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MATEMATICA UNIVERSITARIA n@26/27 junho/dezembro 1999 ~ pp. 67-121 Modelos Matematicos em Finangas: Avaliagao de Opgoes Sérgio B. Volchan + Resumo Apresentamos um modelo dinémico para ui mercado finan- ceiro em tempo discreto. Discutimos 0 problema da avaliagio de derivativos através relac&o entre arbitragem e martingais. Final- mente, examinamos uma aplicagdo a0 chamado modelo binomial multiperiddico, que é a versio em tempo discreto do modelo de Black-Scholes-Merton. O enfoque, de natureza teérico-conceituel, visa ressaliar 0 uso de idéias e técnicas mateméticas na construgio de modelos em finangas, chamando a atengio para as hipdteses simplificadoras, tanto econémicas quanto mateméticas. 1 Introdugao Os tiltimos vinte anos testemunbaram uma revolugao sem precedentes na dinamica e estrutura dos mercados financeiros. Em boa parte, ela adveio dos grandes desequilibries da economia mundial no inicio dos anos 70 e que marcaram o fim da era dourada do capitalismo no século XX [16]. A crise do petréleo, os endividamentos, os déficits, a inflagdo e as variagées das taxas de juros e do cambio perturbaram grandemente as projegdes dos investidores. Por outro lado, 0 colapso do sistema Bretton-Woods ( 28, 30]) para gestdo de taxas de cimbio (em 1971 Nixon decretou a n&o-convertibilidade do dolar e portanto o fim do padrao-ouro) resultou na instabilidade destas taxas e acelerou a drastica desregulamentagdo do movimento internacional de capitais especulativos. Paralelamente, a revolugao cientifico-tecnoldgica, particularmente nas Areas de microeletronica, informatica e telecomunicagées, alterou 68 profundamente as relagdes espago-temporais entre os diversos mercados financeiros, Estabeleceu-se assim um mercado mundial com movimenta- cdo quase instantanea de volumes astrondmicos de capitais, no qual as transacées sao feitas simultaneamente e em tempo real nas bolsas de Nova Iorque, Londres, Téquio, Paris, Frankfurt, Singapura, Sao Paulo, etc, Além disso, trata-se de um mercado “vinte e quatro horas” ja que as diferengas de fuso hordrio nao sio mais um impedimento para a rea- lizacdo de negécios. O impacto dessas iransformagdes tem sido tremendo. Verificou-se uma verdadeira inversio das relagées entre as finangas e a economia como um todo: de um ramo subordinado & microeconomia o setor financeiro passou a ter cada vez mais importancia e autonomia. Se por um lado o estabelecimento de mercados financeiros altamente ativos, competitivos e com grande liquidez, envolvendo a participac&o de diversos agentes, criou grandes oportunidades de investimento, por outro trouxe também grande incerteza e inseguranca devido & natureza extremamente volatil destes mercados. Empreendimentos locais e até mesmo economias in- teiras tornaram-se vulnerdveis 4s flutuacdes imprevisiveis do mercado financeiro. Nesse novo panorama o risco é considerado como um aspecto ine- vitdvel ou mesmo inerente ao jogo econémico (para uma discusséo das implicagées disto, ver [4, 13]). Conseqiientemente, 0 gerenciamento de riscos tornou-se vital para os agentes econdmicos. E preciso ser capaz de identificar e medir os riscos, decidir quais riscos evitar e em quais apostar de acordo com o retorno desejado, criar estratégias de investi- mento adaptadas as diversas situagées, etc. Isso estimulou a elaboragio € 0 aperfeigoamento de novos e complexos instrumentos financeiros que permitem uma melhor administragdo de investimentos. De grande importancia sdo os chamados instrumentos derivativos, que so ativos cujo valor deriva de outros ativos. Os exemplos mais comuns séo os contratos de opcao, contratos futuros e “swaps”. Ocorre que a andlise destes utilizam idéias e téenicas matematicas bastante sofisticadas, indo muito além da matem4tica tradicionalmente empregada nos problemas cléssicos de finangas. Dessa forma, 6 cada vez maior a demanda de mateméaticos, fisicos e engenheiros na formulacdo e desenvolvimento de modelos ¢ técnicas em financas , em servigos consultoria ou mesmo seu sec PSS EPONA j i : A 69 recrutamento por firmas de investimento. O impacto desta alteragio na comunidade matemdatica mereceria um estudo a parte. O uso de técnicas matemdticas em Economia nao é um fato real- mente novo. Jé na primeira metade do século XIX, Cournot (1838) ¢ Dupuit (1844) propdem uma formulagéo mateméatica para o problema da oferta versus procura em um mercado isolado [15]. A concepgio da Economia como a disciplina que estuda de que forma as sociedades alo- cam os seus recursos escassos para a produgdo de bens e como estes sio distribuidos levou, por volta de 1870, a tentativa de descrever como as preferéncias do consumidor (suas “utilidades”) determinam sua procura por bens. O modelo microeconémico mais comum, chamado modelo da utilidade esperada [12], leva naturalmente a um problema de otimizacio: achar os maximos/minimos de uma funcio sob certas restricSes. Este modelo, proposto inicialmente por Walras (1874) foi desenvolvido por Pareto (1879), Slutsky (1915), Fisher (1892), Hotelling (1932), Frisch (1982), Hicks e Allen (£934), Samuelson (1947) e von Neumann (1944). De grande importancia foi a formulaco por Walras (1874-1877) do pro- blema do equilibrio geral de mercados”, em que a economia como um todo é descrita através da solug&o de um certo sistema de equagées. En- tretanto, o primeiro tratamento matematico do problema da existéncia e unicidade das solugdes das equagées de Walras, surge quase meio século depois em um trabalho de Wald (1936) Ao final da segunda guerra mundial a tendéncia de matematizagéo da teoria econémica, caracterizada por uma crescente abstracio e rigor analitico, ganhou novo impeto [10] sob a lideranga das escolas americana e francesa. O ano de 1944 é um marco desta nova fase com a publicagéo do livro “The Theory of Games and Economic Behavior’ por John von Neumann e Oskar Morgenstern. E sintomatico 0 fato de von Neumann ter sido um dos mais brilhantes matemAticos de sua geracao, tanto na rea pura quanto na aplicada’. Além da novidade do uso do método axiomatico para a formulagio de modelos econdmicos, a possibilidade de tratar problemas de deciséo estocasticos viria a ter grande impacto em economia matematica, 2.4 nogio de equilibrio étimo de mercados remonta A Adam Smith (1776). ®Trabalhou em Logica matematica, Teoria Engédica, Mecdnica Quantica, Andlise Puncional, Teoria dos Grupos e Teoria da Computacio. Foi chefe da comissio de ener- gia etémica do governo americano além de coordenar projetos pioneiros de construgao dos primeiros computadores eletrénicos. |! 70 Outro grande avanco, j& nos anos cinqiienta, foi a demonstragao completa da existéncia do equilibrio em modelos com varios’ agentes por Arrow e Debreu (1954) (e que lhes valeria o prémio Nobel de Economia). Esses resultados, assim como desenvolvimentos posteriores, fazem uso de ferramentas mateméaticas sofisticadas, incluindo desde a anélise classica, topologia, andlise convexa, teoremas de ponto fixo, teoria da medida e integracdo e andlise funcional, até a andlise néo-standard e a teoria da probabilidade. Esses desenvolvimentos nao puderam deixar de influenciar a drea de finangas. Até meados deste século a Teoria de Finangas utilizava a mateméatica adequada aos problemas de atuéria e contabilidade: célculo de juros, pensdes e anuidades, com énfase em administrag&o e incremen- to de fundos. As ferramentas se limitavam 20 conhecimento de calculo diferencial e integral e estatistica basica. Em linhas gerais, na segunda metade do século ocorreram desenvolvimentos em duas vertentes prin- cipais, dependendo do modelo econémico envolver ou nao condigdes de incerteza. Isto 6, envolvendo ou nao técnicas probabilisticas. Por exemplo, Fisher (1930), Modigliani e Miller (1958, 1961, 1963) tratam problemas de otimizagio para investidores individuais e cor- poracées utilizando técnicas mateméticas para andlise de méximos e minimos de fungGes de vdrias varidveis na presenga de vinculos. Marko- witz (1952), em seu trabalho cldssico sobre problemas de decisiio sob incerteza para individuos, relacionado & composigao de carteiras, utiliza nogées de estatistica (variancia e covaridncia) para estimar o risco ver- sus retorno de aces, estudando o papel da diversificagdo de carteiras de investimento no célebre modelo