode ser a tuagGes possfveis, providenciar para que se tolere determinadas condu- tas que fazem parte de conviegdes morais ou éticas de grupos, com res- salvas muito especificas, de acordo com as colocagdes que se seguirao. 12 Princ ios da liberdade e da tolerdncia O principio da liberdade decorre da concepciio de Estado democré- tico. Nele hé 0 reconhecimento, por parte do Estado, de determinado Ambito de autodeterminagio individual cuja penetragdo Ihe € proibida da Refere-se, portanto, & maxima tolerdncia em relagéo. primam o modo de ser, a consciéncia interna, os atos privados do i ida -, que nenhum mal do repistrada a gravidade da conduta praticada pelo ofensor e a gravida- de da lesio a liberdade. Const tra expresso no inciso TM doart. 5.°: “Ninguém seré obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa sendo em virtude de lei juntamente com outros cinones também decorrentes do Estado democrtico de direito, revela 32 PRESSUPOSTOS MATERIAIS MINIMOS DA TUTELA PENAL uma tendéncia no sentido de restringir a atuago estatal como tolher a liberdade, o que nao deve ser confundido com a idéia de impuni- dade, mas, em muitos casos, de intervencio altemativa, buscando-se ou- ‘ros meios punitivos, como as penas restritivas de direitos ou pecuniérias.* A aplicagio do principio da liberdade leva a que nao se criminali- ze, por exemplo tal qual ocorre algures ~, 0 homossexualismo. Dever- , também, deixar de se punir a contravengao penal de mendicancia, le Contravengées Penais,’ ja que 0 Estado nao pode inguém a trabalhar. Sao questoes de foro intimo, de delibera- fundamentar a infracdo criminal em uma atitude voluntaria puramente interna ou em um modo de ser da pessoa. Dat a necesséria distingao entre tipo de perigosidade ¢ tipo de injust meiro a perigosidade social nao corresponde {fato, no segundo, precisa-se de uma ago penalmente relevante para a existéncia do delito” (1991, p. 243). Para Francesco Palazzo, da influéncia dos principios con nais de zolerdncia e pluralismo, “deve originar-se uma tendéncia a secu larizacao do direito penal, secularizagao nao identificada apenas na vi- toria de certas incrustagdes do sistema, de fe fatos reprovaveis de um ponto de v (1989, p. 87), Ainda, sobre o principio da pode-se dizer, com Heinz que “representa o principio fundamental da sociedade plural xxige do Estado, principalmente em matérias discut ico, prescindir de regulat MERECIMENTO DE'TUTELA PENAL 33 constitui “um valor positivo que defende a autonomia pessoal e, portan- to, poe limites as concepgdes que atacam a liberdade, a igualdade ¢ os direitos humanos” (1993, p. 14), A tolerancia imunidade nas de & Pasquino, 1986, p. 1.246). Apesar disto, subsiste um grande mérito deste principio, que € 0 de reconhecer ¢ exaltar a dignidade da pessoa ‘humana, que nfo se perde em presenga do erro (Bobbio & Matteucci & Pasquino, 1986, p. 1.247), nao podendo, portanto, ser atacada sob a jus tificativa de que o agente delingiiiu, A idéia de a qualquer preconceito deve, no 0 de sua contemplagao, reconhe~ cer a necessidade de nao se estigmatizar, inclusive, aquele que sofreu uma condenaco penal 1.1.3. Nao protegao de valores morais Representa caracteristica comum &s constituigdes de cunho.demo- crético, 0 niio alberger disposigbes que versem sobre crimes politicos, bem como dispor sobre questes de ordem religiosa ou moral. Mortis e Hawkins, de acordo con (0 trazida por Jorge de Figuei- redo elo menos do ponto de vista do direito criminal, a todos os homen: te 0 inaliendvel direito de irem para o inferno & sua prOpria maneira, con- tanto que no lesem diretamente [a0 al introdugio, no conceito material de crime, de um ponto de 8 passagem do Estado de direito formal 20 me passa a ser a violaco de deveres morais-soi radigmatica, a este propésito, € a ligo de Welzel, para quem a “tarefa ‘a em ‘assegurar a validade dos valores, os de acdo’; ‘a tarefa pri 6 por incluso na prote- «do dos elementares valores de acto ético-sociais’” (Dias, 1999, p. 59), 34 PRESSUPOSTOS MATERIAIS MINIMOS DA TUTELA PENAL Figueiredo Dias, entretanto, discorda deste entendimento, dizendo que “nio é fungao do direito penal, nem priméria, nem secundéria tute~ Jar a virtude ou