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be f (Bim. » howd ] _ serva a grande canalha Foi Jacques Maniraix, pensador catélico insuspeito de qualquer ligagio ideolégica com as esquerdas radieais, que afirmou — ha trinta anos — ter havido tanto abuso do conceito de demo- cracia que, hoje, nio se consegue mais defini-lo em térmos_ precisos, No entanto, basta abrir qualquer jornal con- dor, basta ler os discursos de comerciantes cm travesti de idedlogos, como sio os represen tantes das associagdes comerciais, basta ouvir os demagogos em seus comicios cleitorais, para com- preender logo que todos éles estio possuidos de furor histérico ou de fervor mistico em defesa da livre iniciativa, da propriedade privada, da liberdade de imprensa, de tudo, em suma, qu sintetizam numa s6 palavra magica: democracia. Mas que democracia é e be perguntar, que mantém inalterados os privilégios de um pequeno grupo de exploradores, que defende o direito de vendilhdes da Patria, que assegura aos traficantes de calinias ¢ inverdades 0 exerci impune de seu comércio de idéias? + Que democracia é essa, convém insistir, em que apenas uma fragio do povo brasileiro tem o direito de votar e, quando vota, esta sujeita pela sua peniria material ¢. cultural “is manipulagdes da classe dominante, constituida pelos latifund! trios, capitae: industria e tubardes do alto comércio ? Que democracia é essa, enfim, que apresenta um Congreso Nacional predominantemente des- ligado —e até mesmo contririo — dos interéss e das reivindicagées de nosso povo ? Claro esta que nao é democracia 0 que pretendem defender e impingir-nos como prin- éipio ético fundamental de vida em sociedade, O que éles querem, ésses inimigos do povo, é precisamente impedir por todos os meios que us liberdades democraticas sejam praticadas e usu- fruidas em plenitude, que o povo tenha o direito de manifestar-se soberanamente, de agir em defesa dos legitimos interésses do Pais, que nao sao coincidentes com os minoria alienada © alienante. (continua na outra dobra) IBAD sigla da corrupsio ELOY DUTRA Deputado Federal e Vice-Governador da Guanabara IBA D sigla da corrup¢ao EDITORA CIVILIZAGAO BRASILEIRA §, A. RIO DE JANEIRO desenho de capa: EUGENIO HIRSCH Exemplar N° 8083 Direitos autorais desta edigao reservados & EDITORA CIVILIZAGAO BRASILEIRA §, A. Rua 7 de Setembro, 97 RIO DE JANEIRO 1963 Impresso nos Estados Unidos do Brasil Printed in the United States of Brazil iNDICE I — INTRODUCAO Il — 0 Pretexto “Democratico” Ill -~ IBAD — Retrato do Neofascismo IV — Os “Ideélogos” da Chantagem V — Um Golpe Milionario VI — A Luta Contra o IBAD VII — Um Bando de Cinicos VIIT — Um Novo Al Capone? IX — Uma Luta Sem Trézua 12 16 26 38, 69 72 O que é 0 Brasil BRASIL no 6 “isso”. E “isto”. O Brasil, senhores, sois vés. O Brasil é esta assembléia. O Brasil é éste comicio imenso, de almas livres. Ndo sio os comen- sais do erdrio, N&o séo as ratazanas do Tesouro. Nao séo os mercadores do parlamento. Nao s&o as sangues- sugas da riqueza publica. Nao sao os falsificadores de eleigées. Nao sio os compradores de jornais. Nao sao os corruptores do sistema republicano. Nao sdo os oligarcas estaduais, Nao sio os ministros da tarraxa. Nao sao og presidentes de palha. N&o s&o os publicistas de aluguer. Nao sao os estadistas de impostura. N&o so os diplo- matas de marca estrangeira. Sao as células ativas da vida nacional. E a multidao que nao adula, néo teme, néo corre, nfo recua, nfo deserta, ndo se vende. Nao é a massa inconsciente, que oscila da servidiéo 4 desordem, mas o coeséo organica das unidades pensantes, 0 oceano das consciéncias, a mole das vagas humanas, onde a Provi- déncia acumula reservas inesgotaveis de calor, de férca e de luz para a renovagao das nossas energias. E o povo, num désses movimentos seus, em que se descobre t6da a sua majestade. RUI BARBOSA I — Introducio A STE LivRo contém muito mais do que uma dentncia. Traduz o meu compromisso dé democrata com o povo brasileiro no sentido de nfo descansar até que se elimine, definitivamente, do cenario nacional mais ésse front de dominacaio estrangeira intitulado 1AD. A verdade — e jamais deixarei de repeti-la até a superacio dessa triste fase de nossa histéria — é que somos um Pais ocupado. Somos um Pais sob a mira de poderosos interésses in- ternos e externos conspirando ardilosamente contra a nossa inevitavel emancipacio politica e econdmica. Nessa luta constante pela total independéncia e afir- magao de meu Pais, tenho estado em muitas frentes. Sado etapas que vamos vencendo rumo ao objetivo final. Esse esféreo, quase sempre vilipendiado e maliciosamente des- torcido pelos sécios da pandega antidemocratica e pelos libertinos de uma falsa demoeracia, nao ha de se diluir no vacuo da indiferenga popular. Posso hoje declarar, apés anos e anos de permanéncia na trincheira da grande batalha pela redencdo e soberania nacionais, estarmos cada vez mais préximos da vitéria. O IBAD e suas im- plicag6es assim me asseguram, eis que tal movimento re- presenta o auténtico desespéro de causa da reacio. O IBAD é a manifestacéo objetiva de certos setores internos e externos no sentido de dominarem éste Pais de dimen- sdes continentais e de 75 milhdes de habitantes. As armas dessa dominagéo — o tempo provou — seriam a violéncia e a corrupeao politica em larga escala. Assim, todos nds, brasileiros, nos tornamos personagens do mesmo drama, 1 que dirfamos tipico do século xx; o das férgas permanen- temente desencadeadas contra o processo de emancipacaio politica e econémica das nagdes subdesenvolvidas. O fato é que o Brasil cresceu a tal ponto em impor- tancia politica e econédmica nos Ultimos anos, principal- mente mercé de seu rapido progresso e da lideranga que assumiu na América Latina, sensibilizando ainda o cha- mado mundo subdesenvolvido, que atraiu para si (ou con- tra si) as atengées de certos pretensos ‘“‘donos” das cha- madas dreas de influéncia. Essas dreas de influéncia n&o sio outra coisa senao a resultante do grande confronto politico, econémico e ideolégico que atualmente sacode o mundo, dilacerando-o entre duas poderosissimas e aguerridas liderangas, refra- tarias uma a outra. Num tdcito névo acérdo de Torde- silhas, EUA e URSS, capitalismo e comunismo, ocupa- dos hoje em apaziguar os Animos e conter os impulsos afirmativos que a cada dia eclodem em suas respectivas areas, pensaram ser vidvel partir de uma premissa de divisio mundial para, mais tarde, consolidado ésse siatu quo dualista, desfechar a luta de gigantes que decidiria, entdo, sdbre o predominio de uma “Jideranga romana”, unica e indiscutivel, 4 qual ficaria submissa a Humani- dade. O curso dos acontecimentos, todavia, repetindo a ex- periéncia histérica, esté mostrando que o esquema das chamadas dreas de influéncia, a exemplo do que ocorreu com o Tratado de Tordesilhas — através do qual Portugal e Espanha ha 4 séculos quiseram repartir 0 mundo — tem a desafid-lo um obstaéculo insuperavel: a séde de inde- pendéncia, de autodetermina¢ao, de liberdade enfim, que earacteriza o género humano. A URSS hoje enfrenta seris- simos conflitos em sua prépria 4rea. Os EUA estao encon- trando na Europa decidida e crescente resisténcia a qual- quer lideranga politica alienigena; no campo econémico, a disputa de mercados, em que europeus e norte-america- nos se empenham, tomou aspectos cada vez mais acirrados, pendendo a vitéria, aos poucos, para 0 Velho Mundo. Os 2 europeus, por seu turno, paulatinamente criaram a sua propria 4rea de influéncia: a Africa, fonte de matérias- primas e berco de indizivel concorréncia aos produtos similares de uma outra regio geo-econdmica subdesen- volvida do mundo ocidental, considerada sob contréle di- reto dos EUA — a América Latina. & mais do que compreensivel, dentro désse panorama ({tragado a fim de que o leitor tenha uma rapida visio da conjuntura mundial), que o fracionamento das areas de influéncia, ou a disposigfio de certos paises das mesmas na defesa de teses emancipadoras, seja objeto dos mais vivos e obstinados esforcos contraérios. Estamos assis- tindo agora ao duro didlogo uRSS — China. O fantasma da “corrupedo burguesa e ocidental” é usado nas miituas acusagdes, esbarrando-se num ponto comum: o labéu do “favorecimento ao capitalismo decadente”, dito e repe- tido num continuo pingue-pongue em que acusados e acusa- dores se confundem. No mundo ocidental, nio é absoluta- mente segrédo a md-vontade com que Washington vé o General De Gaulle, Presidente da Franca, porque éste levantou a tese da “Europa para os europeus”, em con- traposigio ao surgimento de uma alianga ocidental eco- nomica e militar supernacional, sugerida pelos EUA e sob comando norte-americano, para “combate & expansio co- munista”, Na América Latina, a mesma tese de um organismo supernacional de defesa, sob 0 mesmo pretexto, foi levantada pelos EUA, embora recebido sem entusiasmo, principalmente pelo Brasil e México. Esse esquema deve- ria render altos juros para Washington. O caso cubano poderia ser alvo de uma acio militar interamericana, descaracterizando assim, na hipdétese de invas&o da ilha, uma iniciativa puramente estadunidense — o que daria disfargado aspecto militar ao problema, afastando o pe- rigo psicolégico de contra-ofensiva da propaganda so- viética, De um lado e de outro, nos dois mundos, pois, os pretextos (luta contra o comunismo ou luta contra o ca- 3 pitalismo) servem de biombo ao principal: a manutengdo das Areas de influéncia por parte dos mais poderosos. A posigio do Brasil, ante ésse complexo de férgas antagénicas, estA antes de tudo vinculada a dois fatéres: a) a importancia e influéncia do Brasil dentro de deter- minada area de interésse politico e econdmico — a Amé- rica Latina; b) a necessidade de condicionar o comporta- mento brasileiro a certas premissas, tanto no aspecto eco- némico como no politico. Assim, os arroubos do Brasil no sentido de autode- terminacio dos povos, da nao ingeréncia nos assuntos in- ternos das nagées — pontos basicos de sua politica exter- na — bem como a sua insisténcia em abrir novas areas de comércio, fora dos mercados tradicionais, 0 impulso emancipador que o vem caracterizando, inclusive na luta pela reforma de suas estruturas internas, a fim de dina- mizar o progresso nacional, e ainda a lideranga emuladora que esta exercendo cada vez mais expressivamente na América Latina, constituindo, portanto, “perigoso exem- plo” para as demais nagdes do continente, tudo isso levou © nosso Pais a ser encarado sob um prisma de apreensdo e sob um designio de repressio cada vez maiores. O caso IBAD é apenas um expressivo flagrante dessa luta de condicionamento e contréle do Brasil e de seu povo. Il — O Pretexto “Democratico” Bab, fundado em 1959 sob o pretexto de “defender a democracia”, nada mais é que um capitulo negro da vida politica brasileira. Numa conduta sem paralelo quanto aos métodos de acao adotados, ésse 6rgaéo vinha desempenhando, a servigo de interésses antidemoeraticos, antipopulares e antinacionais internos ¢ externos — que punham A sua disposicio um poder econémico bilionario de origens esptirias —, a sinistra missao de colocar nos comandos do Pais os expoentes do mais estreito reacio- narismo. O 1waD surgiu num momento histérico da realidade nacional: o da demarragem do Brasil, acelerada pelo ra- pido progresso industrial, no sentido de novas definigdes da maior repercussio, tanto interna como externamente. Dentre elas destacam-se: a renovacdo demoeratica de nos- sas estruturas internas, através do clamor geral pelas re- formas de base, e a reafirmacdo da presenga do Brasil, em térmos de igualdade e autenticidade — por via da politica exterior independente — no convivio com as de- mais nac6es. Constituin o IBAD, dentro désse processo, uma das manifestacdes politicas daqueles interésses antinacionais jA referidos, no afa de condicionar ou controlar tais im- pulsos de emancipagao. Para dar aparéncia legitima a €sses objetivos velados, o 1BAD desfraldou a bandeira do anticomunismo — como se comunismo féssem os desejos de plena afirmaciio e soberania que 0 povo brasileiro de ha muito nio mais consegue reprimir. Representava o 5 IBAD, inegavelmente, a linha avancada de seus mentores, nacionais e estrangeiros, contra o Brasil. Viam e véem ésses mentores numa reforma agraria auténtica, por exem- plo, a quebra da atual estrutura produtora dos artigos primdrios — café, cacau, etc., vendidos nos mercados in- ternacionais cada vez em maior quantidade, embora por um prego dia a dia mais baixo, por férga das condicées de virtual monopélio do comércio exterior dos paises sub- desenvolvidos, que envilecem a capacidade de trabalho de seus povos. Pelos mesmos motivos, combatiam e comba- tem ésses interésses a politica exterior independente: ela significa, entre outras coisas, ndo apenas uma reafirma- ¢fo de posigdes ou de lideranga, mas o estimulo a novas Areas de mercado além das tradicionais — e novos com- pradores resultariam em maior concorréncia, em quebra do antigo monopélio e em perspectiva de condigées mais vantajosas para o que tivéssemos a vender. O fato é que a atuagio do IBAD estava profundamente ligada a férgas de sujeigéo politica e econdmica que se exerciam e se exercem de fora para dentro, mas com apoio interno, E por que ésse apoio interno? E que o conluio, a cumplicidade entre as fércas politicas e econdmicas aqui sediadas e as estabelecidas fora do Pais, da as pri- meiras uma perspectiva de cobertura e pressdo solidaria nos seus desesperados esforgos em defesa de um statu quo que comega a naufragar, atolando-se em seus préprios vicios de privilégio e espoliacdo, ilegitimamente ambicio- nados & custa da miséria do povo brasileiro, Nao é do meu feitio fazer declaracdes ou defender teses sem que as acompanhe de fatos irrefutaveis. Assim, vou me deter mais um pouco na andlise da razéo de ser dessa soma de interésses que se volta contra o Brasil — inclusive via IBAD. Inegavelmente, nosso Pais 6 um grande negécio para muitos setores internos e externos. Daf assumirem éstes os encargos e os riscos do financiamento a um 6érgiéo to- talitario e subversivo como 0 IBAD; dai também a razdo da fabulosa cornucépia de dinheiro e da carta-branca que 6 puseram nas mdos de um mero aventureiro, Ivan Hasslo- cher, o agente internacional escolhido para chefiar o es- quema ibadiano, Dai também o pretexto “democratico” que conferiram a seus intuitos — no sentido de arregi- mentar inocentes-titeis e penetrar no campo politico. Sem diivida, a “democracia” defendida pelo IBAD é uma democracia 4 moda gorila: a-bandeira anticomunista foi levantada por ésse 6rgao apenas como pretexto, como premissa para, a partir dai, inquinar de “comunistas” ou “esquerdistas” quaisquer tentativas que se fizerem no sentido de uma renovacao institucional nas bases nacio- nais. Em suma: o movimento politico que é 0 IBAD, aten- dendo a interésses externos e internos, visa a congregar fércas em todas as dreas para o fim de subjugar ésse ir- requieto Brasil, década de 60. Observemos, em rapida andlise, 0 momento nacional. Setores norte-americanos e seus representantes na drea de influéncia, que é a América Latina, vivem dizendo que os EUA, apesar de tudo, de nossa “irresponsabilida- de” e “incapacidade de auto govérno” (além da decanta- da “ingratidéo” brasileira), nao desistem de prestar au- xilio ao Brasil e, paternalmente, despejar aqui muitos mi- Thées de délares. Mas qual é a verdadeira histéria que est4 por trés disso — e das arengas de megatérios como o Sr. Eugénio Gudin, papa dos “economistas tradicionais” do Brasil e assessor do IBAD? Vejamos até onde vai a ajuda americana. As cifras oficiais do Govérno brasileiro, para os anos de 1947-60, largamente divulgadas pela chamada “imprensa sadia”, acusam uma influéncia de US$ 1,814 milhdes em investi- mentos novos e empréstimos. O que a “imprensa sadia” nao diz: no mesmo periodo, houve wma retirada de Us$ 2,459 milhdes em remessa de lucros e juros. Acrescente- “mos a essa cifra uma estimativa de US$ 1,022 milhdes, sob a rubrica Servicgos (na verdade, remessas clandesti- nas), e o total da afluéncia favorece aos EUA com a quan- tia de US$ 3,481 milhGes, quase que o débro do afluxo, e mais a retirada liquida de US$ 1,667 milhées. 