CAPM (“Capital Asset Pricing Model”). Em seguida Sharpe? (1964) e Lintner desenvolvem as idéias de Mar- kowitz a fim de explicar o comportamento de investidores em um mer- cado em equilibrio. A noc&o de equilibrio é formalizada por Ross (1976) através do conceito de arbitragem no modelo APM (“Arbitrage Pricing Model”). Intuitivamente, um mercado em equilibrio 6 aquele no qual nao existern oportunidades de arbitragem, isto 6, de obtencao de ganhos sem riscos (“nao existe almoco de graca”). Nesses trabalhos sio empre- “Em 1990 Markowitz, Sharpe e Miller dividem o Nobel de Economia, pela primeira vex concedido na area de finangas sranewnne | i | | | aQampoacrpganegeasn ee 71 gados conceitos probabilisticos como uma ferramenta, bdsica de andlise, controle e estimativa de riscos®. Entretanto, o ano de 1973 6 um marco na, teoria e na aplicagdo de novas idéias na Teoria de Financas devido tanto a eventos institucionais quanto académicos de grande repercussao. Do ponto de vista institu- cional, tem-se a inauguracdo em 19 de abril da CBOE (Chicago Board Option Exchange): a primeira bolsa dedicada & negociagao de contratos de opgao. Operando em sua abertura com 911 opgdes de compra sobre 16 tipos de agdes, em 1987 j4 movimentava 700.000 contratos por dia envolvendo 70 milhdes de cotas. Em duas décadas 0 mercado mundial de derivativos atingiria dimensées gigantescas: em 1996 negociou-se 796 milhées de contratos de opgaéo. Segundo o BIS (Bank for International Settlements), j4 em 1992 o montante negociado mundialmente no setor de derivativos era da ordem de 4 trilhées de délares © Do ponto de vista académico, também em 1973 aparecem duas pu- blicagdes de enorme impacto para a andlise tedrica de contratos de opgao [3]: 0 artigo “The Pricing of Options and Corporate Liabilities” de Black e Scholes, e “Theory of Rational Option Pricing” de Merton, pelos quais receberiam o prémio Nobel de Economia de 1997. Nestes tra- balhos eles procuraram estabelecer 0 chamado “prego justo” ou “prego racional’ para opgdes européias obtendo a famosa formula de Black- Scholes e desenvolvem o conceito correlato de estratégia de cobertura (“hedging”). Apesar do seu cardter tedrico e académico, estes trabalhos tornaram-se quase que imediatamente parte do arsenal cotidiano das mesas de operagées financeiras. Além disso, estimularam uma explosao de outros trabalhos que tratam de tipos mais complicados de contratos de opgoes ¢ de outros derivativos. Do ponto de vista das técnicas mateméaticas estes desenvolvimentos realcaram definitivamente o papel fundamental da teoria dos processos estocdsticos em modelos do mercado financeiro. A Teoria dos Proces- sos Estocasticos é um tépico central, vasto e complexo da moderna Teoria da Probabilidade. Desenvolvida basicamente nesse século [27], 54 necessidade de quantificar a nogao de risco ja existia desde a époce das grandes navegacées maritimas, empreendimentos bastante incertos ¢ que levantavam proble- mas ligados aos prémios de seguros (2). “Este valor é uma fracao do valor nominal de todas as agdes, bonus, moeda e outros ativos subjacentes aos derivativos negociados mundialmente, eatimado em 1995 {pela mesma instituigao) ser da ordem de 46 trilhées de délares. 72 ela atraiu os esforgos de renomados pesquisadores da érea; Devido & sua natureza particularmente abstrata e de suas técnicas complexas pode parecer surpreendente que ela tenha qualquer relevancia para um campo +o “mundano” como finangas. Entretanto, como se observe em varios ramos da Matematica “pura”, o estudo de teorias abstratas freqiten- temente se origina de problemas “aplicados” como, por exemplo, em Fisica. No caso da teoria dos processos estocésticos a conexfo com finangas é ainda mais estreita. E um fascinante exemplo das surpreen- dentes interrelagdes entre idéias aparentemente estanques. Vale a pena descrever sucintamente essa estéria. No infcio do século havia grande interesse em resolver o problema de predizer como evoluem os pregos de ativos financeiros, por exemplo, bonus e acdes. B Gbviamente vantajoso para um investidor ser capaz de prever precos pois desta forma poderia escolher os melhores ativos reduzindo seu risco @ zero. A crenga na possibilidade de previsio era bastante difundida até meados desse século ¢ fez a fortuna de muitos consultores da chamada “anélise técnica”. Entretanto, no ano de 1900 © francés Louis Bachelier (1870-1947) defendia na Sorbonne sua tese de doutorade intitulada “Théorie de la Speculation” na qual estudava as flutuagdes nos pregos das agées negociadas na bolsa de valores de Paris (ver [84]). Nesse trabalho pioneiro” ele propunha que tal evoluc&o era na verdade um processo aleatério, semelhante a um jogo de azar’, Mais precisamente, Bachelier sugeria que o prego da aio num ins- tante de tempo ¢, denotado por S;, seria, para cada ¢ > 0, uma varidvel aleaiéria, Uma varidvel aleatéria é wma grandeza cujos valores ocorrem de acordo com uma certa distribuigaéo de probabilidade®. A colecdéo {Sr, t > 0} 60 que chamamos um processo estocastico, ou seja, uma familia de varidveis aleatérias indexadas por t. Além disso, Bachelier propés que tal familia satisfazia o “efeito Az”, isto 6, se definirmos a variagio de prego da acdo entre os instantes t e #-+ At por AS, = 7A axiomatizagao da Teoria da Probabilidade , em seguida, o estudo rigoroso dos Processos Estocasticos s6 ocorveria a partir do trabalho de matemético russo Andrei Kolmogorov em 1933. isso néo significa que os pregos variam arbitrariamente mas que obedecem as leis matematices da Probabilidade. Por exemplo, ao langar um dado honesto a grandeza “niimero da face virada para cima” 6 ume. varidvel aleatéria com valores possiveis no conjunto {1,2,3,4,5,6} cada uum dos quais com probabilidade de ocorréneia de 1/6, sonmt i : | i Strat ~ Se, entéio AS, = VA, onde a identidade ocorre num certo sentido probabilistico, Bm lin- guagem moderna o que ele efetivamente propés foi um modelo ma- tematico no qual a evolugéo temporal dos precos é solucéo de uma equacio diferencial estocdstica [26], a saber dS, = p(t) dt + a(t) dW. Aqui (+) e o(-) sio certas fungdes usuais enquanto que o proceso es- tocéstico {W4, ¢ > O}, é tal que AW, tem distribuigio normal (ou Gaus- siana) com esperanga E[AW;] = 0 e variancia E[(AW;)] = At. Este 6 ochamado processo de Wiener em homenagem ao matemético ameri- cano Norbert Wiener que foi o primeiro a fazer uma andlise matematica rigorosa de suas propriedades em 1923. Entretanto, Wiener nao estava interessado em financas mas na com- preensdéo de um fenémeno fisico conhecido como Movimento Brow- niano. Este fenédmeno fora observado em 1827 pelo botdnico escocés Robert Brown que constatou ao microscépio que pequenos graos de pélen em suspensio aquosa eram dotados de um movimento incessante com trajetérias muito irregulares. Varias explicagdes foram propostas na literatura cientifica sem que houvesse, contudo, uma solugdo que fos- se definitiva e universalmente aceita. Essa situagdo perdurou até que os trabalhos de Einstein (1905) e Smoluchowsky (1906), usando argu- mentos probabilisticos, conseguiram explicar o fenémeno como resultan- do dos intimeros choques aleatérios das moléculas da suspensio aquosa contra os gros de polén?” obtendo também o efeito VAt. O processo de Wiener, freqiientemente chamado também de movimento Browniano, é a formulagéo matematica daquele fendmeno fisico, Portanto, o que Bache- lier havia proposto era que os pregos das agées evolufam de uma forma extremamente erratica e imprevis{vel de maneira andloga ao movimento Browniano. © trabalho de Bachelier permaneceu esquecido por quase sessenta. anos, em boa parte devido ao veredito dado por seu supervisor, o grande matematico francés Henri Poincaré [3, 6]. Em um resume sobre a disser- tagao de seu estudante, Poincaré comenta que o assunto era “um tanto 194 "propdsito, com esse trabalho Einstein fornecen uma prova convincente para a existéncia de moléculas invisiveis a0 olho nu. 74 quanto remoto em relag&o aos tépicos que nossos candidatos usualmente abordam”. A banca de tese lhe concedeu “mention honorable” ao invés do gran maximo de “mention trés honorable”. Acontece que receber © grau maximo era na época a pré-condig&o para obter-se um bom em- prego no meio académico. Assim, Bachelier trabalhou em instituigdes de segundo escalio 