a moral quer se trate da moral estatalmente imposta, da moral dominante, ou da moral especffica de um qualquer grupo social. Para isso ndo esta o direito penal — como ordem terrena que tem de respeitar a liberdade de consciéncia de cada um (...) ~ de modo algum legitimado. Nem, por outro lado, os instrumentos de que se serve para a sua atuagao se revelam adequados para fazer valer no corpo social as normas da virtude e da moralidade. Nem, ainda por outro lado, para magistrados e 0s tribun: tigo do pecado e da imoralidade s6 podem ser, respectivamente, dade e a consciéncia individual” (1999, p. 60). Ha que se ressaltar, também, que uma tal perspectiva deixaria obnu- bilados os principios decorrentes de um Estado democritico. Ainda de acordo com Figueiredo Dias, uma concepgio deste teor é absolutamente inadequada a estrutura ¢ as exigéncias das sociedades democraticas ¢ plu- ralistas atuais. Em defesa deste p fato de que é caracterfstico do di de mera ‘conservacai tando a partida a poss sociais, culturais e econdmicos propria do Estado de Direito soci rém, o argumento mais forte destacado pelos autores refere-se a0 fato de concepeo nao se amolda ao pluralismo ético-social das so- sm maior ou menor medida, coexis- tem — por vezes de forma pacifica, por outras de forma tensa ~ zonas de consenso com zonas de conflito” (1999, p, 60-61). Um Estado de dircito pressupée a soberania popular, respeitando as opts de vida de cada pessoa, sem se prestar a perseguir construgbes cas, pregacoes divinas ou objetivos transcendentes. Nem mes- atuago no sentido de aplicar corretivos mo- le a pessoas adultas, ainda que suas opgdes nao sejam de bom transito. Para Claus Roxin a moral nao é nenhum bem juridico. “Se uma ago nio afets o Ambito de liberdade de ninguém, nem, tampouco pode escandalizar o sentimento de algum espectador porque é mantida oculta na esfera privada, a sua punigao deixa de ter um MERECIMENTO DE TUTELA PENAL 35 firm de protesio" (1986, p. 29-30). As condutas meramente imorais nZo ccugio do primeiro fim, implica contrariar a liberdade de consciéneia e, portanto, desconhecer o pluralismo ideol6gico ¢ a tolerancia moral & ideol6gica que a mesma implica” (apud Queiroz, 1998, p. 94). Estiio acordes Eugenio Re “Sob nenhum ponto de vista a moral em sentido est ada um bem juridico. A ‘moral pablica’ é um sentimento de pudor, que se supie ter 0 diteito de té-la, e que € bom que a populagao a tenha, mas se alguém carece de tal sentimento, nfo se pode obrigar a que o tenha, nem que se comporte como se o tivesse, na medida em que nao lesionem © sentimento daqueles que 0 tem. (.) Além do mais, a moral € questio Henrique Pierange pode ser conside- Ja, mas de modo algum tratar de impé-la, 0 que, por outro lado, irealizavet” (1997, p. 467-468). ‘Tudo o que se vin até agora, entretanto, nao significa — utilizando- se ligo de Mir Puig — que os bens juridicos nao possam ser bens morais, “mas exige que tenham algo mais que os fagam merecedores de prote- salientar que nfo se trata da substituigio do conc de ‘sentimentos’, com o que se teria dado apenas \s6ria mudanga terminol6gica, Para a criminalizagao estar legitimada, a conduta terd que ofender valores que a luz da Constituigao se possam considerar essenciais. Assim, a tutela do pudor, atualme no terd diretamente a igo da dignidade ia, coma protecio da ide das pessoas gir um tal graw que professam tal religido, tendo estas condutas que a 36 PRESSUPOSTOS MATERIAIS MINIMOS DA TUTELA PENAL. que se possa considerar socialmente danoso, pondo-se em causa a paz publica” (Cunha, 1995, p. 152). ‘A moralidade, enfim, & condigao de relagao social, ndo uma estru- tura a ser protegida em si mesma, e jamais emprest para intervencao do Estado em procedimentos pessoais. Ao direito penal é concedida a dificil tarefa de proteger bens jurfdi- \da, produzindo, contrariamente, maiores e mais graves situagdes de- vas” (Queiroz, 1998, p. 112). As limitagoes do objeto da lei uma autorizagao ou um aria juridicamente impedido ~ tra palavra, de uma zona livre de valoracio juridica, em nome da ferem-se a éreas de contengao juridica, nas quais as decisdes sa0 \das a0 alvedrio das consciéncias dos envolvidos. A inexisténcia