Você está na página 1de 54
PARECERES A CONSTITUCIONALIDADE DA REGULAMENTACAO. DA LEI DE CONSORCIOS PUBLICOS (N2 11.107/05) | POR DECRETO PRESIDENCIAL ‘Andreas Joachim Krell" Sumério: |, Consulta. II. Questéo metodolégica: sentido e limites do estudo de Direito comparado. Il.1. Leis em sentido formal e material, subdiviséio das com- peténcias normatives em nivel horizontal e vertical nas Constituig6es brasilelras @ alem&s. Ill2. Decretos executivos no ambito da “iegislagao de quadra” alema e brasileira. Il.3. A (antiga) discusséo sobre os limites de contetido das normas gerais federais.Ill.4. Bases constitucionais da edigao da Lei n® 11.107/05; a rele- | Gao entre competéncias legislativas privativas e concorrentes da Unio na Carta | de 1988. III5, A importancia de uma leitura sistematica e integrada dos arts. 23 | e 241, CF, para interpretagdo da competéncia federal de legislar sobre cons6r- | | 1 ios publicos. 1V.1. O conteddo substancial da Lei de Consércios Publicos eo | sentido da distingdo entre leis federais e nacionais sob @ égide da Constituicao | de 1988. IV.2. O modelo da Federagao na atuelidade: necessidade de coordena- 40 central 0s efeitos da adoco do federalismo cooperativo no Brasil. IV3 N / cessidade da regulamentago nacional homagénea (e, parcialmente, uniformi- ad) do regime dos cons6rcios publicos. V.1. A natureza da regulamentagao de leis e os abusos por parte do Executivo; a “fel execugéo" de uma lei federal so- bre normas gerais. V.2. A necessidade de adequagao do principio da separaggo dos Poderes & realidade do Estado Social modero. V.3. O sistema brasileiro de ‘execupéo das leis dos diferentes niveis tederativos; @ forma concreta da aplice- (980 da Lei de Consércios Publicos. V.4. A importancia da questao dos limites da delegagéo legal de poder normativo no Brasil. V5. A importanoia do principio da “reserva da lei" formale material. VI. Conclus6es: respostas aos quesitos, 1. Professor de Direito Ambiental e Constitucionsl da Universidade Federal de Alagoas — UFAL. Doutor em Direto pela Freie Universitat Bern DE | Revita de Diteito do Estado Ano? n?6:941-805 janfmar 2007 esto sujeitos todos os modelos juridicos* * & de advertir sempre que a fungao do Direito comparado consiste numn aprimoramento do nacional, @ partir do estudo de institutes utilizados com sucesso em outros sistemas. A pesquisa de institutos juridicos em diferentes paises através do tempo permite configuré-lo melhor no presente e até prognosticar as suas tendéncias para 0 futuro.® 3. Varios aspectos ligados a instituigdes e doutrinas alemas s8o transpo- niveis para o Brasil, onde muitos preceitos das Constituigdes do século XX foram influenciados pelas alemas de 1919 e 1949.6 No entanto, ja advertia Wieacker contra 0 mal-entendido de que Direito alhelo pudesse ser adotado como um todo, sem ser assimilado e, assim, alterado, visto que féo constitui um objeto material capaz de.ser apreendido, repassado ou incorporado, mas uma integra- $80 cultural de formacéo extremamente complexa e alterdvel, um conjunto de diversos processos grupais: histéricos, sociais, intelectuais e psicol6gicos. A co- munidade receptora nao pode ser objeto neste proceso, mas antes o sujeifo, visto que um povg pode “assumir e viver 0 Direito estrangeiro" somente se fizer dele um elemento da sua propria vida e pensamento.’ Cada Estado é um “todo individual sui generis” onde o recebido deve adaptar-se; este fendmeno néo se limita as normas ou instituigdes constitucionais, mas inclu’ igualmente a jurispru- déncia das Cortes.e as teorias, devendo ser necesseriamente um processo cris- tivo. IIl.1. Leis em sentido formal e material; subdivisao das competéncias normativas em nivel horizontal e vertical nas. Constituigées brasileiras e alemas 1. Em quase todos os paises democrticos do mundo moderno, a Cons- tituigeo concede gos Governos competéncias para, no lugar dos Parlamentos, editar também normas gereis, normalimente chamadas de "decretos regulamen- tares"; estes néo séo consideradas leis em sentido formal, mas material” A partir desse entendimento, é correto afirmar que um ato normative sempre pode levar a criago de enungiados juridicos abstratos e gerals, independentemente do fato de a sua origem ser legislativa ou executiva. Ao mesmo tempo, vale friser que 0 termo norma geralé empregado aqui ndo para assinalar a natureza principiol6- gica da mesma, isto 6, que ela néo entra em peculiaridades do assunto a ser 4 vo Dantas, Dire‘io Constitucional commperado — Itrodupgo, 2000, p. 66. 5, Ct, Caio Mério da S. Pereira, Direito comparado @ 0 seu estudo, Revista da Faculdade de Direito da UFMG, ano Vil, 1955, p. 41. © Vide Andress Krell, Direitos sociais ¢ controle judicial no Brasil ena Alemanha os (des)cam hos de um sireto constitucional "comparado", 2002, p. 41 @ 85, 7 Franz Wieacker, Hstéria do direito privade mociemo, 1993, p. 133 ¢ ss 8 Ct. Peter Habetle, Elementos tobricos de un modelo general de recepcion jutidica. In: A-H. Perez Luo, Derechos fhumanos y consttucionalisme ante el Tercer Milenio, 1296, pp. 157 ¢ ss 1786 ss, 9 Hans Kelsen, Teovis pura do Direito— v. I, 1962, p. 78 ss. FADE | Revista de Direlto do Estado Ano? n?§:341-395 janfmer 2007 1. A Consulta ‘A Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental do Ministerio das Cida- des apresenta-nos indagagtes constantes acerca da possibilidade de a Unido regulamentar a Lei de Consércios Pablicos (n® 11.107/05), bem come opinar so: bre a integridade juridica de Minuta do Decreto regulamentar com esse objetivo. Para a necesséria delimitagso temética, foram formulados e serao respondidos a0 finel do parecer solicitado os seguintes quesitos: () O sistema de distribuigao de competéncias legislativas e administrativas da Constituigao brasileira permite que seja instituldo regulamento da Lel 11.107, de 6 de abril de 2005 — Lei de Consdrcios Publicos, por decreto presidencial, especialmente tendo em vista que tal lel deve se limitar a estabelecer somente “normas gerais", que podem ser suplementadas pelos estados federados? (il) As normas do regulamento da Lei n? 11,107/05 devem se dirigir somente & ‘Administragao Publica federal ou devem ser observadas em nivel nacional, isto 6, também pelos estados e municipios? (ji) © conteddo sugerido para 0 regulamento da Lei n® 11. 107/08, nos termos da rminuta anexa, pode ser considerado 0 adequado para a “tel aplicagao" ou excr- bita desse campo? entido e limites do estudo de Il, Questdo metodolégic: direito comparado 1, Desde o inicio, é importante frisar que, pera poder indager sobre a constitucionalidade procedimental ou substancial de qualquer lei formal ou ma- terial, deve-se examinar a norma sempre em sua inteireza, 0 que inclui também a dimensao de sua legitimidade, sem que se possa limitar a investigagao as carac- teristicas técnicas, como vigéncia, validade, eficécia e outras. Por sua vez, “eti- ccia e validez, ser ¢ dever-ser da Constituigao, ainda que devem ser mantidos separados logicamente, referer-se ambos, no obstante, & mesma realidade constitucional em que € posta, sempre, junto com uma destas afirmativas, tam- béma outra’.? 2. Surge, assim, a pergunta acerca da utilidade e das limitagses de um estudo de direito constitucional comparado, que realizaremos neste parecer. Loewenstein, hd meio século, recomendou @ quem “quiser estudar 0 federalismo em seu mais refinado grau, otientar-se na diregdo da Alemanha, que o pratica ha séculos". Entretanto, sendo impossivel “transportar-se um instituto juridico de uma sociedade para outra, sem se levar em conta os condicionamentos a que 2 Hermann Heller, Steatslehve, 1988, p. 919. “Qualquerteoria que parte da alternativa diceito ou poder, norma ou vontade, objeividade ou subjellvidade, desconhece a consirucao dallica da realidade esiatal © 6, por isso, falsa jd no seu ponto de para’ (op. cit). E nossa a tadueso de todos 08 textos do Idioma alarnéo, salvo howver Indica dierent. Karl Loewenstein, Verfaseungelehve, 1950, p. 318. regulamentado, mas simplesmente no sentido de uma norma que liga @ um fato abstratamente determinado uma conseqéncia igualmente abstrata e que preck 2, para poder ser eplicada, de individualizagao. 2. Ponto de partida deste estudo ¢ a ligéo de Pontes de Miranda, para quem as normas gerais federais podem ser estabelecidas ndo somente na forma de leis formais pariamentares, mas também como leis materiais. Comentando 0 art, 6? da Constituigéo de 1946," ele deixou claro que, no émbito des competén- cias legislativas concortentes, @ da Unido inclufa “qualquer fonte de direito fede- ral, endo 86 a le (lei, decreto, regulamento, aviso, circular, portaria, jurisprudén- Gia interpretativa do direito federal, etc.)"1" 0 autor manteve esta posigao até os Comentarios da Carta de 1967/69, que também utlizava a técnica de limitar a competéncia legisiativa da Unido, airibuindo-the o direito de emit, sobre deter minados assuntos, apenas normes gerais, diretrizes ou bases." Todavia, tudo indica que esta inclusdo abrangente de todas as categorias de normas juridicas no Ambito do Diteito federal capazes de ser utlizadas para estabolecer “normas gereis" e, assim, impedir ou suprimir leis estaduais sobre e mesma matéria, esta. va se referindo @ categoria da competéncia supletiva ou complementar dos esta- dos federados, que existe nos casos em que eles apenas "preenchem /acunas ou deficiéncias’ deixadas pela legistag&o federal em relagao a determinados pontos tematicos, sistema este introduzido pelo art. 5® da Carta brasileira de 1934, que foi fortemente inspirada pela famosa Constituigéo de Weimar."° 8. O art. 6?da Carta de 1946, a que se refere o citado comentario de Pon- tes, estabeleceu tambem a legislagao estadual supletiva ou complementar, no entanto, sem mencionar a necessidade de preencher “lacunas” dasleis federais. O autor, na época, nao percebia uma diferenca pratica entre a extensaio da legis- lagao supletiva e complementar estadual nas reas onde a Unido possula com. peténcia privativa e no émbito da restricdo das leis federais a normas gerais."* ‘Além disso, ele também fazia uma extrema ressalva em relagao ao controle judi- cial da abrangéncia tematica das normas fundamentais, gerais, ou diretrizes fe- +o O autor trata da “competéncia concorrentelimilada” da Carta de 1846, segundo a qual @ Unio posia evar hormas gerais de dreilo fnanceio, seguro, previdéncia social, detese © protogao de Baude e regime penitenciério (ar. 6, cle art. 8,6) 0 dretrzes e bases da educagao nacional (at 6%, cle ar. 88, 11 E.G. Pontes de Miranda, Comentarios & Constituipto de 1946, lI, 1963, p. 18 @ ss. 12 F.C. Pontes de Miranda, Comentarios & Constiuicdo de 1967, com @ EC n? 1, de 1969, %. I, 4970, p. 175 ess. 13 ACConsituig8o da Republica Alem8, de 11.8.19, fol elaborada por uma Assembiéia Constituinte Uretemente elt, que se reuria no prédio histérico do Teatro de Weimar (pequena cidade no feslaco federado da Turingia), para homenagesr a heranga dos valores culturais € morais da ‘Alemanha, represertados pelos grandes poctas Goethe, Schiller, Herder e Wieland, que iéinham atuado. 1 “Praticamente, @ dilerenga vai ger nenhuma, O Poder Legislatvo central emite o direto que ‘ntende fundamental e, num e noutro caso, os Estados-membros 86 supiréolacunas e deiciéncias (legislagso fundamental, de base)" cl. FC, Pontes de Miranda, Comentérias 4 Constituigao de 1946, op. cit, p. 5. 344 Gerais: ap6s observar “que a competéncia da Unido ndo ¢ ilimitada, no esgota © assunto, no © exaure”, chega a afirmar que “para 0 corte como inconstitucio. nal, € preciso que o legislador central tenhe ido a pormenores absurdos, pelo inlervir em ‘particularidades do Estado-membro’."® A Carta de 1967/69 voltou & empregar a expresso das normas geraisno seu art, 8, XVII, nas alineas qe o,'8 bem como no seu art. 18, § 12.17 4. De qualquer forma, pode-se alirmar que os sistemas de competéncias concorrentes das Constituigoes brasileiras de 1934, 1946 e 1967/69 ainda consi. deravam a funoao da legislagao estadual, acima de tudo, "supletiva’, no sentido de um preenchimento de lacunas, deficiéncias ou omissbes da respectiva lei fe. Geral" Entretanto, ao contrario destas Cartas pretéilas, nas quais a compstn. Gia legislativa central da Unido sempre era “o centro de gravitagao da esta. dual," no novo modelo das competéncias concorrentes da Carta de 1988, a le estadyal exerce o papel de norma especilica, que se move “em campo pro. prio’. 