0 que, junto com o fato de sua tese no ter sido traduzida para outras linguas, contribuiu para a sua obscuridade [34]. Somente em 1959 surge uma publicacio, assinada pelo fisico Os- borne, propondo, sem conhecimento do trabalho de Bachelier, que os pregos de ativos no mercado financeiro evoluem como um movimento Browniano. Pouco depois o probabilista americano Savage redescobre a tese de Bachelier chamando para ela a ateng&o do economista Paul Samuelson (que viria a ser o primeiro americano a receber 0 prémio No- bel de Economia). Este por sua vez difundiu-a entre outros economistas e matematicos., Ja havia algum tempo que se suspeitava, entre alguns economistas, de que os precos de ages variavam de forma aleatdria de- vido & hipétese do mercado eficiente segundo a qual, num dado instante, o movimento seguinte dos precos depende somente do prego neste instante e no na histéria prévia das variagdes de prego. Em ou- tras palavras, somente o valor presente do ativo tem importéncia para sua evolugéo futura. Esta “auséncia de memédria” é chamada de pro- priedade Markoviana e é uma das caracteristicas essenciais do movi- mento Browniano. A interpretac&o econémica é de que um mercado eficiente reage imediatamente & novas informagées, ajustando-se As novas realidades independentemente do que ocorreu no passado. Samuelson (1965) percebeu um defeito bésico do modelo de Bacheli- er: a hipdtese de que o prego das agdes evoluem segundo um movimento Browniano dito “aritmético”, isto 6, de acordo com a equagao acima, im- plica que os pregos das agées podiam ser negativos. Isso néo é possivel devido ao chamado “principio de responsabilidade limitada”. Este reza que um acionista pode no méximo perder 0 montante que investiu ini- cialmente e portanto o prego das agées no pode ser negative. Além disso, observou que nao é tanto o prego absoluto S; que importa estu- dar, mas o chamado retorno AS;/3S;, ou seja, a variagao relativa de precos. De fato, uma variagéo de 1 ponto é muito mais significativa quando 0 ativo vale 20 pontos do que se valesse 200 pontos. Samuel- son propos entdo que © processo estocdstico {51,4 > 0}, agora chamado E E i : £ i i E : 75 “movimento Browniano geométrico”, seja solugiio da equagao diferencial estocdstica as, = = p(t)dt + oft) dW. 7 Note que no caso particular em que o = 0 a equacdo estocdstica acima passa a ser uma equacio diferencial ordindria, aS, He 7 HOS cuja solugdo é obtida por integragao usual: S = Syelsnoe Em particular, quando y(t) = ys 6 constante, obtém-se St = So eft (t—to) Uma equagio de evolugio do tipo d&,/$; = dt descreve a evolucio no tempo de um montante ou depdsito que rende juros compostos con- tinuamente a uma taxa constante 4, Por outro lado, para resolver equacées diferenciais estocasticas foi preciso desenvolver um novo ramo da Teoria da Probabilidade: 0 Céleulo Estocdstico !!. Comparando as equagées acima pode-se interpretar a presenca do termo estocdstico dW, = Vdt como indicando a existéncia de flutuagdes rapidas dos pregos: informalmente, /dt > dt para dt pequeno e portanto o termo estocdstico predomina em intervalos de de tempo curtos. Uma lei de evolucao desse tipo é uma das hipsdtescs basicas do modelo de Black- Scholes-Merton. Na discussio acima, 0 indice t era associado ao tempo ¢ portan- to variava continuamente: ¢ € [0,-+oo). Diz-se que o processo evolui em tempo continuo. Por outro lado, 0 formalismo matemético fica bem mais simples (porém néo trivial) quando se trabalha com mo- delos andlogos em tempo discreto no qual os pregos formam uma se- quéncia {,,},>0 de varidveis aleatérias indexades por um mimero na- taraln €N = {0,1,2,3...}. © andlogo da lei de evolugo dos pregos no modelo discreto assume a forma AS, Sr = Pr “Criado nos anos quarenta pelo matemétice japonés Kiyos! Ité, Sn41 = Sn(1 + pn)- Aqui {on}uso € uma sequéncia de varidveis aleatérias a ser escolhida de acordo com a conveniéncia. Por exemplo, no modelo de Cox-Ross- Rubinstein (ou modelo binomial), que discutiremos com detalhes mais adiante, as p_ so varidveis aleatérias independentes ¢ identica- mente distribuidas com dois valores possiveis, correspondendo a subida ou descida de pregos com certas probabilidades. Nesse artigo faremos uma exposigéo de uma versio simples deste tipo de modelo que, além do interesse tedrico, é muito utilizado na pratica, em particular como aproximacao discreta de modelos em tempo continuo. Para mais detalhes ver [19}. 2 Alguns Conceitos Fundamentais em Finangas 2.1 Estruturas Financeiras ‘A Teoria de Finangas investiga de que forma “individuos” e “compa- nhias” (ou firmas) dispSem de seus recursos financeiros levando em con- sideragdo o fator tempo (discreto ou continuo) ¢ a natureza (aleatéria on n&o) das condigdes (ou estados) do “mundo”. Grosso modo, podemos distinguir as seguintes estruturas-chave no estudo de finangas: e individuos: investidores, proprietdrios, etc.; © companhias: firmas, cozporacées, empresas, etc.; © mercados: mercados monetérios, de capitais, de mercadorias, ete. ¢ intermediérios: bancos, seguradoras, corretoras, ete. Essas estruturas interagem entre si, tendo 0 mercado um papel cen- tral, Examinemos resumidamente o papel de cada uma delas, isto 6, suas atividades financeires. Individuos tem como meta solucionar o chamado “problema do consumo/investimento”, isto 6, 2 competigéo entre duas estratégias pos- siveis: conswnir jd ou poupar/investir para consumir no futuro. Esse conflito é 0 reflexo da dicotomia “risco/retorno” por sua ver associado & : { i ' i : i / i i [ i : i i i : : I 7 oposiggo “incerteza/seguranca”. A formulagéio matemética desse dilema conduz a problemas de otimizacio Corporagées sao proprietdrias de terras, fabricas e equipamen- tos assim como de estruturas burocratico-organizacionais, patentes, etc. Suas atividades principais sio a administragdo do proceso produtivo e a realizagio da produgio propriamente dita. Seu objetivo é satisfazer ac maximo os interesses dos proprietarios e acionistas. Intermedidrios sio os bancos comerciais e de investimento, segu~ radoras, corretoras, etc. Sua fungao principal é a de tomar empresta- do recursos de unidades superavitérias da economia e canalizd-los para as unidades deficitdrias. Sado também responsdveis pela realizagdo de pagamentos diversos, transferéncias e servigos bancdrios (transagées com depésitos, empréstimos, operacées de crédito, contratos de seguro, ete.) Mercados sao os locais organizados para operar com apélices, con- tratos, e outros titulos estandardizados (agées, bénus, contratos futuros e & termo, opgdes , etc.) @ também com mercadorias (ativos reais). A fungio principal dos mercados 6 de servir como local onde os diver- sos agentes econémicos se reiinem para a negociagdo regulamentada de ativos financeiros, Por exemplo, é onde as companhias procuram ate mentar seu capital langando agdes ou bonus, individuos investem afim de obter lucros, etc. Além disso, os mercados s&o a principal fonte de informagéo usada nas diversas dreas da economia e que auxiliam na de- cisdo de estratégias de investimento. Por exemplo, fornecendo cotacées de pregos e de varios indicadores além de credibilidade, otimismo, expectativas). inais psicoldgicos (conflanca, 2.2 Instrumentos financeiros So os produtos negociados nos mercados. Existem dois tipo basicos: * Subjacentes (ou primétios): mercadorias, bémus, agdes, indices, moedas estrangeiras, taxas de cambio, etc; « Derivativos {ou secundarios): contratos futuros e & termo, con- tratos de opgao, “swaps”, etc. Devido & importancia das ages e bonus para os modelos que anali- saremos mais adiante, faremos um resumo rapido de suas caracteristicas principais. 78 2.2.1 Deis subjacentes: ag6es e bénus . (a) Bénus on obrigagdes séo dividas emitidas por governos, bancos ou empresas privadas (ou outras instituigées financeiras) com in- tuito de acumular capital para futuros investimentos. I o exemplo prototipico de titulo de renda fixa, geralmente de longo prazo e pa- gando juros. Exemplos: titulos do tesouro nacional, bonus de empresas, certifi- cados de depdsito bancario, etc. Os titulos do Tesouro Americano (0s “treasuries”) séio consi- derados os bénus mais seguros do mercado sendo a melhor apro- ximagao, no mundo real, de um investimento sem risco 1. (b) Acées sao titulos que representam fragdes do capital de uma em- presa e sio langadas no mercado afim de acumular fundos para atividades produtivas subseqiientes. Ao contrério dos bonus, cujo itular é credor do emitente, o portador de agées 6 em parte pro- prietario da corporagio emitente e tém direito a receber dividendos e bonificagdes. © prego das agées é influenciado por vérios fatores: performance produtiva e lucratividade da empresa, situago do. mercado, da politica econémica do momento, além de outras varidveis psicolé- gicas (“credibilidade”, “expectatives”, etc.). Sdo portanto ativos de risco. 