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CIENCIA&VIDA | Um mar | de siglas fears eR Sta (0) oie aura ae existéncia de uma Tar Cor Coulee le 8 Longa foi Pe RSI eM Te ECR (3 aU praticos das instituicdes i i PEt uC eU ate leh) bisa PATS UM ea ee SaaS OT) a! ——— 1 “ea Afinal, o Direitos Hu Universalidade versus fragmentag&o cultural Eles constituem uma referéncia fundamental Para a acao politica e como tal nado deixam de possuir vinculos com as condi¢gdes sociais ireitos humanos: uma das luropias mais intensas da. mo- dernidade. Definilos, porém, rio é tarefa simples. Eles abrangem uma plurlidade de significados, sentidos ¢ interprera- 6s, ito é, uma polssemia expressva das posigies dos agentes sociais © das ‘mutagSes politica softidas pela idéia de direitos humanos ao longo da historia. O tinico consenso entre seus defensores promotores é idéia de universalidade. Por ela encende-se a proposigao de que todas 2s pessoas, inclependencemente de sua condigio éenico-racial, ccondmica, individuos, considerando que todos sio detentores de direitos essenciais, incis- pensdveis & convivéncia social. Por isso, 05 dircitos humanos sao fundamentais ¢ inaliendveis, pois eles comportam os pressupostos necessirios para que todos todas possam ter uma vida digna. Por ‘isso, expressam um marco ético-politico que serve de crltica ¢ orientacéo (real e simbdlica) em relagso 2s diferentes pri- ticas sociais juridica, econdmica, educa tivaetc) na luta nunca acabada por uma ‘ordem social mais justa livre, conforme sinetiza Magencizo (1994) £ comum a referincia aos direitos humanos a partir de suas violacces. As (de Guaneinamo, Abu Ghraib, as, as brasleiras, os abusos de poder “oléncias policais. As desigualdades -aconcentracao de renda, precon- -ceitos ¢ agress6es de cunho religioso, au- ___ énciade liberdadescivise politicas ene ‘outros fatos, constituem rotinciramente 4 forma pela qual o conceito de direitos umanos ¢ revordado pelos meios de co- municacio de um modo geral. Principal cy ROBSON Dos SANTOS ‘marco internacional contemporineo des direitos humanos, a Declaracio Univer sal de 1948 foi tecida justamente apds os horrores das duas guerras mundi, des regimes toralitérios, das temtativas de ex- rerminiodos judeuse demais povoscon- sideradosinferiores, da violéncia absurca dhs bombas nucleares langadas sobre Hiroshima e Nagascki, enfim, aps gra- ves desrespeitos aos direitos humanos ‘Mas serd.queé a partir de suas violas6es, co é jusamente por sua auséncia, ¢ que 6 diretes humanos podem ser defini- dos? Somente ao serem negados & que cks sio exigidos? Essa é uma das proble- ‘atizagées colocadas & Sociologia. Constantemente, a crf vadora ans direitos humanos caracte- rira-os coma um conjunto de privilé- fos oferecidos aos criminosos e demais transgressores dos cédigos de conduea legitimados. Setores da midia € agentes politicos encampam ¢ reproduzem 0 discurso de que os direitos humans ig- nora as vitimas e se abst ‘© conjunto bom da sociedade. Osdefensores io enquadrades como apologetas de uma sociedade desprovida ses capares de ensinar a convivéncia social aos “individuos delingtientes” todos rigidos de controle, violentos, duros, 3 altura dos atos praticados por cao de corpos déccis ¢ relacies sociais harmonicas. A ordem 36 € possivel, para a visio conservadora, a partir da violencia ou de priticas antidemocré: ticas, visto que as leis sio considera- Para se compreender a idia de di reitos humanos, os paradoxos que a acompanham e os sentidos sociais que cla assume em cada contexto, é neces- {rio realizarmos uma pequena recons trucio historica de sua trajet6ria. A concepcio moderna dos direitos fhumanos € profundamente imbricada as uansformagies sovioculturas¢ fles6- cas advindas do luminisme Europes ganha forca e projecio, principalmen- te, a partir dos séculos XVII e XVIIL O Iuminismo subverte os fundamentos da dominacao a0 propor, entre outos, © impétio da razao sobre a fé, a centra- lidade do scr humano nas explicagies filossfieas. E sob esse prisma que flo resce grande parte dos fundamentos evidente que tal processo no deixa de ter conexdes com 0 campo social. A principal delas consiste em ressiltar a idéia de igualdade, politica e civil entre os seres humanos. A desigualdace, que ra naturalizada