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Raniero Cantalamessa
Na verdade, a pureza de coração não indica, no pensamento de Cristo, uma virtude particular,
mas uma qualidade que deve acompanhar todas as virtudes, a fim de que elas sejam de verdade
virtudes e não, ao contrário, «esplêndidos vícios». Seu contrário mais directo não é a impureza,
mas a hipocrisia. Um pouco de exegese e de história nos ajudará a compreender melhor.
O que Jesus entende por «pureza de coração» se deduz claramente do contexto do Sermão da
Montanha. Segundo o Evangelho, o que decide a pureza ou impureza de uma acção -- seja esta a
esmola, o jejum ou a oração -- é a intenção: isto é, se realizada para ser vistos pelos homens ou
por agradar a Deus:
«Quando dês esmola, não vai tocando trompete adiante como fazem os hipócritas nas sinagogas e
pelas ruas, com o fim de ser honrado pelos homens; em verdade vos digo que já recebem seu
pagamento. Tu, ao contrário, quando dês esmola, que não saiba tua mão esquerda o que faz tua
direita, assim tua esmola ficará em segredo; e teu Pai, que vê no segredo, te recompensará.» (Mt
6, 2-6)
A hipocrisia é o pecado denunciado com mais força por Deus ao longo de toda a Bíblia e o motivo
é claro. Com ela o homem rebaixa Deus, coloca-o no segundo lugar, situando no primeiro as
criaturas, o público. «O homem olha a aparência, o Senhor vê o coração» (1 Salmo 16, 7):
cultivar a aparência mais que o coração significa dar mais importância ao homem que a Deus.
A hipocrisia é, portanto, essencialmente, falta de fé; mas é também falta de caridade para com o
próximo, no sentido de que tende a reduzir as pessoas a admiradores. Não lhes reconhece uma
dignidade própria, mas as vê só em função da própria imagem.
O juízo de Cristo sobre a hipocrisia não tem volta de folha: Receperunt mercedem suam: já
receberam sua recompensa! Uma recompensa, também, ilusória até no plano humano, porque a
glória, sabemos, foge de quem a segue e segue a quem foge dela.
Ajudam a entender o sentido da bem-aventurança dos limpos de coração também as palavras que
Jesus pronuncia com relação aos escribas e fariseus, todas centradas na oposição entre «o de
dentro» e «o de fora», o interior e o exterior do homem:
«Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, pois sois semelhantes a sepulcros caiados, que por fora
parecem bonitos mas por dentro estão cheios de ossos de mortos e de toda imundice! Assim
também vós, por fora pareceis justos ante os homens, mas por dentro estais cheios de hipocrisia
e iniqüidade» (Mt 23, 27-28).
A revolução levada a cabo neste campo por Jesus é de um alcance incalculável. Antes d’Ele,
exceto alguma rara alusão nos profetas e nos salmos (Salmo 24, 3: «Quem subirá ao monte do
Senhor? Quem tem mãos inocentes e coração puro»), a pureza se entendia em sentido ritual e
cultural; consistia em manter-se afastado de coisas, animais, pessoas ou lugares considerados
capazes de contagiar negativamente e de separar da santidade de Deus. Sobretudo aquilo que
está ligado ao nascimento, à morte, à alimentação e à sexualidade entra neste âmbito. Em formas
ou com pressupostos diferentes, o mesmo ocorria em outras religiões, fora da Bíblia.
Jesus elimina todos estes tabus. Antes de tudo, com os gestos que realiza: come com os
pecadores, toca aos leprosos, frequenta os pagãos: todas coisas consideradas altamente
contaminadoras: depois, com os ensinamentos que ministra. A solenidade com a qual introduz seu
discurso sobre o puro e o impuro permite entender quão consciente Ele era mesmo da novidade
de seu ensinamento.
«Chamou outra vez as pessoas e lhes disse: ‘Ouvi-me todos e entendei. Nada há fora do homem
que, entrando nele, possa contaminá-lo; mas o que sai do homem, isso é o que contamina o
homem... Porque de dentro do coração dos homens saem as intenções más: fornicações, roubos,
assassinatos, adultérios, avarezas, maldades, fraude, libertinagem, inveja, injúria, insolência,
insensatez. Todas estas perversidades saem de dentro e contaminam o homem”» (Mc 7, 14-15.