de proibicdo, entretanto, niio se confunde com a aprovagao de dada conduta, Para 0 autor, quando se fala em zona livre de direito, quer-se acenar, somente, para a contengao de valores, no sentido de o direito nao se manifestar sobre determinada questo. Desta forma, a exclusdo da ilicitude penal nio acarreta a eliminacao da ilicitu- de em geral que o fato provoca. esta teoria abrangeria “nao s6 a todas as condutas inécuas a ver com o diteito ~ comer, sorrir, importante esta afirmagao) a condutas indesejéveis, negativas, mas que nao pertencem ao dominio juridico — por exemplo, aquela Area de condutas imorais que, por nao lesarem bens icos, devem ser deixadas a livre consciéncia de cada um” (Cunha, 195, p. 399). Como exemplos de zona livre de direito, pode-se citar 0 passear... mas também (e aqui [MERECIMENTO DE TUTELA PENAL. 37 incesto, a pornografia (ambos quando envolvam adultos), 0 adultério, © uso de substincia entorpecente, os jogos de azar, dentre outros. Um Estado com conotagdo democrética nao permite a criminaliza- «fo de qualquer conduta que decorra das opcdes conscientes de um gru- po da sociedade ~ ainda que minoria. Desta forma, propagar doutrinas contrdrias a uma determinada religiao, ou mesmo contra a concepgdo de Estado, por exemplo, é conduta que nao pod yamente, ser crimi- nalizada, salvo, € claro, se os meios forem A delimitacio das situagées que podem — eer pelo decorre, ainda, do principio da intervengao minima, pelo qual a atuago do Estado deve se restringir as situagdes que comprome- tam a convivéncia em comum. deve-se ressaltar que em um Estado democritico, plura- arizado a pena s que serve de penal, neste contexto protecio de bens juridicos, deixando ao alvedrio individual todas as opgdes de comportamento que nao lesem nem exponham a perigo bens desta natureza. 2. Aproximagies & nog de bem juridico-penal Os entendimentos acerca do bem juridico-penal sofreram iniime- ‘A tarefa que ora se propde — intelectualmente exigente ~ é a con- 4 privilegiado o seu aspecto mate- |, jf que a meta do trabalho, iro percurso a ser considerado no ‘momento de se criminalizar determinada conduta, interessando, portanto, os aspectos que a antecedem, Conforme Jorge de Figueiredo Dias, a nogdo de bem juridico “ndio pode, até 0 momento presente, ser determinada —e talvez jamais o venha a ser — com uma seguranga que a permita converter em conceito fechado e apio A subsungio, capaz de tragar, para além de toda a diivida possivel, afronteira entre o que legitimamente pode e ndo pode ser crimina- lizado. [Resta, entretanto, um consenso relativamente expressivo, que orbi- | 38 PRESSUPOSTOS MATERIAIS MINIMOS DA TUTELA PENAL taem tomo de um miicleo central do conceito de bem juridico, através do qual se pode defini-lo como] a expresso de wm interesse, da pessoa ou da Comunidade, na manutengao ou integridade de um certo estado, objeto ou bem em si mesmo socialmente relevante e por isso juridicamente reconhe- ‘cido como valioso” (1999, p. 62-63). Como adverte o autor, chega-sea esta conclusio somente aps trilhar longo caminho, no qual so encontradas iniimeras concepgGes normalmente equivocas, duvidosas e controversas. ‘Também contribuem para adificuldade de compreensio deste con- ceito as inimeras expresses que buscam identificé-lo. Manoel Costa das: “perturbagdo gravosa da ordenagio perturbago da paz juridica; contetido de mais ou menos feliz, de um determinado programa politic: que conta entre seus pontos bisicos com a determinagao daqueles bens «que devem ser protegidos sob a ameaga de pena” (Mir Puig, 1996, p. 135). Eesta concepgao que interessa aos limites da pesquisa. AA inscrigo destes bens juridicos acompanha os interesses de grupos sociais que detenham, em dado momento hist6rico, a hegemonia politica tal compartitham um lugar comum: sua ori- le burguesa do século XIX, e permanecem gem é associada a 5 res ¢ interesses preponderantes & época, muito embora 0 smo ¢ do modemo modelo de Estado tenham dado visi- mais sentido o enten ito penal deve estender sua protegao, alcangando ;portdncia para amplos setores da populacao. al, do meio ambiente, das condigées de alimentos e medicaments, dentre outros.