7 A verdade, todavia, é que isso é apenas uma modesta fatia do que éles generosamente ganham as nossas custas. Basta ver que, num periodo de 10 anos encerrado em 1961, aumentamos nossas exportagdes de produtos primdérios em 190% ; isso em volume, em péso. Pois bem: no tltimo ano do periodo, apesar de termos exportado — é bom re- petir —- 190% mais em volume, em péso, do que no pri- meiro ano, recebemos 9% menos em divisas do que na- quele primeiro ano, gracas & manipulagéio dos precos e do mercado pelos paises compradores (os EVA em primei- ro lugar). Em contrapartida — e no mesmo periodo — sempre tivemos que pagar cada vez mais caro pelas nos- sas importagées feitas Aqueles mesmos paises, E logico, nesse quadro, que uma reforma agraria iria ferir poderosos interésses, tanto internos como externos. Externamente, porque sio as velhas estruturas rurais bra- sileiras que fornecem a quase totalidade dos produtos pri- marios e, ainda, exercem poderosa influéncia nas coisas da politica do Brasil. Internamente, a reforma agraria, além de sacudir o latifindio pela base, significaria uma perda de posigdes. Daf as coberturas interna e externa associadas, procurando, a péso de ouro, classificar de co- munizante, ou esquerdizante qualquer tentativa nesse sen- tido. Dai também a posic&o dos politicos da linha ibadia- na — que quando sentem que nao podem dizer ndo direto & causa das reformas, procuram mistificar o povo com formulas ineficazes e vas. Dentro do quadro apresentado, é ébvio o rancor con- tra a politica externa brasileira. Além de quebrar o sis- tema de monopolio no tocante aos produtos primarios, ela ameaca ainda 0 mesmo sistema de monopélio que se exerce, por igual, “na volta”, isto é, na compra de manu- faturados... O desenvolvimento brasileiro — essa é a verdade — nao interessa muito, a nao ser sob determinadas condi- gées,e limitacées, a importantes setores que, em nossa area de influéncia, manipulam os cordéis do jégo politico in- ternacional. No se comovem ésses setores, por exemplo, 8 com os beneficios que a reforma agraria traria aos mi- Ihdes de brasileiros que vivem miseravelmente nos cam- pos. A prova désse pouco caso esta inclusive na Alianga para o Progresso, que é antes de tudo um programa assis- tencial (cartilhas, leite-em-p6, etc.), e nado um esférgo pro- mocional do desenvolvimento (e o seria ajudando a cons- truir estradas, gerar mais energia elétrica, etc.). Pelo contrario. Tudo se faz no sentido do enquadra- mento do Brasil. O simples antincio de que irfamos co- merciar mais amplamente fora das 4reas tradicionais, le- vou o Departamento de Estado norte-americano a expe- dir nota reservada ao Govérno brasileiro, em 1961, pe- dindo que ‘definissemos nosso campo comercial”... Uma forma de presséo, como se vé. O processo de industrializag&o, por outro lado, esta sendo observado pelos setores externos como caminho de contréle ainda maior da vida politica brasileira. Como? Pela desnacionalizagio progressiva da férga industrial com que o Pais esta revolucionando suas bases econémicas. Pois se as estruturas mudam, nas novas estruturas indus- triais — que estéo substituindo paulatinamente a prima- zia do latiftindio — ésses interésses de sujeigao da Amé- rica Latina vao pouco a pouco logrando conseguir um do- minio ainda mais amplo e de corpo-presente, “dentro de casa”... A anélise désse aspecto da questéo é também indis- pensavel. Recentemente, um grupo de importantes homens de negécios norte-americanos foi chamado pelo Departamen- to de Estado a opinar sébre a Alianga para o Progresso e sébre a ajuda dos EUA A América Latina. Entre éles figuravam os Srs. David Rockefeller (Chase Manhattan- Bank) e Emilio Collado (Standard Oil of New Jersey). O relatério divulgado foi esclarecedor. Recusando a su- gestio de quaisquer ajudas de Govérno a Govérno, ésse documento insistia numa maior énfase sébre a iniciativa privada, afirmando que os problemas latino-americanos s6 poderiam ser resolvidos através de investimentos par- 9 ticulares. A certa altura, afirmava o relatério: “a ajuda externa dos EVA deve ser utilizada para induzir as nagées latino-americanas a adotarem politicas favoraveis aos in- vestimentos privados norte-americanos”. E logo adiante: “6 necessdrio intervir no assunto da politica interna das nag6es latino-americanas” (tese, alids, abertamente defen- dida por John Foster Dulles, quando Secretério-de-Esta- do do Govérno republicano de Eisenhower). Essas estarrecedoras declaracées foram pouco mais tarde confirmadas, no que toca 4 sua aceitacgio em Was- hington, por Hanson’s Latin American Letter, publica- gao norte-americana de prestigio. Noticiou ela: “As em- baixadas norte-americanas receberam ordens para inter- vir, e o est&o fazendo, na politica interna do Peru, Ar- gentina e Brasil”. Que dizer-se da anunciada reuniao do Sr. Lineoln Gordon, embaixador dos EVA no Brasil, com industriais americanos em nosso Pafs, com vistas a son- dar as preferéncias dos mesmos para a_sucessio_presi- dencial de 19652.— —7 > ——~-Como se isso nao bastasse, os objetivos de Rockfeller (que se prepara, a longo prazo, para disputar a Presi- déncia dos EUA pelo Partido Republicano), Collado e ou- tros acabam de ser mais uma vez referendados. Um te- legrama vindo de Washington, transmitido por uma agén- cia telegrafica norte-americana e publicado em cantos de pagina pela imprensa brasileira, dizia em sua aparente pouca importancia, no dia 1 de julho passado: O Brasil, o Equador e paises da América Central figuram entre os beneficidrios de uma soma total de us$ 70 milhées, colocada hoje (30 de junho) @ disposigto dos Bancos de Desenvolvimento dos reje- ridos paises pela Agéncia Norte-Americana de Desenvolvimento Inter- nacional (aw). Segundo cldusula que regula a ajuda norte-americana, 0 dinheiro deveré ser utilizado em concessao de empréstimos aos homens de negécios dos EUA que quiserem investir capital nas emprésas dos patses beneficiados. Em sintese: os EUA emprestam dinheiro aos Bancos de Desenvolvimento dos paises subdesenvolvidos, dinheiro @sse que pagara altos juros, para que ésses bancos o en- 10 treguem a homens de negécios norte-americanos, que, por sua vez, com éle, terfio amplo acesso para controlar e do- minar emprésas dos referidos paises. Resumindo: desnacionalizar a férga de produgio dés- ses paises, e conseguida essa desnacionalizacao, utilizar os recursos dai advindos e influir na politica interna dés- ses pafses, O caso do 1BAD, no Brasil, desfigurando eleicgdes, cor- rompendo imprensa, politicos e autoridades através de re- cursos internos e externos — os primeiros fornecidos lar- gamente por emprésas estrangeiras ou pseudonacionais — 6 elucidativo. Com ésse poder na mao, os mentores das tramas ibadianas podem promover o boicote publici- tario a érgios de imprensa independentes, podem pres- sionar as classes produtoras no sentido daquela democra- cia que comeca na violéncia do citado boicote e termina na violéncia maior representada pelo gorilismo das elites — ou seja, a manutengdo, enquanto fér possivel, de um statu quo que, no maximo, recebe nomes diferentes para significar aquilo que justamente é escamoteado ao povo. Inclusive a liberdade. Esses, na verdade, sao os coveiros da democracia. i I — IBAD — Retrato do Neofascismo GovfRNO em boa hora suspendeu as atividades do IBAD (Instituto Brasileiro de Acéo Democratica) e da ADEP (Acéo Democratica Popular), dois organismos politicos acusados de graves crimes eleitorais e as vésperas de outro: a deformacéo e corrupgdo dos pleitos municipais do més de outubro déste ano. Tanto 0 IBAD como a ADEP, nunca é demais recordar, estio sob a diregao ostensiva e aparente — pois seus recursos biliondrios e sua orientagéo politica se encontram sob a suspeita de ser estrangeiros — do individuo Ivan Hasslocher. Ao ordenar o fechamento do IBAD e da ADEP, determinou o Govérno aos érgios do Ministério Publico Federal que, no prazo de trés meses, examinassem em téda a profun- didade a atuag&io daqueles organismos, para dissolugdo definitiva e punicio de seus responsdveis, inclusive na hipotese de outros crimes que nao apenas eleitorais. Se fér definitivamente provada a suspeita de ingeréncias es- trangeiras na atuacéo do IBAD ou da ADEP — que corrom- peram violentamente as eleicgdes de 1962 e as ja realiza- das em 1963, antes de outubro — nfo apenas a Lei Elei- toral seré invocada, mas ainda a Lei de Seguranga Na- cional. A cessacéo das atividades do IBAD e da ADEP, or- denada através de decreto presidencial, correspondeu ao dever imperativo de defesa do regime, da livre expressio do pensamento politico e até da soberania nacional. O BAD, forgoso é reconhecer, nasceu & sombra da de- mocracia — e sdmente viveu para destrui-la no Brasil. 12 Maquiavélicamente, ingressou no progresso eleitoral com a unica finalidade de dominar o Congresso através da dis- torgéo endinheirada dos pleitos, como primeiro passo no sentido de trilhar o caminho do Poder. Para atingir tais objetivos, o agente internacional Ivan Hasslocher congre- gou trés organismos, todos sob seu comando: 0 IBAD, ct. pula financeira e ideolégica do esquema, a ADEP, seu 6r- go eleitoral, e, finalmente, a “S. A. Incrementadora de Vendas Promotion”, ou mais simplesmente “Promotion”, agéncia de publicidade com fins politicos — que da co- bertura ao esquema. O curioso é que Hasslocher e seus comandados sempre procuraram aparentar completa des- vinculagéo entre essas entidades, coisa que desmentire- mos amplamente no correr déste trabalho. Homem obscuro, sem nenhuma tradicdo na vida polf- tica ou empresarial do Pais, Hasslocher foi misteriosa- mente guindado, de uma hora para outra, A posig&o de verdadeira eminéncia parda do processo eleitoral brasi- leiro, Diretor-Presidente do 1BAD e da Promotion, além de membro mais importante no colegiado nacional da ADEP, Hasslocher enfeixou nas mios, ditatorialmente, a sorte de intimeros homens ptblicos, entrou a influir sébre uma parcela apreciavel do Congresso e, mais ainda, estendeu os tentéculos do IBAD, através de 6rgaos de fachada e da ac&éo prédiga em dinheiro de seus agentes, aos setores sin- dicais, estudantis e militares da Nagio. Sob suas ordens, o IBAD passou a controlar pelo menos dois organismos na area sindical, 0 MSD (Movimento Sindical Democratico), em Sao Paulo, e a REDETRAL (Resisténcia Democratica dos Trabalhadores Livres), no Rio, isso sem contar os agen- tes que colocou nas demais entidades representativas dos trabalhadores; através ou naéo do MED (Movimento Es- tudantil Democratico), féz jorrar dinheiro para as elei- gées de centros-académicos ou para atividades polfticas outras nesse setor; promoveu agitagdes de tal monta no Club Militar, visando a indispor a oficialidade com o Go- vérno, que 0 Ministro da Guerra, General Jair Dantas, ordenou a instauracéo de inquérito. Depondo perante a 13 Comissio Parlamentar de Inquérito, que investiga as ati- vidades e as origens dos recursos do IBAD, o Governador Miguel Arraes, de Pernambuco, declarou que tem segu- ras informagées sébre a criagdo, pelo rBAD, de um orga- nismo secreto no seio da oficialidade do IV Exército. O IBAD pode ser ainda responsabilizado pela organi- zagao de boicotes comerciais, mediante terror politico, contra a imprensa que nao quis dar guarida a suas teses ou defender a sua linha. O maior escdndalo dos meios jornalisticos, em 1962, foi o aluguel, por 90 dias, da opi- niao politica-eleitoral do vespertino A Noite, no Rio, isso configurando um fato inédito na histéria da imprensa mundial — pois um jornal pode ser arrendado, mas nao se sabe de caso em que o objeto a alugar tenha sido sua opiniao politica. Todavia, o IBAD.e seus 6rgaos subsidiarios agiram principalmente para destorcer o processo eleitoral. Fun- dada por Hasslocher em inicios de 1962, a ADEP, que ra- pidamente se espalhou por todo o Pais, através de sedes regionais, foi a pega mais importante do esquema. Cum- priu ela a tarefa de selecionar e apoiar cérca de 250 can- didatos a deputado federal, 600 a deputado estadual, além de auxiliar a campanha de oito candidatos a Governador e de intimeros aspirantes ao Senado. Por sua vez — e diretamente — o proprio IBAD interveio no pleito, prin- cipalmente em Pernambuco, Em 1962, a parte o caso dos Governadores, 0 IBAD e a ADEP deram énfase especial as eleigdes para o Congresso. Cabe aqui um paréntesis, para mostrar a eficiéncia do esquema ibadiano. Uma das realizagdes que seus dirigen- tes reputam das mais importantes, no campo do antico- munismo brasileiro (e nés bem sabemos o que significa ésse “anticomunismo” industrializado), foi a tradugdo e ampla divulgacéo do livro “Assalto ao Parlamento”, de autoria do escritor tcheco Jan Kosak. Narra essa obra como os comunistas chegaram ao poder na Tcheco-Hslova- quia, através da acéo de uma minoria bem coordenada que, agindo politicamente, logrou dominar a curto prazo os 14 - postos-chave daquele Pais, em especial o Congresso, con- seguindo depois manter suas posicées, até que a inter- vengao direta do exército russo as consolidou, em defini- tivo. Que licées ésse livro pode dar aos brasileiros? Nao temos, por certo, o exército russo em nossas fronteiras. .. Nem um PC tao coordenado que faga prever aquéle resul- tado, Longe disso, é sabida a fragmentacao e diluic&o por que passa a mAquina comunista no Brasil. O que hd, na verdade, 4 margem da farta publicidade feita em térno do “Assalto ao Parlamento”, 6 um espetdculo que chega a ser cOmico em téda a sua imensa seriedade: a ampla di- vulgagao dada pelo IBAD a uma obra que ésse préprio IBAD parece ter transformado de libelo anticomunista em ma- nual de operagées subversivas no Brasil! Como o IBAD e a ADEP escolhiam um candidato? A ADEP, agindo na fase eleitoral, nao discriminava os can- didatos segundo sua filiagio partiddria, mas de acérdo com critérios que considerava de “orientacdo ideolégica”. Era necessdrio que o aspirante ao cargo eletivo fésse anti- comunista, democrata e que tivesse possibilidades de se eleger. O conceito. de anticomunismo e de democracia dos candidatos, néo obstante, sempre merecia especial atengio. Concordar ardorosamente com uma reforma agraria au- téntica, por exemplo, era o bastante para desclassificar o eandidato. Fazer restrigdes, quaisquer que féssem, ao capital estrangeiro, importava em andtema certo. Em tér- mos interamericanos, ésse tipo de raciocinio fatalmente desembocava na tese de que a defesa contra o comunismo era téo importante que colocava em segundo plano as so- beranias nacionais — tese, alias, nascida no Pentagono. A democracia ibadiana, por outro lado, tem facetas pitorescas. O ex-coordenador da ADEP em Minas, depondo numa CPI da Assembléia Legislativa, em Belo Horizonte, disse que o Sr. Adauto Licio Cardoso, da UDN, apesar de democrata e conservador, nfo foi aprovado pelo cole- giado nacional da ADEP (0 que vale dizer por Hasslocher) por ter se pronunciado favordvelmente A posse do Sr, Joo Goulart, apés a crise da rentincia... aby IV — Os “Idedlogos” da Chantagem LEM dos estranhos conceitos de anticomunismo e de- mocracia que instava féssem perfilhados pelos can- didatos, a ADEP e 0 IBAD, para fornecer auxilio, geralmente também exigiam de seus tutelados um documento a que batizaram de “compromisso ideolégico”. Um modélo désse documento foi apresentado ao Congresso pelo Governador Miguel Arraes. Assinado por um candidato nao eleito a deputado federal, dizia: “Comprometo-me, se eleito 4 Ca- mara Federal, a seguir a orientag&io ideolégica do IBAD”. Verdadeira chantagem politica, a longo prazo, contra os candidatos eleitos. A maior parte désses documentos, contudo, nao serviu aos objetivos de Ivan Hasslocher; o ex-secretério-geral da ADEP, Arthur Junqueira, desconfia- do dos verdadeiros objetivos do IBAD, principalmente pela negativa de Hasslocher em explicar de onde vinham os fundos biliondrios para os inesgotaveis gastos no processo eleitoral, bem como certas estranhas discriminag6es con- tra determinados politicos de tradicio inegavelmente de- mocratica, incinerou-os. Mas alguns ja estavam em outras maos. E me foram entregues. Uma vez aprovado, o candidato recebia auxilio que podia se enquadrar na tabela 1 ou 2. Tabela 1: centenas de cartazes e faixas, um milh&o de cédulas, veiculo (ou veiculos) com aparelho sonoro e dinheiro (Cr$ 1 milhfo e 600 mil para candidatos a deputado federal e Cr$ 800 mil para deputado estadual). A tabela 2 fornecia apenas dinheiro em quantias estipuladas diretamente por Hass- locher. 