21-23).
«Assim declarava puros todos os alimentos», observa quase com estupor o evangelista (Mc 7, 19).
Contra a tentativa de alguns judeo-cristãos de restabelecer a distinção entre puro e impuro nos
alimentos e em outros sectores da vida, a Igreja apostólica afirmará com força: «Tudo é puro para
quem é puro», omnia munda mundis (Tt 1, 15; Rm 14, 20).
Por quanto se disse, parece claro que o puro de coração por excelência é o próprio Jesus. D’Ele
seus próprios adversários se vêem obrigados a dizer: «Sabemos que és veraz e que não te
importas por ninguém, porque não olhas a condição das pessoas, mas ensinas com franqueza o
caminho de Deus» (Mc 12, 14). Jesus podia dizer de si: «Eu não busco minha glória» (Jo 8, 50).
2. Um olhar à história
Na exegese dos Padres, vemos delinear-se logo as três direções fundamentais nas quais a bem-
aventurança dos puros de coração será recebida e interpretada na história da espiritualidade
cristã: a moral, a mística e a ascética. A interpretação moral põe o acento na rectidão de intenção,
a interpretação mística, na visão de Deus, a ascética, na luta contra as paixões da carne. Nós as
vemos exemplificadas, respectivamente, em Agostinho, Gregório de Nisa e João Crisóstomo.
O factor que decide a pureza ou não do coração é aqui a intenção. «Todas as nossas acções são
honestas e agradáveis na presença de Deus se as realizamos com o coração sincero, ou seja, com
a intenção voltada para o alto na finalidade do amor... Portanto, não se deve considerar tanto a
acção que se realiza, quanto a intenção com que se realiza» [2]. Este modelo interpretativo que
fala sobre a intenção permanecerá activo em toda a tradição espiritual posterior, especialmente
inaciana [3].
A interpretação mística, que tem em Gregório de Nisa seu iniciador, explica a bem-aventurança
em função da contemplação. É preciso purificar o próprio coração de todo vínculo com o mundo e
com o mal; deste modo, o coração do homem voltará a ser aquela pura e límpida imagem de
Deus que era o princípio e na própria alma, como em um espelho, a criatura poderá «ver Deus».
«Se, com um teor de vida diligente e atenta, lavas as fealdades que se depositaram em teu
coração, resplandecerá em ti a divina beleza... Contemplando-te a ti mesmo, verás em ti àquele
que é o desejo de teu coração e serás santo» [4].
Aqui o peso está todo na apódose, no fruto prometido à bem-aventurança; ter o coração limpo é o
meio; o fim é «ver Deus». Nota-se, no contexto da linguagem, uma influência da especulação de
Plotino, que se faz ainda mais descoberta em São Basílio [5].
Também esta linha interpretativa terá continuidade em toda a história sucessiva da espiritualidade
cristã que passa por São Bernardo, São Boaventura e os místicos renanos [6]. Em alguns
ambientes monásticos se acrescenta, no entanto, uma ideia nova e interessante: a da pureza
como unificação interior que se obtém desejando uma coisa só, quando esta «coisa» é Deus.
Escreve São Bernardo: «Bem-aventurados os puros de coração porque verão Deus. Como se
dissesse: purifica o coração, separa-te de tudo, sê monge, só, busca uma coisa só do Senhor e
persegue-a (Salmo 27, 4), liberta-te de tudo e verás Deus (Salmo 46, 11)» [7].
Bastante isolada está, no entanto, nos Padres e nos autores medievais, a interpretação ascéticaem
função da castidade que se converterá em predominante, dizia, desde o século XIX em diante.
Crisóstomo dá o exemplo mais claro [8]. Situando-se nesta mesma linha, o místico Ruusbroec
distingue uma castidade do espírito, uma castidade do coração e uma castidade do corpo. A bem-
aventurança evangélica se refere à castidade do coração. Ela -- escreve -- «mantém reunidos e
reforça os sentidos externos, enquanto, no interior, freia e domina os instintos brutais... Fecha o
coração às coisas terrenas e às ilusões falazes, enquanto que o abre às coisas celestiais e à
verdade» [9].
Com graus diversos de fidelidade, todas estas interpretações ortodoxas permanecem dentro do
horizonte novo da revolução aperada por Jesus, que reconduz todo discurso moral ao coração.