2.2.2 Derivativos So contratos financeiros cujo valor “deriva” de (ou baseia-se em) outros ativos ditos subjacentes (ou ativos-objeto). Esses wltimos podem ser desde mercadorias e metais preciosos até agées, taxas de cambio, taxas de juros ¢ outros indices 13, 124 existéncia de um ativo livre-de-risco é importante pois serve como padrao de comparagio/referéncia com outxos ativos. '3.J4 existem derivativos cujo subjacente é a acumulagio de chuva, granizo ou neve num certo perfodo ou a flutuacéo da temperatura. Estes contratos permitem, por exemplo, que fazendeiros e agricultores se protejam contra os riscos climéticos ou de outras catéstrofes naturais (33, 3} | | | 1si- rO- ara ujo 10 TOS ser xas > de eve por 2 de | Uma definigdo mais precisa, devida 4 Ingersoll (1987): Definigdo 2.1 Um instrumento derivativo é um contrato financeiro tal que seu valor na data de veneimento T € completamente determinado pelo prego de mercado do seu ativo-objeto. Em outras palavras, se Sp denota o prego do ativo-objeto (por exem- plo, uma. ago) no vencimento, entio o valor Fr do derivativo, na data de vencimento, é uma fung&o da forma geral Fp = F(T, Sp). Apés o instante 7’ o contrato expira. Neste artigo discutiremos apenas um tipo de derivativo: as opgdes. Mais detalhes sobre estes outros derivativos pode ser encontrada nas referéncias [17, 26, 36, 32, 7]. Um contrato de opgao (ou simplesmente uma opgae) é um acordo que dé ao seu possuidor 0 direito, mas ndo a obrigagéo, de comprar (ou vender, conforme o caso) uma certa quantidade de um ativo (chamado ativo-objeto ou subjacente) dentro de um certo prazo e por um prego pré-estabelecido. Numa op¢io de compra (“call option”) o seu titular tem o direito de comprar 0 ativo-objeto estipulado pelo contrato. Numa opgao de venda (“put option”) seu titular tem o direito de vender 0 ativo-objeto. Os parametros bésicos dos contratos de opgio sao: « ativo-objeto: é 0 ativo (real ou financeiro) sobre o qual 0 contrato se baseia, e.g.. ages, bonus, ete... © o titular da opcao: 60 agente econdmico que compra 0 contrato e que portanto possui o direito de exercer a opgao, isto é, de comprar 6 ativo-objeto (no caso de uma opgaio de compra) ou de vendé-lo (no caso de uma opgio de venda); eo langador da opgao: é 0 agente econdmico que vende a opcao e portanto tem a obrigacdo de vender (respectivamente, comprar) © ativo-objeto se, e quando, o titular exercer a opgio de compra (respectivamente, de venda); e preco de exercicio: 6 0 prego fixo pelo qual o langador se obriga a vender (comprar) 0 ativo-objeto; © vencimento: é data na qual 0 contrato expira; e prémio: é 0 prego que o titular paga ao lancador afim de adquirir 0 direito de exercer a op¢éo; é pago no ato da aquisig¢So da op¢io e no é reembolsdvel mesmo se o titular néo exercer a opgéo; em outras palavras é 0 preco que o comprador paga para entrar no jogo e que visa compensar o risco do vendedor. Note que existem quatro posigdes possiveis para os participantes num contrato de opgiio. A tabela a seguir resume os direitos e obrigacées em cada posigao. [ Opcdes de Compra | Opcdes de Venda Comprador | direito de comprar | direito de vender (titular) © ativo-objeto 0 ativo-objeto ‘Vendedor obrigagéo de vender | obrigagéo de comprar (langador) | 0 ativo-objeto 0 ativo-objeto Quanto A data de exercicio ha dois tipos basicos de opgdes. Uma opgio européia é aquela em que o titular somente pode exercer sua opciio na data do vencimento. Ja para uma opgéo americana ela pode ser exercida em qualquer data até o vencimento!™. Iremos nos restringir ao tipo mais simples de contratos de opgées: opgées europdias sobre agGes que nao pagam dividendos. Para uma andlise detalhada de opgdes americanas, ver [20, 24, 31]; para uma discussio de opgées “hibridas” ou exéticas, o leitor pode consultar [17, 36, 26, 7]. A titulo de precisdo, formulamos a seguinte Definicio 2.2 Uma Opedo de Compra Buropéia sobre um ativo-objeto cujo preco no instante t é S,, € wm contrato financeiro que dé ao seu titular 0 direito de comprar este ativo pelo prego pré-estabelecido K. Esse direito somente poderd ser exercido no vencimento T, quando 0 14Uma opgio “Bermuda” pode ser exetcida apenas em algumas datas até o vencimento 81 contrato expire. O prego Cy pago para adquirir uma opgéo de compra no instante t é chamado prémio. Jremos analisar com detalhe mais adiante o problema de avaliar um contrato de opco, isto é, de saber o quanto se deve pagar por ele. Idealmente gostarfamos de obter uma formula que expresse 0 seu prego em fungiio do prego do ativo-objeto e de outros parametros relevantes. Note que o valor de uma opgao dependerd do retorno que © contrato pode oferecer e, portanto, do preco que o ativo-objeto vird a ter no futuro, isto é, no vencimento. Por hora, observamos que ndo é dificil encontrar o valor de uma opgdo no instante do vencimenio. De fato, seja K 0 prego de exercicio, Srp o prego do ativo-objeto no vencimento e Cr o valor de uma opgao de compra no vencimento. Entao, na auséncia de custos de transagao, comissées e taxas, Cp s6 pode assumir dois valores: () se Sr < K (oped “out-ofmoney”), é vantajoso comprar 0 ativo diretamente no mercado & vista; o titular, sendo um investidor racional, no exerce a opgio ¢ portanto seu valor 6 Cr = 0; (ii) se Sip > K (opc&o “in-the-money”) é vantajoso que o titular exerga, a opgao comprando o ativo por K e revendendo no mercado a0 prego superior Sp obtendo assim um retomo Sp — K; logo o valor da opgio 6 Cr = Sip ~ Em suma, -K seSp>K Ou ainda, em notac&éo mais compacta, Cp = max(Sp — K,0) or={§ se Sr < K onde max(a,b) é 0 maior dentre os mimeros a ¢ b. B claro que, do ponto de vista do jancador da mesma opgo, o seu retorno é dado por ~Cp = min(K — $7,0) (onde min(a,) é o menor dentre os nimeros a eb) Um raciocinio andlogo mostra que o valor de uma de uma. op¢iio de venda no vencimento é dado por _f{ K-Sr seSp nk garantindo um retorno'® de pelo menos n/K. 1Descontando o prémio pago pelas opgées. eerie SERS SF SN THERA EE 3 Avaliagao de Derivativos 3.1 Preliminares Entrar em um contrato de opgo (de compra) consiste essencialmente em adquirir hoje, por um certo prego (o prémio), a quantia Cr = max(Sp— K,0), cujo valor depende do estado do mercado num instante futuro T. O fato de no podermos predizer o estado futuro do mercado é a razio de ser da existéncia de opgdes, que nAo teriam sentido num mundo sem incerteza. O cardter imprevisivel dos precos dos ativos, em conseqiiéncia da desregulamentagio dos mercados financeiros, sugere a hipdtese de que eles evoluem de forma aleatéria, ou seja, segundo as Leis da Probabilidade. Assim, Crp é considerada como uma varidvel aleatéria que 6 fungo do prego Sp do ativo-objeto (uma aco, uma taxa de c&mbio, um indice, o prego de um titulo, etc.). Varios fatores afetam o prego de um contrato de opgao, entre os quais: o prego do ativo-objeto, © prego de exercicio, o prazo de vencimento (duragao do contrato), a “yolatilidade” do ativo-objeto, as taxas de juros e os dividendos (se houver) pagos pelo ativo-objeto durante a vigéncia da opgio. Por varios motivos seria titil que investidores e negociadores pudes- sem estimar o valor da opgdo em fungao do preco do ativo-objeto, antes mesmo de assinar o contrato. Pois assim poderiam: ° saber se o prego de mercado da opgio estd super/subavaliado, e de quanto; avaliar a cotagdo didria dos contratos; avaliar os riscos; avaliar oportunidades de arbitragem. On seja, é desejdvel sermos capazes de avaliar uma opgdo, se posstvel através de uma formula matematica que expresse o seu valor em fungdo do preco do ativo subjacente. O valor de uma opgao 6 chamado prémio. A questéo, portanto, é: como determinar o prémio? Este é 0 problema da avaliag&o de 84 ativos, que é um dos objetivos centrais da Teoria