16 Em 1962, o IBAD conseguiu eleger alguns candidatos. A politizagio do povo brasileiro, entretanto, inflingiu-Ihe sérias derrotas, principalmente nos Estados-chave de Per- nambuco e Guanabara. Mesmo sem alcangar 0 que espe- rava, 0 IBAD néo gastou menos de Cr$ 5 bilhdes naquele pleito. Para que se tenha nogaio mais exata do volume de despesas do grupo IBAD-ADEP-Promotion nas eleigées de 1962 (e sdmente nas eleigdes daquele ano), basta dizer que a ADEP derramou nada menos de Cr$ 1 bilhZo e 40 milhdes nos 150 dias que precederam as eleigées. A Pro- motion movimentou recursos da ordem de C$ 1 bilhao e 400 milhées na campanha eleitoral de 62 — e isso sé- mente num dos trés bancos estrangeiros que séo a fonte conhecida dos dinheiros do IBAD; 0 The Royal Bank of Canada. Que dizer entéo das contas da prépria Promotion no Bank of Boston e no The National City Bank of New York? E as contas do IBAD e de seus dirigentes, Hasslo- cher e Frutuoso Osério Filho? A Promotion teve participagéo importante nas elei- ges de 62. Realizou ela, no curso da campanha eleitoral, centenas e centenas de programas de radio e TV em todo o Pais, além de fartas matérias-pagas na imprensa. Fora das épocas eleitorais, a Promotion é responsAvel pela compra e manuteng&o de mais de 80 programas semanais de radio em emissoras localizadas nos diversos Estados da Federagiio. Esses programas, preparados nos esttidios da Promotion (e ainda hoje em grande parte gravado diretamente na Camara e no Senado), visam a dar cober- tura aos politicos ligados ao IBAD. Teria a Promotion, normalmente, condigdes éticas e profissionais para receber as tarefas que executa, ou — e isso 6 muito mais importante — para manipular os bilhdes que lhe siio entregues? A verdade é que até 1960 a Promotion praticamente nfo existia entre as agéncias de publicidade do Pais, Seu faturamento anual nao pas- sava da casa dos Cr$ 10 milhées. De repente, entrou a gastar verbas da ordem de bilhées, MW Essa pergunta foi suficientemente respondida pelas duas grandes associagdes de classe da publicidade brasi- leira: a ABP (Associacdio Brasileira de Propaganda) e a ABAP (Agsociacéo Brasileira das Agéncias de Propaganda). A primeira dessas entidades declarou, em carta & CPI do IBAD, que nunca a Promotion nem qualquer de seus diri- gentes foram seus associados, embora isso constituisse regra geral entre as agéncias e dirigentes publicitarios do Pais. JAé o Sr. Armando D’ Almeida, Presidente da ABAP, foi mais taxativo: Embora a apap, como associacdo patronal, retina as Agéncias de Propaganda que operam nos principais centros publicitdrios do Pais, pequenas, médias ¢ grandes, devemos informar que a Promotion ndo esté nem nunca estéve filiada d apap, exclusdo que explica, certamente, 0 rumo dado ds respectivas atividades. E acrescentou: Houvesse a Promotion integrado os quadros da awap e respcitado as normas de trabalho e a linha de conduta impostas as suas filiadas, e, evidentemente, ndo lhe teria sido posstvel orientar a sua atuagdo nos rumos investigados. Mas passemos adiante. A agéio do IBAD e da ADEP foi tao ostensiva nas eleicdes de 62 que despertou a atengao de setores ponderdveis do Congresso. Nasceu dai, das sus- peitas geradas quanto 4 incrivel e onerosa atuacio elei- toral dos érgaos comandados pelo agente politico Hasslo- cher, e de seguidas e enérgicas dentincias minhas & Co- missdo Parlamentar de Inquérito que investiga as ativi- dades e as origens dos recursos do IBAD. No tocante a CPI, vale dizer que ela, ainda agora realizando seus t1 balhos de coleta de documentos e audicaio de depoentes, j: deixou claro, ha muito tempo, que 0 IBAD e os organismos subsididrios foram responséveis por um terrivel e inédito processo de corrupcdo eleitoral. O que resta provar sao as origens dos dinheiros mobilizados na trama ibadiana. Os trabalhos da referida cpr tém sido inestimaveis. Essa Comissio levantou dados preciosos sdbre o funcio- 18 namento e o modus operandi do esquema IBAD-ADEP-PRO- MOTION. No depoimento do Governador Miguel Arraes, por exemplo, registrou-se a dentincia de que 0 IBAD, agindo diretamente, criou verdadeiros “currais eleitorais” em plena cidade do Recife, nas eleicdes de 1962. Isso era feito pela reteng&o dos titulos de eleitor de centenas e centenas de habitantes da zona pobre daquela capital, titulos ésses que foram liberados jA com a indicagfio do candidato iba- diano e a promessa de compensagées — utensilios domés- ticos, roupas, etc. — apds a votacao. Um documento entregue pelo Governador Arraes & cpr revela ainda que o IBAD chegou ao ponto de roubar titulos eleitorais referentes a determinadas zonas da ci- dade do Recife em que predominavam os seus partidarics, fato que provocou inquérito no Tribunal Regional Eleito- ral. Outra pratica ibadiana em Pernambuco: a compra de declaragdes de voto a pessoas eleitoralmente influen- tes. O melhor exemplo disso, segundo Arraes, foi o caso do radialista Fernando Castelao, animador de um dos mais conhecidos programas de auditério do Recife. Em troca de Cr$ 600 mil, declarou @le em pleno auditério, depois de muitas escusas, que, em vista de ter recebido carta nesse sentido de uma menina que ouvia seu progra- ma, iria abrir excecfio ce, mesmo o voto sendo secreto, diria qual o candidato de sua preferéncia: o Sr. Jodo Cleofas. Ha, todavia, um documento conclusivo sébre os pro- cessos de corrupeao politica e eleitoral usados pelo IBAD. E uma carta do agente da ADEP, no Amazonas, ao General Joio Gentil Barbato, atual chefe da ADEP nacional. Diz @sse documento, em poder da CPI, sébre o IBAD: Conversei com 0 Djalma Passos, oficial da PM, sew ex-comandado, que foi cleito deputado pelo PL (Partido Libertador)... Quando éle for ao Rio, certamente o procurard. E rapaz cheio de ambigdes e cer- famente negociard conosco apoio a nossa linha em troca de amparo econdmico em futuros plates E meio esquerda: a sua ambigéo é maior que @ sua linha idcoldgica, entretanto. 19 Essa carta foi remetida pouco depois das eleigdes de 1962... Outro documento impressionante, revelado pela CPI, mostra que o IBAD, através da ADEP, caminhava para uma situagdio de fato — nao de direito — que o transformaria em superpartido politico na vida nacional, e isso & custa do esvaziamento sutil dos auténticos partidos. Na reali- dade, Hasslocher e 0 IBAD vinham pouco a pouco retirando aos partidos téda a sua razio de ser, pelo simples fato de pretenderem condicionar um ntmero crescente de re- presentantes daquelas agremiagées no Congresso ao co- mando nico e disciplinado do 1bAD — e apenas do IBAD. Esse processo comecava no sistema do apoio eleitoral, con- cedido 4 base de “compromissos ideolégicos”, a candidatos de todes os partidos que se sujeitassem & sua linha, e terminava, jA no Congresso, transformando os eleitos em meros titeres de Ivan Hasslocher. Sébre ésse processo de esvaziamento dos partidos no Congresso, pelo IBAD, ha uma carta apresentada 4 CPI e constante dos autos. Assi- nada pelo agente da ADEP em Santa Catarina, essa carta, depois de relacionar os deputados e senadores eleitos em 1962 por aquéle Estado — e que assinaram “compromis- so ideolégico” — adianta: “1 — observar que a ac&o dos congressistas acima, principalmente do PSE, muito de- pende da do Partido”. FE no item 2: “so todos os reco- mendados da ADEP sinceramente democratas, mas alguns podem fazer concessdes de siléncio se o Partido os im- pelir”. Essas “adverténcias” do agente da ADEP ao comando do IBAD sao esclarecedoras. Mostram que os partidos poli- ticos, cerne do sistema representativo, estavam de ha muito na mira do IBAD e de Hasslocher, ciosos ambos — a sigla e o homem.— de sua missio de chegar ao Poder, numa primeira etapa, mediante o dominio do Congresso. O que se pode esperar da “democracia” ibadiana, diante de tais processos? Sem ditivida, a agio politica desenvolvida pelo 1BAD tinha em mira, através do Con- gresso, dar cobertura politica a estranhos conceitos de 20 “acho democratica”. Néo escapa, sequer, ao menos atento dos observadores, que o trabalho coordenado de um bloco interpar'amentar teleguiado contra as reformas de base e contra o proprio regime, poderia ter fundas repercussdes na vida nacional. Serviria até mesmo, em qualquer opor- tunidade que se apresentasse, para coonestar agostadas, para dar face legitima, através do Congresso, aos golpes brancos, com aparéncias democraticas, que tém carecteri- zado o estilo mais recente de intervencio das minorias na América Latina: as goriladas, Convém lembrar aqui a énfase que certos politicos deram 4 chegada do més de agésto, a partir do qual, cum- pridos mais de 2/3 do mandato presidencial, a escolha de um sucessor, segundo a prépria Constituiciio, caberia ao Congresso... Havia por certo a esperanca de que um determinado dispositivo fésse pésto a funcionar, quando chegasse a “hora H”. Felizmente, a simples revelacio da verdade j4 reduziu em muito a periculosidade do esquema criminoso, O fato é que a maior parte dos que se deixaram envolver pelas tramas e pela chantagem ibadianas o fizeram iludidos em sua boa-fé, acreditando mesmo que se filiavam a um mo- vimento de defesa da democracia e contra os totalita- rismos. Por outro lado, visando apresentar suas ativida- des como auténticas e legitimas, 0 IBAD e Hasslocher bus- caram envolver nomes insuspeitos na vida nacional. As- sim, figuras tradicionais da linha conservadora, inespe- radamente — e sem qualquer solicitac&o nesse sentido —, receberam faixas, cartazes e até veiculos para suas cam- panhas eleitorais. Isso servia a Hasslocher e ao IBAD na hora de convencer outros candidatos a aceitarem o que jamais tinha sido proposto aos ja referidos no- mes tradicionais: os “compromissos ideolégicos”. “Pois se Fulano e Sicrano assinaram... — deve ter sido a argumentagao empregada. Espiria antes de tudo, a ac&o politica ibadiana pro- curou, a exemplo dos movimentos totalitarios — nunca é demais repetir — envolver o maior numero de pessoas de 21 responsabilidade em suas maquinagées. O depoimento do Sr. Castilho Cabral & CPr sébre o 1BAD foi definitivo, no que se refere a ésse ponto. Disse o ex-Presidente do Mo- vimento Popular Janio Quadros (MPJQ) que Hasslocher © procurara, querendo coloca-lo 4 frente da ADEP, quando da fundagéo da mesma. Ofereceu-lhe recursos iniciais (veja bem o leitor, iniciais) da ordem de Cr$ 1 bilhao. Mas como Hasslocher nfo lhe dissesse de onde vinha o dinheiro, e sentindo que o maior interésse do IBAD era aproveitar a maquina do extinto MPJQ, inclusive para dar aparéncia legitima 4 ADEP, o Sr. Castilho Cabral declinou do convite. Alguns companheiros seus do MPJQ nio tive- ram a mesma prudéncia, embora alertados pelo antigo chefe. Mais tarde, estarrecidos com o que descobriram, alguns déles nao hesitaram em dizer 0 que sabiam ao Congresso Nacional, através da cIP do IBAD. O envolvimento, consciente ou nfo, de pessoas dos mais diversos setores da vida do Pais, marcou uma das constantes na atuagio do érg&o corruptor de Hasslocher. O maior pretexto foi sempre a “defesa da democracia”. O sentido de chantagem ficou exemplarmente evidenciado com os “‘compromissos ideolégicos” impostos & maioria dos que recebiam auxilio das ADEPS em todo o Pais. E impressionante, ainda, o ntmero de militares liga- dos ao IBAD ou & ADEP. Arregimentados pelo General Jodo Gentil Barbato, homem forte da ADEP, e pelo Coronel Ju- randir Palma Cabral, dezenas e dezenas de Generais e Coronéis, em sua maioria da reserva remunerada, fun- cionaram em todo o Brasil dentro do complexo ibadiano de corrupco eleitoral e politica. Também dezenas de ofi- ciais de patentes menos elevadas prestaram sua colabo- racao. Quase sempre, essas atividades eram muito bem pagas. O que é mais grave, no que concerne a ésses mili- tares, em que pese o fato de slenng. déles estarem iludi- des quanto a Hasslocher e ao IBAD, € que emprestaram o prestigio de suas fardas e de seus nomes a uma atividade nociva, ilegal e antinacional. Via de regra, os militares, 22 de Coronel para cima, recebiam a missio de comandar células estaduais da ADEP. Nao sou de citar nomes a esmo, nem de ferretear reputagdes — ainda quando sei que houve muita gente de boa-fé iludida no meio de tudo isso. Mas nfo posso calar ante fatos que repugnam a consciéneia crista e democratica do povo brasileiro, Um documento da maior importaneia, de posse da CPI sébre 0 IBAD, mostra, entre outras coisas, que ésse é6rg&o fazia discriminagio reli- giosa. O referido documento esta ligado & pessoa do Ge- neral reformado Vitor Moreira Maia, que desempenhava a missdo de estimular a criac&o de novos nticleos ibadia- nos em todo o Pais. Lendo, durante a inquiricéo désse General pela CPI, as instrucdes que mandava para a cria- go dos citados ntcleos, vi, a certa altura, a recomendaciio de que “a lideranga dos ntcleos nunca devia ser dada” a protestantes, “que sfio minoria religiosa”, pois “isso afas- taria_os catdlicos”. Por extensfio, essas recomendacdes atingiam os judeus, espiritas, ete.. “Mas isso é discriminagdo religiosa!” Atenta contra a constituicio, observei. Ainda sébre a participacéo de militares nag tramas associadas do IBAD, da ADEP e da Promotion, vou citar outro documento, muito significativo. Esse documento nada mais é do que uma carta cifrada, entregue & CPI e remetida pelo General Paulo Vieira da Rosa, da ADEP de Santa Catarina, a um colega militar funcionando na sede nacional (Rio) do IBAD. Ei-lo: “Floriandpolis, 15-IX-62 Caro Satide 1 — Tudo OK 2 — Tudo OK? 3 — Eu — A — 99/8 a 1/9 — Aturando-te ai B—1 a 6/9 — Atwando candidatos aqui, Voracidadel C —7 a 14/9 — Aturando aver — sp — Scc. doente: substituto no Rio: substitutos de 2.4 ordem, de 2.8 ordem mesmo, D — 15/9 — Relatando 23 4— SP, — A — Razio da ida — Motoristas sdzinhos nada teriam (desconfianga) B — Justificagdo — Adivinhei © — Calculo — 7 feriado, 8 enforcado, 9 domingo, 10 des. achado D — Impreviséo — Murany na cama, Leopoldino no Rio, demais... bem E —- Lucro — Longe da Mendicdncia BILHETE A — Passado e queimado. Cinzas aos ventos sulinos B— Tostéo guardado em reserva “prés” — quatro C — S6 avisarei, encontrando-os, Pessoalmente. Obviamente PANORAMA A — Estudantil: excelente B — Classes produtoras: pifando. Rico dinheirinho C — Candidatos; Voracidade. Nunca mais cessou possibi- Fidade grana D — Propaganda a — Adep — SC — Continuando b — Estudantil, crescendo ¢ — Produtores, pifando i — Estadual — Calma. Queda do Brochado, fim da linha para os Ramos F — Nacional — ?I? FINANGAS (a pagar) Candidatos — quatro e meio (encerrado); Escritério — pro- paganda — um e meio; Bilhete — um inteirinho; Caixa — cinco e quatrocentos; Lapis — deficit; Conseqiiéncia — Vide item 9 PERGUNTAS CRETINAS A — Até quando esté paga a sede? B — Desmonte: data provavel da ordem? C — Ansiedade nas respostas DECISOES A — Sede — Desmonte a 8/10 B — Material — Porfo da minha casa C — Funcionamento — Morre a 10 D — Fatéres das decisées: grana curta 24 10 — CANCAO — tem algum ai? 11 — A SERIO — Quanto e quando? 12 — RASGUE E QUEIME Satide e abragos Ass: PAULO A esta altura, o leitor deve estar tio surpréso como eu fiquei, quando pela primeira vez pus os olhos sdébre essa carta. Afinal, sera que a democracia é um negécio assim tao perigoso ou discutivel, que defendé-la exige cé- digos seeretos ou a solicitagdo de “rasgue e queime” na correspondéncia de dois “democratas’? Nao creio, Sin- ceramente, nao creio. A nao ser, é claro, que se trate no de democracia, o assunto debatido, mas de democracia entre aspas, dessa que é vilmente explorada pelos Ivans Hasslochers, V — Um Golpe Milionario Pravnar eleigdes, corromper homens publicos, “orientar” a opinido politica de 6rgio de imprensa, penetrar nos meios sindicais, estudantis e militares através de um di- nheiro farto e inesgotavel — cis a sintese das atividades ibadianas. Tudo isso sai caro. Muito caro, convenhamos. Como ja tivemos oportunidade de assinalar, sémente no pleito de outubro de 1962 as entidades controladas pelo agente internacional Ivan Hasslocher gastaram nunca me- nos de C$ 5 bilhdes, havendo estimativas globais que che- gam a multiplicar por dois e até por trés essa cifra. A ADEP, eis um exemplo em apenas 150 dias pré-eleitorais daquela campanha, desembolsou nada menos de Cr$ 1 bi- Thao, Isso afirmou & CPI sébre 0 IBAD o Sr. Arthur Jun- queira, ex-secretério-geral da ADEP — e suas declaracdes foram mais tarde confirmadas no depoimento do ex-tesou- reiro dequele 6rgdo, o Sr. Héleio Franga. A Promotion, de sua parte — e em perfodo de tempo pouco maior —, movimentou Cr$ 1 bilhao e 400 milhdes num dos trés bancos estrangeiros onde estado as origens conhecidas dos recursos ibadianos. Esses nimeros refe- rentes 4 Promotion, note o leitor, foram fornecidos pelo préprio The Royal Bank of Canada. Solicitado pela cP1 a informar sdbre os depésitos da Promotion, do IBAD e de seus dirigentes Frutuoso Osério Filho e Ivan Hasslocher, ésse banco estrangeiro agiu com ma-fé: enviou nado o extrato-de-conta da Promotion, mas apenas uma demons- tragéo de movimento (sem origem dos depésitos, em suma, 26 sem a revelacio de quem depositou o dinheiro na conta da Promotion). Portanto, em apenas dois érgiios ibadianos, a ADEP e a Promotion, vemos que foram mobilizados recursos so- mando cérea de Cr$ 2 bilhdes 440 milhdes apenas para intervir no pleito de 1962! Que dizer ent&o dos depésitos da prépria Promotion no Bank of Boston e no The Na- tional City Bank of New York? Que dizer também dos depésitos de Ivan Hasslocher e de Frutuoso Osério Filho naqueles trés bancos? Que dizer dos depdsitos do IBAD na- quelas mesmas fontes de inexauriveis recursos? Admita, caro leitor: conjugar prodigamente os verbos corromper, fraudar e subornar sai muito caro... Mesmo para 0 IBAD. Ninguém deve esquecer, ainda, que se a ADEP promo- yeu as candidaturas de 600 aspirantes a deputado esta- dual e de 250 a deputado federal, gastando rios de di- nheiro em faixas, cartazes, cédulas, veiculos e até em auxilios pecuniarios diretos, 0 IBAD foi o érgdo que inter- veio incisivamente na maioria das eleigdes majoritarias havidas em 1962. Sua atuacio em dois Estados-chave do Pais, naquele ano, a Guanabara e Pernambuco, mobilizou recursos fantdsticos, sdbre os quais apenas se conhece uma bem modesta parcela do total. Quanto n&éo dispensou o IBAD, ao certo, para tentar por todes os meios instalar 0 Sr. Jodo Cleofas no Govérno de Pernambuco? Provou o Sr. Miguel Arraes, em seu depoimento a CPI, que os