Paradoxalmente, os que traíram a bem-aventurança evangélica dos puros (katharoi) de coração
são precisamente os que tomaram o nome dela: os cátaros com todos os movimentos afins que
lhes precederam e seguiram na história do cristianismo. Estes caem na categoria dos que fazem a
pureza consistir em estar separados, ritual e socialmente, de pessoas e coisas julgadas em si
mesmas impuras, em uma pureza mais exterior que interior. São os herdeiros do radicalismo
sectário dos fariseus e dos essênios, mais que do Evangelho de Cristo.
3. A hipocrisia leiga
Vimos que no pensamento de Cristo, a pureza de coração não se opõe primariamente à impureza,
mas à hipocrisia, e a hipocrisia é o vício humano talvez mais difundido e menos confessado.
Existem hipocrisias individuais e hipocrisias colectivas.
O homem -- escreveu Pascal -- tem duas vidas: uma é a vida autêntica, a outra é a vida
imaginária que vive na opinião, sua ou das pessoas. Trabalhamos sem descanso para enfeitar e
conservar nosso ser imaginário e descuidamos o verdadeiro. Se possuímos alguma virtude ou
mérito, corremos para dá-lo a conhecer, de uma forma ou de outra, para enriquecer de tal virtude
o nosso ser imaginário, dispostos até a tirá-lo de nós, para acrescentar algo a ele, até consentir,
às vezes, em ser covardes, com tal de parecer valentes e dar até a vida, para que as pessoas
falem disso [10].
A tendência evidenciada por Pascal cresceu enormemente na cultura actual, dominada pelos meios
de comunicação massivos, cinema, televisão e mundo do espectáculo em geral. Descartes disse:
«Cogito, ergo sum», penso, logo existo; mas hoje se tende a substituí-lo com «aparento, logo
existo».
A origem do termo nos dá as dicas para descobrir a natureza da hipocrisia. É fazer da vida um
teatro, no qual se recita para um público; é usar uma máscara, deixar de ser pessoa e passar a
ser personagem. Eu li em algum lugar esta caracterização das duas coisas: «O personagem não é
senão a corrupção da pessoa. A pessoa é um rosto, o personagem, uma careta. A pessoa é a
nudez radical, o personagem é todo roupagem. A pessoa ama a autenticidade e a essencialidade,
o personagem vive de ficção e de artifícios. A pessoa obedece às próprias convicções, o
personagem obedece a um roteiro. A pessoa é humilde e suave, o personagem é pesado e
ostentoso».
Mas a ficção teatral é uma hipocrisia inocente porque mantém sempre a diferença entre o cenário
e a vida. Ninguém que assiste a representação de Agamenon (é o exemplo citado por Agostinho)
pensa que o actor seja de verdade Agamenon. O fato novo e inquietante de hoje é que se tende a
anular também esta distância, transformando a própria vida em um espectáculo. É o que
pretendem os chamados «reality show» que inundam já redes televisivas de todo o mundo.
Segundo o filósofo francês Jean Baudrillard, falecido há três dias, tornou-se difícil distinguir os
acontecimentos reais (11-S, ou a guerra do Golfo) de sua representação pelos meios. Realidade e
virtualidade se confundem.
Parece um comentário à fala de São Francisco de Assis: «O que o homem é ante Deus, isso é, e
nada mais» [12].
4. A hipocrisia religiosa
A pior coisa que se pode fazer, falando de hipocrisia, é utiliza-la somente para julgar os outros, a
sociedade, a cultura, o mundo. É justamente a esses a quem Jesus aplica o título de hipócritas:
«Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho e assim verás para tirar a palha do olho do teu irmão»
(Mt 7, 5).
Como crentes, devemos recordar a fala de um rabino judeu do tempo de Cristo, segundo o qual
90% da hipocrisia do mundo se encontrava então em Jerusalém [13]. O mártir Santo Inácio de
Antioquia sentia a necessidade de prevenir seus irmãos na fé, escrevendo: «É melhor ser cristãos
sem dizê-lo, que dizê-lo sem sê-lo».