de Financas. Avaliar (ou precificar) significa estimar o quanto vale um. ativo hoje dado os seus possiveis valores futuros. Um exemplo cléssico: quanto valeria hoje a quantia de R$ 1,00 obtida investindo & juros compostos (com taxa constante r por perfodo) durante t perfodos? A resposta é baseada no conceito de juros como valor temporal do dinheiro [22, 35, 25]. Neste exemplo simples, a resposta é oH reais pois essa quantia, se aplicada hoje, resulta daqui 4 ¢ perfodos num montante de R$ 1,00. Ou seja, nesse caso, para “transladar” até © presente um certo valor de um montante no futuro, basta multiplicar pelo fator de desconto ou desdgio uy Infelizmente, a avaliacio de opgdes niio é téo simples. Como entdo avalié-las? Na falta de outro método o prémio é determinado pelo mer- cado, isto 6, pela oferta e procura. Mas, nfo haveria uma maneira mais “gbjetiva” de avaliagZo, que nos informasse o valor “justo” ou “legitimo” de uma opedo, dadas as regras do jogo do mercado? A teoria de avaliagdo ou “precificacio” de opgdes procura determi- nar o valor justo (ou racional ou tedrico) de uma opgio que em geral difere do prémio como cotado no mercado. Este tiltimo é 0 que efetiva- mente se paga pelo contrato quando é negociado no mercado e portante embute um valor adicional que 6 0 andlogo ao “custo de produgdo” ou “mais-valia” com o qual o lancador tem de arcar e espera ser recompen- sado. Para compreender melhor estas idéias 6 titil considerar a seguinte analogia: Imaginemos 0 seguinte jogo elementar entre dois adversdrios deno- minados A e B. O jogador A langa uma moeda honesta. Se sair cara, A paga R$ 1,00 para B coroa, A nado paga nada para B Questo: Quanto vale a aposta, isto é, quanto o jogador B deve pagar para entrar no jogo? Uma solugao: Como a moeda é honesta, hé uma probabilidade de 1/2 de sair cara ou coroa; logo, em média, B ganha (1/2) R$ 1,00 = 50 centavos, dinheiro que é degembolsado por A. Assim, A exige que B pague pelo menos 50 centavos para entrar no jogo pois dessa forma A terd garantido em média se ERR IES ES SH SCRE E i / | i [ | I I 85. um ganho idéntico A sua perda. Em outras palavras, a fim de que em média nem A nem B tenham ganhos ou perdas (ou seja, que a média dos lucros e prejuizos seja zero) o valor da aposta deve ser 50 centavos: este 6 0 seu valor justo. Em outras palavras o valor justo é€ o valor da aposta que faz do trato um jogo de soma-zero. Resumindo: A teoria de avaliac&o (“precificacio”) de opgdes visa identificar o valor justo do contrato independentemente dos pregos de negociagao (de mercado). No caso que vamos estudar (opgdes européias sobre agGes) isso en- volve dois problemas interligados: 1. precificagéio: Qual é 0 valor justo de um contrato de opgdo no instante inicial, dado que, no vencimento, vale max(Sp — K,0)? 2. cobertura: como o langador, que recebe o prémio no instante inicial, deve investir esse recurso afim de gerar pelo menos o valor max(Sy — K,0) no instante T? Na secéo seguinte discutimos a base conceitual dos métodos para achar © prego justo de ativos financeiros. 3.2 Arbitragem O conceito econémico fundamental em todos os métodos teéricos de avaliagio de derivativos é o de arbitragem. Informalmente, arbitragem significa especulag&o sem risco. Ou seja, uma oportunidade de arbitragem é¢ uma oportunidade que um agente econémico encontra no mercado de obter ganhos!® sem correr riscos. Tipicamente, estas oportunidades aparecem devido & uma flutuacio ou discrepancia localizada nos pregos de um mesmo ativo em mercados diferentes. Exemplos: (i) Uma ag&o é negociada simultaneamente nas bolsas de Nova Iorque e Londres por $172 e £100, respectivamente. Suponha que a taxa 16Possivelmente maiores que os abtidos investindo em letras do tesouro americano. de cambio seja de $1.75/ £. Um arbitrador compra 100 agées em Nova Iorque ¢ as revende em Londres obtendo (desprezando custos de transago) um lucro liquid de 100 x ($1.75 x 100 — $172) = $300 sem correr riscos. Fle usou o fato de que, dada a taxa de cambio atual, o prego da aco em Nova Iorque era inferior ao de Londres. (ii) Um exemplo semelhante mostra que o arbitrador nem mesmo pre- cisa ter capital inicial para fazer sua operagdo. Suponha que se possa obter um empréstimo por um perfodo 4 taxa de juros Re que exista um titulo com taxa de rendimento R’ > R no mes- mo perfodo. No instante 0 capta-se RS 1,00 que é imediatamente investido neste titulo. Ao final do periodo, o titulo, que rendeu (1 +R), 6 vendido e paga-se a divida (1 + R) do empréstimo. 0 ganho Ifquido (desprezando custos de transagio) é de R!— R > 0, sem incorrer em riscos. Note que, em mercados competitivos, uma oportunidade de arbi- tragem tende a desaparecer no momento em que é percebida. Real- mente, & medida que outros agentes econémicos tentam exploré-la, a dis- crepancia original tende a sumir levando & eliminagdo da oportunidade. Nesse sentido o arbitrador age de forma a eliminar as oportunidades de arbitragem 0 que, em tese, tende a manter 0 equilfbrio do mercado Podemos entio enunciar a hipétese central da teoria de avaliagdo de derivatives, isto 6, a hipstese de que é imposstvel de obter ganhos sem correr riscos, Hipétese de Auséncia de Arbitragem: Nao existe possibilidade de selecionar ativos cujos precos sdo tais que alguma compra e/ou venda simulténea deles resulte em ganhos sem risco. i | i j | | I Observagées: i) essa é uma hipdtese tedrica que pode ser (e é fregiientemente) violada na realidade; por outro lado certas discrepancias de precos que teoricamente geram uma oportunidade de arbitragem, no o séo na realidade, pois os custos de transagio e taxas pagas para fazer as operagées necessdrias para exploré-la fazem com que ela no seja compensadora!’; (ii) € um principio que serve como um método de precificagao, como veremos adiante; também pode ser proposto como condigéo de equilfbrio de pregos do mercado. Diz-se que os precos de ativos esto em “nivel justo” ou que estdo “corretamente avaliados”, quando nao ha oportunidades de arbitragem; isto é, a auséncia de arbitragem define o “preco justo”. Além da auséncia de arbitragem, outras hipdteses simplificado- ras sio geralmente utilizadas afim de que o modelo possa ser analisado matematicamente. Apesar disto implicar 0 sacrificio da realidade em prol da simplicidade este é 0 passo inicial na construgéo de qualquer modelo matematico. Posteriormente, o modelo pode ser refinado para adequar-se mais fielmente & realidade a ser modelada. Hipétese de Mercado sem Atri (1) nao hé custos de transagio '8 nem taxas para a ven- da/compra de ativos; (II) so permitidas vendas a descoberto (isto 6, vender ativos que nao se possui reaimente no momento, como por ex- emplo a obtengio de um empréstimo em dinheiro) em principio ilimitadas, além disso os ativos so indefinida- mente fracciondveis; (IIT) nao hé pagamento de dividendos; (IV) sempre bd liquidez, ou seja, a cada momento existem compradores ¢ vendedores para todos 0s ativos conside- rados. ''Pode-se definir uma “banda de arbitragem" dentro da qual a arbitrage nao compensa. ** Assumimos que as negociacées s&o feitas instantancamente. Além destas hipsteses, supée-se a existéncia de um ativo livre de risco que rende juros a uma taxa constante (e.g., letras do tesouro americano). Esta tiltima, assim como as (I)-(ILI) séo fundamentalmente hipsteses simplificadoras ¢ podem ser relaxadas mais ou menos facilmente, ao custo de uma complicagao crescente do modelo. A hipdtese de liquidez é bastante forte e pode nao ser vdlida em um dado mercado em um dado instante. 