recursos diretamente invertidos pelo IBAD nas elei- cées de 1962, somente em Pernambuco, e visando especi- ficamente & Governanca, foram maiocres que alguns or- gamentos de Estados — veja bem o leitor! — de Estados da Federacdo brasileira. E isso, repito, em pouco mais de 150 dias!!! Na Guanabara, eu préprio senti o péso esmagador do verdadeiro dilivio financeiro com que o IBAD pretendeu me aniquilar. Nasceu dai, como contarei em outro capi- tulo déste livro, a minha campanha do “centavo contra o délar”, com a qual se iniciou a verdadeira batalha que ~ 27 ainda hoje estou travando contra as atividades ibadianas, e que sé darei por terminada quando do IBAD, de Hass- locher e de sua gang, nada restar. Ja sabemos, de sobra, como 0 IBAD, a ADEP e a Pro- motion funcionarm interligados, sob 0 comando de Ivan Hasslocher e Frutuoso Osério Filho, na missio de cor- romper as eleicdes de outubro de 1962. Ha um porém nisso tudo. E que o funcionamento désses 6rgaos nao se limitou aquela época. O IRAD, por exemplo, foi fundado em 1959. A Promotion, mais antiga agéncia de publicidade de Ivan Hasslocher, desde entéo passou a ser uma espécie de “ministério da propaganda” désse matreiro Goebbels caboclo em que se transformou o ladino “dono” do IBAD. Fora das épocas eleitorais (em 1962 foram autorizados mais de 300 horarios de rAdio e Tv, As vésperas do pleito, promovendo ecandidatos que também tiveram a cobertura de fartas matérias pagas na imprensa), a Promotion pa- trocinava e ainda patrocina cérea de 80 programas radio- fénicos semanais em emissoras espalhadas por todo o Pai O 1BAD, por sua vez, que gastou milhdes alugando a opi- nifio politica do jornal A Noite, e que mantém dezenas e dezenas de jornalistas em suas ‘folhas de pagamento, edi- ta uma revista mensal, a Agaéo Demoerdtica, com cérca de 250 mil exemplares em papel de 6tima qualidade. Apesar de ser distribuida gratuitamente e de nado veicular um dnico aniincio, “milagrosamente” ainda ndo foi ad faléncia. Mas a coisa nao fica apenas nisso. Através do IBAD, como vimos, sao gastos rios de dinheiro para financi: a penetracdo dos agentes de Hasslocher nos meiog sindi- cais, estudantis e militares, atividades essas de carater permanente, ndo estando sujeitas apenas ao perfodo das campanhas eleitorais. # preciso que se diga, também, que o IBAD, a ADEP e a Promotion estiveram atuantes como nunca nas eleigdes municipais travadas em Pernambuco, nos ultimos dias de julho do corrente ano. Seria ingenuidade omitir um outro fato: os érgaos comandados por Ivan Hasslocher tinham meticuloso plano 28 de expansao, a ser iniciado a partir de 1963. A cpl, & qual pertenci, temi um documento de maior importancia, a ésse respeito. Trata-se de uma carta, enviada ao Gene- ral Joéo Gentil Barbato, da ADEP, pelo Ivan Hasslocher. Na sua qualidade de superintendente do IBAD, de proprie- tario da 8. A. Promotion e de membro mais importante do colegiado nacional da ADEP, descreve éle, nessa carta, datada de 12 de novembro de 1962, “algumas de minhas idéias sébre as possiveis funcdes das ADEPS estaduais”. Entre outras coisas recomendava, pensando no futuro: a) as ADEPS devem “servir como elo entre 0 povo e os seus representantes (eufemismo com que Hasslocher batizou os parlamentares eleitos pela ADEP) no Congresso. Trazer ao povo relatérios e explicacdes sébre a atuacio dos seus deputados e senadores em Brasilia. Trazer aos deputados e senadores noticias sébre os problemas e rei- vindicagdes do povo (ou do IBAD?) que representam” ; b) o item segundo é um complemento ao primeiro: fala em “prestigiar, por todos os meios possiveis”, os iba- diano-adepianos do Congresso, e em “assegurar-Ihes apoio na massa de eleitores”. c) o item terceiro das recomendacées de Hasslocher constituia ponto dos mais graves. Recomendava que os nicleos ibadianos formados no Congresso Nacional e nas Camaras estaduais, deveriam também ser criados nas Ca- maras municipeis; d) eis o item quarto, que bem mostra a intervengio que 0 IBAD pretendia instalar no préprio seio dos partidos: “fortalecer e apoiar as organizagées politicas partidarias que se identifiquem conosco” ; e) o item quinto 6 um complemento do anterior, pois sugere apoio aos politicos que se prestem ao papel de advogados do IBAD, inclusive, é légico, na tarefa de des- caracterizar seus proprios partidos: “fortalecer e apoiar os politicos, individualmente, que ideolégicamente se iden- 2 tifiquem conosco” ; 29 f) o item sexto dispensa comentarios: preparar o terreno para a nossa intervengdo, de forma mais decisiva, nas préximas eleicées”; g) o item sétimo revela que a industria anticomunista ia ser levada ao paroxismo: “disseminar propaganda ideo- légiea acérea do atual conflito entre a democracia e o comunismo no. Brasil” (com isso, 0 IBAD, a servico do clima golpista e de intrangiiilidade pretendido por seus mentores “agosteiros”, objetivava acirrar o processo de radicalizacao politica que de ha algum tempo vem intoxi- cando a vida nacional) ; h) 0 item oitayo é uma conseqiiéncia do item terceiro, que recomendava a infiltrac¢io ibadiana também nas Ca- maras municipais: “participar de eleigées municipais” ; i) o item nono determinava a disseminagio de ni- cleos subversivos ibadianos em todo 0 Pais: “promover e auxiliar a fundagio de nicleos populares de “Agio Demo- cratica” dedicados aos mesmos ideais que os nossos”; j) o item décimo mostra que o IBAD pretendia inter- vir ainda mais direta e incisivamente na vida do Pais: promover campanhas de interésse democratico e civico, de Ambito local, regional ou nacional” ; k) o item onze mostra que o IBAD aspirava a nada menos que 0 monopélio de todos os movimentos de sua linha, no Pais, evidenciando assim que Ivan Hasslocher, a maneira de Al Capone, nao to'erava a coexisténcia de “competidores” na rendosa industria do anticomunismo: “auxiliar e coordenar os esforgos de tédas as organizacées e entidades de carater democrético e anticomunista que estejam funcionando dentro de seu Estado” (por seu Es- ‘tado, Hasslocher se referia & funcio fisealizadora das ADEPS nag respectivas sedes estaduais; 1) o item doze indica claramente que as atividades do IBAD, no tocante ao contréle de 4reas da maior impor- tancia, como a estudantil e a sindical, iriam ser amplia- das: “auxiliar os esforgos de elementos democraticos que estejam lutando dentro de esferas especificas, como a es- tudantil, a sindical, ete.” (note-se que a Promotion, du- 30 rante a crise do parlamentarismo, distribuiu inimeras matérias-pagas atribuidas 4 REDETRAL, organismo da 4rea . trabalhadora financiado pelo IBAD, veiculando fortes eri- ticas ao Govérno, ao plebiscito e a volta do presidencialis- Mo}; ao IBAD, alias, — que visava num primeiro passo o contréle do Pais através do Congresso —, a manutencao do parlamentarismo — que transferia ao Congresso a mis- so de dirigir o Pais —- era uma questio de importancia capital ; m) o item treze da carta de Hasslocher informa que © IBAD estava se preparando para agir no sentido da mo- bilizagio de massa, naturalmente através de seu incon- testavel poderio econémico, da atuag&éo de seus niicleos populares, do funcionamento de suas extensdes na area sindical e estudantil, bem como do engédo ideolégico do anticomunismo fementido em que sempre baseou suas ati- vidades: “promover manifestagdes populares em torno de eausas democraticas”; n) o item quatorze evidencia uma outra faceta dos objetivos ibadianos — o de fazer pressées contra o Con- gresso: “providenciar a remessa de cartas e telegramas ao Congresso, que fagam os nossos representantes senti- rem onde residem as verdadeiras vontades populares”; ©) o tltimo item apenas pedia “sugestdes”, como se j& nao bastasse tudo 0 que a carta de Hasslocher relacio- nava. Como se sabe, muitos désses itens j4 estavam sendo cumpridos, neste agitado ano de 1963. Exemplo: inter- vengao nas eleigdes municipais (como acanteceu em fins de junho passado, em Pernambuco) ; disseminacaio de ni- cleos do IBAD (tarefa a cargo do General Vitor Moreira Maia); campanhas de apoio aos politicos de sua drea no seio dos partidos, ete. Diante de tudo isso — e do que ja foi dito sdbre as atividades do IBAD — uma pergunta se torna inevitavel: de onde vieram e de onde ainda estado vindo os dinheiros inesgotdveis que financiam téo poderosa maquina politica de corrupgdo e subversdo no Brasil? 31 Cinico, acima de tudo, Ivan Hasslocher pretendeu insinuar, de certa feita, que os recursos do IBAD proma- navam da venda da revista Agéo Democrética. Isso foi logo ao coméco da grita crescente contra as atividades do pernicioso Instituto. Mais tarde, quando se evidenciou que as despesas do IBAD ascendiam a bilhdes e bilhdes, nio sdmente em campanhas eleitorais mas para o funciona- mento rotineiro de sua m4quina politica, a conversa tomou outros rumos, Solene, Ivan Hasslocher forneceu a expli- cago segundo a qual 70 firmas industriais e comerciais do Rio e de Séo Paulo entravam com o numerario sufi- ciente. Essa conversa, alias, foi a que usou o “vice-dono” do YBAD, da ADEP e da Promotion, o espoleta Frutuoso Os6- rio, em imaginoso depoimento prestado perante a CPI sobre as atividades désses 6rgéos. Apenas um fato, até comico; além dessa fonte de recursos, 0 finério “vice” acrescentou que o IBAD recebia consideraveis recursos em “contribuigées anénimas pelo correio”... Quais as 70 firmas que forneciam dinheiros para o IBAD? Ninguém do IBAD, falando & CPI, soube responder. “Apenas Ivan sabe” — diziam, a exemplo do préprio Frutuoso, que afirmou ignorar, mesmo sendo, como é, lu- gar-tenente de Hasslocher. Provado como esté que o esquema subversivo diri- gido pelo testa-de-ferro Ivan Hasslocher constitui pode- rosissima e inédita mAquina de corrupcao politica e elei- toral, resta apenas saber uma coisa: a origem dos recursos bilionérios com que essa mAquina de subversio foi mon- tada e posta a funcionar. Esse novo front da luta pelo desmascaramento do IBAD se resume, de inicio e princi- palmente, numa coisa: 0 exame dos extratos de conta do IBAD e da Promotion nos trés bancos estrangeiros que sao a fonte conhecida dos dinheiros ibadianos (o Bank of Bos- ton, o The National City Bank of New York e o The Royal Bank of Canada). O que a CPI quer saber é quem deposita os recursos daquelas entidades nas contas désses trés ban- cos estrangeiros; nisso, também, se concentra a atengio 32 dos é6rgfos governamentais mobilizados pelo decreto pre- sidencial que cerrou as portas do IBAD e da ADEP, Paralelamente a isso, os comandos de Ivan Hasslocher estao tentando desesperadamente usar 0 que sempre des- respeitaram — a lei — para impedir que a SUMOC (Superintendéncia da Moeda e do Crédito), agindo em nome do Govérno e por solicitagéo déste e do Congresso, forneca os extratos de conta referentes aos citados bancos estrangeiros. Os advogados ibadianos foram incumbidos, por Hasslocher, de uma dupla missao: pressionar aquéles bancos, inclusive com ameacas judicidrias, para que nao atendam a qualquer solicitacio de exame das contas re- feridas; buscar apoio no sigilo bancario a fim de frustrar qualquer tentativa de obtencao, via SUMOC ou diretamente, dos extratos de conta. As alegacées do IBAD e de seus advogados, em térno do sigilo bancario, néo tém, todavia, o menor cabimento. E isso porque: a) j& foi comprovado que as atividades do IBAD, de notéria corrupcdo politica e eleitoral, constituem crime previsto no Cédigo Eleitoral (art. 145); b) 0s métodos de ac&o usados pelo IBAD e siglas a- fins ndo raro se enquadram no proprio Cédigo Penal, fe- rindo ainda dispositivos da Constituigao; ) existe a suspeita, lastreada em gritantes provas in- dicidrias, de que 0 IBAD est4 sendo financiado com recur- sos estrangeiros — o que envolve aquéle organismo, ainda, nas sangdes cominadas pela Lei de Seguranga Nacional; d) o proprio Claudio Hasslocher, irmao de Ivan e até bem pouco o coordenador ostensivo do IBAD em Sao Paulo, especialmente na Area sindical, interrogado por mim, re- conheceu que as origens dos dinheiros do IBAD “sao ne- bulosas”. Configuradas tédas essas implicagées criminosas no caso IBAD —- e a propria Seguranca Nacional, como se vé, esté envolvida no mesmo — deixa, portanto, de existir o argumento legal que poderia justificar a observancia do sigilo bancdrio. O jurista Castilho Cabral, em minucioso 33 parecer 4 cP, frisou aspecto muito importante da questao. Reportou-se a um parecer do Ministro Afranio Costa: “nao 6 possivel sonegar ao conhecimento da Nac&o certas atividades que envolvem evidentemente o interésse nacio- nal’. O Ministro Nélson Hungria, também citado pe'o Sr. Castilho Cabral, afirmou sébre as atividades das CPIS, quando de um outro inquérito parlamentar: “tédas as di- ligéncias que um juiz criminal pode proceder, na confor- midade do Cédigo de Processo Criminal, 14 esta na lei, com tédas as letras, também a Comissao poderd praticar, como seja, inquirir testemunhas, investigar sébre documen- tos, AINDA OS MAIS SECRETOS, e torna-los publicos, segun- do julgar conveniente qualquer das Casas do Congresso”. & preciso considerar ainda o seguinte: a) ja houve o precedente de Comisssées Parlamenta- res de Inquérito que, para investigag&o dos assuntos a que se propuseram, foram além das restrigdes do sigilo ban- e4rio, anulando-o com base na lei e na necessidade de apurar a verdade; pb) indagado pelo Deputado José Aparecido se as clas- ses produtoras, apesar da inflacdo e da restrigio ao cré- dito, estariam em condicdes de contribuir com mais de Cr§$ 1 bilhio para auxilio a candidatos, respondeu taxati- vamente o Sr. Rui Gomes de Almeida, Presidente da As- sociagio Comercial, financista, banqueiro e lider das clas- ses produtoras: “nao posso acreditar”; ¢) o Presidente do IPs, Sr. Joio Batista Leopoldo de Figueiredo, ex-Presidente do Banco do Brasil e dirigente de poderosas e conhecidas emprésas paulistas, declarou em depoimento & CPI que nao conhece uma sé firma na- cional ou uma sé pessoa de suas relagdes que contribua para os fundos do IBAD; da) tudo isso leva a uma s6 conclusao os dinheiros do IBAD néo sGéo nacionais; suas atividades de corrupedo politica e eleitoral, j4 em si criminosas, néo obedecem se- quer a um comando nacional, tudo evidenciando, ainda, que o esquema de criagéo e atuacdo do IBAD foi arquite- 34 tado por cérebros estrangeiros com muito “know-how” s6- bre atividades désse género. * £sses fatos nfio podem ficar sem maiores investiga- gGes. Acresce que os depésitos feitos A conta do IBAD nos trés bancos estrangeiros, que sAo a fonte conhecida de seus recursos, tem uma sutileza que despertou a mais viva aten¢do (baseio-me na demonstragéo de movimento man- dada & cpt pelo The Royal Bank of Canada para fazer essa afirmagéo): nunca se trata de quantias redondas, co- mo seria de esperar em razdo de seu préprio volume. Existem sempre quebradinhos até aos centavos. Isso evi- denciaria, entre outras coisas, a hipétese de movimento de cambio, ou seja, troca de moeda estrangeira por cruzeiros. Nao podia mais o Govérno, a esta altura, ficar alheio aos problemas. Inclusive porque a atuacio do IBAD e de seus 6rgéos subsididrios, demonstrada nas eleicdes muni- cipais de Pernambuco, hé poucos meses, iria fatalmente se repetir nos pleitos municipais marcados para o més de outubro déste ano, falseando mais uma vez a mani- festagéo soberana do povo. Cumpre notar, ainda, que o IBAD se preparava para a ampliacdo de sua Area de influ- éncia, aumentando suas ja terriveis ramificacgdes, 4 ma- neira de um verdadeiro cancer alimentado pelo dinheiro, no processo politico-eleitoral brasileiro. Esclarecedora nesse sentido foi a carta que o agente politico e testa-de- ferro Ivan Hasslocher mandou ao General Jofo Gentil Barbato, pouco apéds as eleigdes de 1962. Nao podia, repetimos, deixar 0 Govérno de agir con- tra o IBAD, a ADEP e seus dirigentes, quando mais nao fésse, pelo fato de aquéles dois organismos, apesar de nao constitufrem partidos politicos, de nfo terem programas aprovados e registrados no Tribunal Superior Eleitoral, confessarem finalidades eminentemente politicas, entre as quais as de financiar e prestigiar as campanhas elei- torais dos candidatos que lhes atendam aos objetivos. Esse 35 procedimento desvirtua e turva a existéncia dos partidos regularmente inscritos, a ordem politica instituida, o re- gime representativo, a livre consciéncia dos eleitores e dos eandidatos, que se sujeitam, muitos sem o saber, & estra- nha tutela. Essas atividades — nao houvesse outras sé- rias e graves suspeitas ligadas ao IBAD e a seus dirigentes e organismos subsididrios —, sdmente elas, j4 sio um frontal desaeato a principios definidos e intransponiveis da Constituigéo e da Lei Eleitoral. Note-se ainda que as injungdes secretas do IBAD e de Hasslocher estéo envoltas num clima de mdxima suspei- cao. O depoimento do Sr. Castilho Cabral na CPI sébre o IBAD deixou claro ésse ponto, Ao ser convidado a dirigir o organismo que mais tarde viria a se transformar na ADEP, Castilho chegou a dar sugestées no sentido da for- mulagio de um manifesto da nova entidade, Ao