A hipocrisia afeta sobretudo as pessoas piedosas e religiosas; o motivo é simples: onde mais forte
é a estima dos valores do espírito, da piedade e da virtude (ou da ortodoxia!), aí também é mais
forte a tentação de ostentá-los para não parecer que se está faltando a isso. Às vezes, é a própria
função que desempenhamos o que nos empurra a fazê-lo.
«Certos compromissos do consórcio humano -- escreve Santo Agostinho nas Confissões -- nos
obrigam a fazer-nos amar e temer pelos homens; portanto, o adversário de nossa verdadeira
felicidade persegue e dissemina por todas as partes os laços do ‘Bravo, bravo’, para prender-nos
por trás enquanto os recolhemos com avidez, a fim de separar nossa alegria de vossa verdade e
uni-la à mentira dos homens, para fazer-nos saborear o amor e o temor não obtidos em vosso
nome, mas em vosso lugar.» [15]
Um dia, a leitura do Evangelho da Missa era a parábola dos talentos. Escutando-o, entendi
imediatamente uma coisa. Entre fazer render os talentos ou não, existe uma terceira
possibilidade: a de colocá-los para renderem, sim, mas não por si mesmos, não pelo dono, mas
pela própria glória ou pelo proveito pessoal, e isso é um pecado talvez maior que enterrá-los.
Aquele dia, no momento da comunhão, tive de fazer como certos ladrões flagrados no momento
do roubo, que, cheios de vergonha, esvaziam os bolsos e colocam nos pés do proprietário o que
lhe haviam roubado.
Jesus nos deixou um meio simples e insuperável para retificar várias vezes no dia as nossas
intenções, as primeiras três petições do Pai Nosso: «Santificado seja o vosso nome. Venha a nós o
vosso Reino. Seja feita a vossa vontade». Elas podem ser recitadas como orações, mas também
como declaração de intenções: tudo o que faço, quero fazê-lo para que o vosso nome seja
santificado, para que venha o vosso Reino e para que vossa vontade seja feita.
Seria uma belíssima contribuição para a sociedade e para a comunidade cristã se a bem-
aventurança dos puros de coração nos ajudasse a manter desperta em nós a nostalgia de um
mundo limpo, verdadeiro, sincero, sem hipocrisia, nem religiosa nem leiga; um mundo em que as
ações correspondessem às palavras, as palavras aos pensamentos, e os pensamentos do homem
aos de Deus. Isso não acontecerá plenamente senão na Jerusalém celeste, toda de cristal, mas
devemos pelo menos tender a isso.
Uma escritora de fábulas redigiu «O país de cristal». Fala de uma jovem que termina, por magia,
em um país todo de cristal: casas de cristal, pássaros de cristal, árvores de cristal, pessoas que se
movem como delicadas estatuetas de cristal. Apesar de tudo, ninguém ainda havia se quebrado,
porque todos aprenderam a mover-se no país com delicadeza para não causar danos. As pessoas,
ao encontrar-se, respondem às perguntas antes de que estas sejam formuladas, porque até os
pensamentos se tornaram abertos e transparentes; ninguém já busca mentir, sabendo que todos
podem ler o que se tem na cabeça [16].
Dá arrepio só de pensar o que aconteceria se isso acontecesse entre nós; mas é sadio pelo menos
tender a tal ideal. É o caminho que leva à bem-aventurança que tentamos comentar: «bem-
aventurados os puros de coração, porque verão Deus».
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[1] S. Agostinho, De sermone Domini in monte, II, 1,1 (CC 35, 92)
[2] Ib. II, 13, 45-46.
[3] Jean-François de Reims, La vraie perfection de cette vie, 2ª parte, Paris 1651, Instr. 4, p.160
s).
[4] Gregório de Nisa, De beatitudinibus, 6 (PG 44, 1272).
[5] S. Basílio, Sullo Spirito Santo, IX,23; XXII,53 (PG 32, 109.168).
[6] Cf. Michel Dupuy, Pureté, purification, in DSpir. 12, coll,2637-2645.
[7] S. Bernardo de Claraval, Sententiae, III, 2 (S. Bernardi Opera, ed. J. Leclerq – H. M. Rochais).
[8] S. João Crisóstomo, Homiliae in Mattheum, 15,4.
[9] Giovanni Ruusboec, Lo splendore delle nozze spirituali, Roma, Città Nuova 1992, pp.72 s.