5. Neste ambiente conceitual alterado, que visivelmente pretendeu au- mentar a area de normatizago dos estados, o &mbito da legislagao federal nao ode Ser estendido a todas as fontes materiais de Direito produzido por érados executivos da Unido, com a incluséo de regulamentos, avisos, circulares, porta, 38 até da “jurisprudéncia interpretativa’. E, apesar de a citago em comento “do Bbresentarreferéncias a autores germ&nicos (ao contrério dos outtos ase: los das competéncias concorrentes), a extensdo material da legislagao federal a todos os tipos de normas juridicas procuzidas por érgéos da Uniao parece tor sido inspirada pelo famioso preceito do Direito Constitucional alem&o. “Direlto fe. Geral invalida Direito estadual"®" (Bundesrecht bricht. Landesrecht).” Entratanto, 18 Op. cit, p. 6 (destaque nosso}; iguaimente: Comen 1, de 1865, op. cit, p. 168 6 se. F goae ecm & Unite: XII — legislar sobre: c) normas gerais sobre orgament, despese <,seswe patrimonial © fnencera de natureza pdblica; xa judlciva, cusiee e ereclonnones ‘emunerstirios dos serviges forenses, de regisros pablicas e notaries: de diets tmeneeher oe SRC. previdencis socal de defesa e protaydo da sade; de rogime previdenlarin sy ences fa Ui gecucaedo nacional narmas gerais sobre desportes. Perdgralo Unico, A coven e Gr ne nko excl a dos Estados para lagsiar supletvamente sobre as malétios oes ciere 98 v do item XVI, respetada ali fderal"(Redago dada pola EC n° 7/1977) contigs Se cite Gel Complementar estabeleceré normas geal de dielto tibutstio, cspord oe eros ncapeténcia nessa matéia ene a Unido, os Esiados, oDistlo Fedral Se Msc © reguiaré as limitagdes consttucionals do poder de tibutas ** Aecre L. Borges Neto, Competéncias legislatvas dos Estadas-mombros, 1990, p. 128 “aul. Lelie Farias, Competéneia federativa ¢ protecso ambiental, 1999, p. 850. Sala Aleto Lobo, Competéncie legislatva concorrente dos Estados-membros na Constuk (0 de 1986, Revista de Informacéo Legislatva,r® 101, 1969, p Sse oe erage cae sertice etmelégico do verb alamo brechen (= quebrar & mals forte do que Gerrogar, Parecendo, por isso, mais adequaca a sua Veducéo pelo lermo posloenes eoecned %. Comentirios & Conetiuicéo de 1946, op. ct. pp. 11, 14 ess.. Nesta obra, ele ainda ee rfere S08 pecelos empregados pelo art. 18 da Carta de Weimar (RelsrecM brieht Lanchech) «ne arlos & Constitvicdo de 1967, com a EC ne DE | Revista de Dito do Estado Ano? nS:361.295 janfmer 2007 345 o proprio Pontes reconheceu que 0 referido brocardo germanico nae combina oer tompeténcias da Uni8o de legislar sobre normas gorals ¢ diretices ©! Sor ee ora atividade legislativa dos Estados-rmembros nao estaria,“submeti- oes otemente, 8 regia juridica ‘Direito federal corta diteto local.” mmanha pés-guerra continuam partindo 6. Doutrina e jurisprudéncia da Aler federal contido em leis constitucionais do principio de que ndo somente © Direitof So rinsrias, mas também em decretos emitidos pelo Executive federal (além 08 inate costumeiro), possul preferéncia em relag&o a todo tipo de Direto produ Go polos estados, até o constitucional™* Porém, é importante frsar que 0s h co elm deste questao apenas no contexto do at. 3t da Lei Fundamental (LF), tue prescreve a reterida ‘invaidagao" da lel estaduel pela federal, condo ave dete principio histérico, nos dias de hoje, tom pouquissima aplicagéo, Vise Sh Gquase todos os confitos entre Direito federal e estadual $80 resolvidos ecient itterpretagao das regras especticas de cistribuigto das competencies legisi¢- vas aris, 70. ss.,LF) Ist significa que o Dirsito federal somente goza de pre- Jaerela quando 6 formal e materialmente valid, isto €, se as respectivas nownas foram produzidas na base e dentro dos limites das competéncias estabelecides pola Le Meier, e que oDireito estadval exstente acaba sendo invalidade pens ae casos de uma contundente coliséo temtica com normas federsis, que regu famentam o mesmo objeto ¢ levam a resultados diversos. a fur 7. Além do mais, ao contrério da situago constitucional brasileira, 80 dos decretos exeoutivos, na Alemanha, nunca foi restita @ servi apenas & Ffegulamentar a execugSo" de leis pariamentares. Por isso, omero fato de Que om weotdes estencdam o efello derrogatério do Direito federal em relagao ao estadval tambem aos decretos editados por 6rgaos executives federais, muito pouce SA" ase ontério para delimitar os potenciais espagos de que dispoe 0 Chele do eeceutivo no Brasil para regulamentar as leis federals promulgadas na base da Sompeténcia de produzir normas gerais ou diretrizes, que devem ser suplomen- tadas por leis estaduais. 8, £ de trisar também que as numerosas referéncias de Pontes de Miran- da a autores alemdes so restringiam, basicamente, aos constitucionalstas de art de Consitulgdo ler de 1871 (Relchsrect rich! Landesrech), Vale observer que 6 See a oe ooretancia a exlas expressdes preteias também nos seus Comentsrios 3 Consiigt man eye Oe ih A070, pp. 174 © 177), iso 6, dues décadas apés a promAgaco, doe) le 1007/68 gonn, cup a. 31 alerou 0 terme Reichsrech (Dieto do impérc) para Bundes: ncefDroto da Unide), 6 um indcio da estelta HgagSo que Pontes sempre mantinha com Testes e douvinas do consttucionalismo alemao anterior a 1983. ‘Comentiros & Consttuigso de 1967, cam a EC nt 1, de 1968, 1 1970. p. 175 or Todavla, no séo Includas neste rol resolurdes edrinstratvas internas, portari [spt 2 agave’ Miounale federas; ct. Theodor Maurz e Feinhold Zippelus, Deuisches Sieterech dene oso! Blank, Fanginenn e Hemmer, Grundgesetz — Basiskorvmeniar, 896, p. 187 se Hare Jochen Vogel, Elrégimen federal dele Ley Fundamental. In: E. Bend ef al, Manuel de Derecho Consttucional, 1996, p. 631 346 Poca da Republica de Weimar (1919-1933) E, embora a “legislagao de qua- G10" (Rahmengesetzgebung) do art. 75 da LF alema de 1949 tenha encontrado o eu modelo histérico, evidentemente, na figura das normas gerals tederais da “Negistagso de principio" (Grundsatzgesetzgebung) do art. 10 da Constituigao de £918, no pode ser olvidado que o sistema federativo e 0 proprio espinito consti. {ucional mudaram bastante naquele pals no periodo pos-guerra. Em relagéo aos efeitos atribuides & referida legislagao principiolégica de Weimar, muitos autores desta época,” apesar de reconhecerem cerias restrigdes das respectivas leis federais, tendiam a dar preferéncia a “unidade do Direito" e ao “primado politico" da Unio (Reich) e tinham por tungao primorcial destes principios o estabelect- mento de normas juridicas "vinculativas para todos", que-podiam invalidar, inclu. sive, normas estaduals contrérias.®° 8. Pode-se considerar um paradoxo que o sistema de competéncias con- Sagrado na Carta de Weimar, considerada “o bergo das normas gerais”, adols. o. posteriormente, por varios outros paises, ao mesmo tompo, néo conseguit: imPedir a ampliagdo dos poderes legislativos centrais no seu pals de origemn 2 E, apesar de ter constituide um Estado de ntido cardter federativo, a relerida Constituic&o nao mencionou este fato expressamente no seu texto e alé demon de citar 0s nomes dos estados alernées que compunham a Federaséo, no he vendo duvidas de que ela apresentava fortes tragos units.» Outra importante ciferenga anire os sistemas constitucionals da Alemanha antes © depois do regi, me nazista é que, com o advento da Lei Fundamental, o cumprimento do manda. frente de editar apenas normas de quadro passou a ser considerado uma ques. eo tcica, plenamente controlével pelo Judicério, enquanto, nos tempos ce Weimar, ainda prevalecia 0 entendimento de que o respeito da Uniao aos releri, dos limites estava situado no ambito de sua “disericionariedade legiferante”, 0 Que, na pratica, impossibilitava uma sindicancia por parte dos tribunals 10. Voltando a0 contexto juridico do Brasil, séo esclarecedoras as pala- wras de Siqueira Castro sobre 0 assunto, que, apés profunda andlise doutrinaria, na fase final da vigéncia da Carta de 1967/69, chegou a afirmar: {Nao ha confundi, porém, enire nés, 0 poder regulamentar do Executivo de tipo Complementar com a competéncia subsidiaria atribuida aos Estados mombine 28 G, Anschdtz, J, Hatsck ents outros. arco 0 colaboxadores do inluente Manual de Direto do Estado Alero, ectado por Gerhard ‘Arschote ¢ Richard Thema (Handbuch des deutschen Stacterechts, 120, p 801 ¢ ee ) Z Ct. Roll Grawert, Die Rahmengesstagebung des Bundes. In: Wal Hlans-Uwe Erichsen, 2004, p. 20, F Stier Somlo, F. Postech-Hetter, F. Giese, U. Prouss, L. Witimeyer r Krebs, Liber amicorum eciataia D. P Morteto, Partha de competéncia na Consituicso de 1968, Norms gorae Faiagleiacas e elementos configuradores, AT — Cademo de Dreito Constitucterdls Gane Poltice, n° 21, 1997, p. 152. onan’ docten Vogel, El régimen federal de la Ley Fundamental. n: E. Benda etal, Marval de Derecho Consttucional, 1996, p. 616 ¢ ss 81 Gt. Rolf Grawert, op. cit, 2004, p. 26. RDE | Revista de Direto do Estado Ano? n?5:341.395 janimar 2007 387 dda Federagéo para legislarem supletivamente sobre matérias de competéncia le- islatva originaria da Unido (..). Assim, por exempio, a0 estaluir 0 art. 8, item XVII, alinea c, que compete & Unido editar normas gerais sobre otgamento, des- ppesa e gestdo patrimonial e financeira de natureza publica, entre outras, materia essa incluida no cogitaco condominio legiferante entre essas entidades da Fede- racéo, ial importa em reconhecer a competéncia dos Estados para a edigéio de leis subsidiarias aquelas normas gerais de nivel federal. O consoroio de normas da-se, al, com efeit, ndo entre a lei eo regulamento complementar federal, mas sim entre @ lei da Unigo e a lei do Estado. Nada obsta, todavia, nesse caso. a ‘decretactio polo Presidente da Repdblica de reguiamento de execucso das cites hae Gra ese nal au eae pat cag ae F660 ‘cluido nem prejudicado pela leislacdo supletiva dos Estados fecierados. 11. Esta posigao é coerente, visto que 0 regulamento executivo de uma lei caracterizada como “norma geral” néio deve necessariamente entrar em por- menores ou assuntos particulares reservados pela Constituigao para o legislador ‘estadual. Ha varios itens materiais que necessitam de um ordenamento uniformi- zado — ¢ por isso devem constar de uma lei federal—, mas, ao mesmo tempo, ‘carecem de uma regulamentagao mais detalhada por parte do Executivo, para que possam ser efetivarmente executados e aplicados por seus destinatérios, se- jam eles os érgaos administrativos dos diferentes niveis governamentais ou par- ticulares. Evidentemente, tais decretos requlamentares também n&o poderéo dispor sobre assuntos nos quais devem ser consideradas pecullaridades ou es- pecificidades regionais ou locals, o que seria vedado a propria lei parlamentar.® De qualquer forma, deve ser rigidamente separada a questo da competéncia pela emisséo do ato normativo em nivel horizontal — se o tema € de atribuicéo federal, estadual ou municipal — da pergunta por sua adequagéona perspective vertical, isto @, na relagao das fontes legais entre si, se a norma pode/deve assu- mir @ forma de lei, decreto, resolugao, portaria etc. ** I.2. Decretos executivos no ambito da “legislagéo de quadro” alemé e brasileira 1. A forma de reparticao de competéncias em que uma parte das maté- rias € atribuida & Uniéo para emisséo de diretrizes ou normas gerais, enquanto s2 Catlos R. de Siqueita Castro, O Congresso e as dolegagtes legislativas: mites do poder rnormativo do Executive, 1986, p. 121. (Grilos acrescentados.) 8 Em relagdo ao art. 20 da Lel n® 11.107/05, que trata de sue regulamentaczo pelo Poder Executivo da Unido, Odele Medauar © Gustavo J. de Oliveira admitem que seu texto legal possul indmeros pontos obscuros e duvidosos, o quals certamente damandam um maior delalhamentc normativo pela via do deereto execute’, alirmando, eo mesmo lempo, que, “embore presente uma atecnia [sic] (normas gerais so editadas por lel, © jamais por decreto regulamentat), Perlinente € 2 preacupagso do legisiador” (ct. Consércios pulblicas: comentarios a Lei n 11.107/2005, 2008, p. 126), Estas alrmagoes deixam divides sobre a posigao dos autores em ‘elagaio & consttucionslidade da edigto do referido Decreto pelo Governo federal u_Tércio Sampaio Ferraz Jt, Intradupae 20 estuso do Dial: Técnica, decisdo, dominagéo, 1904, p. 285 € ss, 348 cabe aos estados federados a sua suplementacéo, é de nitida inspiragéo da Lei Fundamental alema de 1949, cujo sistema foi adotado, com algumas adapta goes, pela Carta brasileira de 1988.°° A caracteristica mais mercante deste mo- delo foi “abrir aos Estados uma estera de competéncias legislativas concorren. tes, em que Ihes é facultado (...) disciplinar uma série de matérias que antes es- capavam de sua érbita de atuagéo legiferante”. 2. Em relagao a situagao na Alemanha, um Estado federativo onde os es- tados federados possuem uma forte tradi¢do de autonomia politica, administrat va @ juridica, Isensee afirma que a Unido tende a esgotar suas competéncias legislativas, a interpretar extensivamente os diferentes titulos de competéncia & tratar de forma generosa os limites quantitativos da sua legislagéo de quadro estabelecida pela Lei Fundamental.®” La, o equilibrio federativo de poder depen- de definitivamiente do dominio dos érgaos administrativos por parte dos estados, Os quais, em regra, aplicam as leis federais com seus proprios corpos burocrati- 0s, 0 que levou a um verdadeiro “federalismo executivot. Volizugsiéderalis- ‘mus). O fato de que o Governo federal alemdo "mantém elevado poder legislativo Sobre os encargos e as receitas do setor publico, e participa muito modestamen- te da execueéo das tarefas", remonta aos tempos do Império, quando a Uniéo Possula pouca forga administrativa propria, e se deve também a influéncia dos Palses ocidentais vencedores da Il Guerra Mundial na formulagao da Constitui- 940 de 1949, que acabou “reduzindo as possibilidades de reestruturacao de um Poder central forte".