fazer a defesa da politica exterior independente, foi-lhe pedido por Hasslocher que evitasse 0 assunto, pois éste, a seu ver, “daria margem a controvérsias”. Sugeriu entdo Hasslocher que Castilho “defendesse o capital estrangeiro”’. Salientando que nada tinha contra o capital estran- geiro, que em muitos casos colabora efetivamente para o progresso do Brasil, acentuou o Sr, Castilho Cabral a CPI, entretanto, sua estranheza pela colocacéo do problema naqueles térmos, na linha de agéo de um movimento poli- tico brasileiro. “Entendo” — disse Castilho Cabral — “que por maior que fésse a simpatia pela ajuda do capital estrangeiro, nao concordaria em ver isso tranformado em item pro- gramatico de qualquer partido brasileiro, porque seria o mesmo que tolher a sua liberdade de em determinada ocasiao sustentar medidas restritivas ao capital alieni- gena”. Disse ainda o Sr. Castilho Cabral que ésse fato, bem como a falta de tradigao politica e financeira do grupo Hasslocher, somada 4 oferta inicial de Cr$ 1 bilhio que The fizeram para fundar e dirigir a aDEP, “evidenciando 36 que muito dificilmente emprésas brasileiras poderiam estar por tris daquele movimento, mas quem sabe interésses es- trangeiros”, levaram-no a recusar a proposta. Um adendo necessdrio: Castilho Cabral, homem de reconhecida tradicio democratica, goza do maior conceito junto as classes produtoras, onde tem livre-transito, vin- do isso, portanto, reforgar seu diagnéstico sdbre as origens dos recursos de Hasslocher & Cia. 37 VI — A Luta Contra 0 IBAD LUTA contra o IBAD tem sido uma das campanhas mais dificeis de toda a minha carreira politica. Por tradi¢io, sempre levo as campanhas que lidero até o fim. Estou, portanto, calejado. Na Legislatura passada, por exemplo, lutei contra um poderoso truste estrangeiro: a Panamerican Airways. Venci, sob o espanto da maioria inerédula e acomodada. E que se estava dando, naquele momento, um importante passo no sentido da efetiva na- cionalizagéo de nosso comércio aviatério, Outras campa- nhas dificeis, penosas mesmo, foram as que eu fiz denun- ciando irregularidades nos negécios da Diretoria de Rotas Aéreas (onde havia concorréncias fraudadas em beneficio de uma sé e tentacular emprésa do setor), easo ésse que terminou na Justica Militar. Minhas campanhas, alids, e digo isso para que minha posic&o fique desde logo & mar- gem de quaisquer insinuagdes no caso IBAD, jA atingiram, certa vez, a propria 4rea do Govérno. Foi 0 caso de uma outra, vitoriosa, que desfechei contra sérias irregu'ari- dades observadas na administragfo do SAPS, Ao iniciar essas lutas, nunca parti de qualquer outra premissa sendio a do interésse no bem comum. Foi a defesa do interésse piblico — e mais ainda, a do interésse nacional — que me féz entrar de corpo e alma na luta contra o IBAD. Percebi, em 1962, obser- vando os estranhos fenémenos que ocorriam em plena cam- panha eleitoral, j4 entéio transformada em paleo dos ne- gocismos e corrupgdes mais escandalosos, que algo de 38 anormal estava acontecendo. Resolvi levantar uma vee- mente bandeira de protesto e dentincia contra o IBAD. Tive o tréco por essa atitude — e imediatamente. De um lado, a imprensa descomprometida me apoiou em té- da a linha. Recebi ainda, nas urnas, a expressiva solida- riedade do povo carioca, que me elegeu Vice-Governador da Guanabara com meio milhao de votos. Tenho certeza de que posso dizer que o povo carioca falou em nome de todo o povo brasileiro. Do outro lado, 4 moda das organizacées neofascistas que hoje pululam em todo o mundo, o IBAD nao teve ou- tro recurso, ao ver-se descoberto, senio o de me chamar de “comunista”. Injdrias sem conta, calinias que pelo seu proprio volume eu mal podia delas tomar conhecimen- to — tudo isso foi atirado contra mim, pelas paginas présperas de certa imprensa que ndtoriamente faz de sua opinido um mero bale&o de varejo. Através nao sé dessa imprensa, mas do rddio que controlava, dos boatos em que era mestre, 0 esquema ibadiano lancou contra mim uma sérdida onda de mentiras e de lama, atingindo até a minha vida particular. A resposta a tudo isso eu a estou dando agora. A Camara a esté dando. O Govérno também. O povo, em suma, a esta dando. Ao desfechar a campanha contra 0 IBAD, nisso trans- formando boa parte de minha mensagem aos eleitores de 1962, advertindo-os sébre a atuac&o corruptora e antide- mocratica daquele é6rgo, consegui alertar intimeras Areas da opiniao piblica para o tremendo problema, que, mais tarde ou mais cedo, teriamos que enfrentar na vida poli- tiea nacional. As véspera do pleito, a Gazeta de Noticias, do Rio, publicou o seguinte: Os prognésticos em térno do pleito de depois de amanha amedron- tam e em alguns casos enfurecem os inimigos do povo e da soberania nacional. A {rca dos candidatos reactondrios repousa, antes de tudo, no esbanjamento de dinheiro — de délares ¢ de cruzeiros — numa propaganda faustosa, jamais vista em terras cariocas. Os lucros da es- poliagao detxam larga margem. 39 Nos arraiais do entreguismo houve uma espécie de mobilizagao geral. De sacola em punho, ao tilintar dos trinta dinheiros, 0 deputado Jodo Mendes presidiu a chamada, fornecendo 0 milho. Dos reaciondsios jd conhecidos, candidatos a reeleigéo, nado se exi- giu nada, A éles, os manipuladores dos misteriosos dinheiros concedcram tudo. Dos candidatos novos, farta fornada de ilustres desconhecidos, exigiu-se a assinatura de humilhantes compromissos politicos. A legen- ds ‘do anticomunismo serviu de pretexto para o cambate ao naciona- lismo, Um bom Angulo, ésse que a Gazeta de Noticias esco- Theu: “a legenda do anticomunismo serviu de pretexto para o combate ao nacionalismo”. Realmente, os 6rgaos corruptores, como o IBAD, vivem fundamentalmente nfo de idéias ou teses, mas de pretextos. Pretextos ésses que apenas precariamente encobrem o principal: os objetivos a conseguir. A acusacdo ibadiana de “comunista” a quem quer que seja que se recuse 4 humilhante posicao de ‘‘pau- mandado” de sua inconfessdvel orientacao é notéria. En- contra elucidativas semelhangas na John Birch Society, entidade ultra-direta dos EVA, que chegou ao ctimulo de acusar John Foster Dulles e Bob Kennedy de “criptoco- munistas”, numa histeria que chega as raias da loucura ridicula e do penabotismo, vendo bolcheviques em baixo da cama; escondidos nas molas dos colchdes para espionar, quando nfo dentro de escrivaninhas tomando pflulas que os fazem invisiveis, etc. Mas o IBAD, engana-se quem pensar assim, nio age histéricamente. Age friamente. Explora, sim, a histeria alheia, que éle proprio procura fomentar. Comunismo, para Ivan Hasslocher, nao é uma coisa que se combata por ideal. Combaté-lo 6 um negécio como outro qualquer — um grande negécio. Seu tipo de combate ao comunismo € tao suspeito, por exemplo, que faz um mistério tene- broso sébre as origens dos recursos do IBAD. Defender, com sinceridade, a democracia, exigiria isso? N4o creio. A nao ser as John Birch Societies e similares, nos EUA, as organizacdes realmente democraticas daqucle Pais, que vivem fazendo campanhas em prol désse regime politico, volta e meia publicam balangos dizendo da origem e do 40 emprégo de seus recursos. Por que o IBAD nao faz o mes- mo? E que nao pode fazé-lo. Seu anticomunismo nao é demoeratico, pois vive de corromper os processos demo- craticos, como o eleitoral, Seu anticomunismo, que até tropas-de-choque criou (0 que é 0 MAC senaio isso?), a exemplo dos processos nazistas na Alemanha de Hitler, nao passa da tentativa de fornecer pretextos para a ins- talacdo de regimes “‘autoritarios” no Brasil. A defesa da democria feita por Hasslocher e pelo maD é tao singular que chega a ser elogiosa as ditaduras de direita que infe- licitam intimeros paises da América Latina. Que demo- cracia é essa? A de Franco? A de Strossener? A imprensa realmente democrata e legalista com- preendeu totalmente a raz&o e justeza de minhas dentn- cias. De 1962 até hoje, ela me apoia nessa luta. Ultima Hora, por exemplo, publicou recentemente excelentes sé- ries de reportagens sébre a maquinacdo ibadiana. Kis o antetitulo que designou uma delas: “IBAD — Uma cons- piracio contra o Brasil’. Outros jornais, nao s6 do Rio mas de diversos Estados, vieram pouco a pouco fortalecer nossa luta, em que todos comungavamos num 86 propé- sito: defender mesma (sem que isso fésse apenas um mero pretexto), a democracia no Brasil, ameagada fron- talmente palas praticas e objetivos ibadianos. Mas, como dizia antes, comecei a luta contra o IBAD ainda em plena campanha eleitoral de 1962. Entao can- didato a deputado federal e a vice-governador da Guana- bara, nfo podia esconder meu espanto diante da mAquina publicitaria descomunal posta 4 disposigé0 de certos po- liticos e candidatos. A repetic¢ao do fendmeno em outros Estados, principalmente nos chamados Estados-chave da- auele pleito, como Pernambuco, me féz sentir a necessi- dade de apurar o significado daquele estranho movimento nacional, localizado na 4rea do 1BAD, que visava a influir, pelo péso do poder econémico, nos resultados eleitorais. O que mais me despertou a aten¢ao foi, quase como regra geral, 0 sentido do movimento ibadiano como ten- tativa de violentagio das tendéncias e preferéncias do 41 povo. Apesar de todo o derrame de dinheiro, eu venci Jonge. Arraes também ganhou. Mas, em contrapartida, ilustres desconhecidos deram mostra, 4s centenas, de fa- buloso apoio econémico. Nasceu dai, ainda em 1962, o meu pedido para a constituigio de uma Comisséo Parla- mentar de Inquérito que apurasse a verdade. Aconteceu, todavia, que a quarta legislatura estava chegando ao fim. Nao haveria tempo, entao, para coisa alguma. Como Ulti- mo recurso, denunciei as atividades do 1BAD ao Conselho de Seguranga Nacional. Empossado o névo Congresso, em janeiro, a idéia da CPI sébre 0 IBAD tomou névo impulso. Tudo correu segun- do os tramites normais: as assinaturas dos deputados foram recolhidas e o requerimento, apresentado & Mesa da Camara, deferido. Restava a composi¢io da CPI, com a indicac&éo de seus membros pelos partidos. Comecou logo ai, — nem verdadeiramente nascida estava a CPI, — a guerra surda com que se pretendeu impedir a investi- gacdo parlamentar sdbre as atividades do IBAD e as ori- gens de seus recursos. Enquanto meu partido, o PTB, e o Ppc indicaram imediatamente os seus representantes na Comiss&o, a UDN e o PSD retardam ao mdximo aquela pro- vidéncia. Sdmente quando a coisa comegou a transpirar violentamente na imprensa nao comprometida com 0 IBAD € que ésses partidos fizeram suas indicagées. Como era de se esperar, dada a penetragiio do IBAD no Congresso, um verdadeiro selecionado de deputados ibadianos foi recrutado para fazer parte da CPI. “A histéria da CPI sObre o IBAD merece ser contada com cuidado” — escreveu Ultima Hora. “Serve também como adverténcia para o perigo que corre a verdadeira democracia no Brasil, democracia essa que nunca deve ser confundida com aquela entre aspas, de que falam og se- guidores de Hasslocher & Cia. Essa ultima tem um slogan caracteristico: “agésto vem ai”. E cheira a gori- lismo”. E sébre os trabalhos da CPI escreveu “Ultima Hora”: 42 “Numa sala apertada e quente da Camara dos Depu- tados, no recinto das Comissées de Inquérito, funciona em Brasilia a CPI que investiga a origem dos recursos e a atuacéo do IBAD e do IPES. Travava-se, naquele recinto acanhado e simples, uma terrivel luta, que marcou o pré- prio nascimento dessa CPI — e que esté trazendo a pi- blico revelacgées muito incémodas, envolvendo até mesmo o Congresso. O sucesso dessa CPI depende, hoje, funda- mentalmente, de cinco homens. Sao cinco deputados que, enfrentando a visivel hostilidade dos seus préprios com- panheiros de Comissao, carregam, unidos, 0 péso de uma tarefa que muitos ainda dizem ser impossivel: a de des- mascarar a hedionda conspiracio dos encapuzados do IBAD, daqueles que organizaram uma trama inédita de subérno, corrup¢éo e violéncia em escala nunca vista, com a fina- lidade tinica de destorcer o processo politico naciona!, im- pedir as reformas de base e abrir 0 caminho do poder as forgas da reagio. “fsses cinco homens, ésses cinco bons brasileiros, es- téo sendo alvo de tédas as formas de pressées. Nao raro so acusados de “sensacionalistas”. Ou de “instrumentos” dos que querem “desmoralizar o Congresso”. Eloy Dutra (PTB-GB), José Aparecido (UDN-MG), Rubens Paiva (PTB- sp), Jodo Déria (ppc-Bahia) e Benedito Cerqueira (PTB- GB) sabem que a luta vai ser dificil. Mas assumiram o compromisso de leva-la até o fim. Em nome do povo bra- leiro”. Na realidade, essa CPI nascera sem que ninguém, mesmo os ibadianos, acreditasse nela. Em primeiro lu- gar, porque os deputados n&o ibadianos eram minoria na propria Comisséo. E, depois, porque o poder do IBAD ja tinha mais uma vez sido provado. Assim, quando eu e meus quatro companheiros, José Aparecido, Joao Déria, Rubens Paiva e Benedito Cerqueira, comegamos a reunir provas e documentos irretorquiveis sébre os processos de corrupeaio de que se valiam o IBAD e Hasslocher, cer- tos membros da CPI entraram em panico. Volta e meia, no seu desespéro, um ou outro deputado (certamente nas 43 miaos de Hasslocher, por ter assinado “compromisso ideo- légico”), fazia abertamente a defesa do IBAD. A coisa chegou a tal ponto que, j4 provada a corrup¢do ibadiana e faltando apenas descobrir quais seus mentores financei- ros e politicos, a CPI foi suspensa, na véspera do depoi- mento de Ivan Hasslocher! E por qué? Sob o argumento de que o decreto pre- sidencial que fechara o IBAD e a ADEP “desmoralizara o Congresso”, a maioria ibadiana da CPI resolveu dar “uma resposta & altura”, N&o ao Govérno, por certo. Mas ao “chefe” Ivan... A alegria dos ibadianos durou pouco. O Congresso mostrou que ainda nfo se tornara um érgiio castrado. A atuacao que teve, naquele momento critico do caso IBAD, nao deixa margem a duvidas quanto a vitalidade de al- guns dos seus membros. Tao logo os ibadianos, que pre- dominavam na CPI do IBAD, resolveram suspender as ati- vidades da Comissao, & véspera do depoimento do chefete ibadiano Ivan Hassloeher, muitos observadores chegaram a pensar que a batalha pendia para o lado das siglas e dos individuos a sdldo do IBAD. Entretanto, registrou-se apenas um momento de suspense. A alegacao ibadiana de que os trabalhos da CPI deveriam ser interrompidos em face do decreto presidencial que mandou fechar a ADEP eo IBAD, “esvaziando e desrespeitando o Congresso em sua missdo de apurar a verdade”, correspondeu a atitu- de firme da Camara, que renovou em alto nivel todos os membros da CPI, por iniciativa dos préprios lideres de partidos, bem como a enfatizacio das medidas tomadas na area do Executivo. Ao Executivo, ainda, coube a enér- gica atitude de firmar sua disposigéo de no permitir o surgimento de metastases do cAncer ibadiano — sob pena de aco judicial para coibir as fraudes 4s determinagdes do decreto que cerrou as portas do IBAD e da ADEP. E que certos setores afirmaram que iriam fundar novos movi- mentos para prosseguir “em defesa da democracia”, man- tendo no ar os programas de r4dio do IBAD e, mais ainda, editando sua revista... 44 “Na realidade” — comentou a revista PN — “a ful- minante acio que no Congresso e no Govérno se desen- volveu, em poucas horas, contra 0 BAD, deveu-se antes de tudo 4 certeza de impunidade que os comandados de Ivan Hasslocher propalavam aos quatro ventos. A coisa che- gou a tal ponto que, quando o Govérno publicou o decreto que extinguia a ADEP e o IBAD, as Areas politicas mino- ritérias ligadas ao esquema ibadiano vieram a piblico afirmar, com a maior energia, que a democracia no Bra- sil estava sob terriveis ameacas. Por outro lado, o pré- prio Hasslocher nao teve o menor pejo de publicar na im- prensa, como matéria-paga, artigos assinados, em que, além de atacar a decisio do Govérno, 0 Govérno e a pré- pria pessoa do Presidente da Republica, cinicamente pro- curava apresentar o IBAD, a ADEP e a Promotion como en- tidades completamente desvinculadas nas origens e fina- lidades. Tudo isso como se a prépria CPI que o Congres- so dissolveu, no tocante a seus membros, por suspeita de eomprometimento inaceitével com o objeto das investiga- gdes (0 IBAD, em suma), tudo isso como se essa CPI nao tivesse provado que IBAD, ADEP e Promotion séo a mesma coisa; como se a CPI nao tivesse provado que Ivan Hasslo- cher 6 dono da Promotion, Presidente do IBAD e membro mais importante do colegiado nacional da ADEP; como se a CPI nao tivesse provado fartamente que a ADEP era a maquina eleitoral ibadiana que fabricava deputados e se- nadores, financiada pelo IBAD e divulgada pela Promo- tion; como se a CPI nao tivesse anexado a seus autos do- cumentos comprobatérios das atividades de corrupcao elei- toral que levaram, finalmente, 4 prépria dissolugio da ADEP, do IBAD e, temos certeza de que esta para aconte- cer, da.Promotion — enquanto, ao Congresso, a simples repercussio de tais escdndalos esvaziava por completo as fileiras ibadianas”. Bis ai a verdade. A verdade irrespondivel. O caso IBAD, segundo A Revista PN., serviu também para que 0 verdadeiro conceito de democracia e de politica conser- vadora fésse apresentado, sem maiores exploragdes — 45 inclusive as que vinham sendo exacerbadas pelos profis- sionais do anticomunismo —, para esclarecimento da opi- nigo publica, Um exemplo frisante disso foi uma entre- vista do deputado Pedro Aleixo (UDN-Minas), Lider da Oposicéo na Camara, ao jornal Ultima Hora. Comegou éle por estranhar que, a pretexto de lutar contra o comu- nismo, certos setores — e se referia ao IBAD — utilizas- sem métodos de ac&o politica frontalmente antidemocra- ticos e, o que € pior, atentatérios & democracia. Acres- centou que nao podia, em hipétese alguma, concordar com os processos de corrupcao politica e eleitoral postos em pratica, sob a capa de finalidades legitimas, pelo grupo ibadiano. E foi mais longe: examinando as atividades elei- torais da ADEP e do IBAD, e suas repercussdes no Congres- so, salientou que os parlamentares que tinham aceitado conscientemente a corrupeaio do IBAD deveriam ter seus mandatos cassados. “A poda” — sublinhou Pedro Aleixo — “faz com que as drvores (referia-se ao Congresso) vi- cejem mais”. Em seguida, falando sébre os “compromis.