[10] Cf. B. Pascal, Pensieri, 147 Br.
[11] S. Agostinho, De sermone Domini in monte, 2,5 (CC 35, p. 95).
[12] S. Francisco de Assis, Ammonizioni, 19 (Fonti Francescane, n.169).
[13] Cf. Strack-Billerbeck, I, 718.
[14] S. Igácio de Antioquia, Efesini 15,1 («È meglio non dire ed essere che dire e non essere»: «É
melhor não dizer e ser, que dizer e não ser») y Magnesiani, 4 («Bisogna non solo dirsi cristiani,
ma esserlo»: «É necessário não somente dizer-se cristãos, mas sê-lo»).
[15] Cf. S. Agostinho, Confessioni, X, 36, 59.
[16] Lauretta, Il bosco dei lillà, Ancora, Milão, 2° ed. 1994, pp. 90 ss.
Ter o coração puro é não dar abrigo a paixões inferiores, tais como: o
ódio, a inveja, o orgulho, a maledicência,... As paixões inferiores turvam a visão
espiritual.
A palavra "coração" indica a que espécie de pureza Jesus está se referindo. Davi orou a Deus
dizendo: "Cria em mim, Senhor, um coração puro e renova dentro de mim um espírito
inabalável".
No contexto das bem-aventuranças, contudo, "pureza de coração" não está limitada apenas a
vida íntima e moral das pessoas, mas, também, à nossa maneira de nos relacionarmos uns
com os outros.
Um estudioso da Bíblia define os "limpos - ou puros - de coração" como aqueles que são
íntegros e que estão livres da tirania de um "eu" dividido. Usando a expressão do salmista, no
Salmo 24.4, diríamos que uma pessoa "pura de coração" é correcta no agir e limpo no pensar.
Mas, como lembro John Stott, "somos tentando a usar uma máscara diferente e a representar
um papel diferente, de acordo com cada ocasião. Esta representação é a essência da
hipocrisia".
A integridade é um dos mais preciosos bens que alguém pode ter. Perdê-la por causa de
necessidades ou pressões é assinar um atestado de indignidade humana e espiritual.
É sobre integridade que Jesus está falando nesta bem-aventurança. O dicionário diz que a
palavra integridade vem do latim "integritas" e quer dizer "inteireza física", "inteireza moral",
"retidão". A raiz desta palavra significa "inteiro", "completo", "prefeito".
Uma pessoa íntegra é inteira, não é dividida, ou seja, não tem dupla personalidade. Dupla
personalidade é coisa de gente esquizofrênica. Uma pessoa íntegra não é uma coisa aqui e
outra ali; não é uma pessoa em público e outra em particular; não é alguém na presença e
outra na ausência. Não é uma pessoa em casa e outra na rua. Não é um indivíduo na igreja e
outro no mundo.
Warren Wiersbe diz que a integridade envolve toda a pessoa interior: o coração, a mente e a
vontade. Sendo assim, uma pessoa íntegra possui três características básicas:
1. Tem um coração honesto. Não tenta amar a Deus e ao mundo ao mesmo tempo. Seu
coração está em Deus e ponto final.
2. Tem uma mente honesta. Isto é, discerne o certo do errado e não tenta fazer nada para
alternar um com o outro.
3. Tem uma vontade honesta. Ao discernir o certo do errado escolhe o que certo, sem
melodramas ou arrependimentos. Escolhe por ter uma vontade honesta.
4. Tem uma visão honesta. Uma pessoa íntegra jamais confundirá as trevas com a luz. Há
muita gente por aí desobedecendo à Palavra de Deus, seja através de jugo desigual com os
incrédulos, ou do exercício desonesto de suas profissões, usando a desculpa de que o
propósito de seus corações é espiritual. Para estes eu deixo Gálatas 6.7:
O que acontecerá aos que buscarem ter um coração puro? "Eles verão a Deus".
A Idéia aqui de ver Deus, não está se relacionando diretamente com a visão física, mas com o
conhecimento e as experiências que obtemos com Deus, quando buscamos viver uma vida de
obediência a Ele.
No Comentário Bíblico da Ed. Mundo Cristão, nós podemos ler as seguintes sentenças acerca
desta bem-aventurança:
"Os limpos de coração são os íntegros, livres da tirania do "eu" dividido, e que não ficam
tentando servir a Deus e ao mundo ao mesmo tempo. Destes é impossível que Deus se
esconda".