®* Neste contexto, é interessante a alirmagao de que os pai- Ses latino-americanos de organiza¢ao federetiva também estariam caminhando em ditegao a um “federalismo de execugo” de inspiragao germanica 2 3. A principio, as leis elemas de quadro sempre devem estar aptas a re- ceber suplementacdo por parte dos estados, No entanto, razbes em favor do bem integral” (Gesamtwoh) da Federagao sao capazes de tornar menos rigidos os limites da definigéo destes quadros tematicos. A propria Corte Constitucional (BVerfG) ja decidiu que o legislador federal, na base do art. 75 LF, poderia tam- ss Fernanda D. M. de Almeida, As competéncias na Constiuigéo de 1988, 2000, p. 76; José ‘Alonso de Siva, Curso de aireto consttucional positive, 2003, p77 98 Femanda D.M. de Almeida, op. cit, p. 77 a7 Ci. doset Isensee, Idee und Gestalt des Féderalismus im Grundgesetz. In: J, sensee e P. Kirchhol, Handbuch des Staetsrechis de Bundesrepublik Deutschland — Ba. WV (§ 98), 1986, p 630 @ se, ‘at Cl. Sérgio Prado, Equalizapao e federalism fiscal — ume andlise comparad: Alemanhe, inl, Canacté, Austria, 2008, pp. 69 @ ss, 83 ees. (Destaque no rigina) se F Feinéndez Segacio El federalismo em Américe Latina, Revista Lino-Americane de Estudos Consitucionais, n+ 2008, p. 485. No Basi, um Projeto de Lei Complementar para reguiomentagso Ge art. 23, pardgralo Unico, CF, pretende reservar aos Estados e Municioies as atividades do execuso,ficando a Unido encarregade de estebelocer poticas e dretlizes nacionalt, em cacos de omisséo ou fata de concedes dos enlesinfetiores © pare redusir deseaulorios regione cevidentes, permiti-se-la, mediante concordéncia destes, a eluagao da Unido como execuiors dos medidas e dos servigos ef. Cémare dos Depuiados. Jisticativa do Projeto de LC-PLP (200s ‘autora: Dep. Ricardo Ferraco, Disponivel em: www.camara.gov.br (acess: set, 2006), ROE | Revista de Direto do Estado Ano? n?5: 941-805 jantmar 2007 349 bém “esgolar a normatizagao de aspectos pontuais de ume matéria”, ordenan- do-a de forma integral, ¢ eté criar normas de eficacia imediata perante os cid aos." Assim, determinacios pontos teméticos de uma lei de quacro podem ser objeto de regulagao plena, caso o assunto guarde elevado “interesse numa nova regulagéo federal uniforme, rapidamente ap! ‘avel"" @ a propria lei seja conce- bida numa forma que deixe ao legislador estadual espagos suficientes a serem preenchidos."? 4, No entanto, observou-se que estas "regulagées parcialmente plenas’ (partielle Vollregelungen) abrangentes e detalhadas’ (flichendeckende Detailregelungen), quadro somente pudesse ser identificado “com extremo esforgo’ iam se tornado, em muitos casos, “normatizagoes ujo caréter de * Nesta linha, © Parlamento aleméo, na formulagao da Lei de Quadro sobre as Instituigdes de Ensino Superior,** néo considerou aceitavel o uso restritivo de sua competéncie legislativa de quadro nesta matéria, "em face da dinamica do desenvolvimento do ensino superior’, que precisaria ser dotado de uma unidade funcional. Ao mesmo tempo, 2 jurisprudéncia superior alem& acmitiu também a possibilidade da edig&o de decretos pelo Executivo federal no émbito da legislago federal de quadro,"® como veremos adiante. 5, Caso paradigmético desta linha 6 a deciséo do Tribunal Federal Admi- ristrativo® sobre a validade do Decreto federal sobre Notas (Bundesnotenve- rordnung), de 1981, em que © Ministro da Justiga fixou conceitos de avaliacdo hos exames estatais para 0 acesso as profiss6es juridicas, baseado numa dele- {e¢ao contida na Lei Alema da Magistratura (DRG). Julgou que, apesar de a Unido, segundo o art. 98, II, LF, possuir apenas competéncia de produzir normas de quaciro para dispor sobre as condicoes de capacitagdo do exercicio da pro- fissBo de julz, a propria edi¢do e o contetido do referido Decreto ndo teriam ultra passado 0 €mbito dos paderes normativos federais, invocando, inclusive, juris- prudéncia da Corte Constitucional (BVerfG) neste sentido: “Uma regulamentagéo federal néo ultrapassa os limites postos @ ‘normas de qua- dro quando ela, segundo o seu conteddo e objetivo, é apta enecessitada de uma 40 Hane-Jochen Vogel, El regimen federal de la Ley Fundamental n: E. Bends ef al, Manual de derecho constituciona, 1998, p. 643 4) BVerIGE n® 43, p. 943 ess, 1 Hans-Werner Rengeling, Gesetzgebungszustandigkell In: J. Isensee e P. Kitchhof, Hencbuch ‘des Staatsrechis — Bd. 1V (§ 100}, 1980, p. 638; BVerIG, Neue Jurstische Wochenschiit, 1988, p. 2525 e ss. ‘28 Christof Gramm, Gewaitenverschlebungen im Bundesstsat — Zu Mogiichkeiten und Grenzen der Verlassungsrechtsdogmatik, Archiv des offentichen Rechis, Bd. 124-2, 1898, p. 230. 44 Hochschulrahmengesetz, de 1976; em vigor, hoje, na verso dada pele emenda de 19.1.99 4s. Hans D. Jaress e Bodo Pieroth, Grundgesetz fir ale Bundesrepublik Deutschisnd, 1989, p. 528 (nt 75, Arve), com referencia @ repelidos julgados do BvertG (E n? 4, pp. 291 © 343; n® 66, pp. 270 e 285). 1s Bundesverwaltungsgericht (BVerwG), decisto de 16.8.85 (7 B 51, 8, 58/85 —MUnchen), Neue Juristische Wochenschr, 1988, Heft 14, p. 951 e ss. Suplementaedo através cle um ato de livre vontade por parte do legislador esta: ual no sentido de que somente a referida suplementagdo da obra legislativa so bre o assunto a ser ordenado a tore completa ¢ exequivel (BVerfGE 4, 115, 130), (..) 0 fato de que normas tederais contenham dispositivos completos que. de ‘cordo com o alcance do seu objeto de regulamentago, néo deixam mals espa. 0 para @ legislagao estadual (como o Decreto Federal de Notas), ainda nao ul- trapassa a competéncia de quadro se — como aqui— a regulamentagéo, vista Como um todo, continue apta @;necessitada de suplementagéio mediante legisla. (940 estacual (BVerIGE 25, 142, 152). Enquanto a regulamentago juridice federal No ultrepassa os limites da competéncia de quadro, néo hd motivo para ver uma falta de competéncia no fato de que a regulamentagéo nao tenha sido efetuada, Belo proprio legislador federal, mas —na base de uma delegagao lepal — por Perte de um Ministro federal mediante edicao de decreto." Por fim, 0 Tribunal enfatizou também que o legislator federal jé agira des- {a forma repetidamente, nas areas teméticas das Leis de Quadro sobre a Caga (BJagaG), 0 Gerenciamento dos Recursos Hidricos (WHG), a Protet reza (BNatSchG), 0 Registro dos Cidadaos (MARG) e as Carteiras de Identidade (PersAuswG), 8. Outro exempio ilustrativo da referida tendéncia 6 a Lei de Protegio do Patriménio Cultural Alemao contra 0 Exodo,*" cuja edigéo, inicialmente, ora be Seada na competéncia concorrente (art. 74, |, n?5, LF), o que perma & Unido uma normatizagao abrangente. Em 1994, a matéria fol ransterida para o ambito das competéncias de quadro (art. 76, |,n®6), 0 que indicava a vontade do cons. tituinte reformador de aumentar os respectivos espagos legislativos dos estacios. Todavia, epesar da pretendida ‘refederalizagéo" da area tematica, a nova versio Ga Lei federal, de 1999, praticamente repetiu a regulamentacdo plena anterior, Gisciplinando, de forma detalhada, quase todos os aspectos ligados ao assunto @mantendo, inclusive, a ample delegacao de poder normativo ao Governo fede. Fal, que concede ao Ministro competente o direito de baixar decretos para “real Za¢éo" (Durchtihrung) de varios dispositivos da Lei, com anuéncia do Conselho Federal (art, 21).48 7. Em geral, pode-se observar que ha varias leis alemas de quadro que também delegam poder normativo, de forma mais ou menos abrangente, a or. G08 executivos federais (governo, ministros), sendo que alguns destes decro. {os precisam da anuéncia do Conselho Federal,*® outros néio;® hé também dele. G92¢88 aos governos estaduais, sob condigdo de “entendimento" (Benehmen) Sa Gee 24m Schune deutschen Kuturgutes gegen Abwanderung, cvja versdo original deta de 6.56. 48 Ci. Rolf Grawert, Die Rehmengesetagebung des Bundes Hans-Uwe Erichsen, 2004, p.27 ss, & gi Ge Ordenemenio Terria! — ROG (art. 17 Il); Leide Gerenciamanto dos Recursos Hicricos 5 AG (ers. 60, 190,21, W}; Lei Federal sobre Protegdo da Nalureza ~ BNalScnG (art Sop {© Lei Federal sobre a Ceca — BlagdG (art. 36, I}: BNatSchG (at, 45, I) In Walter Krebs, Liber emicorum ADE | Revista de Direto do Estado Ano 2 n6:341-295 janlmar 2007 351 com um Ministro federal" © emprego destas diferentes formas de delegacao normativa depende da questo se os respectivos “pormenores” (das Nahere) de uma lei de quadro devem se alinhar mais na diregéo de uma regulementagao nacionalmente unitorme ou se prevalecem 0s aspectos que falam em favor de uma maior diversidade regional ®® 8. Na prética constitucional brasileira, também & comum que 0 Poder Executive federal promulgue decretos para regulamentar leis, cuja tematica esté inserida no Ambito do art. 24, CF, que limita a competéncia da Unio & emissao de normes gerais (§ 19). Assim, o Decreto n 3.298/99, regulamentando a Lei n® 7.859/89 sobre a Poltica Nacional para a Integragéo da Pessoa Portadora de De- ficiéncia (base: art. 24, XIV, CF), restringindo-se, basicamente, a estabelecer princfpios e regras para a atuacdo dos érgaos e entidades da Administragao Pu- blica Federal direta e indireta, Jé 0 Decreto n? 1.800/96, que regulamenta a Lei federal n®8,924/94 sobre o Registro Publico de Empresas Mercantis e Atividades ‘Afins (base: ert. 24, Il, CF), no se dirige somente ao 6rgao federal, o Departa- mento Nacional de Registro do Comércio, mas estabelece varias normas espect- ficas sobre 0 funcionamento e a composigéo das Juntas Comerciais, que s&0 subordinadas, administrativamente, aos governos estaduais, deinindo as sues competéncias e sua estrutura bésica, além de prescrever, de forma detalhada, 0s procedimentos do registro e do arquivamento, os processos decisério © revi- sional, bem como a emisséo de certidoes. 9. 0 recente Decreto n? §.591/05, que reguiamenta a Lei rf 11.107/05 (base: art. 24, VI, CF) sobre a Poltica Nacional de Biosseguranca, detalha com- posigdo e funcionamento da Comissao Técnica Nacional e do Conselho Nacio- nal de Biosseguranga, e estabelece que os érgaos da Administragao Publica fe- deral podergo celebrar convénios com os estados e municipios, para a execu- do de servigos de fiscalizagao (art. 74, § 28). Além disso, dispde que qualquer instituigao de ensino, pesquisa cientifica, desenvolvimento tecnolégico e produ- 40 industrial, que ullize técnicas e métodos de engenheria genética ou realize Pesquisas com organismos geneticamente modificados (OGM) e seus deriva~ dos, “deverd criar uma Comisséo Intera de Biosseguranga' (art. 61), 0 que in- lui também instituigdes ligadas as Administragdes estaduais e municipais. 10. Na mesma érea de competéncia concorrente de editar normas gerais, sobre protegao ambiental, oi editada, em 1998, a Lei da Natureza (r® 9,608), cujo art. 70, § 1%, declara “competentes para lavrar auto de infragéio ambiental ¢ ins- taurar processo administrativo os funcionérios de Grgos ambienteis integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente —SISNAMA (...)"°3 © Decreton®3, 17989, st BlagdG (art. 44), 2 Cl. Rolf Grawert, op. cit, p. 86 ¢ ss. ss Esta lel federal obriga, inclusive, qualquer autoridade ambiental a epurer, imedialamente, as infragoes de que tiver conhecimento, sob pea de co-responsabildade (art. 70, § 39), define os prazos méxirios de apuragéo (ert. 71) # a8 possivels sangoes admiistrativas (ar. 72), prescre- endo que as respectivas multas devem ser reverticas aos Fundos de Melo Ambiente da Unigo, regulamentando-a, especitica as sancdes aplicdveis as condutas e atividades lesivas ao meio ambiente @ volta a se referr, repetidas vezes, aos “érgé0s do SISNAMA’, 0 que inclui também reparticoes administrativas estaduais ¢ murict. pals, criando prescricdes para @ sua aluacdo (art. 22, § 6% demoligéio de obras art. 2%, § , |e Il: aplicagao da multa simples), 11. Iguaimente, exister Decretos tederais nas reas tematicas do art, 22, CF em que a Unido — apesar de sua competéncia ser privativa—tambom oetd firiteda a produzir normas gerais. Assim, o Decreto n®3.658/00, que requlemen. j2.2 Lei n° 8.666188 sobre Licitagdes © Contratos Administativos (base. art 22, XXVI CF) @ cria & modalidade lcitatéria do ‘pregao eletrOnico", é considerado, Bor alguns, de aplicagéo obrigatéria também para os estados © municipios, quando se refere a bem ou servigo comum.4 llL3. A (antiga) discussao sobre os limites de contetido das normas gerais federais |. Embora no seja objeto deste parecer a andlise da constitucionalidade Gos dispositivs da prépria Lein® 11,107/05, 6imprescindivel tecer algunas con Sideragdes sobre a natureza, a fungao e os limites das normas gerais federais do sistema brasileiro de legislagto concorrente, visto que a abrangéncia do conteo Go deste conceito possui suma importancia também para poder alert a extencao Go espago material que se abre para a regulamentagao da reterida lei pelo Go. verno federal. Para tanto, no € preciso adentrar profundamente na discussao Ceultinara sobre as oiiculdades da fixagdo dos limites materiais das normas ge, {2is.ne contexto das competéncias legislativas concorrentes da Carla de 1908, tendo em vista que este tema jé fol abordado, com profundidade € propriedade, Por Dalmo Dallari® ¢ outros juristas. 