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Na história alternativa das sociedades secretas, a posição tomada pelo Vaticano, e por
quem quer que tenha calçado as sandálias do pescador, em qualquer época da história,
sempre foi uma questão da maior importância. O relacionamento entre o papa e os Grão-
Mestres das sociedades secretas tem sido explosivo. E não poderia ser de outra forma. A
Igreja encarou os membros das sociedades secretas como anarquistas espirituais, agentes de
uma conspiração satânica contra a religião organizada. Por sua vez, os maçons e rosa-cruzes
acusaram a Igreja de ter suprimido os verdadeiros ensinamentos de Jesus de Nazaré. Outras
sociedades secretas, como os Illuminati e os Carbonari, foram fervorosamente anticlericais.
Elas conspiraram para derrubar a Igreja Católica, devido a sua oposição às antigas religiões
pagãs e à heresia maniqueísta, fontes de inspiração espiritual para esses grupos, e ao seu
apoio à rica classe dos latifundiários, opressores das massas.
Ao tomar esse tipo de ação, o Vaticano estava seguindo uma tradição histórica, pois a
Igreja cristã, em seus primórdios, tentara neutralizar os seus dissidentes por uma série de
concílios que estabeleceram os princípios e as doutrinas oficiais do cristianismo. Esses
concílios — sobretudo o terrível Concílio de Nicéia, reunido pelo imperador romano
Constantino, no século IV d.C. — rejeitaram crenças pagãs, como a reencarnação, mantidas
pelos primeiros cristãos, e apresentaram Jesus como Deus encarnado, em vez de um mestre
espiritual humano. Quem discordasse dessas decisões era tachado de herege, significando
“aquele que escolhe”, pouca tolerância podendo esperar da nova geração de líderes cristãos
que detinham o controle político da nova Igreja.
Uma das primeiras vítimas da intolerância da Igreja Cristã foi o cristianismo celta,
dissolvido pelo Concílio de Whitby, em 664 d.C. O cristianismo celta desenvolvera o seu
caráter peculiar durante a ocupação romana da Grã-Bretanha, tendo sido fortemente
influenciado pelo druidismo, Consoante a lenda, a primeira igreja cristã nesse país, foi
construída pelo tio de Jesus, José de Arimatéia em Glastonbury, no condado de Somerset,
onde atualmente existe uma abadia medieval. José era um rico mercador que visitava as
minas de estanho da Cornualha com objetivos comerciais. Em uma dessas viagens a negócios,
José teria trazido consigo o seu jovem sobrinho, iniciado em um colégio druida. Glastonbury
havia sido um centro espiritual desde tempos pré-históricos e a versão do cristianismo
introduzida por José e seus discípulos se entremesclava com o paganismo. Um ramo separado
da Igreja celta foi estabelecido em Gales, no século V d.C., por monges irlandeses que haviam
combinado as tradições orientais com o paganismo nativo da Irlanda.
Além do druidismo, a Igreja celta fora influenciada pelo cristianismo copta. Essa versão
não-ortodoxa da nova fé foi fundada por Clemente de Alexandria, que mesclou os
ensinamentos de Jesus com o gnosticismo, o judaísmo e o neoplatonismo. Clemente baseou
sua Igreja Copta no evangelho secreto de Marcos, escrito pelo evangelista em Alexandria,
após a morte de Jesus. Esse evangelho preservou os ensinamentos secretos de Jesus aos seus
discípulos mais próximos, iniciados nos Mistérios cristãos. É interessante notar que Ormus, o
lendário fundador no século I, pertencia à sociedade secreta que se tornou o Priorado de Sião.
Ormus viveu em Alexandria e foi convertido ao cristianismo por Marcos.