Você pode dizer hoje que é uma pessoa íntegra? Você é por dentro aquilo que realmente
demonstra ser por fora?
Conclusão
Se a sua resposta é: "não, não sou", você precisa permitir que Deus reverta esta sua situação
hoje mesmo. Apresente-se a Deus, confesse sua falhas... Lembre-se "felizes as pessoas que
têm o coração puro". Amém.
O Santuário de Fátima escolheu como tema central das suas actividades pastorais, litúrgicas e
formativas deste ano, o nono mandamento da Lei de Deus, segundo a formulação do catecismo
tradicional: Guardar castidade nos pensamentos e nos desejos.
A formulação bíblica do livro do Êxodo diz: “não cobiçarás a casa do teu próximo, não cobiçarás a
mulher do teu próximo, nem o seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento,
nem coisa alguma que lhe pertença”. Uma e outra formulação centram-se no coração humano,
sede de toda a personalidade moral, para exprimir a grande orientação. A frase do Evangelho
segundo S. Mateus, “os puros de coração verão a Deus”, ajuda-nos a entrar no conteúdo do
mandamento de Deus e a captar os apelos de pureza do coração e da vida, que são caminho de
renovação pessoal e de abertura à sã convivência comunitária.
Ponto prévio para o acolhimento deste mandamento de Deus é a fé de que o apelo provém do
Deus da aliança, da amizade e do amor, do Deus que nos propõe caminhos de vida que nos
tornam efectivamente felizes. Para quem não conhece Deus, para quem não tem fé ou para quem
desconfia da bondade de Deus, qualquer mandamento ou preceito pode soar a exigência
despótica, a sacrifício indesejado, a atentado contra a autodeterminação humana.
Terá sentido, ainda hoje, falar de pureza de coração? A experiência de vida e de relações
existentes entre as pessoas está continuamente a demonstrar, pela negativa, as consequências da
sua ausência. Os fenómenos de desagregação familiar, consequência de infidelidades e traições,
são o melhor espelho. Se, para tirarmos esta conclusão, não bastasse a vida real que conhecemos
directa ou indirectamente,teríamos a avalanche de romances, filmes e novelas que, por outra via,
nos fazem entrar essa realidade pelos olhos dentro. Os fenómenos de fraude económica e
financeira, de pequena ou grande escala, fazem-nos duvidar da rectidão de tantas intenções,
palavras e acções, frequentemente revestidas das melhores aparências. Os fenómenos de sedução
e aliciamento, assentes nas mais bonitas promessas de felicidade a baixo custo, revelam corações
incapazes de amar e simplesmente interessados em explorar. Quantas pessoas, adolescentes e
jovens se não têm deixado cair nas teias preparadas por corações viciados e exploradores, que
através dos novos meios de comunicaçãoconseguem realizar os seus intentos! E as promessas de
trabalho em paraísos de felicidade e de dinheiro fácil que acabam em autênticos cativeiros,
lágrimas e dor, fruto de corações sem escrúpulos! O coração, com tudo o que representa, quando
se perverte, desencadeia os piores males.
Quase sempre a felicidade e pureza de coração são mais discretas. No entanto, a experiência de
vida e de relações entre as pessoas também são suficientes para demonstrar, pela positiva, o que
é e o que vale um coração puro. São grandes os homens e mulheres, pais e mães, trabalhadores,
jovens e adultos, cujo sonho é simplesmente viver de forma honesta, justa e santa. Não desejam
nada que ponha em causa o bem dos outros, não anseiam senão por dar o seu contributo para
que todos tenham pão, paz, companhia, amizade… Anseiam ver a Deus, sem dúvida, mas sempre
pela via do respeito e do amor aos irmãos.
O Santuário de Fátima procurará ainda ao longo deste ano apresentar a figura do Beato Francisco
Marto, no centenário do seu nascimento, como uma dessas figuras grandes na pureza de coração.
Extremamente atento às necessidades dos outros, por quem reza e se sacrifica; extremamente
atento a Deus, com quem tem gosto de estar e que anseia por ver.
Nisso se resumem os seus pensamentos, os seus desejos e a sua vida.