3.3 Um exemplo: o Modelo Binomial Uniperiédico Para exemplificar as idéias expostas na seco anterior, vamos considerar um modelo bastante simples de um mercado financeiro. Suponhamos que existam dois ativos negociéveis: I Um ativo sem risco (por exemplo, dinheiro em espécie ou letras do tesouro americano) que rende juros a taza constante e igual a © por periodo. Assim, se este ativo vale uma unidade no instante inicial t = 0, entdo no instante final t = 1 (final do perfodo) valeré (1 +r) unidades. II Um ativo de risco (por exemplo, uma agSo), cujo prego evolui estocdsticamente da seguinte forma. Se Sp > 0 é 0 seu prego em t = 0 ent&o, em ¢ = 1 seu valor sera: g, = { 90% com probabilidade q (alta) += 4 Sb, com probabilidade 1—q (baixa) onde 0 b> 0 (chamadas razdes de alta € baixa). Note que existem apenas dois instantes relevantes e que o ativo de risco pode assumir apenas dois valores. E o modelo binomial uniperiddico. A proposigio seguinte é um exemplo de avaliagiio de ativos através da hipdtese de auséncia de arbitragem Proposigéio 3.1 Sob auséncia de oportunidade de arbitragem, (i) b<1tr 0. Ou seja, existiria oportunidade de arbitragem. Portanto, 1+r > b. Andlogamente, suponha que 1 +r > @. Entdo, em t = 0 vende-se (a descoberto) uma acio por Sp e compra-se um bénus ao mesmo preco: saldo inicial é nulo. Em ¢ = 1 resgata-se o bénus por (1+ r)Sp © compra-se a aco, que vale no mdaimo Soa, que é devolvida. O saldo resultante 6 maior ou igual a (1+7)So — Soa = [(L+7)- 4] So >0, ou seja, temos uma arbitragem. Logo, 1 +r < a. (ii) Se a > b (no caso a = b a acho se comporta como um bénus) entiio, de (i) segue que 0 < p < 1. Podemos entdo definir uma distribuigao de probabilidade P* tal que P*[S, = Soa] = p = 1 — P*[S: = Sod]. O valor esperado de $1 sob esta distribuigo é E*[5i) = Soap + Sob(1—p) = Sof(a—6)p +b] = So(1 +r). a Suponhamos agora que o mercado negocie com opgdes européias s0- bre acdes, com vencimento em t = 1 ¢ prego de exereicio K. Se Co é 0 valor da opgfo em t = 0, entéo, em t = 1 scu valor sed: Ca, com probabilidade q Cy = max($i — K,0) = { Cy, com probabilidade 1~q. Uma carteira (ou “portfélio”) é uma combinacao dos ativos de base disponiveis no mercado, no caso, bonus e agées. Podemos imaginar uma carteira como um par (c, 8), indicado as quantidades dos ativos possuidos pelo investidor. O valor V; da carteira dado por a x [prego do bonus) + 8 x [prego do bonus}. Verifica-se facilmente que existe uma carteira que simula o comportamento da op¢ao (um derivativo), isto 6, tal que em f = 1 seu valor coincide com o valor da opgéo. Basta impor a condigao: MY =a(ltr) +65 = C1. Ou seja, a(ltr) + 85a = Cy a(l +r) + BSob = Cy 91 Resulta que \ a= BSoa T+r GHG a= Sofa — b)” Daf, um célculo simples fornece pare o valor inicial da carteira repli- cadora: l 1 Vo = a + B80 = 7 [PCa + (1-p) Ci] = Tae Es supondo auséncia de arbitragem. Podemos ent&o obter uma férmula de avaliago de opgdes de compra européias. Proposigéo 3.2 Sob auséncia de oportunidades de arbitragem, 1 = ——E"(C], Co = EC isto é 0 valor justo (ou “prémio”) de uma opgdo de compra européia sobre agées no modelo binomial uniperiddico é dado pelo seu retorno esperado, com respeito 4 distribugdo P*, atualizado 4 taxa r. Demonstragao: Suponha que fosse Cy # Vo e mostremos que isso gera uma oportunidade de arbitragem. Por exemplo, seja Cy > Vo. Em t = 0.vende-se a opgio por Co (mesmo nfo tendo a agéo) € compra- se uma carteira replicadora por Vo. Com a diferenga Cy — Vo restante, compra-se bénus. O saldo inicial é Co — Vo — (CoV) = 0. Em t = 1, temos duas possibilidades de interesse: {a) Sq > K: 0 titular da opgao vai exercé-la; 0 vendedor compra entaio a agdo no mercado por S, e a entrega ao titular pelo preco K; fnal- mente resgata-se os bonus. Lembrando que a carteira replicadora vale nessa situagdo C, = Sa — K, 0 saldo final é: (Co~Vo)(1 +r) + (K~ Se) + Ca = (Co- Va) +7) > 0. 92 (b) S) 0. Em qualquer caso, temos uma oportunidade de arbitragem. Logo, Co < Vo. Um raciocinio andlogo para a hipstese Co < So finaliza a proposicaéo. fa) Observagdes 1 Supomos acima que S, SK < Sa, que € a site ago de interesse. Note que s¢ Sa SK, 0 titular da opgéio nunca a exerceria e recaimos no caso (b). Por outro lado, se Sy > K 0 titular sempre exerceria a opgao e reeatmos no caso {a). Note que, como Vo = Ch eV; = Ci, um vendedor de wma opgio de compra pode investir o prémio em uma carteira repticadora de tal forma que, no vencimento, ele terd 0 montante necessdrio para satisfazer o titular caso este venha a exercer a opedo. Dof que tal carteira é chamada carteira de cobertura ( “hedging port- folio” ). O leitor deve ter notado que nas férmulas de avaliagdo que obtive- mos, aparecem certes médias ou valores esperados com respeito a uma distribuicio P* = (p,1 — p) cujo peso é p ao invés da distribuicao real P = (q,1—4q) que aparecia nas hipdteses do modelo. A compreensio deste ponto é muito importante. Vejamos, entdo. O retorno real de investimentos de risco € dado pelo valor esperado (ou média) do prego destes investimentos no instante final da aplicagao, Assim, lembrando que P = (9,1 — q) @ a distribuigdo real de probabilidade de ocorréncia dos valores dos ativos, teremos: E[Si] = Se + (1—4)Sp E[Ci] = aCa + (1-4). semen ee SEO STI RTE | | 93 Por serem ativos de risco, deve-se ter em geral qiie esses valores médios, desagiados A taxa livre-de-risco r, satisfacam: So < Toes I Co < 7 => BIC). Realmente, suponha que valessem as identidades, por exemplo: Co = E[C\). a ltr Ou, reescrevendo: (l+r)Co = BIC). Isso significa que 0 retorno médio real de um investimento de risco (no caso, uma agéo ou uma opgdo sobre esta ago) seria idéntico ao retorno obtido caso aplicdssemos o valor em dinheiro do ativo no instante inicial & taxa de juros livre-de-risco r. Isso é uma contradiciio do ponto de vista econémico, desde que aceitemos a hipstese de que os investidores geralmente tém aversio ao risco. Por que aplicar recursos num ativo de risco que oferece um retorno médio igual ao valor que se obteria aplicando os mesmos recursos A taxa de juros livre de risco? Portanto, afim de atrair investidores aversos ao risco, o ativo de risco deve oferecer uma compensagéo ou prémio. Ou seja, em geral teremos: {1+ k}Co = E[C;] onde a nova taxa de juros & = r+ A inclui uma “taxa de risco” 2. Note que a hipétese de aversio ao risco serve como método de avaliagdo de ativos de risco. Assim, o preco atual do ativo é dado pela sua esperanga futura desagiada com taxa k. Por exemplo, para uma opgéio: = E(Ci] [qCa + A-g Oy). 1+ oF “Ek F A questao agora é a seguinte: é possivel achar valores pel—p tais que, substituidos no lugar de qe 1—g, nos permita trocar a taxa (de risco) k pela taxa livre de risco r? A resposta é afirmativa, caso nao haja oportunidade de arbitragem, Em outras palavras, a hipétese de 94. auséncia de arbitragem garante, pelo teorema de arbitragem, a existéncia de uma distribuicio “sintética” P* (ou artificial, em contraste com a distribuigao real P) , tal que: i __l pe So = pz Sop + —P) = EPS e Cy = [ap + -)) = SEC! 0 = ppp ae TOOT PNS Ty Vernos entdo que esta formula de avaliag&o de pregos em termos da distribuigdo “sintética” P* evita ter de conhecer a taxa de risco A, que 6 dificil de estimar, e permite uma estimativa do prémio que pode entao ser confrontado com sua cotagio no mercado. Por outro lado, como na férmula aparece apenas a taxa livre de risco r (que é em gera! conhecida) tudo se passa como se a avaliagéo fosse i feita num mundo indiferente ao risco: este 60 principio de avaliacao neutra ao risco. Claro que na realidade o risco continua existindo € est& “embutido” na distribuigio “sintética” P*. Finalmente, a proposic&io anterior fornece uma formula para o prémio da opgio em termos dos pardmetros 7, a, 6, K e Sp: max(Soa — K,0) } max( Soo — K,0)}. 4 Modelos Dinamicos em Tempo Discreto Nas segdes anteriores vimos conceitos e nogées gerais relacionadas aos tmercados financeiros. Desenvolvemos algumas hipdteses basicas sobre © funcionamento desses mercados e fomos capazes de obter alguns re- sultados interessantes, por exemplo, a respeito do prego justo de alguns ativos. Nesta secio procederemos @ um patamar de abstragao matemética bem mais sofisticado objetivando, entre outras coisas, unificar ¢ clari- ficar varios conceitos j4 discutidos. Uma vez que tivermos formulado com exatiddo certas idéias fundamentais, seremos capazes de enunciar sr $e onenctgennrsnny gen 95 dois teorernas fundamentais da Teoria de Finangas: o teorema de arbi- tragem 0 teorema da completude. Poderemos entao resolver, nesse contexto, o problema da avaliagao de derivativos, por exemplo, para opcodes européias referidas A uma aco. 4.1 O Modelo O modelo que analisaremos evolui em tempo discreto e com horizonte finito, isto é, os instantes relevantes séo 0,1,2,...,N, onde o némero N chama-se o horizonte (tipicamente interpretado como uma data de vencimento de certos titulos). Além da hipstese de mercado sem atrito vamos propor a hipétese de evolugao estocdstica para os precos dos ativos de risco. Isto é formalizado postulando um espago de probabilidade (2, F,P) onde: e 26 um conjunto finito representando os possiveis “estados do mun- do”; e F, chamada algebra 1° de “eventos”, representando a estrutura da informagao globalmente disponfvel no mercado; ¢ P éa probabilidade objetiva sobre 2, onde supomos que P({w}) > 0, Yu e 2. A informagao em F 6 organizada através de uma filtro {F,}*_9, isto 6, uma familia crescente de sub-Algebras: Fo CF, ©...G Fu = F, onde geralmente escolhe-se Fy = {0,9} ¢ F a colecdo de todos os sub- conjuntos de 2. A Fn. chamada de Algebra dos eventos até o instante n, 6 interpretada como contendo “a informacdo disponivel no instante n”. A monotonicidade dessas Algebras equivale & idéia de que nado hd “perda de informagao” © mercado consiste em d+ 1 ativos financeiros cujos precos no instante m sao dados pelo chamado vetor de pregos: Sn = (Seo Sis Sy S) ERIM, 191.