Antes de se tornar uma estrutura de poder estabelecida, protegida pela força da Roma
imperial, o cristianismo primitivo agira secretamente, como os cultos de Mistérios pagãos, e
sofrera perseguições pelas suas crenças subversivas. O ódio romano aos cristãos devia-se à sua
crença de que os seus ensinamentos eram politicamente subversivos e ameaçavam o status
quo. No século III d.C., quando o Império Romano ingressou em um período de crise, os
cristãos haviam se infiltrado em importantes posições da sociedade romana, apesar de serem
vistos como perigosos dissidentes, cujas idéias alienígenas colocavam em perigo o tecido
social do Império. Essa perseguição coincidiu com grandes conflitos no interior da própria
Igreja, a respeito da relação do poder soberano dos imperadores romanos com a
espiritualidade cristã.
Na primeira década do século IV, surgiu uma situação em que vários imperadores rivais
lutaram pelo trono romano. Dessa luta intestina emergiu um candidato que, durante o seu
longo reinado, de 306 a 337, desempenharia um papel decisivo na história tanto do Império
Romano como do cristianismo. Esse homem foi Constantino Magno.
Constantino fora criado nas crenças religiosas pagãs do culto do Sol Invictus, que
identificava o imperador como a encarnação do deus Sol. Esse culto foi a primeira tentativa,
na cultura romana, de impor uma estrutura monoteísta ao panteão politeísta de deuses e
deusas cultuados pelo povo. Em muitos aspectos, assemelhava-se à religião de Aton do antigo
Egito, criado pelo faraó herético Akenaton. Inicialmente, Constantino fora um pagão devoto,
e registra-se que, ao lutar na Gália (França), teve uma visão do deus solar Apolo, cultuado em
Roma como a encarnação suprema do divino Sol. Entretanto, ao marchar sobre Roma,
Constantino teve outra visão, de uma cruz flamejante no céu encimada pelo lema, em letras
de fogo “In hoc signo vinces”, traduzindo: Com este signo vencerás. No dia seguinte, ao
vencer a batalha, o oportunista Constantino decidiu que o deus cristão era uma deidade
poderosa, digna de sua adoração.
Constantino, por sua vez, aumentou o poder político da Igreja embrionária, nomeando
cristãos para posições-chave em sua corte, proibindo a prática privada de rituais mágicos e
declarando o domingo um dia de descanso. Durante o seu reinado, o paganismo continuou
florescendo e ritos sacrificais foram praticados como um importante aspecto do ritual oficial,
Entretanto, não havia ilusão quanto ao fato de que Constantino, ainda que tolerasse esse
estado de coisas, secretamente favorecia o cristianismo, tornando-a religião oficial do
Império Romano.
Rumores logo circularam de que Juliano não havia sido morto pelos persas, mas
assassinado por um membro cristão de seu próprio exército, contrário às crenças pagãs do
imperador.
No final do século VIII, o relacionamento entre os reis francos e o bispo de Roma tinha
se estreitado, Em 795, o papa Leão III reconheceu o monarca franco Carlos Mano como o
Patrício de Roma. Quando Carlos Magno salvou o papa da desgraça de uma acusação de
corrupção, o pontífice em gratidão, o coroou como o novo imperador romano. O sacro Império
Romano, governado pelo rei franco, foi a primeira tentativa da Igreja medieval de expandir a
sua base de poder, da esfera espiritual para o mundo da política internacional. O intuito do
Vaticano era formar uma Europa unida, com base nos valores cristãos e na cavalaria, através
da qual pudesse exercer o poder temporal e espiritual absoluto.
Com a morte de Carlos Magno, esse sonho da unidade européia rapidamente se
desvaneceu. O seu neto foi coroado imperador romano em 915, mas com a sua morte, nove
anos depois, o trono imperial permaneceu vago por duas décadas. Em 936, Oto – o filho de
Henrique, o Passarinheiro, que consolidara a dinastia saxônia, na Alemanha – foi eleito rei
pela aristocracia alemã. Ele declarou a sua intenção de lutar contra os inimigos de Cristo e
expulsar os pagãos de sua terra. O Vaticano viu, nesse guerreiro alemão, um imperador
romano potencial.