* © Sobre. tema do capitalismo, pode-se citar a lei que trata de crimes contra 0 sistema financeiro nacional (Lei 7.492/86) ¢ a que se refere & ordem tribu- MERECIMENTO DE TUTELA PENAL. 39 Tal compreenstio encontra-se concorde com a mais recente det iio de bem juridico, que o entende como um produto da sociedade, 0 que vengiio do direito penal a necesséria prevenclo de da- ros sociais, nfo Ihe permitindo salvaguardar concepgdes de indole ideo- 6gica ou moral, ou ‘Ademais, concebe ao direito penal a fungdo de realizar prestagbes p ‘cas necessérias 4 protegio destes bens. Hormazabal Malarée também atribui uma origem social ao bem jjuridico, acrescentando que em um Estado democratic a determina- {¢40 do objeto a ser protegido pela norma penal nao pode depender de uma exclusiva decisio afeita ao legislador. “Formalmente, como con- seqiiéncia do a legalidade, o preceito penal serd o resulta- do de um processo legislativo, mas a determinacao do bem juridico corresponde & base social que comunicard sua decisdo As instdncias iar dita deci- (1991, p. 142-143). Desta forma, ha uma necesséria zona de va protegio de bens juridi- snquanto produto social, ¢ hist6rico. Nao pertence senéio que surge de um sistema concreto de tando-sé de um Estado de © dos provessos de dis- fscussio depen- ou seja, do maior ou menor cariter democratico do Estado e da sociedade. No Brasil, poucos so os autores que dedicaram seus estudos 20 ‘bem juridico. Com excegio de Luiz. Regis Prado’ que publicou livro sobre o assunto e de Everardo da Cunha Luna® que ao tema dedicou, na tira, econdmica es relagdes de const 17/90); sobre concepgio de Estado, vercrimes contra. precot ccupago com medicamentos, Capitulos de direito penal: parte geral. So Paulo : Saraiva, 1985 ( 40 PRESSUPOSTOS MATERIAIS MINIMOS DA TUTELA PENAL sua obra, um capitulo especifico, os demais a fazé-lo apenas 0 tangen- ciam, ainda que com elaboragées respeit Para Prado, a nogaio de bem jurii ica a realizagfo de um juizo positivo de valor acerca de um jo objeto ou situagio ‘social ede sua relevancia para o desenvolvimento do ser humano” (1997, p. 63-64). Everardo da Cunha Luna, a0 elaborar 0 conceito de bem jurfdico i “ to penal protege bens juridicos rat fundamental o bem jurfdico que mais [entendendo por direitos nat ¢ vividos, direitos cuja postergagao impede ou manutengdo e o desenvolvimento do homem ¢ da col rados como um todo” (1985, p. 134). Anibal Bruno, percebendo que a selegéio dos bens ju socidvel de uma componente hi el fundamentais do individuo ou da sociedade que, consciéncia comum do grupo ou das camadas s eleva & categoria de bens jurfdicos” (1967, p. 15). Enlende Helen Cléudio Fragoso que 0 bem jurfdico-penal “é 0 1 que se procura preservar, cuja natureza sentido que a norma tem ou que acla $0, uma realidade contemplada : &, portanto, ‘0 reconhece, ¢ a cuja preservagiio 991, p. 265). ica os bens juridicos como valo- s “que o direito seleciona, com o objetivo de assegurar a ‘oloca sob sua protego para que no sejam expostos a 1e ou a lesies efetivas” (1994, p. 16). Nilo Batista contesta as concepgdes légico-formais de bem juridi- co, por entender que elas descuram de uma caracteristica imanente 2 sociedade atual: a divisao de classes sociais, Para 0 autor, “numa socie- dade dividida em classes, o direito penal estard protegendo relagbes so- ou ‘valores’) escolhidos pela classe dominante, ainda que aparentem certa universalidade, ¢ contri- buindo para a reprodugiio dessas relagbes" (1996, p. 116). Para robuste- a NTSC ee ecm -MERECIMENTO DE TUTELA PENAL, 4 cer seu posicionamento, cita a ligéo de Juarez Cirino dos Santos, que critica os objetivos manifestos do direito penal, traduzidos na expresso “ protegao dos interesses e necessidades (conhecidos como valores) es- senciais para a existéncia do indi pressupostos] as nogies de unidade (e niio de divisao) social, de ide dade (e nio de contradigao) de classes, de igualdade (e niio de desig dade real) entre os componentes das classes sociais, ¢ de liberdade (e niio de opressio) individual” (1985, p. 23). Inscreve-se nas fungdes do Estado s dig6es para concretizar os comandos normat 10, mas uma relagao de intermediagi do de que aquele se coloca a disposigao deste, inclusive ant na resolugio dos problemas que afeter as pessoas. 