FACULDADE DE LETRAS PORTUGUS X Aluno: Ailton Magela de Assis Augusto
Matrcula: 200729001
Franjas e franjas: uma reflexo sobre A Igreja do Diabo, de Machado de Assis.
O conto A Igreja do Diabo, coligido por Machado de Assis na coletnea Histrias sem data, de 1884, ainda hoje parece confirmar a afirmao do filsofo: o homem a medida de todas as coisas. O prprio Machado diz, na advertncia da obra, que a maioria dos trabalhos nela reunidos tem data, mas que a suposio de que seu objetivo seja definir estas pginas como tratando, em substncia, de coisas que no so especialmente do dia, ou de um certo dia permite entender o ttulo que ele atribui. Ou seja, o ttulo da coletnea se justifica com o fato de tratar-se de histrias sobre coisas de todos os tempos. E que h de mais antigo no mundo, porm ainda atual, que o duelo entre o Bem e o Mal? No conto em questo, o Diabo considera a possibilidade de fundar uma Igreja que combata todas as outras doutrinas existentes, partindo da premissa de que h muitos modos de afirmar; h s um de negar tudo. Decidido, ele procura Deus e comunica desafiadoramente seu objetivo. Uma vez estabelecida, a nova igreja arrebata todos os fiis de suas rivais com uma pregao que os incita prtica dos chamados pecados capitais: gula, inveja, avareza... O grande problema que, depois de algum tempo, a quantidade de adeptos entra a diminuir. Sem refletir, comparar e concluir do espetculo presente alguma coisa anloga ao passado; Lcifer retorna presena do Criador para question-lo sobre o porqu desse acontecimento. O Altssimo calmamente lhe explica que a eterna contradio humana a responsvel pelo fenmeno.
Esta contradio costuma ser explorada com freqncia nos escritos
machadianos, como no conto Entre santos, publicado no volume Vrias Histrias. Neste outro texto, um dos santos (Francisco de Sales) afirma: Os homens no so piores do que eram em outros sculos; descontemos o que h neles ruim, e ficar muita cousa boa. Quer nos parecer que esta relativizao das certezas, to destoante do cientificismo do sculo XIX, esta considerao da volubilidade do carter do ser humano, perceptvel nesses dois textos em que o autor se apropria de personagens da seara da religio, constitui ponto de particular interesse mesmo agora. Neste incio de sculo XXI, quando o fundamentalismo religioso e ideolgico quase sempre nos encaminha para a intolerncia e a luta armada, talvez seja oportuno reler Machado de Assis. Se h franjas e franjas, por que esperar tanto do ser humano?