- sos ideolégicos” a que o IBAD submetia os candidatos aju- dados pela ADEP, se eleitos, acrescentou Pedro Aleixo que um politico que se preza sé deve ter compromissos com 0 povo e com seu partido. Alias, um dos pontos que me- receu maiores atengdes, no processo IBAD, foi a questao dos compromissos ideolégicos. Nada mais eram éles do que uma promisséria politica, item importante nos propé- sitos de desvincular os representantes dos partidos no Congresso do comando partiddrio — para jungi-los & li- deranca superpartiddria do IBAD. O maquiavelismo dés- ses propésitos — e do que foi feito para atingi-los — es- tarreceu o Pais. As quantias que foram gastas na corrup- ¢40 politica e eleitoral, que levaria Aqueles extremos de deformac&o da vida partidéria e do pronunciamento po- pular nas urnas, ascenderam a bilhdes de cruzeiros. Ai esta, note-se, a inica coisa que até agora nao foi apurada: a origem dos recursos, dos esptirios dinheiros manipula- dos por Ivan Hasslocher. “Provada como esta a corrupeiio- de que se serviram o IBAD, seus dirigentes e suas siglas subsididrias (ADEP, Promotion) para alcangar o poder, numa primeira etapa através do Congresso”, — disse a Revista PN — “resta agora que o préprio Congresso e o Poder Executivo, com amplo respaldo no Poder Judicidrio, saibam quem pa- trocinou tudo isso... Afirma-se, alids, que a tinica coisa que restringe a agdo do Gevérno, no momento, € o receio de abrir frentes de crise internacional, a partir do que vier a descobrir de agora por diante’”’. 47 VII — Um Bando de Cinicos 'ONVOCADO, pela primeira vez, para depor, Ivan Has- ‘slocher se valeu de seus advogados ibadianos no seio da propria CPI para tentar paralis4-la e dissolvé-la. O golpe falhou. Convocado pelos novos membros da CPI, com data marcada para 26 de setembro passado, nega- ceou. Ele e seu lugar-tenente Frutuoso Osério Filho se recusaram “a falar como testemunhas”. Justificaram-se, dobviamente, para nao dizer o principal: — seus financia- dores: “Recusamo-nos por nos considerarmos no dever mo- ral e legal de guardar sigilo em térno dos brasileiros que colaboraram em defesa do regime democratico, contra a infiltragéo comunista no Brasil”. Os novos membros da cPI, sabidamente descompro- metidos, homens do maior gabarito moral, levaram Has- slocher ao panico. “S6 falaremos néio como testemunhas, mas como indiciados” — disse Ivan, pensando que tudo ficaria nisso. O relator Pedro Aleixo, udenista tradi- cional, democrata inatacdvel, conservador de quatro cos- tados (nao se confunda conservador com reacionério), tranqiiilamente observou: “Os dois (Hasslocher e Frutuoso) parecem persona- gens 4 procura de um artigo do Cédigo Penal para néle se enquadrarem. Se se consideram réus de algum crime que ainda n&o conhecemos, deixemos que o confessem aqui”. Hasslocher tem raz&o para ficar em panico. Os novos membros da CPI séo homens como Adauto Lucio Cardoso, 48 Ulisses Guimaraes, Pedro Aleixo, Bocayuva Cunha, Tem- perani Pereira. Gente de gabarito e tradigio. Finalmente, depondo perante a CPI que investiga as atividades e as origens dos recursos do IBAD, Ivan Hasslo- cher nao desapontou seus mentores encapuzados. Ag de- claragées por éle prestadas foram uma farsa; seu cinis- mo pessoal chegou a provocar revolta e indisfarcdvel mal- estar entre os membros da Comisséo. Sabedor de que os documentos em poder da crt constituem provas irrefu- taveis, Ivan resolveu demonstrar, pelo menos de inicio, uma curiosa “boa vontade”: admitiu o que tedo mundo ja sabia, isto é, que 0 IBAD apoicu em 1962 nada menos de “250 candidatos a deputado federal, cito a governador e 600 a deputado estadual’. Logo em seguida, contudo, recusou-se a citar nomes, bem como disse n&o ser verda- deiro — em que pesem as provas contrarias de posse da cpr — tenha sido o auxilio eleitoral do IBAD e da ADEP condicionado a assinatura de quaisquer compromissos por parte dos candidatos. “Jamais subornamos candidatos ou autoridades” — proclamou, solene. Frio e caleulista, Hasslocher pretendeu a certa altu- ra desmoralizar os Srs. Arthur Junqueira e Castilho Ca- bral, cujos recentes depoimentos 4 CPI tiveram efeito ar- razador contra 0 IBAD. Insinuou que o primeiro, quando secretdrio-geral da ADEP, havia sido desonesto na mani- pulagéo dos fundos da entidade. Essa ridicula e sérdida calinia, entretanto, se defronta com o simples fato de o proprio Ivan ter aprovado tédas as prestacdes-de-contas de Junqueira, documento ésse juntado aos autos. Quanto a Castilho Cabral, 0 melifluo Hasslocher tentou fazer crer que o convite para que o mesmo dirigisse a ADEP n&o se concretizara porque Castilho nao lhe inspirara confian- ga... Cairam dbviamente no vazio essas evidentes ten- tativas de Hasslocher no sentido de minimizar a impor- tancia dos depoimentos de Castilho e Junqueira. Outra faceta das taticas ibadianas veio em seguida a tona. Hasslocher, ardilosamente, tentou envolver, em seu 49 depoimento, pessoas inatacdveis, da maior responsabili- dade, numa evidente cartada final para justificar os seus escusos negécios e atividades. Até o nome de D. Hel- der Camara o esperto Hasslocher quis usar! Como ésse “golpe” também falhasse, em face do desmentido de D, Helder, 0 dono do IBAD, da ADEP e da Promotion pouco mais disse. Bombardeado pelas 252 perguntas do relator Pedro Aleixo e pelas muitas outras dos demais deputados membros da cr!, Hasslocher manteve a calma. Inespe- radamente, entretanto, reconheceu ser exato que oferecera Cr$ 1 bilhio a Castilho Cabral para que éste fundasse a ADEP. De onde veio ésse dinheiro? Na realidade, tédas as atengdes da cPl se dirigiam para ésse ponto — a origem dos bilicnarios recursos iba- dianos —, uma vez que as atividades politicas e eleitorais do grupo IBAD-ADEP-Promotion ja foram suficientemente levantadas pela Comissao. Aparentando grande autocon- tréle, Hasslocher procurou justificar, & sua moda, ésse melindroso aspecto do caso IRAD. Mas desde logo apenas conseguiu entrar em flagrantes contradigdes com o que antes afirmara pela imprensa (“os recursos do IBAD vém de 70 firmas industriais e comerciais do Rio e de Sao Paulo”), ao tentar explicar & CPI como consegue dinheiro para suas atividades. “Os financiadores do IBAD”’ — disse Hasslocher & Comisséo — “eram 126 cidadaos brasileiros, em sua maio- ria paulistas”. E a uma pergunta do deputado Bocayuva Cunha, que pedia nomes: “No posso reveld-los”. Acrescentou: “os que contri- bufam tinham seus nomes anotados num caderninho, onde, na qualidade de presidente da entidade, eu fazia a conta- bilidade”. A guisa de explicacio, disse ainda que dos 126 contribuintes do IBAD, 86 também financiavam a ADEP... JA af se evidenciava a manobra no sentido de mais vez “explicar” que IBAD e ADEP sao “coisas diferentes”. Portanto, e segundo o préprio Hasslocher, ja nao so firmas, mas “cidadios brasileiros”, em ntimero de 126, 50 os financiadores dos bilhées do 1BAD. Gente multimili ndria essa, com certeza. Grande maroto ésse Hasslocher. Mudou a cantiga, passou de emprésas para individuos. Para ganhar tempo, eis que todos sabem ser muito mais dificil apurar fatos dessa ordem sébre individuos do que sdbre emprésas... Essas tltimas tém contabilidade, tém livros. Qualquer suspeita poderia ser rapidamente inves- tigada. Mas... e individuos, misteriosos, anénimos e mi- liondrios individuos?. Tudo isso me leva cada vez mais a uma timica conclu- séo: os dinheiros do IBAD e de Hasslocher sao estrangeiros! Acresce que, referindo-se na CPI a seus financiadores, Hasslocher falou sempre no passado: “126 brasileiros fi- nanciavam 0 IBAD”; “os que contribuiam tinham seu nome num caderninho”, etc, Nés sabemos, entretanto, que 0 IBAD, a ADEP e a Pro- motion continuaram a agir depois das eleicées de 1962; sabemos que ésses é6rgios intervieram nas eleigdes muni- cipais de Pernambuco, em junho/julho do corrente ano; sabemos que IBAD, ADEP e Promotion iam agir nas eleicdes municipais marcadas para outubro seguinte; sabemos ainda que os programas de rédio do 1BAD nunca deixaram de ir ao ar, que a revista do famigerado Instituto sempre - foi distribuida, que até hoje érgaéos ibadianos est@o fun- cionando na Area sindical e estudantil.. Quem esté fornecendo dinheiro para isso tudo? Por outro lado, se apenas 86 contribuintes entre os 126 do BAD davam dinheiro A ADEP, e se esta em 1962 mobilizou recursos de mais de Cr$ 1 bilhao em 90 dias pré-eleitorais, a que extremos de poder econdmico nao te- ria ido o IBAD, érgio preferido pelos supostos financia- dores? Cheio de contradigées, mostrando que mesmo um agente internacional supertreinado nfo consegue mentir sempre — e com perfeicdo —, o depoimento de Hasslocher foi antes de tudo mais um libelo contra o IBAD. * 5L Menos importante que o depoimento de Hasslocher (que contou até com a presenca “‘solidaria’” de deputados ibadianos), a reinquirigio do seu lugar-tenente Frutuoso Osério, feita pouco depois, serviu para mostrar, entre ou- tras coisas, como Frutuoso mentira a CPI, na oportunidade de seu primeiro interrogatério, ainda na primeira fase do funcionamento da Comissio. Falando depois do “che- fe”, Frutuoso resolveu n4o insistir nas mentiras mais evi- dentes. Admitiu, por exemplo, que recebera Cr$ 339 mi- Th6es para aplicar no Nordeste, dada a sua posigdo de coor- denador eleitoral da ADEP e do IBAD na regiao. Todavia, em seu primeiro depoimento falara em apenas Cr$ 15 milhées... Outra coisa que disse: em Pernambuco, Estado onde mais dinheiro foi gasto, os dinheiros eram entregues segundo orientagio dada pelo entéo Governador Cid Sampaio. Entre o primeiro e o-segundo depoimentos de Frutuoso houve, no final de contas, um ponto comum: as deslavadas mentiras com que procurou se furtar 4s perguntas que lhe foram dirigidas. A exemp'o do primeiro depoimento, e apesar de ser diretor do IBAD, diretor da Promotion e figura importante da Promotion, Frutuoso quase sempre “nao se lembrava”, “nao sabia”, etc. Sempre usou de sevasivas, quando tinha que responder a alguma coisa. “Que eu me lembre”, “se n&éo estou enganado”, “acre- dito”, “tenho a impressfo” — eis seus chavées. A coisa chegou a tal ponto que o relator Pedro Aleixo protestou. Isso, quando Frutuoso disse nfo saber quais os diretores do IBAD, apesar de ser éle préprio um dos diretores da- quele organismo. . . Singulares tipos de “democratas”, ésses do IBAD... mentirosos, cinicos e aventureiros! * Inttil seria dizer do poderio do 1BAD. Ivan Hasslocher, testa-de-ferro de grupos estrangeiros, organizou uma das maiores maquinas de corrupeao neste Pais. Quem é Ivan Hasslocher? Atualmente um todo-poderoso, com deputa- 52 dos, advogados e jornalistas movimentados pelos cordéis de seus bilhdes. Quem era Hasslocher antes do IBAD? Al- gum industrial de renome? Algum politico de projecdo? Algum jornalista experimentado? Nada disso. Sabemos, sim, para que veio; mas de onde veio e como veio? Facil sera admitir que para uma ago dessa natureza o “homem” devera estar especialmente preparado. Técni- ca e psicolégicamente preparado. Entdo, nfo se trata de um simples aventureiro. Evidentemente Ivan Hasslocher foi_o escolhido para cumprir uma missSo que nfo foi le- vada ao fim porque a trama foi desmascarada. A tnica vitéria que obteve, em sua “missio parti- cular”, foi a de empanturrar-se de dinheiro, armando o bai de ouro que se chama Promotion — fabrica de “‘co- munistas” onde realiza seus altos negécios As custas da democracia. Apenas numa de suas contas, no Banco do Canada, enviada & Comisséo Parlamentar de Inquérito, Hasslocher movimentou, nos trés meses que precederam As iltimas eleigdes: 1 bilhdo, 880 milhées de cruzeiros. Os depésitos de Hasslocher séo feitos sempre com quebrados de 30, 40 ou 50 centavos. Evidentemente quem deposita 20 ou 30 milhdes nao vai se preocupar com centavos, E o porqué désses quebradinhos? Trata-se nada mais nada menos do que conversio cambial de moeda estrangeira, em depési- tos sempre feitos em Agéncias de Bancos de outros paises, que funcionam no Brasil. Industriado pelos “Servigos de Inteligéncia” do pais ou paises aos quais serve, Hasslocher armou a maquina do IBAD, com organismos paralelos, que sfo as ADEPS, disfarcando-as com estatutos juridicos independentes. E tanto assim é, que os seus funciondérios que depuseram na Comiss&o, como éle préprio, através da imprensa, sempre declararam enfaticamente que o IBAD nada tinha com a ADEP e vice-versa. Pura mentira. Hasslocher é 0 Chefe- supremo do IBAD, da ADEP e da Promotion. S6 éle dava ordens, s6 éle recebia e sé éle pagava. 53 Apresento documentos que provam irrefutavelmente o que afirmo. Referem-se éles & campanha eleitoral de 1962. O primeiro diz o seguinte: “Prezado Junqueira. — Tem sucedido que no passado algumas das minhas instrugdes ou solicitagdes sébre o funcionamento da ADEP tém sido mal compreendidas, mal executadas ou ignoradas. — Escrevo-lhe esta, portanto, para que n&o haja nenhum equivoco quanto A possivel futura venda de materiais permanentes adquiridos pela ADEP ou em prol da ADEP e que, possivelmente, se torna- rao sobressalentes ou desnecessdérios depois do dia 7 de outubro, — Refiro-me a quaisquer materiais dessa natu- reza, desde grampeadores até veiculos e o aviao adquirido pelo Sr. Leopoldino. — Esses materiais sé poderao ser vendidos por mim diretamente, nao estando autorizado nenhum diretor ou funciondério da ADEP, quer nacional, quer estaduais, a negocid-los de qualquer forma. Peco-lhe fazer sentir essas instrugdes a todos os seus subordinados. — Atenciosamnete, Ivan Hasslocher’. Este documento demonstra que o contréle pessoal e ditatorial de Hasslocher sobre as ADEPS era total e abso- luto. Transcrevo agora o documento n.° 2: “Prezado Senhor Emanoel. —- Comunico-lhe que nos ultimos dias remeti a importancia de Cr$ 60.000.000,00 & ADEP do Recife para a sua campanha. — Ao Muranye, em S&o Paulo, foi remetida a importancia de EF “B.404.000,00 como ultima parcela das nossas contri- buigdes 4 ADEP naquele Estado. —- Ao Sr. Leopoldino foi entregue a importancia de Cr$ 14.106.000,00 também co- mo Ultima parcela de nossa contribuicéo & ADEP de Mi- nas Gerais. — Ao Sr. Armando Fillardi foi entregue a importancia de Cr§ 1.560.000,00 também como iltima parcela de nossas contribuicées ao Estado do Rio de Ja- neiro. — Atenciosamente, — Ivan Hasslocher”, Este iiltimo documento prova que a distribuigéo das verbas para as ADEPS era feita exclusivamente por Has- slocher. Alias, os documentos que estou apresentando ao 54 leitor provam, como alids o fiz exaustivamente na CPI e na tribuna da Camara, que 0 IBAD, a ADEP e a Promotion sio uma espécie de “santissima trindade” terrena, isto é, trés pessoas distintas numa sé, e todos os dinheiros das misteriosas organizagdes manipulados, exclusivamente, por Hasslocher. Com tanto dinheiro nas m4os, Hasslocher chegou a ter uma férea incrivel. A CPi do IBAD, em sua primeira fase, era composta na sua maioria de fandticos advogados ibadianos. Os esforcos dos Deputados Joao Déria, Bene- dito Cerqueira, José Aparecido, Rubens Paiva e eu foram coroados com o fechamento do érgéo corruptor pelo Exe- cutivo. Esse ato de patriotismo poderia caber ao Congres- so Nacional, mas os ibadianos da Comissdo Parlamentar de Inquérito, e que constitufiam maioria, ficaram tomados de panico com o possivel interrogatério de Hasslocher. Fizeram uma magica bésta, a titulo de suscetibilidade fe- rida, e suspenderam os trabalhos da Comissao. N&o contavam éles, por certo, com a indicag&io de novos nomes — e insuspeitos — para a Comissio. Entre éles esta, como vimos, o deputado Adauto Cardoso, lider da UDN na Camara. Conhecedor dos processos ibadianos, declarou éle & imprensa que a UDN é contra o IBAD. E nu- ma outra entrevista: “Fui considerado elemento “pes. toso” pelo 1BAD”, Adauto é conservador, adversdrio im- penitente do PTB, mas de cuja honradez ninguém duvida. O ex-Deputado Castilho Cabral, criador do Movimento Janio Quadros, depondo na Comissio Parlamentar de In- quérito disse o seguinte: “Fui procurado em minha re- sidéncia por IVAN HASSLOCHER, que me ofereceu a quantia inicial de um bilhdo de cruzeiros para auxiliar candidatos nas eleicdes”. Antes, jA4 fora procurado pelo mesmo Sr. Hasslocher, em companhia do Sr. Gladstone Chaves de Melo, que me trazia um documento considerado “gravis- simo”. Tal documento era um acérdo entre 0 PTB e o Partido Comunista para apoiar o General Lott, com a assi- natura do entéo Presidente em exercicio do PTB, Sr. Baeta Neves”. 