e instituconalizada durante séculos de dominagao feudal & monarquica, € gradualmente substivut- da pola busca da igualdade, mesmo gue de maneira restrita ¢ formal. Nesse contexto, a Revolucio Fran- cesa de 1789 constitui um acontecimen- (© histérico profundamente simbélico das lus s0 dade menos desigual. Liberdade, igual dade e fatemidade, seus lemas odlebres, ais em prol de uma socie influenciaram e foram. influenciados, cm certa medida, pelos fandamentos da nogao original dos direitos humans, Um. dos principais “produros” da Revolugio foi a Declaragio de Dineitos do Homem © do Cidadio, vouda pda Assembléia Nacional Constituinte francesa, em 26de agosio de 1789. Elaé um marco relevante na construgio de uma nogio de igualda- de, principalmente vile politica NO SECULO XIX, as duas principais rnis e socialistas, de formas opostas, concentram suas reivindicagées. por direitos baseados, principalmente, na nogio de igualdade. Se para os libe- nais ela concentrava-se (e concentra: se) na esfera dos direitos civis ¢ po- liticos, para os socialistas a igualdade ndo deixaria de ser uma quimera en quanto nao fosse possive a igualdade XIX, a formagio dos grandes centros urbano-industriais da Europa se as. sentou sobre a exploragio da méo-de- obra operiria. Nesse contexto fesa dos direitos humanos se articula 3s lutas dos trab: lores que reivin dicavam inicialmente condig6es mais dignas para exercerem suas funcées. © amadurecimento das organizagoes opcritias ¢ de suas lutas ampliou 0 contetide das reivindicagées, que forma de exploracio e objetivar, con seqiientemente, uma sociedade ver dadeiramente livre ¢ igualicéria. Os direitos humanos incorporam esas dimensées na luta por justiga social E possvel afirmar que, em alguns setores da esquerda, até recentemerte, (6 direitos humanos eram considerados apenas um mecanismo pali mo conivente com o sistema capitalista hhumaros apart de suas vilcoes. Arovoacdo de trtiras humihantes nis (oto) fram noteia terraciona ¢ efetivar a igualdade social. Karl Mars em A questo judaica, wexto de 1844, ji apontavaos limites da busca pela eman cipagio social somente a partir da lute por direitos civise politicos, isto é pela igualdade formal. Porém, nos. paises do chamado socialismo real conscata sea auséncia de uma preocupagao em politicos, como o sufrigio univers 0 pluralismo de partidos, liberdade imprensa, o que comprometee limita, por sua ver, es conquistas da igualdade social. Tal debate indic impossibi lidade de pensar os direitos himanos como uma realizacao parcial, indepen dente do sistema politico E evidente que a moderna con: cepgao dos dircicos humanos nfo se 0. Eles so extremamente atrelados is condi tuacdo encontra-se em permanente processo de incorporacio de signif cados, numa complexa dindmica en trea woria ea pritica Os séculos XVII, XVIII ¢ XIX ofereceram grande parte dos con teitdos © dos paradigmas com os Gubisfes) ditcicis:husancsifevam pensados © debaridos no sécule XX, considerados para alguns au rores, como Notherto Babhio, a era dos direitos, incluindo os huma nos. Em tal contexto, A Declaracao Universal de 1948 constitui uma das referéncias mais importantes em termos de pactuagio internacio: nal sobre os direitos humanos. El reafirma 0 compromisso politico ¢ social entre determinados Estados nacionais de que garantiriam em seus territérios ¢ na relagio com os demais, a promocio ea defesa dos direitos humanos como valores fun: damentais da democracia E evidente que a Declaracao Uni- versal dos Direitos Humanes néo constitu um documento desprovido de vinculos com as condigées sociais gue a produziram e com as disputas Je poder global de entao, A concepgaio modema dos direitos humanos € imbricada as transformagoes socioculturais e floséficas do lluminismo Europeu No comtexto de emergéncia da Guerra Pria, isto & de conflitos entre 0 comunismo € capitalismo, © conresido do artigo XVII da Declarigio denota a opcio por uma das formas le organiza do socivecondmica, no caso 4 capitals: ta: “, Tao er bumano tem dircto pro priedade, #6 ou em sciedade com outra 2. Ninguém serdarbitrariamenteprivado de sua propriedade”. Isso nao indica, po rém, que a Declaragao seja apenas um acordo entre os Estados capitaistas de centao. Pelo contritio, sugere em seus divensos