2, Num estudo comparativo, Roschmann® alega que constituinte bra- Heiro de 1988 orientou-se, na concepgao das compeléncias concortentes, 'ais ou menos no exemplo alemo, porém, sem levar suficientemente om con. 12 realidacte ¢ a histeria de permanentes abusos por parte do poder cenifcl, © Nuk Geveria ter levado a uma melhor definigao do conceito das normas gerais, Na forma atuel da redacéo genérica falterlam “pontos de relerencia concoce ; ‘ento pera. legislador federal e estadual quanto para os tibunais, para tracer o¢ os estados ou municipios (art. (ert. 75), & Didgenes Gag P.30. initacdes, ee alat, Normas gerals sobre sede no Estado federal brasileiro: cabimento e livtagoes, Revista LatinAmericana de Estudos Constiucionals, n° 1, 2006 esi Gack Hecuttslan Roschmann, Veroeich des federatven Aufbaus: Bundesrepubik Deutseniand! — Toot ng URN Brasion, mit Schwerpunkt au dem BuncLancer Verein, (Dae: Unis la) 1991. p. 78 78) @ fixando © seu valor maximo em cinqdenta milhées de reals Patin, Prego presencll In: D. Gasperinl, Prego presonciale eletrénico, 2006, DE | Revista de Diteitodo Estado Ano? nf: 341.395 janvar 2007 limites exatos entre as dreas de competénola. De qualquer forma, as mittiplas tentativas de criar critérios e identificar carateristicas genéricas para as normas gerais viever sempre respeitar a ressalva da especificidade de cada materia tre- tada. Além disso, os limites concretos das competéncias legislativas concorren- tes dever ser fixados a partir de uma interpretagao sistemaitica do texto const tucional como um todo, bem como submetidos a uma criteriosa hermenéutica teleoidgica. O mesmo vale para a densidade tematica que se deve conceder (ou do) & regulamentagdo das leis formais mediante decreto por parte de Executivo 3, Nesta linha, Ferraz Jtnior alega que a abrangéncia do contedo de normas gerais federais deve ser definida mediante analise do seu contetido fina- listico, para identticar 0 “interesse prevalecente na organizac&o tederativa” bra- sileira que, segundo ele, "aponta muito mais para um federalismo do tipo coope- rativo, que exige a colaboragéo dos entes federativos e confere, corresponden- temente, menor importéncia a separagao e independéncia reciproca entre eles (..) Assim, toda matéria que extravase 0 interesse circunscrito de uma unidade (estadual, em face da Uniéo; municipal, em face do estado) ou porque é comum {todos tém o mesmo interesse) ou porque envolve tipologias, conceituacées que, se partioularizadas num @mbito auténomo, engendrariam conflitos ou dificulda- des no intercdmbio nacional, constitul matéria de norma geral.’®” Este fator pro- picia, evidentemente, a produgéo de um regramento homogéneo em assuntos de interesse nacional.*® 4. As decis6es do STF, nas tllimas duas décadas, tiveram a nitida ten- dencia de ampliar a estera de atuacao da Unigo em detrimento de estados municipios, langando mo, no émbilo das competéncias concorrentes, de um conceito bastante formal de normas gerais. Além do mais, “nos casos de divida sobre a incluso de determinada materia na esfera das competéncias concor- rentes ou no émbito das competéncias privativas da Unio, o Tribunal decidiu em favor da segunda hipdtese.” Também no acérdéo da ADIn 927, 0 STF, apeser de ter ensaiado, pela primeira vez, um efetivo exame material do conceito constitu- cional de normas gerais, recusou a alegagao geral da inconstitucionalidade da aplicagao da Lei n? 8.666/93 aos estados e municipios e limitou ao émbito da Unido a eficécia de apenas alguns dispositivos, que tratam da exigéncia de lic tagdo referente & doacdo e permuta de bens méveis ¢ iméveis entre Grados ou entidades da Administragao Publica © 51 Tércio Sampaio Ferraz J, Nermas gersis e compettncia concorrente: ume exegese do arllgo 24 da Constiuigge Federal, Revista Trimesiral de Direito Pablco, n° 7, 1994, p. 19. 48 Ci. Yara D. P. Montelo, Parte de competéncia na Constituicao de 1988. Notas gerals, AT Cadierno de Dello Constucionel e Ciencia Feltica, nf 21, 1997, p. 156. 58. Ci. Antonio G, M. Maués, 0 federalismo brasileiro na jrisprudéncia do STF (1988-2003). In: F LX Rocha e F. Moraes, Direlo constitucional contemporéneo — esiudos em hommenagem a P. Bonavides, 2005, p. 75 € 81 es8.. Magno G. Chagas considera estas decisOes “inetocdvels’ Visto {que eviariam a implantagao de "ums crise prejudicial ao sistema brasileiro" (Federaliso no Eras (0 poder consttvinte decorente na Jursprudéncia do STF, 2006, p. 82) 354 mediante aplicacao dos Principio gerais da hermeneutica e dos consagrados no texto da Carta oe obs Fara cle, a legislacao federal sobre normas gerais nao deve “ater se on es dos rincipios e dos critérios, deixando a regulamentagao dos institutoe espectticos 2 ieaislagao estadual”, destacando que normas gereis *séo todas ae cones Fred os Ga Unido, desde que eplicaveis unitormemente a todos os Estadoxe Erodes 0s cidadéos, sem dlscriminagoes, ou seja, normas de eplioagao oro: (2.6m todo 0 teritério nacional” ®" O tema da necessidade de uma normatizagao homogénea e até uniforme em nivel nacional seré aprofundado rare adiante, IIL’. Bases constitucionais da edigéio da Lei n? 11.107/05; a relagao entre competéncias legislativas privativase concorrentes da Unido na Carta de 1988 1. Como jéfrisamos, a questéo da possibilidade @ da extenstio da regu- 2rrentacdo da Lein® 11.107/06 por decreto presidencial esta intimareene ligada 2 celimitagao da base de competencia da propria lei parlamenian Necks « ‘con S0rGi0 Pablico € objeto de normatizagéo mediante dispositivos de natercze dife- jarehoe’ ambito do Direto Civil (ant. 22, |, CF), ela os concede a personcicecs [urlca: na érea administrative, ria as condigbes para seu tunclonamenie a Fe nareepe see (att. 22, XXVII, CF) para execugdo de servicos publicos, maces ra financeira (art. 24,1, CF), estabelece regras sobre a sus fiscalizacao contabil, gestéo econémica etc. Assim, Plena. @ privativa de normas gerais e @ concorrente pa Gependencio do ponto tematico especttico. Neste ponte, 2. Na medida em que 0 ar. 241, CF, aribuiu a competéncia de ecttar lels sobre consécios publicas e convénios de cooperagdo anire ce entes fede- 0 Ch André Borges Neto, Competéncias least Alats C. Alves, vas dos Estados-membros, 1898, p. 127; ‘Sancamento bésico: concessées, perm Ges € convénios puibicas, 1986, p. 102, Giles Lele Farias, Competdncialaderatvae protegao ambien, 1999, pp, cba ¢ op fe Cl. Hans-Werner Rengeling, Gesctzgebungezust uch des Steatsrechis, Bd. IV (8 100), 1990, 748 © “Art 241. A Unido, os Estados e os Muriel Dblicos © 0s convénios de eoopereedo ene oe tandiokeit n: J. Isensee e P. Kirchhot, Mend: ios disciplinaréo por melo de lei es consbrcios ‘entes federados, autorizanco a gestéo aesoclade FRDE | Revista de Direiod Estado Ano? n?5: 41-305 janfnar 2007 355 rados, ao mesmo tempo, a todas as trés esferas governamentais, sem delimitar os limites para cada uma, a norma deva ser compreendida dentro do contexto do captizic constitucional especifico sobre as competéncias, 0 que faz com que @ sua interpretago deve se alinhar ao sistema estabelecido pelos arts. 22 e 24, CF. Isto significa que a Unido possui direito de prescrever normas gerais no sentido do art. 24, § 1°, CF, “através de lei geral nacional, a ser obedecida pelos Estados Municipios quando disciplinarem a mesma materia’, cabendo aos estados 2 competéncia suplementar (art. 24, § 2), Isto vale mais ainda considerando-se 0 fato de que o art. 241 foi inserido no texto constitucional somente em 1998, pela Emenda n? 19. A simples mengao de possiveis leis oriundas das trés esferas es- tatais sobre 0 tema "consércios piblicos", portanto, no teve 0 condiio de erlar uma exceco @o conjunto do sistema das competéncias legislativas criado pelo Poder Constituinte originario. 3. Para Medauar e Oliveira, a edigdo da Lei n®11.107/05 teve como funda mento constitucional, “ao lado do art. 241", 0 art. 22, XXVII, CR®° que concede & Unio a competéncia privativa para legislar sobre “normas gerais de licitagéo e contratagao, em todas as madalidades, para as administragdes publicas diretas, autérquicas e fundacionais da Unido, Estados, Distrito Federal e Munictpios dispositivo este que se afina perfeitamente a opgaio do legislador de prescrever & formalizagao dos consércios publicos por contratoe ao teor do art. 1°da Lei, uma vez que ela “dispoe sobre normas gerais para a Unido, os Estados, 0 Distrito Fe- deral e os Municipios contratarem cons6rcios piblicos para a realizagao de obje- tivos de interesse comum e dé outras providéncias". (Destaque nosso.) 4, Ao mesmo tempo, os citedos autores reconhecem que "mesmo formal- mente identiticada na categoria de lei de normas gerais, percebe-se (...)0 intuito de regular, com grande abrangéncia, omodo e a forma como os entes federados Uniréo seus esforgos em torno de objetivos de interesse comum. Tais aspectos, como, por exempio, o protocolo de intengo, 0 contrato de rateio, a formatagao, da natureza juridica dos consércios publicos, parecem ser de dificil suplementa- :40."®9 Assim, é evidente que a Lei n® 11. 107/05 trata da propria formagdo e do funcionamento dos consorcios publicos, dispondo sobre vérios pontos ligados & sua propria natureza juridica, indo muitos além de meros aspectos de sua con- tratagao por entes estatais, o que leva & concluséo de que as bases constitucio- nais para sua edig&o se encontram, ao lado do ert. 22, XXVII, no proprio art. 241°”, e, também, no art. 23, parégrato Unico, como mostraremos adiante. de servigas publics, bern como a transferéncia total ou parcial de encargos, servis, pessoal & bens essencials @ continuidade dos servigos transfers. 164 Floriano de A. Marques Neto, Os consércios publcos, Revisia de Direlto do Estado, 1 2, 2006, p. $04 6 919 e ss, 5. Odete Medauar @ Gusiavo J. de Oliveira, Conséreios publicos: Comentarios & Lei 17.107/20085, 2006, p. 17 es. 0 Op. cit, p. 19 @ 8. «67 Este artigo oi, Inclusive, citado como base de competéncia pela EM 18 (de 25.6.2004), que acompanhou 8 apresentago do PL 3.884 (2004) e a Jusiicagao do PL 1.071 (1999). 986 5. Ainda que doutrinadores de peso entendam que o sistema dos §§ 12-42 do art. 24 seja aplicavel também as normas gereis indicadas em outros artigos Constitucionais, visto que “a caracteristica da legislacao principiolégica (normas gerais, diretrizes, bases), na repartigéo de competéncias tederativas, consisle €m sua correlaczo com competéncia suplementar (complementar e supletiva) dos Estados’.® parece-nos mais coerente a posig&o de que a suplementacao estadual de normas gerais federais editadas no campo das competéncias priva tivas do art. 22, CF, represente o exercicio da sua competéncia legislativa rema- nescente assentada no art. 25, § 18, CE 6. De qualquer maneira, o art. 22, XXVII, CF, representa uma importante base de competéncia da Unio para editar normas gerais sobre os consdrcios pablicos, que, segundo a concepgo da prépria Lei n® 11.107/05, possuem ca. Fater eminentemente contratual.” Além disso, é de lembrar que o relerido inciso se refere, expressamente, a “todas as modelidades" de licitagdes e contratos era @ Administragao Direta e Indireta, 0 que alarga @ sua area de abrangéncia tematica.”" Nao concordamos que seria um “equlvoco" ou “erro de redagaio" 0 Constituinte de 1988, no ambito das competéncias legislatives privativas da Unido (art. 22, CF), ter colocado incisos que somente permitem @ promulgagao de diretrizes ou normas gerais federals, com a conseqléncia de que a sua abrangéncia substancial seria idéntica & das normas gerais dai legis\agéo con- Corrente (art. 24, § 1°, CF)."® A premissa maior para a interpretagdo do texto da Lei Malor de qualquer pais deve ser sempre que todas as suas palavras "tem uma fungao @ um sentido proprio", sendo que *ndo hé palavras supériiuas na Constituicéo, nem se deve partir do pressuposto de que o constituinte incorreu 1m contradigéo ou obrou com mé técnica”. 7. Através de uma andlise sistematica da questo, chegamos a conclu: 8&0 de que houve a intengéio de conceder & Unido, nessas areas materiais, um espago maior de decisao e permitir uma normatizag&o mais densa dos assuntos arrolados no art. 22, até daqueles em que hé uma limitagao & edigao de normas gerais; se no fosse assim, a matéria teria sido inserida no rol do art, 24, Destarte, as normas gerais e diretrizes da legislagao privativa preconizadas em alguns in. 6 ost Alonso de Siva, ‘STF —ADInMC 1926-FE. @ Ci. Marcelo Labenca C. de Aratjo. O condominiolegistativo: um estudo sobre a possibitidade e aplicagao do principio de subsidlariedade na reparigéo de competéncias legisiatves cones rentes entre Unido e Estados-membros previsia na CF brasileira de 1808 (Dissertevao de Miecieng, FPGD-UFPE), 2001, p, 116 e ss., com referéncia ao STF — ADIMC n®2.336-SC, Rel. Min, Maney Alves, de 28.5.2001. Disponivel er: won. govbr (Informative ré 229), 70 Fiotiano de A. Marques Neto, ap, cit, p. 323 (apés profunda endlise des teories existentes sobre o assuntc). 