Em 951, Oto foi coroado rei da Lombardia e se tornou o governante do norte da Itália.
A eleição em 1073, do papa Gregório VII comprometeu essa cômoda aliança. O novo
papa declarou a sua crença de que o Vaticano era o senhor dos imperadores romanos e o
vigário eleito por Cristo. Asseverou que a coroação do sacro imperador romano pelo pontífice
era uma demonstração pública de que o poder político do Império emanava de Deus, através
de seu emissário eleito no Vaticano. O imperador Henrique IV contestou essa visão e foi
imediatamente excomungado pelo papa por traição. Diante de revoltas locais que ameaçaram
derrubá-lo do trono, Henrique viu-se forçado a se retratar e a submeter-se à autoridade do
papa.
Essa batalha ideológica entre os papas e os imperadores romanos, por eles criados,
estende-se por centenas de anos. O ponto em que podemos discernir o início da influência das
sociedades secretas, nessa luta pelo poder, foi no reinado de Frederico II, coroado sacro
imperador romano em 1215. Frederico era um homem possuidor de uma grande visão
espiritual, tendo seguido os passos de seu avô, Frederico Barba-Roxa, que desafiadoramente
declarara: “Possuímos o nosso reino e o nosso império não como um feudo do papa, mas pela
eleição dos príncipes de Deus somente”. Frederico II tornou-se rei da Sicília e, em 1228,
partiu para uma cruzada à Terra Santa em que acabou se tornando rei de Jerusalém. Corriam
rumores de que Frederico se envolvera na prática do ocultismo, incluindo a astrologia e a
alquimia. Ele mantinha um harém, em sua corte na Sicília, falava árabe e havia,
presumivelmente, sido iniciado na fé islâmica. Talvez seja essa a explicação de o papa
Gregório IX ter denunciado Frederico como um herege e a personificação do Anticristo.
O sacro imperador romano fundou a sua própria ordem cavalheiresca, conhecida como
os Cavalheiros Teutônicos, rivalizando com os templários. De 1230 a 1239, diversas batalhas
foram travadas entre as duas ordens pela supremacia na Terra Santa. Como um ocultista, é
possível que Frederico se opusesse aos templários por discordar das suas crenças espirituais e
julgar que tivessem se extraviado do verdadeiro caminho. Frederico sabia que qualquer
tentativa de derrubar a Ordem pela força estava fadada ao fracasso, devido ao apoio do
Vaticano naquela época. Entretanto, a sua oposição à Ordem na Terra Santa enfraqueceu
seriamente o seu poder político e a perda do templo de Jerusalém solapou o seu moral. Essas
circunstâncias contribuíram para a queda final dos templários.
Em 1529, os príncipes alemães que haviam apoiado Lutero e a sua política reformista
protestaram junto ao imperador Carlos V contra as restrições impostas ao novo movimento
cristão.
Essa manifestação deu origem à palavra “protestante”, e uma campanha para reformar
a Igreja Romana de seu interior, foi transformada em uma religião alternativa que desafiou a
autoridade espiritual do papa e o poder material do Sacro Império Romano. Os grão-mestres
das sociedades secretas ofereceram apoio aos reformadores religiosos por reconhecerem na
Reforma um meio de enfraquecer a influência da Igreja Católica nos assunto europeus.
Quando as lojas maçônicas começaram a se espalhar pela Europa, a Igreja reagiu com
uma campanha de difamação semelhante à empregada contra os hereges e as bruxas.
Distribuíram-se panfletos antimaçônicos, alegando que práticas sexuais anormais, como a
sodomia e flagelação, tinham lugar nas lojas maçônicas. Em 1738 foi emitida pelo papa
Clemente XII, a primeira bula papal condenando a franco-maçonaria. Essa bula ameaçava com
a excomunhão qualquer católico que se tornasse maçon, naquele tempo uma punição
gravíssima, Como resultado dessa bula, registrou-se alguma ação policial limitada contra os
maçons, na França e em outros países.
