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Resenha sobre o livro “Jamais Fomos Modernos”, com énfase nos capitulos 4 e 5 Por Nathalia Ronfini de Almeida Lima Em “Jamais Fomos Modemos”, Bruno Latour pée em cheque o conceito de modemidade e declara que tanto a culpa como o sentimento de superioridade do homem que se entende como modemo (ocidental) so, por isso, equivocadas. Por meio da desmistificaro da diviséo rigida entre humanos ¢ néo humanos, entre o que é natural ¢ o que é cultural, o autor mostra que a modemidade ¢ uma fabula e que o mundo nunca deixou de ser um fluxo continuo entre as coisas ¢ as pessoas, entre politica e ciéncia Para entender ailuséo sobre a modemidade, cabe entender a purificapfo, que se trata do processo separarao entre esses pélos. A unido desses elementos, entendidos como opostos, gera os hibridos - quase-sujeitos e quase-objetos - como a bomba de vacuo, a bomba atémica 0 cédigo genético, a AIDS, através da tradugao Purificago ¢ tradupao podem parecer conceitos antitéticos, ¢ 0 sé, de acordo com a Constituigo Moderna”. Entretanto, esses processos também se complementam, pois para se entender que um elemento ¢ parte social e parte cultural, antes ¢ preciso enxergar cada uma desses polos. Purificé-los para toma-los hibridos Seguindo 0 raciocinio de Latour, é possivel concluir que a purificardo ¢ dispositive de entendimento do real que coloca o homem numa posigao superior diante da natureza, Entender 0 meio ambiente com um fator extemo e inferior aos humanos permite primeiro que se cause danos desmedidos e depois que se trate com descaso a urgéncia de se conter os desequilibrios gerados pela apo antrépica ‘Nas pesquisas académicas, a viséo modema tambem traz prejuizos, 4 que separa as questdes sécio-politicas das ciéncias puras, impedindo a interdisciplinaridade. Assim, pesquisas em nanotecnologia sdo feitas sem que se entendam seus efeitos politicos e sociais possivelmente gerados, ¢ estudos sobre o comportamento humano ainda séo produzidos sem que se pense em na possivel influéncia da genética sobre a personalidade de cada individuo ou até sobre a interapao coletiva ‘No campo profissional, a fragmentapéo gerada pela purificarao traz danos incontaveis. As universidades ainda formam engenheiros que constroem passarelas sem analisar por onde realmente as pessoas atravessam - ha motivos socioculturais ¢ historicos que influenciam até mesmo na escolha de uma passagem - e sem considerar os usos que séo feitos. Nem sempre a passarela é so um lugar de se levar um ponto sem que se tenha que passar por entre os carros. As vezes, as passarelas so importantes pontos de venda por exemplo. Por outro lado, ainda ha jomalistas se negando a entender que matemética € importante, pois, entre outras coisas, ela ajuda no desenvolvimento do raciocinio légico, ferramenta muito valiosa na hora de apurayo com profundidade ‘A criapfo de disciplinas, cada um em sua caixa hermeticamente fechada também gera dificuldade no aprendizado, principalmente das criangas que ainda no foram completamente docilizadas. No universo dos pequenos, as coisas apenas so. Nao ha matematica, fisica, quimica, historia, geografia ou linguas, até que, numa certa idade, a escola impée a divisto de professores, dos tempos de aula e dos materiais didaticos Se antes tudo acontecia ao mesmo tempo, sem que se precise dessas etiquetas', a sala de aula passa a ter a pureza fia das coisas cirurgicamente cortadas e esterilizadas das impurezas do mundo O que toma a purificayao um processo ainda possivel de ser sustentado séo os hibridos, que criam redes entre os humanos e nao humanos e entre o cultural ¢ o natural Sem essas conexdes, seria complicado fazer funcionar na prética as disciplinas, que funcionam no maximo dentro dos laboratérios, mas que no comer da vida no se aplicam. Assim como os pequenos, Latour consegue ver a organicidade das coisas sem o olhar modemo, to cheio de fragmentarfo sobre o real. Por sua vez, a manutenso da distingéo ontologica produz a proliferapo desses hibridos Outro equivoco trazido pela modernidade é a incapacidade gerada para se fazer uma andlise antropolégica incluindo natureza, entendida como externa ao homem e fora da cultura Através do principio da simetria generalizada, seria possivel encontrar um ponto de observario privilegiado, por meio dos hibridos, entendendo assim os agrupamentos por meio dos fatores naturais e sociais. Assim, 0 antropélogo “simétrico” nfo se guiaria pela separapo criada por sua propria cultura, mas sim daria os mesmos pesos ao que a cigncia tem por “verdadeiro” e o que tem por “falso” Explicar a dinémica de uma sociedade sem analisar os fatores naturais, como as substancias contidas nos alimentos, fatores genéticos ¢ clima de certos agrupamentos poderia afastar a oportunidade de entender questées que muito provavelmente devem afetar 0 comportamento. Por outro lado, querer explicar fendmenos sociais apenas pelos fatores biolégicos e climaticos seria reduzir a andlise a apenas uma dimensdo possivel e cair no determinismo profundo. O antropélogo vai a campo com as ferramentas que ja conhece, mas perde quando dispensa as novas ferramentas que encontra em campo 1 As mies costumam encapar os livros e etiqueta-los com o nome de seus filhos ea disciplina, para que a crianga possa identificar o livro que sera usado naquele tempo mais facilmente

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