55 Prudentemente, Castilho Cabral, em companhia do Dr. Raimundo de Brito, procurou averiguar a autenticidade da assinatura. A mesma era falsa. O documento féra for- jado no laboratério anticomunista do Sr. Hasslocher. Em quem acreditar? Em Castilho Cabral, homem conserva- dor, nosso adversaério, com trinta anos de vida politica, ou no Sr. Hasslocher, falsificador de assinaturas e senhor supremo do IBAD, ADEP e PROMOTION, organizacées testas- de-ferro de grupos estrangeiros? Em entrevista publicada em “O Globo”, Hasslocher cinicamente declarou que o IBAD n&o financiara candidatos a cargos eletivos e que era entidade inteiramente distinta da ADEP. Mais uma mentira de Hasslocher. Ja demons- trei, com documentos, que Hasslocher distribuiu as verbas para a ADEP e controlava todos os dinheiros dessa subsi- didria do IBAD. Mais depressa se pega um mentiroso do que um coxo. O Governador Miguel Arraes apresentou centenas de documentos 4 CPI e destacou o seguinte: “Re- cebi do Instituto Brasileiro de Acio Democrdtica a quan- tia de um milhio de cruzeiros para fins de alistamento eleitoral”. Tal documento est4 assinado por um represen- tante do IBAD. Para provar definitivamente que Hasslo- cher, e s6 Hasslocher, comandava essas trés entidades, tra- go a ptblico névo documento com o timbre do Instituto Brasileiro de Acfio Democratica, “IBAD”, em que o pequeno fihrer transmitia ao ex-secretario-geral da ADEP 03 no- mes que compunham os colegiados do Nordeste. Vamos ao documento: “Ilmo, Sr. Arthur Oscar Junqueira. Rua México 98 — sala 802. Rio de Janeiro, 15 de agésto de 1962, Pre- zado Junqueira, Atendendo 4 sua extraordinaria solici- tagiio (uma vez que essag informacédes deveriam vir dai para cA e nao vice-versa), transmito-lhe os nomes que compéem os nossos colegiados do Nordeste, com excecio da Paraiba, onde o diretério se estA constituindo apenas esta semana. 1 —— Ceara: Fzequiel Menezes, Aécio Borba, Milton Mota Fernandes, General Humberto Ferreira Elery, Ge- raldo Santos e Coronel Sabino Guimaraes. ‘2 — Rio Grande do Norte: Wober Lopes Pinheiro, Augusto Alves Rocha, Ilo Fernandes Costa e Francisco Dantas Guedes. 8 — Pernambuco: Orlando Paraim, Anténio Corréa Oliveira e Olimpio Ferraz. 4 — Alagoas: Ib Gatto Faleio, Everaldo Macedo de Almeida. 5 ~ Sergipe: Murilo Dantas, José Teixeira Macha- do, Edson Brasil e Francisco Costa Garcez. 6 — Bahia: Joiio Mendes Neto, Germano Machado, Oscar Cardoso e Epaminondas Moncorvo. Atenciosamente (a) Ivan Hasslocher. Copia: Gene- ral Barbato”. Verbas, pagamentos, recebimentos, contréles sdbre to- dos os colegiados da ADEP e do IBAD, total comando da PROMOTION, tudo isso era e é feito por Hasslocher. Mas ésse agente secreto muito bem preparado pelo servico do pais estrangeiro que o contratou, funciona A semelhanca de Goebbels, 0 papagaio do III Reich. Possuindo enormes verbas para pagar paginas e p4ginas de jornais, adotouw o “slogan” do ministro da propaganda nazista: “KE pre- ciso mentir, mentir sempre, porque em alguma coisa o povo acabaré acreditando”. Hasslocher sabe muito bem como explorar o médo de certos setores reaciondrios atra- vés da indtstria anticomunista. Conhece todos os truques de propaganda e sabe perfeitamente que num pais emo- cional como o nosso, ha de encontrar sempre medalhées Avidos de publicidade, que fingem acreditar em suas men- tiras, e parlapatdes corruptos que se vendem por um vin- tém e uma colher de mel coado. Mas os seus dias estao contados. A consciéncia popular j4 tomou conhecimento do que é 0 IBAD. Os conservadores da UDN que nao se deixaram corromper pelos dinheiros de Hasslocher co- 37 megam a reagir contra a alianca que alguns exibicionistas sem categoria desejam fazer do IBAD com a UDN. A maquina de corrupgéo de Hasslocher comega a se - desmantelar. Ele insiste no jégo anticomunista para que os seus patrées estrangeiros nfio o considerem um agente fracassado. Invadiu paginas de jornais com as suas ba- boseiras, a péso de ouro, e nao desiste da campanha con- tra a democracia auténtica_e contra os homens de bem que lhe barram og passos. Com a desfacatez tipica de um agente internacional bem treinado, Hasslocher insiste de- sesperadamente em manter a sua maquina de corrupc¢aio agindo a todo o vapor. Em qualquer democracia do mun- do ésse homem ja estaria na cadeia por atentado as Leis de Seguranea Nacional. Mas aqui no Brasil ainda en- contra. defensores da “civilizac&o crista” que o elogiam e beldroegas que o seguem fielmente. A vitéria de Hasslocher sdbre 0 Congresso Nacional seria o fim do préprio Congresso, O Legislativo passaria a ser um instrumento décil désse miliondrio da corrupgao. Mas a Camara dos Deputados, através das suas liderangas, manteve a Comiss&o de Inquérito antes dissolvida pelos deputados ibadianos. Isto é uma prova da vitalidade da nossa democracia. Os ibadianos nao conseguirao le- var a melhor, ainda que mintam, ofendam, agridam e corrompam. Tenho a esperanga que esta m&quina da cor- rupeao sera desmantelada definitivamente. A denincia que fiz do 1BAD nao caird no vazio da indiferenga parla- mentar. E o que o povo brasileiro espera. * O cinismo de Hasslocher é qualquer coisa de incrivel. Sentindo-se vitorioso logo apés a interrupgfo dos traba- Thos da CPI, em sua primeira fase, 0 dono do IBAD, da ADEP e da Promotion publicou extensa e carissima matéria-paga em praticamente todos os jornais, dizendo textualmente: “tem sido confundido o IBAD, por uns deliberadamente e por outros inocentemente, com uma segunda entidade dis- tinta, a ACAO DEMOCRATICA POPULAR — ADEP”. 58 Va ser cinico na patria que o expeliu. Os documentos gio muitos. Ivan, apenas Ivan, somente Ivan, recebia, pa- gava, ordenava, mandava e desmandava nas trés entida- des fantasmas. ‘As ordens de pagamentos so inimeras. Vejam mais estas de 4 de setembro: “Prezado Junqueira — Comunico-lhe que hoje en- treguei ao Sr. Salvador de Gracia para as operacées da ADEP em Porto Alegre a importancia de Cr$ 10.000.000,00 (dez milhées de cruzeiros), a qual peco seja devidamente laneada na sua contabilidade. Ficou acordado com o Sr, Gracia que lhe sera feito um suprimento adicional de Cr$ 5.000,000,00 (cinco milhdes de cruzeiros), e mais nada, comprometendo-se éle a levar as suas operagdes a bom térmo com essa importdncia e as outras jé recebidas. Comunico-lhe, outrossim, que entreguei ao Cel. Cas- cais a importancia de Cr$ 10.000.000,00 (dez milhdes de cruzeiros) para as operagées da ADEP no Amazonas. Fi- cou combinado com Gal. Barbato que esta sera a nossa fltima contribuicio para a ADEP no Amazonas, devendo 0 Cel. Cascais levar a bom térmo naquele Estado as nossas operagdes com essa importancia e as somas anteriormente recebidas. Atenciosamente, IVAN HASSLOCHER”. E esta outra, de 10 de setembro: “Prezado Junqueira — Comunico-Ihe que no dia 7 do corrente entreguei a importancia de Cr$ 25.000.000,00 ao Sr. F. Osorio Filho para as suas operagdes no Nordeste. Atenciosamente, IVAN HASSLOCHER’. Frutuoso desempenhava a importante missio de coor- denar a aco do IBAD e da ADEP no Nordeste, regiao que muitos interésses nacionais e estrangeiros consideram “explosiva” — e dai talvez a razio de o proprio vice-deno do IBAD ter se incumbido pessoalmente dessa tarefa. Nessa qualidade, Frutuoso apenas dava satisfagdes de suas ati- vidades a Hasslocher. & 0 que vamos provar em seguida. No dia 12 de janeiro de 1963, o secretario-geral da avEp, Arthur Junqueira, mandou telegrama a Frutuoso 59 Osério Filho, instalado ainda em Recife, pedindo-lhe a prestacio de contas das despesas referentes 4 ADEP. Eis a integra do telegrama: “SOLICITO REMESSA DOCUMENTAGAO URGENTE FIM PRES- TACAO CONTAS COLEGIADO — ARTHUR JUNQUEIRA”. Como Frutuoso nao respondesse, Junqueira insistiu, remetendo névo telegrama a 14 de janeiro: “REITERAMOS SOLICITAGAO URGENTE REMESSA DOCU- MENTACAO PRESTACAO CONTAS COLEGIADO — ARTHUR JUN- QUEIRA”. A resposta de Frutuoso Osério Filho, séca e contun- dente, veio a 19 de janeiro: ‘NENHUM RECURSO RECEBL voch pt NAO HA CONTAS A PRESTAR-LHE — OSORIO”. Em outras palayras, Osério queria dizer: ndo presto contas a vocé porque, mesmo sendo vocé secretdrio-geral do IBAD, quem forneceu o dinheiro foi Hasslocher. Diga-se, alids, de passagem, que o Sr. Frutuoso Os6- rio, aleagtiete de Ivan no Nordeste, mentiu descaradamen- te na CIP quando declarou que a “gang” democratica gas- tou em todo o Nordeste apenas quinze milhées de cruzeiros. 86 nas ordens que ja publiquei destinadas ao Nordeste as quantias vio a cento e cinco milhdes.. E ordens, como todos os documentos que apresento, assinados por Ivan! Ainda na matéria paga, acima mencionada, Ivan de- clara que foram apoiados 250 candidatos a deputado fe- deral, 450 a deputado estadual e ainda candidatos a gover- nador e a senador. E tudo isso com o “dinheirinho arreca- dado com a venda da revistinha “Aciéo Democratica” (de- claragao de Ivan publicada em um vespertino) e com a co- operacio de “patriotas andnimos que enviaram contribui- gées pelo correio”... (palavras textuais de Frutuoso na cPlI!). Fazendo tais declaragées, Ivan, indiretamente, esta avisando aos ibadianos: “vocés me defendam, sen&o eu conto...” Na matéria-paga a que jd me referi, Ivan declara: “o IBAD tem sido acusado de fomentar a corrupgdo elei- 60 toral. Na realidade, o IBAD nao interveio nas eleigdes de 1962 ou em quaisquer outras eleicdes”’. E ainda: “nao constitui corrupcdo eleitoral fornece- rem-se os meios para que candidatos comparegam 4 tele- viséo ou ao radio, para que disponham de faixas e carta- zes de propaganda eleitoral ou para que se utilizem de veiculos e equipamento sonoro para disseminar a noticia de sua candidatura”. Constitui crime sim. Primeiro, porque ésse auxilio era dado em troca de alienagéo da condi¢do pessoal e par- tidéria do candidato, através dos famosos “compromissos ideolégicos” exigidos pelo IBAD e pela ADEP. Ademais, po- rém, Ivan nao da bola para as leis brasileiras. Sendo, teria o cuidado de ler o artigo 145 do Cédigo Eleitoral. Alids, qualquer agente internacional sabe que ésse artigo diz textualment “Art. 145 — Sao considerados ilicitos os recursos fi- nanceiros de que trata o artigo anterior, assim como os austlios e contribuigdes cuja origem nao seja mencionada”. E a ADEP? S6 dava faixas e cartazes, 6? E o IBAD? No interveio nas eleicdes? E o documento, que veremos em seguida, com timbre do IBAD, no qual Ivan menciona o acérdo estabelecido entre éle e Cid Sampaio para finan- ciar a candidatura Joao Cleofas? Teria Ivan se “esque- cido” désse acérdo? Os trés primeiros itens do referido documento dizem o seguinte: “Prezado Junqueira. 1 — Comunico-lhe que, nesta da- ta, estou enviando Cr$ 25.000.000,00 (vinte e cinco milhées de cruzeiros) ao Sr. Osério para operagées da ADEP em Pernambuco. 2 — Correm boatos nos escritérios da Rua México no sentido de que essas remessas ao Sr. Osério sao feitas por favoritismo, em prejuizo de outros Estados. Nao € verdade. As remes: ao Sr. Osério obedecem ri- gorosamente 4 cronologia acertada por mim e pelo Go- vernador Cid Sampaio quanto as necessidades da cam- panha do Sr. Jo’o Cleofas. 3 — Estou anexando, para as operacdes da ADEP sob a sua supervisdo direta, um che- 61 que no valor de Cr$ 40.000.000,00 (quarenta milhdes de cruzeiros)”. E quem é Frutuoso Osério? Representante do IBAD no Nordeste (Depoimento crt). Ivan esta falando demais. Deu dinheiro a muita gen- te e parte dos documentos estio comigo. Continua na ilusdéo de que esté confundindo o povo brasileiro com as suas matérias pagas. O Sr. Claudio Hasslocher, irm&o de Ivan, depondo na Comissio Parlamentar de Inquérito, declarou textualmen- te: “O dinheiro do rBAD é de fonte nebulosa”. O depoi- mento esta assinado. Que fonte é essa, Ivan? Que grupos estrangeiros o financiam? Firmas brasileiras? En- tio prove com documentos, apresente recibos e certidées do Impésto de Renda dessas emprésas. Os defensores da democracia devem ter orgulho das suas atitudes e nio precisam se esconder no anonimato. Nos Estados Uni- dos, dezenas de Institutos Democraticos apresentam pe- riddicamente os seus balancetes. Mas Ivan sabe que isso éle nado podera fazer. Perderia o emprégo. Acredito que desta vez o Parlamento reagirA contra tipos dessa natureza. Alias, Ivan insiste em dizer boba- gens pelos jornais. Agente secreto tagarela dé em Agua de barrela! Essa tagarelice de Hasslocher ficou mais do que de- monstrada pela segunda matéria-paga com que éle inun- dou a imprensa, em seqtiéncia 4 primeira, a que nés ja nos referimos. Pretendeu éle, com ambas, defender 0 1BAD ea ADEP do decreto suspensivo do Govérno. Ainda Aque- la altura, pensava Hasslocher que o Congresso viria em seu socorro, levando o Govérno a um recuo ou a um “tudo em ordem”, depois do prazo de trés meses dado ao Poder Judicidrio pelo Poder Executivo para examinar os arqui- vos ibadianos e adepianos, Na sua segunda matéria-paga, o agente de grupos econdmicos estrangeiros, Ivan Hasslocher, dono do IBAD, ADEP e “Promotion” (é tudo uma coisa s6), agrediu esti- pidamente os novos membros da Comissio Parlamentar 62 de Inquérito do map. Bateu o “democratico” pézinho e sentenciou pimpio: nao digo, nio digo, nfo digo! Em recado indireto aos grupos estrangeiros que o financiam, Ivan os acalmou: “Nao direi a origem dos bilhées do weAD”, A CPI que va as favas. Nao sero os novos mem- bros da CPI, os “comunistas” Adauto Cardoso, Pedro Alei- xo ou Ulisses Guimaraes que me farao confessar crimes eleitorais (Artigo 145 do Cédigo Eleitoral. ‘Sao consi- derados ilicitos os recursos financeiros de que trata o artigo anterior, assim como os auxilios e contribuig6es cuja origem nfo seja mencionada”’). Plagiando Eca, na “Ultima Carta de Fradique Men- des”, Ivan afirma aos intimos: “Bem cedo, do Brasil, do generoso e velho Brasil nada restou: nem sequer brasi- leiros, porque sé h& comunistas — a nagéo inteira se comunizou. Do norte ao sul, no Brasil, nao ha, nao en- eontrei senio comunistas! Comunistas, com téda sorte de fungées! Comunistas, com uma espada, comandando sol- dados; comunistas, com uma carteira, fundando bancos; comunistas, com um apito, dirigindo a policia; comunis- tas, com uma lira, soltando carmes; comunistas, com um prumo, construindo edificios; comunistas, com balangas, misturando drogas; comunistas, sem coisa alguma, gover- nando o Estado! Todos comunistas. O Dr. Tenente-co- ronel... O Dr. Vice-almirante... © Dr. Chefe de Po- Meia... O Dr. Arquiteto... Homens inteligentes, ins- truidos, polidos, afaveis — mas todos comunistas”. A semelhanga de um “cruzado” da democracia, Ivan afirma dramaticamente: com os bilhdes que recebo do estrangeiro eu salvarei o Brasil, ainda que para tanto tenha que convocar o “exército” do General Danilo Nunes e fazer com que o meu “Ministro da Marinha”, 0 matalote Pena Béto, acenda os fogos e morrées da sua invencivel esquadra... Ivan encomendard poderosos artigos de fundo aos jornais que he ddo apoio, e os seus escribas faraéo com que palavras contundentes dancem sarabandas frenéticas no cranio do velho democrata Pedro Aleixo. 