7 Cl. Adiison A. Dalla, Aspectos juries de lictagzo, 1997, p. 24 72 Assim: Curso de cireito consttucional pesitivo, 2003, p. 802; no masme sentido Fernanda DM, de Almeida. As competéncias na Canstiuigéo de 1988, 2000, p. 104 78 Luls Roberto Barroso, Interpretacao e gpleagéo de Constitulggo, 1899, p. 190. FIDE | Revista de Direto do Estado Ano? n°5:341-395 jenmar 2007 cisos do art. 22 podem ter uma abrangéncia mais ampla do que as baseadas nas ‘competéncias concorrentes. Nessa linha, Valle Figueiredo enfatiza, em rela a0 aft. 22, XXVII, CF, que "a competéncia para normas gerais é privativa, portanto ample"; 6, apesar de admitir também sua suplementagao nos moldes do art. 24, §§ 12 e 2%, ela arremata: "Se as normas de licitapao e contratos inserem-se no direito administrativo (...), quis a Constituig&o, expressa e enfaticamente, alojar tudo que fosse pessivel de ser geal, homogéneo apenas na competéncia da unio."”4 8. O préprio Supremo Tribunal Federal (STF)’® brasileiro entendeu que "a cistingdo entre competéncia exclusiva e competéncia concorrente nao se fez ern atengao ao valor intrinseco das matérias que constituem objeto de uma ou de outra (.), mas, sim, em vista do interesse da federacao, que exige que certas, matérias, quaisquer que sejarn os aspectos de que se revistam (...), tenham a mesma disciplina em todo o teritério nacional, 0 que s6 é possivel meciante a atribuig&o de competéncia exclusiva da Unido para legislar sobre elas.” 9. Destarte, “6 possivel afirmar que e competéncia privativa exerce um direito de preempoao sobre a competéncia concorrente € mesmo a comum, sempre que entre elas se identifique um ponto de contato’, sendo esta “e forma pela qual a pratica judicial @ administrativa tem solucionado as questbes: com maior centralizagéo".”* E interessante observer que, na Alemanha, a doutrina ea jurisprudéncia constitucional tém seguido a mesma linha, conferindo & Uniéo 0 direito de utilizar a base de competéncia mais abrangente, nos casos em que a ‘matéria regulada por uma lel federal podia ser enquacrada, ao mesmo tempo, em diferentes titulos (competéncias privativa, concorrente ou de quadro) da LF.” 10. E de frisar também que a preferéncia da competéncia legislativa re- manescente dos estados em caso de nao-mengéo expressa da matéria no siste- ma de distribuigao de competéncias constitucionais (arl. 25, § 1°, CF) n&o deve ser entendida como uma “presungdo geral" da competéncia estadual em relagaio federal, E sempre preciso adatar nao a interpretagaio “mais restrita possivel’ das competéncias da Unio, mas aquela que corresponda melhor ao sentido da 1 L. Valle Figueiredo, Competéncias administratives dos Estados e Municipios — Licitagdes, Revista Trmesiral de Direto Pablo, r# 8, 1994, pp. 29 6 31 @ ss.. Arma ainda a autora: “AS rrormas gerais, pare ds, possuem caractersticas diierenciadas das normas, com hierarquia normative inloitéia a0 legislador ordinério, se estadual ou municipal, de cisporem de forma dlferente, € a8 mealérias, que devam ser objeto de normas gerais, no podem ser legisiadas por tuttos enies polticos, # néo ser nas hipSteses consitucionals de suplementaglo (art. 24, §2° da Consituigio).” Todos destaques no original.) 18 ADIn 2.996-G0, Rel, Min, Ellen Gracie, j.8.5.2005. Na mesma linha, o STF negou — no ambito do art 24 GF — que, "nouso da competence legisltiva residual um estado forule uma discipiina que acebe por alasiat a aplioagae das normas federais de cardler geral" (ADIn 8.035-PR, Rel Min, Gimar Mendes, |, 6.4.2005) 16 P. de Bessa Antunes, Direo ambiental, 2008, p. 75 (Grilos acrescentades.) 27 Cl, Theodor Maunz. In: Maune, G. Doig et al, Kommentar zum Grundgesetz, 1987 (ar. 7, Fin. 42; art 73, Prt. 11; art 74, Rec 7). 358 propria subdiviséo & seja mais adequada ao eletivo exercicio das proprias fun- bes normativas,”® 11. Por fim, a base da normatizagéo federal sobre os consércios puiblicos pode ser encontrada também na competéncia implicit ou natural para regular 0 assunto. Segundo a teoria dos "poderes implcitos” (implied powers) da Suprema Corte dos EUA, atribuem-se a Unido, além das competéncias expressamente gnunciacles no texto constitucional, aquelas matérias que séo pressupostosin- dispenséveis para atingir es finalidades enunciadas.” Na Alemanha, existe a Possibilidace de uma competéncia legislativa ser considerada federal “em virtu de da natureza do assunto” (kraft Natur der Sache). quando hé uma “necessida- de coercitiva” de uma regulamentagao por parte da Unido. Ainda que a inci- déncia deste tipo de competéncia deva ser interpretada sempre de forma restri- {iva.*" ela serve pare robustecer a afirmacélo da competéncia federal de produzir ormas sobre o assunto em tela. lIL5. A importancia de uma leitura sistematica e integrada dos arts. 23 e 241, CF, para a interpretagdo da competéncia federal de legislar sobre consércios puiblicos 1. Ha fortes indicios de que a Lei n® 11.107/05 teve como fundamento constitucional para a sua edigao— ao lado dos aris. 22, XXVI, e241 — também © pardgrato unico do art. 23, CF, epesar de no se tratar de uma lei complemen- tar, como determina este dispositive." Mesmo assim, a reterida norma é impor- lante para se chegar a uma interpretagdo sistematica coerente, integradora e Coneiliadora dos dispositives constitucionais citados, que tratam de competén- Cias legislativas aparentemente distintas, 0 que afeta também o respectivo espa go.de poder regulamentar do Executivo. Na verdade, a insergéo do art. 241 (pela EC 19/98) corrigiu @ omisso do texto da Carta de 1988, que mencionava a coo- Peracao entre os ents federativos apenas em relacao as competéncias comuns, mas no a cogitava no émbito do exercicio das tarefas prdprias de cada um, como se “riscasse linhas de competéncia compartimentada, que néio se podiam {anspor sequer pare a¢des conjuntas, batradas pela autonomia garantida no art. 18, CFS 2 Hans-Werner Rengeling, Gesetzgebungszusténdighel. In: J, lsenese e P.Kirchhol, Hanabuch ee Staaterechis, Bd. IV (§ 100), 1990, pp. 735 « ss.,.com referencia & dacisdo BMerIGE r? 15, 126 66. © 139. } Ci. André R, Tavares, Curso de direlto constitucionel, 2008, p. 645; f , Hans-Werner Rengeling, op. cit. p. 747 € ss. i Ct. Kontad Hesse, Elementas de direlto consitucional de Republica Federal de Alemanha, 1998, p. 192 es, 2 Odete Medauar e Gustavo J. de Oliveira, Consdrcios publices: comentérios & Lei 11.107/2005, 2008, p. 17 ess, 4 Jesse T. Pereira Jr, Da relorme administrativa constitucional, 1999, p. 384 DE | Rovistade Diretodo Estado Ano2 r5:341-295.jenvmar 2007 2. A respeito da relagao entre os arts. 241 e 23, CF, tudo indica que so- mente a Unio é capaz de fornecer a Federagao brasileira um “quadro geral" dos institulos previstos na Constituigao, dentro do espltito € dos limites fixados por ela; neste mister, cabe ao ente central enquadrar as competéncies legislativas € ‘administrativas dos demais entes sabre a matéria.™ Se o legislador tivesse trata- do 0 tema com mais sensibilidade didética, teria atribuldo a este dispositivo da Emenda (art. 241) uma posigo mais adequade no conjunto da Lei Maior, intro duzido-o nela como “art. 23-A*, para expressar melhor a intima conexéo material dos dois dispositivos.® 3, Representaria um equivoco hermenéutico exigir que a Lei n? 11.107/05 fosse necessariamente uma lei complementar, o que seria preciso apenas se ela objetivasse a cooperagao entre Unido, estados € municipios sob 0 aspecto do “equillbrio do desenvolvimento e do bem-estar em ambito nacional’.®° Como a lei so limita a estabelecer regras gerais constitutivas de cons6rcios publicos “para a realizagtio de objetivos de interesse comum” (ert. 12), no esid restrita &s ages voltadas para o fim da referida parte final do art. 23, pardgrafo nico. Isto signifi- ca que néo existe uma ligagao direta — e, muito menos, uma “dependéncia" — entre a formag&o de consércios publicos, previstos no ert. 241 CF, e as compe- téncias administratives comuns do art. 23 CF” A partir da EC 19/98, ficou est belecido que o tema especifice dos consércios publicos podia ser disciplinado Por lel ordindria, ja que a exigéncia de aprovacao por maioria ebsoluta de uma lei complementar teria “dificultado, sobremodo, a efetividade da solugao alvitra- da” Era o direito legitimo do Poder Constituinte reformador efetuar esta altera- {980 no sentido de baixar o quorum qualificado, para facilitar a promulgagéo de uma lei federal sobre consércios publicos, visto que se tornavam cada vez mais, evidentes as dificuldades polticas para aprovagao da lei complementar do art. 23, paragrato Unico, CF. 4. Por derradeiro, tudo indica que o Poder Constituinte reformador, quan- do estabeleceu, no art. 241, CF, omandamento de que Unio, estados e munic- ios “clisciplinarao por meio de leios consércios publicos e os convénios de coo- Peragao entre os entes federados, autorizando @ gestao associada de servigos ublicos (...)" (destaques nossos), nao teve a intengdio de criar uma espécie de ‘competéncia exclusiva” de cada integrente da Federagdo para normalizar, iso- ‘+ Flotiano de A. Marques Neto, Os consbrcios publices, Revista de Direito do Estado. n? 2, 2006, p. 328. 48 A técnica de inserir novos artigos na Constiuigéo no luger tematicamente mais adequade, iGenificados com letres acrescentadas ao ndmero dos disposiivee & serem complemeniados, loi ‘adolade no Brasil somente a parr da EC 25/2000, que acrescentou ao texto da Lei Maior 0 ar 29-4 (que trata da remunerageo de veteadores) © Cleber D. Olivera de Siva, Consideragées sobre a futura reguiamentago da lel geral dos ‘consorcios piblces, disporivel em: hip:sfus2.uol.com br/doutrina/exto.esp7id=7863 (acesso: Se 2006), 7 Cl Odete Medauar © Gustavo J. de Oliveira, op. cit, p. 25. Jessé 7, Pereira Jc, De reforma administrative constitucional, 1990, p. 386. 360 ibém porque a Jurisprudéncia que uma regra que subordinasse 's por érgéios do Executive a auto- 5. 4 teferida emenda era necessaria tami Suprema, desde 1980, era firme no sentido de & celebrago de acordos ou convénios firmados magao prévia ou ratificacéo legislativa feria o principie de independéncia e har- oe oan G8 Poderes, com o agravante que “entendia-se que ial Shave, abarcaria ©8 consércios".® Esta linha do STF, 1 So.t8e do at. 241 no texto da Lei Maior, em 1998, pelo mence ne que diz respeito relate amentos dos convanios de cooperacao.™ Nestas decisoee ecentes, hé {eleréncia @ numerosos precedentes do Tribunal" que sivas datam de tempos | arteriores & EC 19/98, o que comprova que a Larégia Corte brasileira, no &mbito | Gas Competéncias federativas, possui o costume de os rele sua jurisprudén- | pre ot (mesmo pretérita) sem atribuir a devida importancia 2 inovagoes no Proprio texto constitucional sobre o assunto.®@ 6.Em 2002, 0 Gerais,* que facultava aos m mento da nants 2provado pela Cémara municipal, para a gestae, cok Planeja- rant oc uneoes pablicas ou servigos de interesse comune a forma perma- | nente ou trensitéria (I), e cooperar com a Unido eo estado, nos termos de convé t m0 ou consorcio previamente aprovados pela Camara Municipal, na exeougaio i 8 Odete Medavar © Gustavo J. de Oi % Em 2003, 0 STF declarou a inconstituc Govern Go eal Compelis& Assembisialegislatva auforsar concer Gowetno do Estado com entidades de Direho Publics ox | ivelra, op. cit, p. 71 tonalidade do art. 54, XX), da Carta estacuel do Parend, erem celebradas pelo Privado (ADIn 342/PR, Rel. Min. Sidney I \uigdo do Estado de Santa Catarina (arte rwénios, ejustes, acordes, convengées @ instumernc Ain 342s MG 0.1997: ADIn 46228, de 1997, ADIn67BFU, de 1996, ADIn 177IRS, oe 1996; | Bin SAID. de 1960; Fp 1.210/RI, de 1084: Rp 1.02NGO ne ee | U postin GM. Meués, 0 tederaismo brasileiro na iggredncta do STF (1988-2003), in: F | Eionaviser ef; M%Ses, Dro constiscionl conterphraney eS fem homenagem a P. | unde ay z205, P85. Pat is, ndo cencordamoe coh eee 7 ne Jonior (op. cit, p. $88) \ or [oh eae Que a Erends 19 seputs @ contovesia [eaeencer ‘aprovacao de convénios i Ser carealno mesmo Senco da orentagao preteen Se yes de que “a materia passa & ser Caracteristleamente adninistallva, com aval eoveah eros ADIN 770NG, Rel Min Elen Gracie, j. 1.72002, BJU 20.9 2000. DE | Revisiade Diet do Estado Ano? 15:34%-995 janimar 2007 de servigos e obras de interesse para 0 desenvolvimento local ({I). Ao mesmo tempo, n&o (oi objeto desta ago o inciso Il do mesmo artigo, que continua per- mitindo aos entes locais "participar, autorizado por lei municipal, da criagéo de entidade intermunicipal para ealizagéo de obra, exercicio de alividade ou exe- cugo de servigo espectfico de interesse comum” (destaque nosso), 7. Observe-se também que nem sequer se menciona nesta decis&o o ter mo "consércio" — ulilizado pelo proprio art. 181, I, CE-MG (que foi parciaimente anulado) —, falando-se somente de "acordos convénios” administrativos que Bo poderiam ester sujeitos & eutorizagso prévia do rgao legisiativo municipal. Este fato, junto ao tratamento apenas periférico dispensado aos convénios de cooperagao por parte da Lei de Consércios Pablicos," leva a crer que os dois, instrumentos administrativos tomaram rumos juridicos diferentes. Além disso, seja lembrado que dificiimente foi contestada a necessidade de aulorizagao le- gislativa para participagao de ente federetivo em convénio au conséreio que en- volvesse despesas (0 que é regra), em virtude des exigéncias da Lei n® 4.320/64 e da necessidade de incluso destes gastos financeiros nes diferentes leis orgamentarias (art. 165, CF). IV.1. O contetido substancial da Lei de Consércios Publicos e © sentido da distingao entre leis federais e nacionais sob a égide da Constituigao de 1988 1. JA foi mencionado que a constatagéo de que, no mbito das compe- téncias legislativas concorrentes, poderé haver também normatizacéo federal por meio de edigéo de decretos regulamentares, por si, contribui muito pouco ara a definiggo da possivel abrangéncia do conteuido material destas normas executivas. Para Gonzalez Borges, a Lein? 11.107/05, em seu conteido substan- Cial, pretende "regular a aplicagao do texto constitucional por todas as unidades da Federacaio, com o carater de /e/ nacional’ e cuida de “definir como as vonta- des dos entes federados se articularéo em torno da consecugao dos seus obje- tivos de interesse comum, sem que se quebre, com isso, sua autonomia consti- tucional”. Segundo a autora, nao se tretaria de uma “complementagao ou suple- mentagio de tais normas, para adaptacao a peculiaridades especificas de cada ordem federada, como se verifica no caso das normas gereis, mas, sim, de su- ra-ordenamento da composicao de competéncias desses entes da Federacao, em plano abrangente e nacionar ® 94 “AML. 13, § 42 O conirato de programa continuara vigente mesmo quando extinio © consérclo ppablico ou © convénio de ccopersez0 que auictizou a gesido autcrizada de servigos pUblicas. § 5 Mediante previso do conto de conséicio piblico, ou de convénio de cooperacdo, ou de Contrato de programa poderd ser celebrado por enlidades de direlto publico ou pivado que integrem a adminisagSo indirela de qualquer des entes da Federagso consorciados ou conve. niados.