¢., uma colegdo de subconjuntos de 9 fechada sob complementos e uniées finitas de subconjuntos, Uma sigma-digebra é uma algebra fechada sob unides enumerdveis, 96 sendo St o prego do i-ésimo ativo no instante n. A hipdtese de evolucdo estocdstica se traduz pela suposicaio de que {S,}4_, seja um processo estocdstico. Assim, cada S, é um vetor aleatério d+ 1-dimensional, ou seja, cada Si, para i= 1,2,...,d é uma varidvel aleatoria. Supomos também que este processo seja adaptado ao filtro, isto 6, que Sn € Fn paran = 0,1,...N. (intuitivamente: os investidores conhecem os precos passados e presentes, mas nao os futuros). Quando F, for a sigma- Algebra gerada por So, S1,.--,5n, denotada por Fy = o(Sp,51,-.-, Sn), o filtro é dito natural. Intuitivamente, F, contém a informagio disponivel até o instante n (i., @ “histéria” do processo até o instante 7). Os ativos i = 1,2,...,d sfio ativos de risco enquanto que para i = 0 temos um ativo sem risco (por exemplo, letras do tesouro americano) que rendem juros & taxa constante r (para simplificar): So = (1+ 7r)"9§, e escolhemos Sf = 1, A atividade do investidor consiste em administrar uma carteira de titulos, ou seja, em comprar ¢ vender ativos objetivando lucros ou protegao contra riscos. Isso é feito por meio de uma estratégia de investimento. Definigdo 4.1 Uma estratégia de investimento é um processo esto- cdstico 0 = (On}N_9 de vetores On = (02,04,...,64) e RO e que é predizivel, isto é, parai=0,1,...,4 65, & Fo 8, € Fra Observagoi (I) 0 vetor 8 chama-se carteira (ou “portfolio”) do investidor no instante n; 04, 6 a quantidade de ativos do tipo i que o investidor 97 possui no instante n; no jargiio financeiro, 6 a “posigdo tomada no i-ésimo ativo neste instante”. Note que 2, € R, podendo portanto ser positiva (o investidor possui aquela quantidade do ativo), ne- gativa (o investidor pediu emprestado aquela quantidade do ativo) ou nula (ativo ausente); (II) a condigio ®, € Fn1 significa que as posigées na carteira sio reajustadas bascando-se na informagio disponivel no instante n—1, sendo entdo mantidas até que as novas cotacées sejam anunciadas no instante n. Definigao 4.2 O valor da carteira 6 no instante n, 0, 861 S2, sen=0 Note que Vj (8) é um processo estocdstico adaptado. Dentre todas as possiveis estratégias, vamos admitir somente aquelas que sao auto-financidveis, isto 6, tais que < On, Spit > =< On-1, Sai > (4.1) para 2 = <6n,$,—-Sn-1> + - Mas a equagéo (4.1) afirma que ultimo termo da identidade acima é nulo, indicando que a variagio no valor da carteira é devida somente & variagiio dos pregos dos ativos. Intuitivamente, podemos imaginar que imediatamente antes do ins- tante n, ou seja, antes das novas cotagdes serem anunciadas, o investidor 20Fssa hipétese simplificadora pode ser relaxada para incluir um fluxo de capital no sistema 98 pode rediséribuir as posigdes da carteira através apenas da compra ¢ venda dos ativos disponiveis no mercado, Assim sua nova carteira, 8p, tem o mesmo valor Va_i(9) que antes, j4 que nfo hé fluxo de capital. Assim que as novas cotagées sfio anunciadas no instante na carteira tem um novo valor Vq(é) devido apenas aos novos pregos dos ativos. Observe que, da iteragdo da formula acima, obtemos uma versio equivalente da condiggo’ de auto-financiamento: Va(@) = Va-1(0) + < On, ASn > = Va-2(8)+ + < On, ASp > 2 += Val) + 3 <4, ASK >, =] paraQ < AS >, (4.2) 1 para 0 0) >0. Em outras palavras, sem arriscar capital algum o investidor tem uma chance de obter lucros. Note que tais oportunidades sio as mesmas para os processos {$n} ¢ {5,}. Argumentos de ordem econémica sugerem a hipdtese fundamental de que para mercado “em equilibrio” nao existem oportunidades de ar- bitragem: “ndo ha almogo de graca”. Agora estamos em posic¢ao de dar-Ihe uma formulagio matematica precisa: Hipétese de Auséncia de Oportunidade de Arbitragem (AOA) Para toda estratégia auto-financiadora 9, se P(Vo(#) = 0) = 1 e P(Vy(@) > 0). = 1, entio P(Vy(6) =0) = 1. Definigao 4.4 Um mercado ¢ dito vidvel quando nao existe oportu- nidade de arbitrage, O resultado seguinte, conhecide como o Teorema Fundamental da Matematica Financeira, proposto nos trabathos pioneiros de Harrison ¢ Pliska (1979,1981) (ver [21]), fornece uma caracterizacéo dos mercados vidveis através de medidas de martingal equivalentes (para nogdes sobre martingais, ver apéndice A). Definig&o 4.5 Uma medida de probabilidade P* é dita equivalente a P se, para todo evento A € F, P(A) =0 P*(A) =0 100 Em outras palavras, medidas equivalentes associam probabilidade po- sitiva aos mesmos eventos. No nosso caso, P* é equivalente a P se P*({w}) > 0 para todo w € 2. Teorema 1 Um mercado é vidvel se ¢ somente se existir uma medida de probabilidade P* equivalente & P tal que os pregos atualizados dos ativos sejam P*-martingais. Demonstragao: Suficiéncia: Se o processo {$,} é um P*-martingal, ent&o para toda estratégia auto-financiadora 6, V,(0) também é um P*- martingal. Entdo, lembrando que Vo(8) = Vo(6): EV, (0)] = E*[Vo(0)] = E*[Ma(0)]- Portanto, pela equivaléncia de P e P* e supondo P*(Vyv(6) > 0) = 1, temos que: P(V(0) = 0) = 1 > P*(Y(O)=0) = 1 => B[W(O)] =0 SE [Vy(O}=0 + P*(Vv(8)=0) =1 > P(Py()=9) = 1, donde @ nao é uma arbitragem. Necessidade: ‘A demonstragéo aqui é mais delicada. Primeiramente observamos que, como estamos considerando um espaco amostral finito, & = {wi,-.., wim}, entao cada, varidvel aleatéria X sobre Q pode ser representada por um vetor m-dimensional dos seus valores: X ~ (X(w1),..-;X(wm)). ‘Assim, 0 espaco W de todas as varidveis aleatérias sobre 2 é identificada com o espago R™. Considere agora os seguintes subconjuntos de R™: v= {X © W: 39 auto-financiadora, Vo(9) = 0 ¢ X = Vn(6}} K={X EW: Ww X(w) 20 e E[X]=1}. Nao é dificil checar que K 6 compacto convexo e V é subespaco vetorial. Além disso, se 0 mercado é vidvel, entio KN V = 0. en rnenintetemnn 101 Portanto, pelo Teorema de Minkowsky (ver apéndice B), existe um funcional linear L(-) sobre W tal que vX EV, L(X)= e WX EK, L(X)>0 Isto é, existe uma seqiiéncia {\(w) }uca de ntimeros reais, tal que: YX EK, FY Aw) X(w) > 0 (4.3) wEQ e WX =Ur(@) EV, J Aw)X(w) = 0 (4.4) wen Da desigualdade acima, segue que Vw € 2, temos Aw) > 0: basta escolher X(w) = —1pvew,}, onde pj = P({wi}) com i = 1,2,:..,m. Entao, P™ definida por: Aw) SPE) BED P*({w}) = é uma medida de probabilidade equivalente a P. Resta verificar que P* 6 uma medida de martingal. Para usarmos a proposicéo A.4, precisamos do seguinte fato: Para todo processo predizivel {(04,..., @2)}¥_9 pode-se cons- truir um processo {09}4_y tal que @ = {(09,62,...,02)}4 9 seja uma estratégia auto-financiadora com valor inicial nulo, Realmente, basta escolher 63 = 0 (€ Fp) e para n > 1 define-se 69 de tal forma que seja valida a condig&o de auto-financiamento (4.1) com valor inicial nulo: Vn(0) = 02 + OSL +... + O48¢ = S> (OLAS +... + 0FA5%), j=) 102 Obtemos, n-1 . . . . = DAS} +... + OFAS$) + [-ORSh a —... — RSG 1], j=l de onde se conclui que 6° € Fn_1. Ora, a identidade (4.2) 6 valida para toda estratégia auto-financiado- ra, em particular para as do tipo que acabamos de construir. Portanto, por (4.4), N 0 = E*[My(0)] = E'S) <0;,A8; >} j=l para todo processo predizivel {(61,...,42)}¥_y. Em particular, vale para 0 processo: oh ={ 6, sek Ai T=) di, seksi onde escolhe-se #! € Fj_1. Entéo, para i = 1,2,...,d e toda seqiiéncia predizivel {3} 9, temos que N BD- 9, A5j] = 0, a que, pela proposigio A.4, implica que {S1}%_9 6 um P*-martingal. 