A campanha antimaçônica de Taxil teve tamanho sucesso, que uma conferência foi
organizada, à qual compareceram milhares de pessoas ansiosas para ouvir mais revelações. O
papa enviou um telegrama abençoando o evento; lido em voz alta para a multidão, que
aplaudia ruidosamente. Na conferência, os delegados pediram a Taxil que apresentasse a sua
famosa testemunha, mas o astuto jornalista contou à assembléia que ela tivera de se
esconder, após ameaças de morte por assassinos maçônicos.
A cruzada antimaçônica manteve sua força total até 1887, quando Taxil finalmente
confessou, em uma entrevista coletiva, que Diana Vaughan havia sido um produto de sua
imaginação. Ele afirmou ter escrito os livros para expor os ridículos excessos dos ataques da
Igreja Católica Romana aos franco-maçons. Essa confissão, além do simbolismo templário e de
conexões com a Alvorada Dourada, sugere que a cruzada antimaçônica foi uma operação
“suja das sociedades secretas a fim de desacreditarem futuros ataques da Igreja”. A ação
surtiu o efeito desejado, ainda que o infeliz Taxil, atacado pelos seus enfurecidos colegas
jornalistas, enganados por suas mentiras, tivesse que ser resgatado pela polícia.
Afirmou-se amiúde que o derradeiro objetivo das sociedades secretas seria infiltrar-se
no Vaticano e instalar no trono papal um de seus homens. As conspirações iluministas foram,
finalmente, desmascaradas em 1875, com a morte acidental de um sacerdote membro da
Ordem. Durante uma missão secreta para a Ordem, ele foi atingido por um raio, e o seu corpo
foi recolhido a um convento próximo. Uma freira que preparava o corpo para o sepultamento
encontrou um maço de documentos costurados no forro de sua batina. Esses documentos
esboçavam planos para a destruição da Igreja Católica a partir de seu interior. As autoridades
prontamente prescreveram a Ordem e o seu líder, Adam Weishaupt, foi banido da Baviera.
Ainda que morresse na obscuridade, alguns anos depois, logo após o seu banimento,
estabeleceu as bases de seu grande plano que, conforme muitos acreditam, continua ativo
até hoje.
De acordo com Compton, o papa João (anteriormente, bispo Angelo Roncalli) era um
iniciado de uma sociedade secreta. Roncalli foi consagrado bispo em 1953 e ingressou no
serviço diplomático do Vaticano como visitante apostólico da Santa Sé em Sófia, na Bulgária.
Em sua estada na Bulgária, Roncalli teria, supostamente, se filiado a uma sociedade secreta
cujo símbolo era a rosa e a cruz. Durante o seu papado, de 1958 a 1963, foram fomentadas as
primeiras grandes reformas da teologia católica, desde a Idade Média. Aos olhos da ala
tradicionalista da Igreja, essas reformas eram um programa de mudança radical ditado pelos
Grão-Mestres das sociedades secretas ao seu títere papal.
Em seu livro, Compton afirma que centenas de importantes clérigos católicos são
membros de sociedades secretas. Ele cita um artigo em um jornal italiano, em 1976, que
listou mais de 75 autoridades do Vaticano, como membros de sociedades secretas. Elas
incluíam o secretário particular do então papa Paulo VI, o diretor-geral da rádio do Vaticano,
o arcebispo de Florença, o prelado de Milão, o sub-editor do jornal do Vaticano, vários bispos
italianos e o abade da Ordem de São Benedito. Supõe-se que a sociedade secreta em questão
seja a franco-maçonaria, ainda que ao menos um nome da lista teria ligações familiares com
os rosa-cruzes.