* (Grifes acrescentados.) 85 A. Gonzalez Borges, Os consbicios publicos na sua legislagto reguladora, Inferesse Plbilco, 1? 32, 2005, p. 284, (Gitos screscentsdos.) 962 2. A Lei de Consércios Publicos regulamenta a cooperagao horizontal e vertical entre as diferentes esferas de governo brasileiras e inroduz uma nova Possibilidade de organizagao politico-administrativa de cooperagio e negocia- 980 intergovernamental para @ coordenagéo de iniciativas e implementagéio de Polllicas publicas no &mbito territorial. Néo se trata da deciséo sobre a paricipa- S20 dos outros entes federativos, nem da definicao vinculativa de seus objetivos ou dos detalhes de seu funcionamento, que poderdo ser estipulados, em cada aso, pelos préprios integrantes dos consércios, Também néo ha diivida de que 8 Unio possui competéncia plena para normatizar éreas tematicas que somente atingem o funcionamento da sua propria Acministragao (direta e indireta).®° A Questo é justamente esclarecer até que ponto o ente federativo superior pode também regulamentar estrutura © o uso de instrumentos administrativos a se- fem empregados pelos niveis inferiores. Ha quem defenda a impossibilidade de um decreto federal poder disciplinar condutas de criagéo de consércios aos es- tacos € municipios por violar @ sua autonomia administrative, consagrada no art. 18, caput, CF Outros ja aceitam que um decreto presidencial possa assurir, & Similitude da norma que pretence regulamentar, a feig&o de *norma nacional", de observéncia obrigatéria para todos os entes {ederativos, 8. Segundo a teoria das /eis nacionais, baseada na matiz Igico-ormal kelseniane ¢ introduzida, no Brasil, por Geraldo Ataliba, em 1976, so leis fade. ‘ais as normas especiicas que s6 envolvem a propria Administracéo da entida. de central para cumprir as suas competéncias materiais, Ao contrério, as leis na- cionais serviriam para todo o Estado federal, ditando normas a serem cumpridas também pelas Administracées dos estacios e municipios.®® Coexistiriam, portan. to, no regime juridico brasileiro, os sistemas nacional, federal, estaduaise muni- Cipais, sendo a primeira a lei da ordem total do Estado nacional, que tem “aplica bilidade nao apenas as pessoas subordinadas Unio, mas também colhe no ambito pessoal de validade de suas normas todos os suditos do Estado, inclus'. ve @ Unido @ os Estados-membros". Caberia & Unido produzir normas federais 6 fnacionais, ambas na forma de leis ordindrias, resultando as primeiras “cia com. nidade juridica central estritamente, e as segundas da comunidade jurdica total, apesar de os legisladores se corporificarem em um mesmo érgéo" * 4. Com esta distingao, Ataliba pretendia defender, sobretudo, a isonomia das fontes juridicas no plano federativo, dirigindo-se contra 0 “preconceito da hierarquia das leis" e destacando que “as normas gerais de direilo financelro 86 Prova disso ¢ 0 art. 84, Vi, CF. inseride pela EC 32/2001, & Atl 18. A organizacdo polico-scministrativa de Repdblica Federativa do Brasil compreende @ Uniéo, 08 Esiados, 0 Distrito Federal e os Municipioe, todos aulénomes, nos lernite desta Consttuicto.” £8 Ci... Geraldo Ataliba Nogueia, Leis nacional eles Cnormas gerais, “dretrzes de base" no nosso sister em hom. a Vicente Réo, 1976. p. 136 % Gabriel Ivo, Consttuipao Estadual, 1997, p. 83 e ss. federais no regime constitucional brasileiro a federal}. InP. Prade, Estudos jurgicos DE | Revistade Direlo do Estado Ano? 1? §:3341-995 enviar 2007 ¢ tributério S40, por definicao e pela sistematica constitucional, leis nacionais, leis que nao se circunscrevem ao émbito de qualquer pessoa politica, mas trans- ‘cendem aos trés", havendo, assim, “leis nacionais, leis brasileiras, voliadas para todos os brasileitos, indistintamente, abstragao felta da circunstancia de serem eles stiditos desta ou daquela pessoa poltica’."°" Invocando a ligéo de Cirne Lima," ele classiticou de federais as lels que *contém normas que envolvem a propria Administragéio da Unido, notademente as de cunho administrativo e tribu tario", materias que estariam localizadas no “instrumental” de cada pessoa poli tica, como meios de sua “explicitagao e afirmagao". Como este Direito foi quali cado de aplicacao exclusiva, a Unido, os estados e os municipios seriam “plena- mente competentes para criar seu direito administrative (e ipso facto) tributé- tion 5. Entretanto, o inegavel mérito da referide teoria esté intimamente ligado 08 problemas politicos da época da sua criagaio (meados dos anos 70), na érea especitica do Direito Tributério e Financeiro,'* onde © Governo autoritéto tenta: va suprimir a autonomia dos estados © municipios, aniquilando progressivamen- te es suas competéncias. Apés a criagao do sistema de competéncias legislat- vas e administrativas pela Carta democratica de 1988, néo parece fazer sentido continuar alegando a existéncia de quatro tipos diferentes de leis (nacioneis, fe- derais, estaduais © municipais), com “campos rigorosamente separados por me- teria’."® Prova disso € o proprio rol das competéncias concorrentes do art, 24, CF, onde constam vérias matérias ligadas a grande rea do Direito Administrati- vo, nas quais a Unio pode estabelecer normas gereis, as quais, logicamente, veleréo também para os outros entes federativos. 6. Neste sentido, Borges Netto mostra com propriedade que as normas Gerais mencionads no texto da Carta de 1988 s80 sempre “nacionais", ainda gue atinjam somente a Administragao da Unido com seus funcionétios, sendo {ue a sua finalidade & uniformizar 0 “essencial sem cercear o acidental’,justfi- 100 J. Geraldo Ataliba Nogueira, op. cit, pp. 157, 159 ¢ ss, 101 Op. cit, p. 181 e ss. 102 Principio de direlto administratvo, 1982. 10s Cl, Geraldo Ataliba, Conteddo e elcance da competéncia para ecitar noxmes gerels de diceto trigutério (art. 18, § 19, do texto constituciona), Revise de Informapao Legislative, r® 75, 1982. p. 102, 101 Cf. Alomar Belecito, Direto nbutéro brasileiro, 2001, p. 28 12s Geraldo Alaliba, op. cit, p. 105. Ao mesmo tempo, parece duvidosa a alirmacéo genérica de {que “a norma geral, por ter de ser sempre nacional, néo poderd dispar sobre a orgentzacdo, servidores e bens des coletividades parciais(Uniéo, Estados-membros, Distrito Federal © Munict pics), lela por Eduardo Cambi, Normas gerais e a fixaggo da competéncia concorrente na federagao brasileira, Revisia de Frocesso, nf 92, 1998, pp. 255 @ 260 (Gesiaques no criginal). a8 “Ar. 24. Compete & Unio, aos Estados @ eo Distrito Federal legisla concarrentemente sobre | — direlio tibutério, fnanceia (..)e urbanistico; Vi florestas, cage, pesca, fauna, (.) protecso {60 meio ambiente e contiole da poluigso; Vil — protege ao pattiménio historico, cultural, artistic, luristico e peisagistico” 364 Gando-se essa “atividacle homogeneizadora na medida em que uma excessiva rersicagao normativa prejudique o conjunto do pais...) So geraic. pols on Teece co carater nacional que ostentam, as normas que por alumna raeae cre tpceZe interesse publica sejam tratadas por igual." No entanto, deve ser raves seegiGe Que a teoria des leis nacionals fez escola na doutrinajurdioa breslene, Sendo que varios autores, até hoje, se referem a ela e observain que, mullas et pols eamormas gerais ("nacionais*) estariam inseridas nas mesmas leis oditsces Foie seiko Que Contém também regras especlicas (‘federais"), somente ajica, Vels @ sua prépria Administragéo," clusiva" de cada ente federativo, que, até en to, tanto havia prejudicado a efi- Ciencia na prestagao dos servigos pablicos. Além disso, a manutengéo da distin- Sonia a) cngnte les federais enacionais 6 causada também pela contusce hol Geral e oe os Seeres tecnicamente separadas da criago das notmas locals Gerctince ence Splicaedo pelos é1g80s adiministrativos nos diferentes nivale we GErativos (Lema a ser aprotundado adianie), o que faz com que cela cone oy rele sida! No mister da demarcagao do poder regulamentar do Execs Teferente & execugo de normas gerais federaic 8. Nesta senda, Olivera da Siva considera a Lei n?11.107/05 uma lel ge farin'® aplicabilidade nacional", sendo as leis nacionais de “atenliments obriga- {orio pelos demais entes federativos*, visto que no sistema potion uma Federacao somente caberia a Unido, na descentralizar @ acministracéo ceanGiade de se padronizar determinadias regras de interesse de lodee oe entes éstalais, esta tarefa poderia ser cumprida apenas através de Promulgacao de normas gerais federais de aplicabilidade nacional. Para o auto igos publicos entre os entes federativos, revela gue enrante um assunto de interesse nacional, requerendi a digo de nena Gerais raionad ots legate que o Estaito da Cidade (Lel# 10287101) eaeboetey een, estes “comands eens Pe lodos os eres federatvos, os quae salam coronas eer Aaloon A Bones, Socrates" na formulagdo do sua prepa lellogse tebe wea sateen, Dalat O esiatuto da cidace @ suae detines gerae Meee nes Sérgio Ferraz, poniue da cided, 2002, 5; Vale Figuatedo, Disepiba ubonenss a propriedadle, 2006, P. 114; F. Gesta Leal, Direto urbantetico, 2003, p. bt ¢ oe 409 Cf, Cleber D. Oliveta da Siva, Consider Conséreios publics, disponivel em: hips 2008). rages sobre a ulura regulamentago ds lel geral dos 2.uol.com.br/doutrinatexto.asp7id=7068 (aceseo. oa FIDE | Revista de Direito do Estado Ano2 85: 841.995 jantnar 2007 9. Assim, teria @ Lei de Consércios Pdblicos a mesma qualidade de nor- ma geral nacional da Lei n® 4.320/64, que criou normas gerais de Direito Finan- ceiro,""° e da Lei Complementar n? 101/00, que estabeleceu normas financeiras voltadas para a Responsabilidade Fiscal, os quais séo de aplicago obrigatéria Para todos os entes federativos.'"' Conseqiéncia desta posigo 6 também 0 re- chago de uma pretensa inconstitucionalidade do texto do decreto regulamentar da Lei n? 11.107/05, na medida em que determina procedimentos eos demais enntes federativos, o que nao feria @ sua autonomia federativa consagrada no art. 18, caput, CF, visto tratar-se de regulamentacao de uma lei federal “de caréter geral” ¢, portanto, de eplicabilidade nacional. Nessa vis40, o decreto em andlise também seria uma norma de caréter nacional e, “assim sendo, os demais entes federativos dever-tne-Go plena obediéncia em todos os seus termos ¢ condigo- a 10. No entanto, néo faz sentido a afirmagéo de que certas leis federais, por possulrem caréter nacional, teriam de ser seguidas e aplicades por todos os niveis governamentais, apenas pelo fato de que estes diplomas normativos emi- tidos pela Unido tratariam de “interesses nacionais™. Como jé advertia Celso Bas- tos, ndo existe, no Direito positive brasileiro, qualquer discriminagdic enire leis federais e nacionais, pois estas néo foram mencionadas pela Carta de 1988, nem pelas anteriores, 0 que protbe ao intérprete do Direito “erigir regimes juridicos proprios a cada uma dessas categorias normativas’.""> Ao mesmo tempo, néo € vidvel a comparagao da natureza e dos efeitos da Lei n? 11.107/05 com os da Lei ‘Complemientar de Responsabilidade Fiscal, espécie legisletiva que, além de exi- gir quorum qualificado para aprovagao, na opinido de autores de peso, também goza de uma posigao hierérquica superior a lel ordinaria.'" No caso de uma lei complementar federal, este entendimento pode influenciar também na sua po- tencial capacidade de vinculagao em relacdo a assuntos administrativos e tribu- térios dos estados e municipios. 0 "Ar. 1 Esta lel estatui normas gerels de direito financeio para elaboracao e controle dos corgamentos e balangos da Unido, dos Estados, dos Municipios e do Distrito Federal. de acordo ‘com 0 disposio no arligo SF, inciso XV, letra 6, da Constiuiezo Federal 11 "Art 18 Esta Lei Complementar eslabelece normas de financas pablicas voltedes pare @ responsabilidade na gestdo fiscal, com ampara no Capiiulo Ii do Tivo VI da Constituiggo..