63 O lider udenista teré de interrogar Ivan. Lamento. The a sorte. Désse momento em diante, exatamente désse momento, Aleixo seré considerado pelo fa-clube de Ivan como um “criptocomunista” a servigo de Kruschev... Mas, vamos aos fatos. Leiam mais esta carta,assi- nada por Ivan: “Ilmo, senhor A. O. Junqueira — Rua México 98, grupo 802 — Rio GB — Prezado Junqueira — Com referéncia & sua nota de hoje sébre alguns can- didatos a Deputados Estaduais do Estado da Guanabara, comunico-Ihe que os tinicos deputados da UDN e do ppc, que podemos apoiar, sfio os que constam das relacdes que ja lhe mandei. Nao estando nelas os senhores Domin- gos D&angelo, Edgar Pires Ferreira ou Hernany Rebelo Fernandes, nao podemos apoid-los. Quanto ao Sr. Togo Gomes de Almeida, ainda no tenho a lista do PR e pro- vavelmente éle seré indicado na mesma. “Devemos ter em mente, ao selecionar candidatos, que além de possuirem grandes dotes e predicados morais e intelectuais, devem ter condigdes para eleger-se. DE OUTRA FORMA PERDERIAMOS 0 NOSSO DINHEIRO. O Sr. Ed- gar Pires Ferreira colocou-se péssimamente na chapa do ppc na ultima eleig&o, sendo que a chapa do ppc nao foi nenhuma cornucépia de deputados, uma vez que dela 86 se elegeu um, 0 nosso amigo e correligiondrio Glads- tone Chaves de Melo. “Com as sinceras manifestacdes de meu aprégo, estima e consideracdo, subscrevo-me muito atenciosamen- te, — Ivan Hasslocher”. S6 Ivan, como percebem os leitores, manipulava o di- nheiro e indicava candidatos. As ADEPS obedeciam. O IBAD nao apoiou candidatos, afirma Ivan. Ja provei exaus- tivamente que apoiou e o féz em massa. Em todo caso, vamos adotar a pedagogia das escolas ptblicas, a fim de gravar bem o assunto. Vamos 1d: 0 IBAD é Ivan. Ivan éo0 IBAD, A ADEP 6 Ivan. Ivan 6a ADEP. Ivan é a “Promo- tion”. A “Promotion” é Ivan. IBAD, ADEP, Ivan e “Promo- tion” séo uma coisa s6. Mas Ivan custeava eleicées de gracga? Nao, éle mesmo o diz na carta acima, quando as- 64 . sinala: “de outra forma perderiamos o nosso dinheiro”. Para Ivan, candidato é investimento de capital. Ocupar o Pais politicamente, era a primeira fase do plano. De- pois, através dos representantes do IBAD no Congresso, fa- zer leis antinacionais que permitissem aos grupos estran- geiros que representa ag&o livre em nosso territério. Esse, o plano. Essa, a verdade. E dizer que alucinadas ceifei- ras da politica ainda gritam e bradam histéricamente por Ivan. Que pais é éste, meu Santo Deus! Na Bélgica, na Franga, em Ménaco, na Inglaterra, nos Estados Unidos, em qualquer pais que se preze, ésse Ivan ja estaria na eadeia. E aqui, ainda publica matéria-paga, insultando 0 Govérno e desafiando o Congresso. E tudo isso sem falar nas entrevistas concedidas aos érgios “austeros” da cha- mada imprensa “impoluta”, onde aparece fotografado de gravata borboleta, sorrindo marotamente, unhando um dente de ouro e chupando cigarrilhas inglésas. Eo fim! * Na primeira fase da CPI do IBAD, dois homens dis- seram a verdade, pelo menos até onde a sabiam: Arthur Junqueira, ex-secretdrio-geral da ADEP, e Hélcio Franga, ex-tesoureiro da mesma. Apresentaram éles 4 CPI um re- cibo de total quitacéo dos dinheiros que manipularam, assinado por Ivan Hasslocher. Desligaram-se de Ivan e da ADEP porque, apesar dos insistentes apelos que fizeram a Ivan, éste se negava a dizer-lhes quais as origens do dinheiro fartamente dispendido, embora se tivesse .com- prometido antes a fazé-lo. Se Arthur Junqueira e Hélcio Franca falaram a ver- dade, essa nao foi uma regra-geral. Pelo contrario. A regra-geral foram os depoimentos ultra-cinicos e aberta- mente mentirosos, como o de Francisco Lampréia, agente de Ivan junto ao Congresso, e o de Frutuoso Osério, ex- funciondrio de uma emprésa de petrdleo estrangeira, re- presentante do IBAD no Nordeste. 6 Lampréja, mais conhecido nas rodas ibadianas pela graciosa alcunha de Chico Dalva, e assessor do deputado Jo&o Mendes, tem livre transito no Congresso Nacional. Traz sempre um sorriso esperto, orvalhado pelo espirio dinheiro de Ivan. E uma figurinha asseada, engomada, empomadada e enjoativa. Definiu assim, perante a CPI, seu curriculum vitae profissional nas hostes ibadianas: “Comecei minha carreira na Promotion, onde che- guei a ocupar a geréncia. Depois, fui diretor-fundador do IBAD. Mais tarde, desliguei-me do mesmo. Apés certo tempo, vim para Brasilia, onde representei a ADEP. Hoje, sou representante da Promotion em Brasilia, e assessor do deputado Jofio Mendes”. Em suma: tédas as siglas do grupo estéo na carreira profissional do meloso Francisco Lampréia. Eis como Frutuoso Osério Filho definiu, para a CPI, sua posigéo dentro do esquema ibadiano: “Sou o diretor-geral do IBAD, sou sécio da S. A. In- erementadora de Vendas Promotion e fui, de uma certa forma, extra-oficialmente, coordenador das atividades da ADEP na Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraiba, Rio Grande do Norte e Ceara”. Apesar disso, pretendem agora ésses espoletas dizer que o IBAD nada tinha com a ADEP, e ambas nada com a Promotion. Pois um dos diretores da Promotion, o Sr. Carlos Reis, enviou a seguinte circular aos representantes de emissoras de radio e TV, em plena campanha eleitoral de 62: “Com a presente, desejamos comunicar a V. S. que a partir desta data sdmente a S. A. Incrementadora de Vendas Promotion tem autorizagio para contratar tempo e outros servicos de rAdio e televisio em todo o Brasil, em nome do IBAD e da ADEP”, Frutuoso € homem de inteligéncia comum e espirito mediocre, mas tem a esperteza da catita, ésse ratinho de gaveta que escapa sempre pelas frestas e réi tudo quanto é papel. Bisses dois séo auténticos componentes da “gang” de Hasslocher. 66 Os generais reformados que servem sob as ordens do pequeno “fihrer’ s&o, no meu entender, neuréticos do comunismo, criaturas que tém a mente obumbrada e véem russos barbudos comendo crianca crua em cada esquina da cidade. Sao homens capazes de jurar que Joao XXIII era comunista. Nunca é demais repetir que IBAD, ADEP e Promotion sio uma coisa sé. Muito de indistria, numa de suas ma- térias-pagas, Ivan franqueou as contas da ADEP e do IBAD em qualquer banco, para qualquer exame. Malandragem do Ivan. O dinheiro grosso esté depositado na conta da Promotion e na sua prépria, bem como na de Frutuoso, nos trés bancos estrangeiros que j4 citamos varias vézes ao correr déste livro. Na conta da ADEP, que recebia di- nheiro via Hasslocher, existiram cérea de Cr$ 400 mi- Ihdes — e depositados num banco nacional, 0 Andrade Arnaud. Note-se que Ivan utilizava a réde bancdria na- . cional, depois de retirar originariamente os dinheiros de pancos alienigenas, apenas para aproveitar o fato de os bancos nacionais terem suas agéncias instaladas em tédas as cidades de alguma importancia no Pais, Assim, éle facilitava e resolvia da maneira mais simples o problema de distribuir numerdrio entre os seus agentes. Na tinica conta da Promotion da qual se obtiveram informagées, no The Royal Bank of Canadé, o movimento foi da ordem de Cr$ 1 bilhio e 380 milhdes em apenas 3 meses. “Mas existem outros documentos que gostariamos de exibir ao leitor. Vamos analisar mais uma carta de Ivan: “Rio de Janeiro, 21 de agdsto de 1962, ‘Ilmo. Sr. A. O. Junqueira — Rua México, 98, gr. 802 — Rio — GB. Prezado Junqueira. Estou anexando um cheque de Cr$ 16.000.000,00 para as operagées da ADEP. Chamo a sua atengéo para o fato de que sdmente hoje e sexta-feira, o tiltimo dia util, transmiti-lhe a im- 67 portancia total de Cr$ 38.050.000,00, sendo que no dia 15 Ihe havia mandado Cr$ 40.000.000,00, . Acho que essas importancias, judiciosamente empre- gadas de acérdo com o General Barbato e o Coronel Ju- randir, nado podem dar margem para reclamagées de vocé, como do seu pessoal, no sentido de que nao lhes estariamos mandando suprimentos suficientes. Estéve aqui hoje o Sr. Emanuel e aproveitei a opor- tunidade para entregar-lhe as contas do Recife referentes aos meses de junho e julho, que me foram entregues pelo Osorio. Diz-me o S. Emanuel que o Sr. Peter Muranye ndo Ihe manda contas nem comprovantes. Isso 6, evidente- mente, gravissimo e pecgo a sua interferéncia, bem como a do General Barbato, para essa situagiio insustentavel. Com os meus sinceros votos pelo seu sucesso na sua campanha eleitoral, envio-lhe numerosos abracos. as. Ivan Hasslocher. e/c. : Sr. Héleio Franca e/e, : Gal. Barbato EM TEMPO — Peco-lhe n&o se esquecer da nossa reu- nido de domingo, das instrucdes nela veiculadas pelo Deputado Joo Mendes sébre a transmissio de dinheiro a alguns candidatos, de acérdo com uma lista preparada pelo Sr. Leopoldino, e, portanto, da necessidade de utilizar ésses dinheiros que ora lhe envio para ésse fim’. Como se vé, além dos inGmeros programas de radio e televisio, faixas, cartazes, viaturas, folhetos, etc, etc... entregues a 450 candidatos a deputados estaduais, a 250 candidatos a deputados federais, a alguns senadores e a candidatos a Governos estaduais (foram 8 os candidatos a governador apoiados por Ivan — depoimento op1), Ivan, de acérdo com as instrugdes do Deputado Jofio Mendes (vide carta), ainda entregava dinheiro vivo a alguns can- didatos. 68 VIIE — Um Névo Al Capone? E™ RECENTE matéria-paga, Ivan Hasslocher afirmou tex- tualmente: “Até agora o Govérno Federal e os deputados que tém atacado o IBAD ndo conseguiram caracterizar como crime nenhuma de nossas atividades”. Ivan assemelha-se, no seu raciocinio, ao célebre AL CAPONE. O famoso gangster matou, roubou e desafiou o Govérno norte-americano, sem que éste conseguisse provar os seus crimes. A tinica maneira de vencer “Scarface”, ainda que pareca incrivel, foi pegd-lo por sonegagao do impésto sdébre a renda. Noutro tépico, da mesma matéria paga, Ivan desafia o Executivo, o Legislativo e o Judicidrio, afirmando que nao dira a origem do dinheiro, embora saiba que isso con- traria frontalmente o artigo 145 do cédigo eleitoral. Mas, adiante Ivan escreve, ou alguém escreve por Ivan: “Se houver alguém neste Brasil que, de boa fé,. dé crédito & caltinia langada contra o IBAD e a ADEP, sébre o financiamento estrangeiro...” E a declaragio do Rui Gomes de Almeida, um dos lideres de nossas classes produtoras, afirmando que em- présas brasileiras nfo estariam capacitadas a fornecer t&o vultosas quantias a um sé individuo? E as declara- g6es na CPI do ex-Deputado Castilho Cabral, afirmando que conhece tédas as grandes fortunas do Rio e de Sao Paulo, nao tendo noticias de que nenhuma delas tenha for- necido dinheiro ao Ivan? E os depésitos de milhées de cru- zeiros, nas contas da “Promotion”, sempre acompanhados 69 de quebradinhos (20, 30 ou 40 centavos), significando cla- ramente conversio cambial? No documento que publico, Ivan se arreceia de per- der o que éle chama “nosso dinheiro”. Nesse ponto Ivan tem raziio. Os grupos estrangeiros deram-lhe o dinheiro. Passou a ser déle o numerdrio todo. Esses grupos nio querem encrenca com as autoridades dos outros paises. Nao lhes convém aparecer, N&o pedem e nao dio recibo quando entregam dinheiro aos seus “agentes” para acdes subversivas. S6 medidas enérgicas da nova CPI ou do Govérno Fe- deral, junto aos Bancos do Canada, de Boston e outros, pedindo o nome dos depositantes da conta “Promotion”, poderé esclarecer o assunto, Fora disso, é chover no mo- Ihado. Ivan continuaré mentindo através de sua farta matéria-paga. Lampréia continuaraé a circular pelos cor- redores do Congresso, batendo na barriga dos deputados ibadianos. E Frutuoso, por certo, continuaré desfrutan- do as benesses do misterioso dinheiro, e a rir-se interior- mente de nds outros que tentamos aparar-lhe o topéte. Uma tristeza tudo isso. Pobre democracia que permite a existéncia de tais organizagédes. Se a coisa continuar como vai, Ivan aca- bard Ministro da Fazenda, Frutuoso, Chefe de Policia e o engomado Lampréia, Ministro da Relacées Exteriores. E os deputados que combatem essa corrupcio téda? Esses acabarao na cadeia como “comunistas”, se nao forem para o “paredén”, por crime de “alta traigio” & Patria. E viva o nosso Brasil de céu azul e aspecto varonil. Os documentos que possuo eu os levei para a tribuna da Camara e os entregarei & nova CPI. Mas, antes de ter- ~ minar, quero mandar um recado para Ivan: — Nas vésperas das tltimas eleigées, realizadas em 1962, Ivan deu entrevista a um vespertino prometendo-me um automével se eu provasse que a sua organizagao era nazi-fascista. E a minha resposta.a Ivan é 0 Decreto do Govérno Federal fechando o seu IBAD e as suas ADEPS. Fle que nunca mais caia na asneira de oferecer automével a 70 deputados que se prezem e muito menos a homens como eu. E se fundar outros IBADS e ADEPS disfarcados com outras siglas, sempre me encontrara pela frente, ainda que isso me custe a s6érdida e brutal campanha da sua poderosa imprensa. Haja o que houver, eu nao largarei ésse agente internacional enquanto nao o tiver destruido. 1 IX — Uma Luta Sem Trégua INHA LUTA parlamentar contra 0 IBAD, suas siglas associadas e seus métodos de agao politica, foi in- cansavel. Denunciei essas estranhas entidades e os res- pectivos dirigentes, dissequei as taticas subversivas em- pregadas, falei dos estranhos bilhdes que a voragem ‘“‘an- ticomunista” consumiu. As réplicas, por estranho que possa parecer, eu quase nunca as ouvi da tribuna da Ca- mara — encontrei-as nas paginas daquela imprensa ma- treira e cobigosa, insistente na autodefinic¢ao como demo- erata, que de imediato transformou a conspirac&o di: gida pelo escroque Ivan Hasslocher em industria da ma- téria-paga, em caudal financeiro das “reciprocidades ideo- légicas”, em desavergonhado toma-cé-da-la de interésses e consciéncias, . Para que o leitor sinta em profundidade o sentido da verdadeira batalha parlamentar por mim desfechada-con- tra o cancer ibadiano instalado no Pais, transcrevo, a se- guir, o diseurso que pronunciei na Camara, a 28 de setem- bro passado. “Sr. Presidente e Srs, Deputados. Acabo de ouvir com a maxima atencao as palavras do jovem Deputado que me precedeu na tribuna. E, se S. Exa. me der a honra de ler alguns dos meus discursos na legislatura passada, e ainda nesta legislatura, perceberd que os nossos pontos- de-vista sio idénticos. Cheguei a um ponto da minha vida parlamentar em que niéo mais acredito em siglas parti- darias... cheguei a um ponto em que o desestimulo da 72 tribuna j4 me invadiu o espirito. Vejo o Congresso nuni processo de autoflagelacio; vejo éste Pais entrar no cam- po da passionalidade; vejo os homens colocarem, & mar- gem do raciocinio, a ponderagdo, o bom-senso, a sutileza ea malicia politicas, tio caracteristicos dos que ocupam assentos nesta Casa, para se entregarem a uma desvai- rada paixdo por grupos que estao corrompendo éste Pais, por Areas que estio desmoralizando esta Democracia, por setores que estio enfraquecendo éste Congresso, a tal ponto, que ndo sei o que nos estaré reservado no dia de amanhi. O Congresso, tornando-se abilico, dé-nos a im- pressao de que nao reage mais. Nos meus peniltimo e til- timo discursos usei a expressio “estado de multidao” para éste Pais, prevendo os motins, prevendo as revoltas, prevendo tudo que ai esté. Realmente, Srs. Deputados, neste Pais, 86 um org&o pode salvar a Democracia: — é o Congresso Nacional, Se o Congresso nfo reagir, se o Congressq no se capacitar da gravidade da hora que atra- vessamos, se 0 Congresso nfo colocar a parte as questitn- culas pessoais, as idiossincrasias partidérias, o Congres- so, muito breve, deixard de funcionar, porque esta se automutilando, e acabard inerme, anddino e incapaz. “Tomei parte, Srs. Deputados, na Comissio Parla- mentar de Inquérito para apurar a acdo politica e a ori- gem dos dinheiros de uma das organizagées mais estra~ nhas e misteriosas que ja apareceram neste Pais, orga- nizacio tao estranha e tao misteriosa que os seus respon- saveis contrataram os maiores advogados do Pais para que, através de mandados, através da Justica, seja negada a Comissio Parlamentar a origem désses bilhdes e bilhdes que foram espalhados por todo 0 Brasil, para corromper, para trazer a éste Congresso elementos que serviriam ao interésse de grupos que ainda nao estado caracterizados, Se ésses bilhdes tivessem sido entregues a uma pléiade de homens de tradig&o, a politicos de renome, a jornalistas famogos, a advogados experimentados, ainda haveria uma logica para ésse tipo de corrup¢io. Mas entregaram mis- teriosos bilhdes a um escroque, que se chama IVAN HAS- 3 SLOCHER, E digo escroque porque, no depoimento do ex- deputado CASTILHO CABRAL, disse aquéle ex-parlamentar que ésse mesmo Ivan compareceu & sua casa, 4 época das eleicgdes presidenciais, com um documento que provava um acérdo entre o Partido Comunista e o PTB, para eleicio do marechal Lott. “Prudentemente, Castilho Cabral procurou verificar a autenticidade da assinatura, porque se tratava de um documento de alta gravidade, e constatou facilmente que a mesma era falsa — documento forjado pelo Sr. Ivan Hasslocher, no seu laboratério “anticomunista”. “Essa rendosa industria féz com que ésse ilustre des- conhecido pudesse movimentar, em apenas 3 meses, numa de suas contas no Banco do Canad4, antes das eleigées, a quantia de um bilhdo 380 milhGes de cruzeiros. “Organizou ésse homem um organograma que atin- giu a todo o Pais. Disfargou-o sob a capa de duas enti- dades que criou, o Instituto Brasileiro de Acéo Democra- tica (IBAD) e a Acio Democratica Popular (ADEP). Por tras delas utilizou uma suposta agéncia de publicidade, de nome Promotion, que é o bai de ouro dessa quadrilha da Democracia. “Tenho, Srs. Deputados, nesta pasta, os documentos mais estarrecedores, e os entregarei aos novos membros da Comissio Parlamentar de Inquérito que iré apurar as origens désse dinheiro. Mas o curioso, Srs. Deputados, é que poucos talvez estejam entendendo que o Brasil faz parte do sistema pan-americano € que o campo fértil, na América Latina, nado é para a implantag&o do regime co- munista, porque seria a queda de todo um sistema que nio pode quebrar facilmente. Mas é campo fertilissimo para ésses aventureiros da democracia, campo tao fértil que, no momento, oito ditaduras degradam oito paises da América Latina, e nao sio ditaduras comunistas. Cam- po fértil porque essa gente sabe, técnicamente, como ex- plorar a sensibilidade popular, como colocar em panico as classes produtoras, como desnortear as elites, e quem acompanhou a histéria do nazismo e leu “Ascensdo e Que- 74

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