Em sua exposição das sociedades secretas e de sua suposta influência sobre o Vaticano,
Compton aponta o cardeal do século XIX Mariano Rompalla (1843-1913) como um de seus
principais agentes dentro da Igreja. Esse liberal siciliano esposava pontos de vistas radicais e
subiu à posição de secretário de Estado no papado de Leão XIII. Em 1903, com o falecimento
do papa, Rompalla emergiu como o principal candidato à sua sucessão. Ele só deixou de ser
papa, porque o cardeal da Cracóvia, a mando do imperador José de Habsburgo, exerceu o
poder de veto. Como governantes do Sacro Império Romano, até 1806, os Habsburgo haviam
preservado o direito de vetar qualquer candidato papal que considerassem inadequado para a
função.
Com a morte do papa reformista João XXIII, em 1963, a Igreja Católica ingressou em
um período turbulento que viu o Vaticano abalado por um escândalo financeiro causado pela
sua duvidosa relação com uma loja maçônica secreta, com a Máfia e com extremistas de
direita. O novo papa, Giocanni Montini, havia sido arcebispo de Milão, e os seus críticos o
viam como um socialista que tentara fazer um pacto com o Partido Comunista italiano, após a
Segunda Guerra Mundial. Na Verdade, a visão política do novo papa era mais complexa do que
esse flerte com a política esquerdista deixa transparecer.
Montini sem dúvida tinha pontos de vista fortemente antinazistas, que ele exerceu de
1940 a 1945, como chefe de uma seção do serviço secreto do Vaticano na Europa ocupada.
O pai do arcebispo Montini era um destacado social-democrata e as suas relações de
família permitiam ao seu filho, o secretário de estado do Vaticano, encontrar-se com líderes
comunistas, em 1944, para discutirem a partilha do poder, na Itália do pós-guerra, com
socialistas e democratas. De acordo com um relato da reunião preparado pela CIA (a agência
norte-americana de espionagem), Montini esperava que, após a guerra, comunicações
pudessem ser estabelecidas entre o Vaticano e a União Soviética, a despeito do
anticomunismo do papa Pio XI.
Quando Montini foi eleito o papa Paulo VI, em 1963, os seus críticos notaram que a
anterior linha dura do Vaticano em relação à franco-maçonaria relaxou consideravelmente.
Em 1917, às vésperas da Primeira Guerra Mundial e no ano da Revolução Bolchevista, o
Vaticano proibira os católicos de se tornarem franco-maçons. Um católico que se descobrisse
ser um maçon ou membro de “qualquer outra sociedade secreta que conspirasse contra o
Estado” poderia ser excomungado. Sob o papado de Paulo VI, essa rígida proibição foi
relaxada e um católico passou a poder aderir a uma loja maçônica, contanto que isso não
envolvesse atividades anticlericais. Como resultado, em 1975, um arcebispo brasileiro
celebrou uma missa especial pelo 40º aniversário de uma loja maçônica.
O temor papal de uma tomada do poder pela esquerda era compartilhado pelas
sociedades secretas e, especialmente pelos membros de uma loja maçônica italiana cuja
exposição pública jogaria uma luz sobre as intrigas políticas e financeiras clandestinas dentro
do Vaticano, o que possivelmente acarretaria o assassinato do próximo ocupante do trono
papal. Propaganda Dois, ou P”, como se tornou popularmente conhecida, era uma loja
maçônica elitista, fundada em 1960 por um rico negociante, Licio Gelli. Ele lutara junto aos
fascistas italianos na Guerra Civil espanhola, nos anos 30, e irmanara-se aos nazistas durante
a Segunda Guerra Mundial. Não obstante os seus pontos de vista direitistas, Gelli estabeleceu
vínculos com os guerrilheiros comunistas, durante as hostilidades, o que lhe valeu escapar de
ser julgado como criminoso de guerra. Gelli tinha ligações com vários grupos fascistas na
América Latina, com a CIA e a Máfia. Para ele, a adesão à franco-maçonaria era um
importante aspecto de seu trabalho político. Em 1976, disse a amigos que “a franco-
maçonaria odeia o comunismo, por ser este contrário à idéia da dignidade do individualismo
pessoal, destruidor dos direitos da dignidade do individualismo pessoal, destruidor dos
direitos fundamentais que são a herança divina de todos os homens e inimigos do princípio
maçônico da fé em Deus”.