0 do tipo democratica e de dircito deve proteger, com ex- laste de bens. A determinagio do que seria digno de senta uma decisio politica do Estado, que, entretanto, nio é arbitrria, mas condicionada a sua propria estrutura. Fm um Estado social e democritico a eleigdio dos bens juridicos haverd de ser realizada levando em sragdo os individuos ¢ suas necessidades no interior da sociedade ‘que conduz. a equivocos e confusdes uma distingdio dos |juridicos entre individuais e coletivos, de acordo com 0 fato de a latidade pertencer ao individuo ou a sociedade. A selecdo dos bens juridico: de contemplar os interesses luais, & vista das necessidades concretas do individuo, encontra- .-08 requerimentos de intervengdo penal para a protegio de determinadas relagdes sociais particulares. Em um Estado surge das préprias bases da relago soci podendo perder de vista o individuo e seus di 0 de manipulagao, transformat ey 42 PRESSUPOSTOS MATERIAIS MINIMOS DA TUTELA PENAL pelo direito penal deve possuir correspondéncia coma satisfacao de uma necessidade humana. Independentemente de todas estas discussdes, hi consenso no sen- tido de que 0 bem jurfdico representa o contetido material de valor do ‘to penal. No entanto, tal concepgao ~ que pertence ao seu sentido — permanece va de significado material, pois fo informa os elementos a serem considerados, a fim de que se possa selecionar os bens juridicos dignos de protecao por via penal. Pode-se dizer ainda mais: wuxeram elementos para a compreensio do significado e da importin- dobem juridico, porém, fats pode ser considerado como carénci colago, mas a uma limitagao fética, j4 que € impossfvel aprisionar 0 bem juridico num concei ‘0, que esgote qualquer divida em relagdo ao seu contetido. Resta, entretanto, uma tarefa mais acessfvel, que éa de estabelecer uma série de critérios negativos fundados nos principios apresentados no item I deste capitulo, por meio dos quais se poderia refutar, ou no, do bem. Estes critérios negativos de deslegitimagdio —a expressio€ de Luigi Ferrajoli - vio desde a irrelevancia do bem tutelado, passando pela au- séncia de lesiio efetiva do comportamento interditado e pela necessidade da tutela penal, desembocando na andlise acerca da efetividade do siste- ‘ma punitivo. S6 depois desta longa verificagéo pode-se, com mais tran- qililidade, mas sem afastar o risco de uma incorrego, chegar & afirma- Gao de que a tutela penal daquele bem ¢ legitima. O maximo que se alcanga, portanto, em sede de nogao de bem juridico, é, por um lado, fixar algumas nogGes orientadoras constituti- ‘vas, porque Ihe dao contomo (0 que foi objeto deste apartado); e, por tabelecer as limitagées a que esta entidade € submetida, face as restrigdes proprias do Estado social e democratico de direito, o quecons- titui seu conceito negativo. Conforme se verd no item 4, a fungio do bem jurfdico encontra-se estreitament mete-se para ada a esta sua concepclo negativa, razo pela qual re~ ‘as demais consideragdes sobre ela. -MERECIMENTO DE TUTELA PENAL 43 Antes, porém, de se debrugar sobre este tema, avangar-se-4 um ppouco riais na concepgao constitutiva do bem jurdico, sob a perspecti- va, agora, da propria Constituigao. 3. A determinagio do bem juridico sob 0 enfoque das teorias cons- titucionais ou valorativas? © bem juridico protegido pelo direito penal deve ter, ao menos indiretamente, respaldo con: ‘ob pena de nao possuir dignida- de. Binconcel ‘ dieito penal outorgue protecao a bens que no sto amparados cons! bergados pela Carta, jé que € nela que sHo inscritos os valores da socie- dade que a produz. Decorre do caréter legislador o: como 0s valores na Carta inseridos, nas ocasides em que sua implicar a definigdo de bens jurfdicos. “Alids, 0 propri ral do concei minagdo ou no de condutas. (...) A conceituagao niaterial de bem juridico implica o reconhecimento de que 0 legislador eleva & catego- na realidade social se mostra como um inseca a norma constitucional, cuja vir- tude nio € outra que a de retratar 0 que constitui os fundamentos e os valores de uma determinada época. Nao cria os valores a que se ref mas ce dar-Ihes um espec