parigrafos uma incorporayio, por parte destes Estados, dos modelos pelos paises socialists e cada ver mais necessiris frente &s formas le desigual dade produridas pelos paises assentados sobre @ economia de mo indica 0 fortalecimento. do chamado Fstado de bem-estar social. F constante a percepgao de que apés a Dedlaragao de 1948 os direitos hum: uma fregiiéncia ainda maior Contudo, pparimetto miinimo de jalgimento, sam indicador de monitoramento. das viol Mlarcos internacionais e nacionais de Direitos Humanos 1994 eae Dr en ee oe cca ty) 4omem e do Cidadao ay ee aes Neen acy Desa pee eas Cera Cate) 1949 eee ey Seer ae eed ati Pee ee ok cue fecnere Cees co 2002 Diet tata ie PL} Coenen 0 ST Ra Phau Cae eee te ea fee ea 1951 - Convencgao relativa 20 Esta- Peres 1956 - Convangao Complementar sobre Aboligao da Esoravidao 1965 — Cornvergéo scbre a Ell- Geren eens ere eee ences Eee ee mas perro eee eee es Peter bt: een eae Pee eee eee ert er ry ear eee ROLY Pranic Gee ee eect ot Ble eect 1989 - Convenedo sobre os Prete ter cr Serer ee Eee aera Programa Nac Bop etal erences eas bes e de controle social dos is rratados lobar formas do Seguiram-se diversos acordos intemacionais que buscavam en os miiltiplos contctidos hhumanos. Tas acordos foram incorporados de maneiras variadas pelos signatitios, pos o grau ce promo- ‘Go e garantia dos direitos humanos nos de de pressio, mobilizasio da sociedade ede sts organiragies, enfim, da solider sociocultural ¢ institucional da demo- cracia em cada pas A POLITICA que predominou du- rante a Guerra Fria deixou sua marca idade dos direitos. humanes. Desde a Declaracto Universal, elesapre na histo sentam uma separagio que compromete aracteristicas, « indivisibilidade, isto, impossibilidade de reali-les parcial- mente, De um lado, estio os direitos ¢- vis politicos cuja caracterstica centtal a “exigibilidade irmedtiata” ce que predo- minaram na Declaragao de 1948 como bandeira priortiria dos paises capital democrat tas de regime liber © outro “conjunco” de direitos hu- sla > dk forma paises s¢ restrita na Declaragio Universal de 194 porad a On das Nagoes Unidas (ONU) em 1966 a partir do Pacto Internacional de Direi- bandeira priorizada pelo bl alistas, esl presente Foram inc tos Bex his dire scans jusidico, com a fSrmula politica micos, Sociais e Culturais os foram enquacirados em outro smitindo alizagio progressiva Slaoigs asim que sta aplicacio néo fose cons derada eadocada deforma imediats, su pondo que tas direitos requerem trans formasées sociais préviss. lo permitiu, desde que postergam iene die'sua aplicacio. Diance disso, os governos da maic ria dos paises ac direitos ¢ postergando a realizacio dos outros para um frruro nunca definid Tal situagao explicita 0 caréter histbrico dos direitos humans, evidenciando sua dinamica com os conflitos de poder ¢ os vinculos sociais e politicos a partir dos quis eles sio construides. Para fins didaticos e nao em oposi io ao seu principio estrurural de indi visibilidade — isto é, da impossbilidade de serem realizados pl humanos sio_subdividides.historica mente por analista e milicantes em trés geragbes, que denotam as etapas hist rico-sociais da sua construcdo, sempre em processo de incorporacio de novas dimensoes e de complexizacao. A primeira geracto engloba os dire tos civ € politions e se articula as ideas liberais da democracia, comsolidadas no. século XIX. A segunda rclaciona-se aos 20 mundo do trabalho. por iso se vin cula is Tatas dos trabalhadores, ressa: tando sempre o ideal da igualdades ela expressaa defesa de um Estado de bem: estar social que gana forca nas décadas posteriores& Segunda Guerra A tereina geracio se refere 20 di reéito de autedeterminagio dos povos « incorporando-se as preocupacoes que ganham espago no conjunto des movi mentos sociais e de muitos Estados na: tikimas décadas do século XX e inicio do XXI. A incosporacio de tais dimensGes 20s direitos humanos, longe de dividi los, sugere a amplitude que eles ganham 20 longo do processo socal. Sua realiza ransfommnagoes A conceituacao dos direitos humanos encontra-se em permanente processo de incorporagao de significados Os des fies contemporaineos que os dircitos humanos colocam ao campo so: 20 possuem obviamente aspectos variados. A reflexio