0 4.3 Mercados Completos Ao contrario da hipotese de auséncia de oportunidade de arbitragem, que possui uma justificativa econémica bastante evidente, a completude de um mercado é uma hipétese restritiva e dificil de justificar, descontando 0 fato de ela permitir a obtengdo de férmulas relativamente simples para pregos de ativos Definigdo 4.6 Uma varidvel aleatéria X € Fy € dita duplicavel™ se existir uma estratégia auto-financiadora 6 tal que Vn(@) = X. lem inglés, “hedgeable” ou “attaineble” 103 Definigéio 4.7 Um mercado € dito completo se toda varidvel aleatdria X € Fy for duplicdvel. Em outras palavras, em um mercado completo toda v.a. mensurdvel é da forma d X = Coby Sy =< On, Sx > =0 para alguma estratégia auto-financiadora @. Ou equivalentemente, N x -, o, ~ ae = Vw(9) = Vol) + So . iN n=l O teorema seguinte fornece uma caracterizagéio de mercados vidveis completos. Teorema 2 Um mercado vidvel é completo se, e somente se, enitir uma Gnica medida de probabilidade P*, equivalente a P, com repeito & qual os pregos atualizados séo martingais. Demonstragao: Primeiro a necessidade: Suponhamos que o mercado 6 completo. Sejam P; e Py» probabilidades equivalentes a P e com respeito 4s quais os precos atualizados sejam martingais. Pelo corolario A.3, {Vn(6)}4Lp também 6 um martingal. Pela completude, dado X € Fn, existe 0 auto-financiadora tal que Xo. ap = Vie). st ni) Entéo, pela propriedade de martingal resulta que E,[Vv(9)] = Es[Vo(@)] = Vol8) = Vo(o), onde Fi[}] denota a esperanca com respeito & distribuicio P;, i = 1,2. Note que usamos o fato de que toda v.a. mensurdvel com respeito a Fo = {0,2} € uma constante. Entdo, Ei[X/SX(8)] = Bo[X/SH(0)], para toda X € Fy. Em particular, para X(w) = 14{w), com A € Fy, teremos que 104 Pi(A) = P2(A), VA € Fy. Conseqiientemente Pi = P2 sobre Fy = F. Para mostrar a suficiéncia, consideremos um mercado vidvel e in- completo e mostremos que nao vale a unicidade. Pela incompletude, sabemos que existé pelo menos uma v.a. Fy- mensuravel que n&o é duplicdvel. Isto é, se W é 0 conjunto de todas as v.a.’s em (2, £), entéo o conjunto N E = (Xe Fy: X=Up+ ¥> ; n=1 Uo € Fo, Om € Fn, n> 1} é um subespaco estrito de W. Dada uma é uma probabilidade P* em (2, F), consideremos 0 pro- duto interno em W definido por (X%SY) = EY(XY). Entao, sabemos que existe uma v.a. X que nao é identicamente nula | que é ortogonal (com respeito ao produto escalar acima) ao subespago . &. Observando que a v.a. identidade pertence a € obtemos | E*(X) = 0. Considere agora a fungao de conjunto sobre (@, F) definida por PM ((u}) = (1+ srg) Phe), onde [[Xfjso = max |(w)| > 0 2 Afirmamos que P** 6 uma probabilidade sobre (2, F). De fato, como I x4) og zr 1+ z 21% foo 105 segue que P**({w}) > 0, Além disso, a a X(w) P*(Q) = P*({w}) = l+ P*({w = PPro = Ee (0+ gy) PD alt aE) =, Ora, P** é , por construgéo, equivalente mas distinta de P*. Por- tanto, nos resta mostrar que, se P* 6 uma probabilidade equivalente 2 Petal que {S,}%_9 6 um P*-martingal, entdo {5,}4 up também é um P**.martingal. Temos, para qualquer {8,}49 previsivel, N E“[3> < ,ASn >] = n=l N BSS < On, AS, >] + nai axis saa" UY ] = 0, onde o primeiro termo é nulo pois {$,}4_ é um P*-martingal, e 0 segundo se anula pois X 6 ortogonal a €. Portanto, pela proposigao A.4, (8, }4U9 6 um P**-martingal. a 4.4 Avaliagao de Ativos Em um mercado vidvel e completo qualquer ative X € Fy pode ser avaliado (ou “precificado”). De fato, X é duplicavel e portanto existe uma estratégia auto-financiadora @ tal que X = Vw(6) ow ainda x = = Vl). / se ‘n() (4.5) Seja entdo P* a medida de martigal equivalente. Vimos que V;(8), 0 << N é um P*-martingal. Entéo tomando o valor esperado na equacao (4.4), Ze] = B'l(0)) = WO), N 106 onde usamos a propriedade de martingal. Assim, Vo(9) é identificado como o prego do ativo X no instante n = 0. Ou seja, o prego de X é © que se paga hoje para comprar uma carteira (composta dos ativos de base do mercado) que permite duplicar o prego de X no futuro. Mais geralmente, decorre da propriedade de martingal que Val) = B*[Vi(0) | Fal, ou seja, Va(8) = ste'[ a |] e V,(8) € chamado de preco do ativo X no instante n. Portanto, afim de obter o prego C;, de uma opgéo de compra eu- ropéia sobre 0 ativo de risco $} basta aplicar a férmula acima para X = max(Si, ~ K,0) = ($1,— K)*, onde a notagiio (Z)* indica a parte positiva de Z. Temos entéo: SyoK)* 1 Co = eye Te |] = *((Sh-K)* | Fa, (4.6) e andlogamente para o prego P, de uma opgéo de venda européia: AEST UK Sh" | Fa) Pas Bm ambos 0s casos 6 é uma estratégia de cobertura para o langador da opgao. Note que come ($}-K)+ = $1~K + (K-$1)*, aplicando valores esperados obtemos a chamada “paridade call-put”: 1 Cy ~ Pa = Si ~ ———-~ K, men Sn eye relacionando os pregos dos dois tipos de opgio. Em particular isso mostra que basta avaliar, digamos Cp, para obtermos P,. Na segao seguinte iremos avaliar Cp no caso de um modelo especifico bastante importante. 107 4.5 O Modelo Binomial Vamos agora aplicar os resultados da seg’o anterior a um modelo es- pecifico, o chamado modelo binomial multiperiédico ou modelo de Cox-Ross-Rubinstein [8]. I a generalizacio do modelo uniperiddico dis- cutido na secao 3.3. O mercado consiste em dois ativos. O primeiro é um ativo livre de risco rendendo juros a taxa constante r > 0; seu valor no instante né {0,1,...,N}éS9 = (1+1r)". O segundo é um ativo de risco, e seu valor no instante n + 1 é obtido do seu valor no instante n da forma: Sra Sn4t = Sab onde 0 0. Isto é, no instante seguinte a um instante dado seu valor pode ou ter uma alta ou ter uma baixa, o que ocorre aleatériamente de acordo com uma certa distribuigéo. O prego atualiza- do € dado por Su = ae Oespago de estados 2 {, a} consiste om N—uplas representando os valores sucessivos de Sn41/Sn, onde n = 0,1,...,.N —1, on seja as altas e baixas sucessivas a partir do valor inicial ao final. Note que 4Q = 2%. Por exemplo, um dado w € 2 pode ser w = (a,a,b,a,b,b,b,a,...,a,b,6). Podemos pensar cada w € 2 como uma possfvel realizagaio do processo (ou evolugéio) dos precos do instante n = 0 até n = N. Ou ainda, como uma, “trajetéria” ligando o nodo inicial a um dos nodos finais de uma arvore binomial recombinante (ver figura). Por exemplo, um w com j a’s e N ~ j b’s corresponde @ uma tinica trajetdria conectando o nodo 0 ao no nodo (N,3), com exatamente j altas e Nj baixas na ordem especificada pelo vetor wv, e reciprocamente. Além disso, o preco final do ativo nesta realizagio é Sy(w) = Spa 907 Escolhemos F = P(Q), eo filtro natural Fy = 0(S1,...,5p) (Fo = {@,2}). Assim a base probabilistica do modelo é dada por (9, F, {Fn,0 < n <= N},P), com P({w}) > 0 para todo w € Q (logo, P é tinica a menos de equivaléncias). (NN) (N,N-1) (N,N - 2) (N.1) (N,0) Figura 2: Arvore de N perfodos Consideremos agora a colegao de v.a.’s {Tn }L onde Tr = Sn/Sn—1- Note entdo que dado w = (w,...,wyy) temos P({w}) = P(Ty =u1,..-,Tv = wy). Em palavras: a medida P fica completamente determinada pela dis- tribuicdo do vetor aleatdrio (7j,.-., Ziv). Além disso, F, = o(T),..-, Tn). O objetivo dessa segdo 6 obter uma formula para o valor no instante n de uma opc¢ao européia, referida ao ativo de risco, com prego de exercicio K e data de vencimento N. Lema 4.8 O processo (Sn E{Tn41|Fn} = ltr, paran zz € um P-martingal se, ¢ somente se O1,...,N—1L. Demonstragao: Basta seguir as equivaléncias: ElSna1| Fal = S, < ElSn4i/$n | Fa] = 1 = EBlfan/(+r)| Fl = 1 i re 109 Lema 4.9 Se o mercado é vidwel, entiob <1 +r x1,s,-2}, onde x varia sobre 0 conjunto (finito) de = valores da v.a. Sp, temos, aplicando a formula (4.5): Cu ES, ll T-KY|F Oar vn ~ UF 5 " iont1 cael a BL 2 ssa) Iz om = aay) 15,2) Bile Il TK)". ientl Para caleular o valor esperado, notamos que a v.a. Y = [TN ay, Th tem distribuigéo binomial: Ply =a" = Ay para j= 0,1,...,N —n. Portanto, "51 — py, N Ey [J B-4)*)= i=n+1 N=n pN-?-I(1 — p) (wa ap) — K+. A formula acima define uma fungio f(z). Finalmente, obtemos que: 1 1 Ch = Tepe Vien f(z) = Wer FS) Note que, em particular, o prémio é dado por 1 Ny phe faite Co = aGan¥ Lwaar a" J (Spal bv-F — Kt, que é uma fungio do prego inicial Sp da agdo, da taxa de juros r, do prego de exercicio K, da duracio N do contrato, e das razies a, b de alta ¢ baixa da agdo.

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