co” (Prado, 1997, p. 76). A norma constitucional, neste regra, so aqueles ‘comungados pela sociedade que a insti tucional no é dada a prerrogativa de descumprir ou mesmo ignorar este quadro de valores abrigado na Constituigao. © A referéncia & Constituigio no momento de delimitar os bens jurdicas ne- cessitados de protegao penal € comum as doutrinas de Francesco Angioni, Franco Bricola, Enzo Musco, Claus Roxin, Hans Joachim Rudolphi, Igndcio Berdugo Gomes de la Torre, Luis Arroyo Zapatero e Francesco Pallazzo, dentre outros. a neeenaenene | 44 PRESSUPOSTOS MATERIAIS MINIMOS DA TUTELA PENAL, para buscar o referente material do delito,"° podem ser bi-partidas nos seguintes grupos: a) teorias constitucionais amplas e b) teorias consti- tucionais de cardter restrito. Para estas, é a Constituigao que determina que bens juridicos serdo, efetivamente, protegidos pelo direito penal, enquanto para aquelas a Carta serve de parmetro para o reconhecimen- to desses referidos bens, sem esgotar a questo, no entanto. 3.1 Teorias constitucionais amplas i — base sobre o qual se constr6io discussio que envolve a deter A Con: iva, outros, mesmo que tamente pela Constituig exige-se, como condi bem protegido e a ordem con: poderiam ser criminal téncia de antagonismo entre o tucional, Ampla marge de liberdade, pois, 6 concedida ao legislador na sua tarefa criminalizadora. dade 6 regrada por principios como © da necessidade, 0 do merecimento, dentre outros. Para Domenico Pulitano, nas palavras de Hernén Hormaz4bal Malarée, a Constitui¢ao “cumpriria uma funcdo de orientagao posit ‘que parte da matriz liberal, indo até a revelagao de necessidades po: [Sendo assim, ela nao pode ser tida como um si que conduziria a uma jana. nela foram aprofundadas. Franco te, desenvolveu a tese, a partir de 2 -MERECIMENTO DE TUTELA PENAL 45 ‘Assim, conforme a esta variante da teoria constitucionalista do bem juri- ddico, a Constituigio serviria de base para fomentar uma expansio do sistema penal em que suas proposigdes concretas somente poderiam ser controladas em seus pressupostos” (1991, p. Os pressupostos liberais da Constituigéo cumpririam um duplo propésito: a) assinalari- ‘amos limites da tutela penal e b) constituiriam um marco para o desen- volvimento da politica penal. Estas teorias buscam acolher as répidas transformagées sociais que, face ao ineditismo, no foram contempladas na Con: do. que se estabelega um déficit na relagao do direito penal com a realidade ¢ sua mutabilidade. Sempre novas demandas de tutela, vindas de modos de organizagio social que a modemidade pede, de invengdes € de pro- gressos cientificos, da sofisticagio das relagées comerciais, do fendme- no da globalizagéo, poderao ser atendidas pelo direito penal, mesmo desses valores para os quais se reclama protegio, ja esto (0, ou se encontram em pres- Maria da Conceigio Ferreira da Cunha, fazendo mengio a estas, teorias, exp! igo deixaria ampla mar- ‘gem de operatividade ao legislador penal, apenas Ihe apondo limites sferéncia no uso de poder discriciondrio por parte lador penal” (1995, p. 191-192). ‘Também é neste sentido o entendimento de José Francisco de Faria Costa. Refere-se, 0 autor, a um espaco livre de incriminagdo que perten- io € por meio do qual “o quadro dos bens jurfdi- ‘do tem de ser estaticamente definido por um jonal” (1992, p. 647). E exatamente esta imprescindivel smite, aliés, que ataques a novos bens jt ‘cos possam ser criminalizados. 46 PRESSUPOSTOS MATERI MINIMOS DA TUTELA PENAL Pietro Nuvolone entende que pode esgotar-se na perspectiva con indubitével que os bens expressamente tutelados pela Constituigto (..) caracterizam interesses primérios, também é verdade que ndo exaurem, por sua na tureza, os interesses suscetiveis de tutela penal. £ claro que nacio da lesio de tais interesses sera c mas nio serd ilegitima a incriminagio da lesio de outros interesses desde que nio esteja contrariando os garantidos pela Con: * (1981, p. 40). cessidade” (1997, p. 78-79). Jorge de Figueiredo Dias chama a atengiio para o fato de que toda idade estatal, af incluida a ju sariamente, que a ordem legal dos bens juridicos e a ordenacio axiol6gica que preside a Constituigio encontram-se