-) $2 As disposigées desta Lei Complementar obrigam @ Unido, os Estados, o Distito Federal e 0s Municipios-* 112 Cleber D. Olveira da Silva, op. ct. 413 Celso R. Bastos, Lei complementar: Teoria e comentérios, 1985, p. 32; no mesmo sentido: Wilber de M. Agra, Manual de dieita consttucional, 203, p. 417 114 Jose Afonso da Silva, Aplicablidade das normas constiucianale, 2002, p. 241-250. O proprio STF tem assumido, gradativamente, a posigao d hierarqula superior des leis complementares em telagdo ds ordinérias, considerando a elevada imporléncia des matérias discipinadas por aquelas © acoitando a sua “competéncia absolute de completa’ a Conslivigso", No entanto, parle da outrinanéo enxerga uma hiererquie, mas apenas “campos de incidéncia distintoe"; cl Sergio R. acha, Constiviego Federal: Leis complementarese leis ordnariae. Hlerarquia, 2004, pp. 63 ¢ 5S e144 11. Som cluvida, a Constituigéo de 1988 reformulou o sistema das com petencias legislativas concorrentes para “possibilitar a tessitura de uma mala legislative que, nacional, tenha condigées de mais adequadamente aleangar as Pecullaridades politicas, econémicas, socials © geogréficas encontrades om nosso imenso Pais",""® configurando o art. 24, CF, com a nitida inteng&o de au- mentar @ autonomia dos estados, "sem, contudo, causar projulzo A previsao de diretivas nacionais homogéneas”, necessérias para a integragéo dos estadios om polticas unificadas, tendo em vista a “primazia do interesse nacional. As normas gerals, na verdade, séo a prépria forma de exercicio de uma legisiagao nacionel, através de criagéo de “regras nacionalmente uniformes e, por isso, vin. culantes a todos os entes federativos",""® 12. E importante considerar a propria natureza dos consércios ptiblicos, Que server justamente para possibilitar uma maior cooperac&o entre entes fede, Fades, no somente por aqueles do mesmo nivel (ex.: municipios da mesma re. ), mas também, € cada vez mais, para a colaboragéo entre dois ou até tres Fe ae Governamentais diferentes. E importante também lembrar que a formagéo Ge consorcios (ou organismos semelhantes) no Brasil — ao contrario de outros pelses (Itélia, Alemanha) — néo pode ser imposta por lei federal ou estadual: @ adesio de um ente federaco a um consorcio sempre foi e continua sendo jrid Cements facultative, Seria, portanto, preciso esclerecer em que medida jstficar. pele uma “execucao varidvel" da Lei de Consorcios Publicos em cada estado brasilcto, em virtude das pecullaridades aii existentes, e até que ponto a sus {cavlamentagéo por decreto federal efetivamente influenciaria na “organizagao Sciministratva’ estadual e municipal. Na verdade, ela nao contém prescrigees sobre @ organizacao interna das pessoas poliicas, visio que o instrumento do soAsrc'o Publico possui a fungao de viabilzar 0 estabelecimento de relagdes administrativas externas de cada ente federativo, 13. Por derradeiro, seria inaceitével também a qualificagéio da Lei n® Ji JOTIOS @ de seu futuro decreto regulamentar como meros pardmetros, que Bodrlam (ou no) ser adotadios pelos estados e municipios, com a conseausre Cia de que, caso estes nao tivessem interesse em adotar 6 modelo, esteviam {uricicamente, livres para modelar formas aliernativas & gest&o dos seus coneGr, Gees. Esta situagdo também no muda com a prética frequente de os estados 0 Fabre oes brasileros reproduzirem muitas normas federais (‘nacionais" ou néo) Sere Besuntos novos, transformando-as em leis préprias, o que faz com que Efs $e lornem, somente a partir deste momento, de aplicagao obrigatena pare 0S seus 6rgdos administrativos, Its Diogo de F: Moreirs Neto, Competéncia concorrente limita: o prob rotmas geral, Revista de Informardo Legisativa,ré 100, 18, oot he Cl, Eduardo Camb, Normae gereis e a fixagao da brasiere, Revista de Processo, n? 92, 1998, p. 250-60, ema ds concelivecto das Competéncia concorrente ne federegse ADE | Revista de Direitodo Estado Ano2 nt: 341.295 janimer 2007 367 IV.2. O modelo da Federagao na atualidade: necessidade de coordenagao central; os efeitos da adogao do federalismo cooperativo no Brasil ‘1. No mundo inteiro, o modelo do Estado federativo conjuga o eritério fun- cionel como espacial, dividindo 0 poder estatal entre entidades territoriais polt- cas, 0 que multiplica as combinagues possiveis entre ambos os critérios © os problemas deltas decorrentes.'”” A federacéo pode ser considerada uma trans- plantacao da tripertigao de poderes, do plano horizontal pare o plano geogréti- 00,1 o que tora o Estado federal uma expresséo da “diviséo vertical de pode- res’."'® Entretanto, os principios do federalismo e da diviséo dos poderes sao complementeres, pois server para a resolugao do equillbrio das forgas sociais e a diversidade funcional da atividade do Estado." Para Neves, o federalismo ‘sempre tem por base a Constituigéio "como acoplamento estrutural entre Direito © Politica” e ganha seu pleno significado através de co-atuagao dinémica e con- flituosa destes dois émbitos sociais parciais no quadro do Estado Democratico de Direito, representando uma forma de distribuigo de poderes de decisao que, @ principio, possui natureza politico-juridica, mas 6 condicionada pelos outros Ambitos sociais, em relagao aos queis ela esta sempre aberta. 12" 2. E preciso, portanto, entender a forme politica do Estado federal como m corpo racionalmente subdividido cujas partes se coordenam no sentido de desenvolverem permanente eficécia comum", que procura “conjugar as neces- sidades de regulagao central — inegaveis sobretudo no moderno Estado indus- trial — com as vantagens da descentralizagao federativa’’%2 O principal motivo do aumento das competéncias federeis tem sido a necessidade de planejar, or- ganizar e financiar determinados servigos publicos e sua prestaco em ambito nacional.’ Neste caminho, 0 federalismo sofreu modificagées substancials, da inicial ampliagéo das competéncias da Unido, em direggo a um “federalismo in- tegrado”, em que as leis © processos legislativos dos diferentes entes estatais, tendem a se completar, em favor da comunidade federativa global.’ Esta inte- gragao no permite mais encerar a distribuiggo de competéncias como “instru- mento de disputas entre o autoritarismo ceniralizador e as autonomnias locas”, 117 Diogo de F. Moraita Neto, op. cit, p. 128. 11 Celso R, Bastos, Curso de dire consttucional, 1999, p. 285, 119 Konrad Hesse, Elementos de dieito constituclonal da Republics Federal da Alemanha, 1998, P. 187 ss, 120 Augusto Zimmermann, Teoria geral do federaliemo democrético, 2008, p. 87. 1a Marcelo Neves, Grenzen der demotratischen Rechisstaatichkell und des Féderalismus in Brasilien, 2000, p. 4 6 ss. 122 Reinhold Zippelus, Teoria geral do Estado, 1997, p. 512 ess. 128 Cl, Manosl Gercia Pelayo, Derecho Consiitucional compared, 1999, p. 245, "24 José Alttedo de O. Batacho, Teoria geral do federaliemo, 1986, p. 71 e ss. 368 ‘mas se transforma em "um compromisso de solideriedade e de uniao de estor. 908 para realizar do mais adequado possivel o bem-estar da coletividacie" 3. © modelo estatel do federalismo representa uma “dificil etrabalhosa forma de equiliorio do poder, com seus diferentes pesos e contrapesos” e seta ditetamente ligado ao principio da subsidiariedade, para promover a diversidade regional ee descentralizacdo das insténcias de deciséio. Ao mesmo tempo, deve este sistema garantir a homogeneidade das estruturas polltico-administratives ia Unido e seus estados, o que nao ¢, necessariamente, um arqumento em favor Ge sua unitormidade." Expresso deste principio é 0 art. 19, lll, CF, que veds os entes federativos “criar distingBes entre brasileiros ou preferéncias entre ol" Moreira Neto, defendendo a subsidiariedade no plano federativo, com fortaleck, mento dos entes inferiores “por serem estes os mais préximos dos individuos 6 {erem, assim, melhores condig6es de conhecer e de atender a suas necessida, des funclamentais’, ressalva que "a mais importante ago do ente maior em rele: 90 aos menores & a aco estimuladora para ctiar condigoes de coordenat Por cooperagao ou por colaboragao, para que todos eles, estatais endo estarals Se desenvolvam em parceria e em sua plenitude,""2” 4. Uma das vertentes do prinefpio da subsidiariedade é a sua “tungao telacional’, que obriga © poder estatal a “possibilta, potencielizar e promover" as ages des entidades menores, em prol do bem-comum: este apoio se deve dar mediante prestag6es, para compensar as suas falhas e suprir omiestoe Como o principio esta fortemente ligado ao critério da eficiéncia, ele possul card. ‘er ambiguo, visto que pode ser invocado tanto em favor da descenttalizageo de terefas quanto para justicar a sua centralizagao em niveis superiores. De quel. Gus’ forma, seu verdadeiro sentido jaz no postulado de que as decisdes police administratvas cevem ser tomadas no mais baixo nivel de governo possivel, 0 Que implica ajuda e cooperacio, sem que haja uma interpretagao eminentemen. te “técnica”, que no valorize a preservagéo dos entes menores. No contexte do {ederalismo cooperative, que visa estabelecer parémetios & aluagae conjunta de éentidade maior @ menor em um mesmo nivel de execucso, o principio da subs dlariedade promove a cooperago e 0 inter-relacionamenio entre elas. 12° S. Por um lado, 0 fortalecimente dos niveis governamentais subnacionais Consiitul um processo que fortalece a democracia brasileira e leva a uma maior eficléncia edministrativa, De outra banda, néo pode ser alvidado que os estados 128 Leonardo Greco, Competéncias constitue Legislative, 116, 1992, p. 138, 128 Cl. Hans-Jochen Vogel, El régimen federal dela Le ‘de Derecho Constitucional, 1896, p. 621 ¢ ss 121 Diogo de F Moreira Neto, Mutapdes do Direito Administrative, 2000, p. 21 aatcelo Labance C. de. Arado, O candominiolegislatho: um estudo sobre a possiblidede de Sriicagte do principio de subsidiaredece na reparicdo de competéncias legilativas concore ics into © Estados.membros previsia na CF brasileira de 1988 (Diss: de Mestace, eee UFPE), 2001, p. 828s. 80, 85 ionals em matéris ambiental, Revista de Informagéo ey Fundamental n: E, Benda etal, Menvel [ADE | Revista de Diteitodo Estado Ano? n6:341-895 janimer 2007 368 € municipios, até hoje, so locals preferenciais do clientelismo, da corupgao ¢ da ineficiéncia, podendo @ sua crescente “autonomizagéo" também ser contra- Produces ie em relag&o aos esforgos de estabilizagao e responsabilidade fiscal das instancias polticas centrais. Nessa perspectiva, a notéria “guerra fiscal" en- tte estados © municipios € uma prova da auséncia de coordenagao em favor de um efetivo desenvolvimento nacional."®® Ja nos anos 60 do século passado, Mei- relles Teixeira entendia a crescente regulamentagéo federal como reajustarmento inevitével da distribuig&o legal dos poderes resultante de uma “tendéncia bem marcada para uma unidade nacional cada vez maior”. No entanto, esta extenséo dos poderes centrais, para a solugo dos novos problemas criados pela propria ivilizagao, "no destr6i nem infirma, em absoluto, 0 ideal federativo e as vante- gens politicas e administrativas de forma tederativa de governo"."™ Para ele, um Gos tragos do novo federalismo era 0 "desenvolvimento de uma vasta area de cooperagao entre os poderes centrais e locals, com mituas vantagens, sem dis- Iribuigao constitucional dos poderes. O governo federal necesita de maiores contatos com os poderes e com os problemas locais; os governos locais, por sua vez, necessitam de mais ajuda, de maior assisténcia dos governos centrais. Dal acordos, uso de pessoal burocréttico, servigos em comum, empréstimos federais aos Estados-membros, etc.” 6. Ainda em 1999, um ano apés a Reforma Administrativa, era evidente a fragilidade juridica e poltica da figure do consércio, que dependia do Direito Pri- vado e do aval dos governos superiores para poder receber empréstimos e sofria fortemente com a descontinuidade administrativa, o que reduziu bastante a sua propriedade de servir como instrumento para estabelecer estaveis relacoes in- tergovernamentais horizontais (criag&o de "redes intermunicipais") ou vorticais em termos de pollticas publicas e garantir uma prestagdo mais eficiente dos res. Pectivos servigos.'*' Por isso, nao é exagero afirmar que 6, paradoxalmente, so- bretudo o Governo federal brasileiro que dirige e coordena a implementagao das Politicas descentralizadas pelos entes federados, opiniio esta corroborada Pela alegacéo de que “realisticamente, e preponderancia da Unido no federalis- mo contemporéneo é um dado com que se tem de aprender a conviver. O que 6 Preciso impedir é uma hegemonia do poder federal que desnature o sistema." 