socioligica depara- pensir a nocio de tiniversalidade, que caracteriza os direitos humanos, frente a tum contesto trio emetodoldgico que disso. i ee poeeeeressionmpeerr tern] hugo de qualquer sujeito ou conceito universal? A diversidade, as diferencas, a akeridads, os regionalismos socisis ¢ culturais disolvem o fundamento universal dos direitos humanos, ou exigem a ressignificagio do conceito? Se cada organizagio e/ow sistema de relagoes culturais p intrinsecas © legitimas, como ficam reivindicagées € 08 julgamentos do quesio violagées ans direitos humanos diante do relativismo sociocultural? Em num contexto de globalizagio neoliberal, de aprofundamento de todas 2s formas de exclusio ¢ da imposigao dos interesses econdmicos pelo poder das armas, como distinguir no discurso da liberdade civil ¢ politica uma verdadei ra defesa dos direitos humanos, ou uma meri apropriagio dos ideais com fins econdmicos e imperialistas? Essas sio mas das indagagées com as quiais se depara a reflexao sociolégica sobre ¢s dircitos humanos, s¢ja no contexto nacional ou internacional, ou lacal e global como preferen Enfrenté-las exige que a Sociolo. gin mobilize sens instrumentais analt ticos de forma a superar as narrarivas essencialistas ¢ naruralizantes com as quais se defronta a teoria ea pritica dos direitos humanos, ‘A CONSTRUGAO da cidadania no Brasil esteve constancemente atrelada com ampla participagio social e in- clusio, Dessa forma, os direitos, de um modo geral, sempre foram pen- sados como concessées paternalistas oferiadas pelos ‘upos dominantes a0 restante da populagio, ol na ctacure mia, cue impos prisio aa forturade cues elects, canduind 0 pais femocraca, que ders grupos focis contrisuram para a tas dispensivel para a tealizacio dos dite. tos humanos. pois opera como uma espécie de alicerce social no quel eles se constroem ¢ se reprodurem. ‘Tal condicao nao se constata no Brasil. Os defensores cos direitos humanos depa ram-se, nesse cenatio, com um irduo caminho para incorpori-los 2 vida po Iicica, cultural e social do pas. fuea por direitos sockais ¢ libedade no a dos direitos humans, Hles_adguitiram, como referéncia para as. mobilizacées Brasil, sob a como algo recente politicas, uma relevincia destacada nos lltimos 40 anos. A ditadura militar que conduziu o paisem 1964 ao autoritaris mo € 4 centalizaga do poder. a partir de um conjunto de pritices repressiva, democracia ¢ dos diteites humanos vimentos populares e sindicais, do cam- po e da cidade, estavam exigindo uma distributcio justa dos hens pmdluridas pelo trabalho e uma maior panticipacéo social na decisio dos rumos adotados pelo Pais, Porém, foi na ressténcia 3 di- tadura — que impés como novidade 20 paisa prisio e a rortura de grupos int: lectuais e de classe média € nao apenas dos tradicionais segmentos alvos da tea redemocratizagio formal do Brasil que diversos grupos religiosos. organi zaghes politicas € movimentos sociais contribuiram com a producao de um conjunto de experiéncias fundamentais para as lutas subseqjentes em prel dos dircitos humanos, principalmente 0 campo educacional e cultural A Constituigio aleral de 1988, que conton com destacada participacso social, incorpora diversas bandeiras tr dicionais dos dlitvitos himanos. pring: palmente no campo das liberdades civis politicas, Contudo, no que se refere dimensio social e econdmica, mesmo 4que significando um avango em relacio 20 pasado, possi muitas limitagéesque nao podem deixar de sr pensads como uma manutenciodo satus quo, marcan- doa divisao social que caraceriza pais 2 impesicéo dos interesses dominant. jusaamente nessa dimensio que residem 0s principais obsticulos a construgio ¢ incorparacio dos diteites humanos 1 vida social brasileira. © quadro aprofin dado de desigualdade opera como um impeditivo esrrutural para a consolida io dos direitos humanos, visto queim possibilita para a maioria da populacio o acesso aos meios €a0s contetidos soci, culturas epoltices indispensives a uma Os direitos sempre foram pensados como concessées paternalistas ofertadas pelos grupos dominantes ao restante da populagao Por outro lado, atsalmente os direi tos humanos no Brasil assumiram uma projecio relativamente destacada, prin-

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