A cruzada anticomunista que motivou Gelli e outros membros da loja P2 permitiu que
ela se tornasse um instrumento da atividades subversivas da CIA na Itália, durante os anos 70.
Diversos membros de destaque da P2 receberam apoio financeiro da Agência para combater
os comunistas italianos que canalizaram recursos para outros grupos anticomunistas no
exterior. A filosofia política da P2 centrava-se na criação de um governo alternativo, que
tomaria o poder caso a Itália enfrentasse uma insurreição comunista ou os comunistas
vencessem uma eleição democrática. O plano previa um “golpe branco”, organizado pela P2,
de contra-revolucionários, com o auxílio externo da CIA e de tropas norte-americanas, se
necessário, estabelecendo um regime direitista e pró-EUA. À semelhança das sociedades
secretas políticas do passado, como os Illuminati e a Sociedade de Thule, a loja P2 buscava os
seus membros, estimados em 2.500, nos altos escalões do establishment social, político e
militar. Eles incluíam três ministros, os chefes do serviço secreto italiano, os chefes do estado
maior do exército, marinha e Ministério da Defesa, os comandantes da polícia paramilitar e
da alfândega, 18 membros do parlamento, 21 juizes e destacados negociantes, jornalistas e
comentaristas políticos.
Um desses grupos neotemplários, cuja existência foi revelada nos anos 60, contava com
ricos membros ligados ao Vaticano. Esse grupo era, estranhamente, pró-católico, monarquista
e anticomunista, e um de seus líderes, Constantin Melnik, estava vinculado ao serviço secreto
francês, à rádio Europa Livre (uma organização de fachada da CIA) e à Rand Corporation (uma
instituição direitista de alta consultoria financeira pelo Pentágono). Melnik nascera na
França, mas os seus pais foram russos brancos e, segundo ele, o avô havia sido médico pessoal
do czar Nicolau II.
Goliniewski foi apoiado, em sua pretensão, por uma Ordem cavalheiresca direitista
chamada os Cavalheiros de Malta, que remonta as suas origens aos cruzados que lutaram na
Terra Santa. De acordo com a tradição ocultista, um dos grão-mestres dos Cavaleiros de
Malta, Manuel de Fonseca, iniciou-se na tradição templária, no século XVIII, e introduziu o
conde Cagliostro no templarismo.
Goliniewski tinha uma antiga ligação com a família real britânica que é interessante.
Lorde Luis Montbatten, tio do príncipe Charles, foi um dos principais críticos da pretensão do
fugitivo polonês à descendência dos Romanov. Montbatten era aparentado, através da rainha
Vitória, à família real russa e também era um forte oponente dos Cavaleiros de Malta e crítico
de sua associação com a CIA. O nome de Montbatten havia sido cogitado quando Churchill e
Roosevelt, supostamente membro de uma sociedade secreta de inspiração iluminista,
discutiram a restauração do antigo império dos Habsburgo, depois da Segunda Guerra
Mundial, como parte de seu ambicioso plano de uma Europa unida. Churchill acreditava que a
restauração de uma supermonarquia européia serviria de antídoto aos planos de uma
supermonarquia européia serviria de antídoto aos planos expansionistas comunistas na
Alemanha, França, Itália e Áustria do pós-guerra. Montbatten foi indicado como um candidato
adequado a imperador, assim como o Dr. Oto de Habsburgo, um importante expoente de uma
federação pan-européia.