imbricadas ¢ em reciprocidade. “Relagao que nio ser’ de ‘identidade", ou mesmo s6 de ‘recfproca cobertura’, mas de analo- sia material, fundada numa essencial correspondéncia de sentido, a permitir afirmar que a ordem de v: \eamente, o critério regul de uma aceitével e necesséria odo fe para o poder criminalizador, deixando em aberto a indispensavel garantia de restrigao da tutela penal a valores visivel- mente fundamentais para a comunidade. A fim de amenizar tal pro- Dlematica, deve-se exigit uma relagao de sen do bem na jo na Carta que se pretende tu valores constitucionai ‘Também subsiste a dificuldade de se relacionar os bens constitu- cionais implicitos ou, na linguagem de Cunh 0s bens de relacao de As discusses sobre a necessidade de mo capitulo, la penal serdo travadas no préxi- MERECIMENTO DE TUTELA PENAL 47 pressuposicdo necesséria, 0 que desemboca no alargamento da insegu- ranga juridica. Este € custo que ndo se pode relegar, sob penia de que se sm as distincias entre a consciéncia social e o concreto momento rico, ‘a versiio que contempla os valores com relevo constitucio- aterial éa que “concebe um melhor equilibrio entre vin- culago constitucional/liberdade do legislador, garantindo que s6 se pro- tejam penalmente valores dignos de tal protegio, mas nio asfixiando a capacidade de apreciago legislativa, nem a adaptabilidade do direito 9s indispens4veis para a melhor protegio dos interesses do individuo e da coletividade. 3.2. Teorias de fundamento constitucional restrito ‘A corrente estritamente constitucionalista, da mesma forma que a anteriormente mencionada, foi desenvolvida principalmente pela dou- do prevé, “a importincia da liberdade pes- soal como valor que somente pode ser vulnerado pelo Estado quando se haja produzido uma lesao contra um bem de similar importancia, isto é, de fundamento constitucional” (art. 13). Segundo Luiz Regis Prado, estas teorias “orientam-se firmemente em nfvel de prescrigdes ). 53). Partem da tentativa de sok tos do agressor que sero restrin- vlerd restringir direitos fundamentais do primeiro quando tiverem tos igualmente fundamentais da segunda. Enquanto va de direitos, liberdades e garantias, a aplicagao da lei penal se resumiré a tutelar valores albergados pela Carta. De acordo com as teorias sob perspect lador penal no 6 dada a prerrogativa de contrariar a ordem constitucional (seus pri pios e valores). Além disto, somente poderiam ser criminalizados os bens que, de alguma forma, refletissem valores constitucionais. Assim, 0 nn SSeS 48 PRESSUPOSTOS MATER ‘MINIMOS DA TUTELA PENAL apenas na Constituicdo poderiam ser buscados os bens ju 0s quai 1 idico-penais, quais, por conseguinte, haveriam de representar os bens relevantes socialmente, ja que contidos na Carta Maior. Dois so 0s valores coloca. 7 Gm causa: liberdade de opedo legislaiva concregdo constitucio- nal. A opsio é pela restricio daquela em favor desta, estreitando bastan- te as relagdes entre poder legislati — Aenis cia de valores com relevo constitucional nto faz pressu- imposigao de tutelé-los penalmente. Esta escolha fi Tegislador pen: epee penalmen Raciocinar desta forma em um. Constit fs como 0 Brasil, regido asttuigdo prolixa' e recém-promulgada, pode parecer 4 melhor oped, ja que as intimeras matérias nela contidas foram valoradas de acordo com concepedes contemporineas, diferentemente do que ocor- re, principalmente, em relagdo a Cartas de paises europeus, . promulga- Ver capitulo 1, item 1. De acordo com Paulo Bonavides, as Const aquelas que traze propriamente di Ihor caberiam em rain reesiepe enced | 10 autor, 0 surgimento rincipalmente, ds seguintes causas:] a io, 0s encargos indispen- (1998, p. 73-74), [MERECIMENTO DE TUTELA PENAL 49 das hd muito tempo. No entanto, ao se pensar no inciso XII do art. 5. s telegraficas, de dados e 10 caso, que seja quebrado 0. teses ¢ na forma que a lei estabelecer para fins de investigagio crimi- nal ot jode-se chegar a conclusGes bas- nicagoes em sistemas de informatica e telemitica, extrapolando, as- sim, 0 comando constitucional. Perquire-se se a lei ordindria poderia colmatar a lacuna deixada pela Carta Magna, para que pudesse melhor servir ao interesse comum, Estes aspectos féticos, ainda que néo resolvidos teoricamente, que ndo se pode, em absoluto, dispensar o legislador cional de acompanhar as mudangas ¢ evolugdes sociais, a fim de estar sempre se atualizando em sua tarefa de selecionar os bens-valores que representem elevado grau de importancia aos indi- vviduos em sociedade, ainda que a Norma Fundamental os tenha olvi- Francisco Javier Alvarez Garci que “Iimitar a tutela penal a bens const 6 oportuna para o ordenamento em set conta que as constituigdes envelhecem, nao resultando estranho que sur- jam novas exigéncias de tutela que nem sequer eram previsiveis no momento da elaboracdo do texto fundamental” (1991, p. 33). A fim de evitar este descompasso, apregoa, 0 autor, a utilizagdo de uma interpre taco evolutiva, por meio da qual se possa adaptar @ contetido da Carta As crescentes demandas séciais. Bricola chama a atengao para a necessidade de se ainda, dimensio precisa” (apud Alvarez Garcia, 1991, p. 39). En ‘mento diverso ¢ patrocinado por Alvarez Garcia, por entender que 0} to penal “deve atuar somente em relagao aos ataques dirigidos aos bens 50 PRESSUPOSTOS MATERIAIS MINIMOS DA TUTELA PENAL Juridicos nos quais estejam igualmente interessados todos 0s cidadaos, 0 ‘que, certamente, no ocorre em relagao aos bens que esteja ainda em pe- riodo de especificagao, impusionados geralmente por determinados gru- pos em seu exclusivo interesse; haveré que esperar, para outorgar prote- $0 penal, a que esses bens se assentem, se concretem e sejam acolhidos pelo interesse geral. Tal nfo significa que se precise de uma larga espera, J que o contrério nos levaria a construir um direito penal continuamente atrasado em relagiio & demanda social” (1991, p. 39). 4. A fungiio do bem juridico no processo de criminalizagio in thesi de condutas Quando da criagio legislativa do tipo penal, as consideragdes sobre ‘bem juridico passam para o primeiro plano. A fungéo preponderante é a de servir de limite ao legislador. A medida que o direito penal somente. std autorizado a intervir quando sua a¢do estiver voltada para a protegio de bens juridicos, oso, no momento da elaboragio da lei, Tecotrer a teoria do bem juridico, a fim de se estabelecer 0 que pode e 0 ue esté excluido do ambito de abrangéncia de um tipo penal. A me que a teoria do bem juridico esteja apta a fornecer as informagdes sobre o que se proteger em determinado bem e porque se 0 faz, surge a possibilidade de se elaborar uma revisio critica da norma penal ede todo o ordenamento que a sustenta em um duplo processo: de ‘uma parte, a descriminalizagao de determinadas con; tamento interditado ja naio mais possui vigéncia social; de outra, a cri nalizagao de novas condutas surgidas com a evolugao do processo social © que necessitam de t iva que caracteriza o direito penal 10s, obnubila o conceito de bem juridi- co-penal como critério valorativo reitor e continente das opgdes penais, impossibilitando a criaglo de uma teoria do bem juridico. Isto porg idade, a causalidade, a continéncia e, as vezes, a inconsisténcia ivalem, de fato, ao esvaziamento da idéia mesma de ‘bem’ ¢ indicam a sobrecarga de fungdes impréprias que lastra a (..) justiga penal” (Ferrajoli, 1995a, p. 475). Esta tendéncia de proliferagio desor- denada de tipos penais é responsével pela auséncia de harmonia norma- tiva e gera a vulgarizago do ordenamento juridico-penal. A fungio de [MERECIMENTO DE TUTELA PENAL 51 penal também é reservada, Este enfraquecimento leva, também, ao descrédito da justiga, obstaculizando a que se atinja uma outra das funcGes primordiais do direito penal, que é a de afastar 0 cida- dio do cometimento do delito por meio da intimidacao. motivar o respeito & norma, que ao di De toda forma, esquecendo-se de como funciona o processo de criminalizagao e concentrando-se na sua formulagio ideal, pode-se, a la no item 2 deste capitulo, reforgar a reduzir a matéria de proibigao estatal aos seus devidos limites. conceito negativo do bem juridico alcangado por meio das ides proprias do Estado social e democratico de. Um bem juridico-penal cor a.colaborar na fungi que um di um Estado social e democrat perspectivado no ito deve visar.

Você também pode gostar