A revelação das atividades ilegais da loja P2, além de mostrar uma rede de
conspiradores direitistas engajados em atos subversivos, também trouxe à luz um escândalo
financeiro que envolveu altos funcionários do Vaticano. Esse escândalo emergiu com o colapso
do Banco Ambrosiano, cujo diretor-gerente, Roberto Calvi, ainda que um católico fervoroso,
também era uma personalidade de destaque na loja P2. Em 1971, Calvi foi apresentado ao
diretor do Banco do Vaticano, o bispo Marcinkus, por um colega da P2, conselheiro financeiro
do papa Paulo VI. O bispo tornou-se diretor do Banco Ambrosiano, cujas subsidiárias estavam
ativamente engajadas na “lavagem” de dinheiro ilegal para a Máfia.
O escândalo da loja P2 veio à luz após a morte do papa Paulo VI, no verão de 1978. Um
papa socialista, Albino Luciani, que havia sido patriarca de Veneza, foi eleito pelo Colégio de
Cardeais, adotando o nome de João Paulo I. O novo papa parecia determinado a associar um
novo estilo ao papel de vigário de Cristo, e logo os meios de comunicação e denominaram de
“papa sorridente”, devido ao estilo brando, ao senso de relações-públicas da Igreja. Tratava-
se também de um sofisticado liberal, defensor do controle da natalidade e de uma posição
mais liberal ante o divórcio, o aborto e a homossexualidade.
Além disso, parecia que o novo pontífice planejava investigar os recentes escândalos
financeiros da Igreja, vender vários de seus ativos para distribuir dinheiro aos pobres e
reformar o sistema bancário do Vaticano, dominado pela influência da loja P2. João Paulo I
também chocou muitos tradicionalistas ao se referir, abertamente, a Deus como pai e mãe,
em um sermão para as multidões da praça de São Pedro. A natureza andrógina de Deus havia
sido discutida por teólogos liberais por muitos anos, mas sempre fora vista como uma heresia
pelo Vaticano. Poucos dias após a sua eleição circulavam boatos pelos corredores do Vaticano
de que o papa era um herético, homossexual e criptocomunista.
Como era de se prever, João Paulo I enfrentou uma forte oposição, dentro do Vaticano,
à sua campanha contra a corrupção que havia infestado a Igreja durante o papado anterior.
Pouco antes de sua eleição, o pontífice recebeu uma lista de um Ambrosiano, um exemplo de
lealdade a um amigo, em vez de uma conspiração envolvendo sociedades secretas.
Os serviços secretos ocidentais espalharam, pela imprensa, uma falsa versão, visando
encobrir os verdadeiros fatos, de ter se tratado de uma tentativa da KGB, através do serviço
secreto búlgaro, de silenciar o apoio do papa ao sindicato Solidariedade de sua terra natal, a
Polônia. Entretanto, pessoas bem informadas mostraram que o quase assassino não tinha
vínculos com o bloco do Leste, sendo de fato, membro dos Lobos Pardos, grupo terrorista
turco de direita financiado pela CIA e por neofascistas italianos.
Afirma-se que o Vaticano foi antecipadamente advertido de uma possível trama para
matar o papa. A fonte dessa informação foi um alto funcionário da embaixada soviética em
Roma. Devido a essa advertência, e às informações coletadas pelo serviço secreto do
Vaticano, o papa se convenceu de que a tentativa de assassinato não foi uma conspiração
soviética, mas produto de interesses comerciais ocidentais contrariados. No dia que foi
alvejado, o papa João Paulo II pretendia lançar um ataque contra a imoralidade do
capitalismo ocidental, exortando as sociedades européia e norte-americana a um retorno aos
valores espirituais.
Não obstante a sua visão tradicionalista sobre questões morais, vozes extremistas no
Vaticano continuam especulando que o papa Paulo II pode estar sob a influência das
sociedades secretas. Desde os dias de João XXIII, um movimento radical dentro da Igreja tem
procurado estabelecer vínculos mais estreitos entre o catolicismo e outras igrejas cristãs, com
o objetivo final de eliminar as divisões da Reforma que enfraqueceram o cristianismo. Esse
evento certamente não seria benquisto pelas sociedades secretas; porém os ultranacionalistas
têm visto, no desejo do papa de apoiar essa linha, indícios de uma conspiração anticatólica.