7. Um aprofundamento maior da constitucionalidade da regulamentagso las normas gerais federais sobre os consércios publicos por decreto presiden- {29 André Regis de Carvalho, Reengenharla lederativa: A questdio dos consércios inlemunicipes Inv C. M, Figueiredo e M. Nébrega, Adminisragso Publica — Ditto acmiisuiativo, Imancere gestéo publica, 2002, p. 86 ‘wo. H, Moltelies Teixeira, Curso de cielo consttucional, 1991, p. 657 e ss. 81.1. Femando L. Abrucio e Valeriano M. F. Coste, Reforma do Estado @ 0 contexto federativo brasileiro, 1998, pp. 39 e 148 e ss. 122 Cl. Marta Arreiche, Mios da descentaizagSo: Mais democracia ¢ eficiéncia nes polticas Publicas? Revista Grasitire de Cincias Socials, n® 31, 1996, pp. 51 ¢ 56 e ss. Apud Gilberts Bereoviei,Dilemes vo Estado federal brasiler, 2004, p. 70. ‘2 Fernanda D, M. de Almeida, As competéncies na Consituigéo de 1986, 2000, p. 91 370 cial nos leva, necessariamente, & reflexdo sobre o conceit, afungéio e o contet do de um federalismo cooperative. Depois de este modelo ter sido criticado por tender a concentrar os poderes estatais nas maos da Unio, levando, ao contra rio de sua declarada intengao, a um sistema unitarista, ele passou, nas ditimas duas décadas, por um "reexame”, para melhor servir de "meio para operaciona- lizar um intercémbio adequado entre os entes federatives o central, ce modo a otimizar as relagdes intergovernamentais, das quais a intrincada realidade eco. nomica e social e, sobretudo, a complexidade dos servigos publicos, néo pres- cinde", Nessa nova viséo, ele deve assumir a forma de uma cooperegao subsi- didria entre os entes tederativos, para fornecer ‘uma ajuda ao ente menor quanto as tarefas que ele nao consegue realizar por si com eficécia (..). Fortalecem-se os entes regionais € locais, que obtém meiores condigdes de prestar com eficd cia 0s servigos piblicos aos cidadaos (...).""% 8. Neste ponto, vale frisar que a (muito citada) caraterizagao da Republi ca Federal da Alemanha como "Estado federal unitario", usada por Hesse num ensaio de 1962 (Der unitarische Sundesstaat), posteriormente fol abrandada pelo autor, que admitiu tenha e "ampla unitarizagéo material’ levado a uma “auto- Coordenagdio" entre Unido e estados alemaes e destes entre si, mediante prati- as juridico-administrtivas unitormes. Em relagéio ao federalismo cooperativo, ele observa que uma “colaboragao coordenada’ claramente melhorao exercicio elicaz das tarefas do Estado Sociel moderna, sem conduzir, necesseriamenie, a uma centralizagao. Ao mesmo tempo, considera o modelo “nenhuma panacéia” € V@ 0 seu sucesso na dependéncia de correigGes pontuais da Lei Fundamental ‘no ambito das competéncias legislativas e da ordem financeira,® 9. Especialmente em virtude da insergao do art. 23 na sua Lei Maior, o Brasil seguiu 0 modelo do federalismo cooperative, o que, segundo Bercovici, ‘se justifica pelo fato de que, em um Estado intervencionista e voltado para 2 implementacéo de politicas pablicas, como o estruturado pela Constituigio de 1988, as esferas subnacionais no tém mais como analisar e decidir, originarie mente, sobre inimeros setores da atuaco estatal, que necessitam de um trata- mento uniforme em escala nacional”, © que toma o federalismo cooperativo *o federalismo adequado ao Estado Social"."® Na mesma senda, Martins essevera que “a sintese do modelo pétrio revela que o poder constituinte originario estabe- leceu um federalismo cooperativo que, formalmente, outorgou mais poder para a Unio", levando-se em conta que a transigao do federalismo dual para 0 coope- rativorepresentaria também uma mudanga de referéncia axiolégica: do valor au- todeterminagao para o valor integragao. "8" +34 Cl. Siva F. Tore, © principio de subsidicriedede no deli pubtico contemperéneo, 201. pp. 220 @ 225 e ss. 125 Konrad Hesse, Elementos de direito consttucional da Republica Federal de Alemanha, 1996, Pp. 183 € 189 e ss, 16 Gilberto Bercovii, Dileras do Estado federal brasileiro, 2004, p. 56 « ss. 137 Cristiano F. Martins, Principio ederativo e mudenga constiticiondl, 203, pp. 156 e 165 e ss. DE | Revista de Direitodo Estado Ano? n®S: 941-805 janimar 2007 m 10. No ha duvida de que a criago do art. 23, com seu pardgrafo tinico, 2 posterior insergao do art. 241 no texto da Lei Maior expressam anitida vonte, de cu Constituinte origindrio e reformacir brasileiro de introduzir no pals o mode- '0 do federalism cooperative, que tem por fim melhorar a colaboragéo entre Unido, estados municipios, através da coordenago no exercicio das diferen- {es tarefas © da compensagao de receitas financeiras."® A prépria idéia da coo- erage mostra-se forte em varios pontos do texto constitucional." Para este fir, 0 Brasil deveria buscar mais a realizacao do principio da “solidariedade fun- cional” entre as diferentes esferas de competéncia administrativa e estabelecer um “equilfbrio dinamico", cuja conseqdéncia poderia ser até uma “abolicéio da ‘igida partitha de competéncias". “Em funcéio deste mesmo objetivo, na Alema~ nha, © principio da “Iealdade federativa® (Bundestreue) obriga os entes estatais @ exercerem as suas competéncias de forma sempre respeitosa em relaco aos interesses dos outros." 11. A lei complementar do parégrato Unico do art, 23, que deverd fixar Normas de cooperagéio entre os trés niveis estatais, até hoje ndo fol promulgada enenhuma das propostas chegou a ser discutida de forma mais ampla,"o que se deve @ preocupagao dos érg8os politicos de que ela poderé trazer profundas slteragdes nas responsabilidades juridicas e politicas, referentes ao cumprimen- {0.das taretas publicas por parte dos trés niveis de governo. José Afonso até afi. ‘ma que esta lei seria, na verdade, supérfiua e 86 serviria para interferir na auto. nomia dos entes federativos.'* O art. 23 estabeleceu nada menos do que 20 fung6es materiais comuns (e, ao mesmo tempo, concorrentes), porém sem a de- finigao de uma “hiererquia cooperativa” entre os entes federativos, que nao devia ter sido deixada para uma lei complementar.'“4 E, ainda que o conceito de com. peténcia comum tenha por objetivo preservar o interesse puiblico, visto que, se um ente federado no exerce a sua alribuigao numa rea, havera outro igualmen. te competente a fazé-lo, "os problemas aparecem quando dois ou mais entes igualmente competentes desejam exercer suas competencies, o que requer dis- ciplina’. "48 198 Cf. Konrad Hesse, op. cit, p. 189 e ss. 129 Pedro Duréo, Convénios © consércios adminstrativs, 2004, p. 64 e ss. Mo Gilberto Bercovici, Constuigso e superacdo das desigueldades regionals, 2001, p. 77 ut Hans-Jochen Vogel, Elrégimen federal de la Ley Fundamental. in: E. Benda et al, Manual de derecho constitucional, 1996, p. 634, 142 A grande maioria dos projelos de LC para regulamenago do parégrato Unica do art. 23, CF ue irmitam na Cémare dos Deputados, se refere 8 presiagao dos servigos publicos igados ao saneamento bésico (PLP 72/1988; 234/1998; 118/2000; 145/200, 159/2060); das esese prope sigbes foram arquivedas. Cisponivel em: wirw.cemare.govbafintemoUsllegioron. pesquisa neo (ecesso: set. 2006), ves José Afonso de Siva, Aplicablldade des nomas consttucionais, 2002, p. 240. wi CI. Fernando L. Abrucio el al, Descentralizagze — pacto federalive, Cademps da Escola "Nacional de Acministracdo Publics, n® 1, 1983, p. 22 © se UEC! Cémare dos Depulados. Jusificatva de PLP 145/2000, autora: Dep. Ricardo Fetraco. Disponivel em: wiwn.camsra.gov-br (acesso: set, 2006), 372 12, Esta indefinigao das competéncias comuns dificulta bastante a atri- bui¢éo de responsabilidades juridicas e politicas aos trés nivels federativos, o Que causa impactos negatives em varias areas da gestéo publica, entre eles a extrema dificuldade da reorganizagéo tributaria do pais, que ha anos adia inves- timentos em selores como o de saneamento basico,"*® Assim, torna-se evidente que existéncia & permanéncia do Estado federal esto assentadas numa "sinte- Se dialética” dos elementos opostos da coesao e do particularismo, que depen- dem de fatores extraconstitucionais (naturais, econémicos, sociais etc.), sendo que *o federalismo néo se revela de forma homogénea, mas dindmica, variando Ge pais para pais e transformando-se ao longo do tempo.” E nesta nova etapa Go federalismo cooperativo brasileiro que se insere a atuagéio dos consércios pi blicos, 'V.3 Necessidade da regulamentagao nacional homogénea (e, parcialmente, uniformizada) do regime dos consércios puiblicos 1. Parte da doutrina brasileira guarda, até hoje, uma forte aversao a uma @brangéncia maior das competéncies legislativas da Unido," condenando a tendéncia do poder central de “usurpar" @ produgéo normativa de assuntos ré- servados pela Lei Magna aos estados federados, 0 que, certamente, se deve as experiéncias dolorosas durante o regime militar, sob a égide das Constituigoes anteriores. No entanto, devem ser ponderados, em cada caso, os argumentos €m favor de e contra uma regulamentagao normativa central ou regional. No devemos perder de vista que uma lef estadual ndo é, por sua natureza, mais ade. quad para resolver um problema do que um ato normativo federal. Ainda que Soja verdade que a Carta de 1988 teve a nitida intenggo de transferir muitas das atribuig6es legislatives para o estados, nao ha duvida de que a Unido deve nor- matizar determinadas matérias que ndo comportam um regime diferenciado en. tre os diferentes entes federados. Com isso, no estamos defendendo uma mal Tefletica e generalizada "supremacia federal’ sobre os estados em fungao de uma pretensa prevaléncia automética de politicas ou projetos nacionais, 2. Para Horta, “a lei estadual suplementar introduzird a lei de normas ge- fais no ordenamento do Estado, mediante o preenchimento dos claros deixados Pela lei de normas gereis, de forma de aperteigod-la as peculiaridades locals", ‘Sendo “manifesta a importancia desse tipo de legislagéo em federagao continen. tal, como a brasileira, marcada pela diferenciacéio entre os estados.""* Valle Fi. ‘ws Aspésia Camargo, Ertrevsts,dlsponivel em: hitpl{dados.lamurs. com briportalintnoticia_ ela asp? cod nolicia=6328cod lelauten? (acesso: mar. 2003), 7 Cl Siva F, Torres, O principio da subsidiariedadle no dteto publice contemporéneo, 2001, p. 216 ese, 48 Cl. Celso R. Basics, Curso de dreto constitucional, 1999, p. 209 « ss v8 Raul M, Horta, Estudos de drelto canstitucionel, 1995, p. 420. ROE | Revista de Direto do Estado Ano2 1°6:941-395 janfmar 2007 373 gueiredo defende que as normas gereis deve disciplinar determinadas maté Tias de forma homogénea, com efeito para todas as pessoas politicas federati- vas, sempre em prol da seguranga e certeza juridicas @ para assegurar uma apli- cago uniforme dos principios constitucionais expressos e implicitos, ®° invocan- doa ligdo de Ferraz Junior, que também sublinha a fungao de garantir a seguran- ga, certeza e igualdade das normas gerais, asseverando que elas “podem, sb assim, completar a eficdcia de preceitos expressos e de principios decorrentes a Constituigao, mormente quando a realidade brasileira, com sua multiplicida- de de Municipios e Estados-Membros exige uma formulagao global, garanticiora de unidade e racionalidade’.'*" 3. Visto que a todos os entes federados foi dada a atribuigdio de editarleis sobre determinados assuntos — como é caso dos consdrcios publicose convé- nios de cooperagéo (art. 241, CF) —., estas matérias devem softer um tratamento Padronizado em nivel nacional como forma de garantir a observancia dos princi- pios constitucionais pertinentes e manter coesas todas as ordens juridicas tede- Tativas. Esta fungaio cabe as normas gerais da Unio, que devem veicular regras homogéneas acerca de pontos essenciais destes institutos administrativos, com Gefeito de limitar a competéncia dos legisladores estaduais e municipais. Na ver- dade, a distingao e criagéo das diferentes modalidades dos consércios publicos, bem como os seus atos contratuais preparatérios e de controle financeiro, nao fepresentam meras quest6es acessérias ou secundarias, mas cruciaispara a sua viabilidade e insirumentalidade em relagao ao alcance dos fins a que se prop’ em."*? Por derradeiro, amplia-se a abrangéncia do poder normative da Unio so- bre os consércios publicos ne medida em que os estados nao devem criar nor- mas que estimulem politicas antagGnicas sobre 0 seu Uso, visto que este compor- ‘tamento contrariaria os fins expressos nos proprios arts. 23 € 241 da CF. 4, Somente a Unido € capaz de estabelecer as regras sobre a gestdo f- nanceira e contabil dos consércios publicos, cuja formacéo em larga escala po- deria ser até abusada para burlar as obrigagbes de responsabilidade fiscal, caso no houvesse normas claras e uniformes a respeito. Nesta area, a fungo do de- oreto regulamentar da Lei n? 11.107/08 se limita a concretizar as normas ja exis tentes em outros diplomas legais, havendo plena sujeigdo da execugao de recei- tas e despesas pelos consorcios as prescrigbes da Lei n? 4.320/64, da Lei Com- plementar n® 101/00 e das respectivas Leis de Direirizes Orgamentiérias e Orca- mentos Anuais de cada ente federativo consorciado. 5, Para que se possa exigir respeito & pluralidade politica @ & autonomia das entidades federativas, ¢ preciso que exista um &mbito de efetiva diversidade wo L, Valo Figueiredo, Competéncias adminisiravas dos Estados e Municipios — Licitagbes, Revista Trinestral de Direto Publica, r® @, 1994, p. 31 ¢ $8 181 Ferraz Jp, Tércio Sampaio. Seguranga [uridica e normas gereis trbutérias, Revista de Direto Tnbutéro, r® 17/8, pp, 50-56 © ss. (Gries acrescentados.) 182 Cl. Eliseo A. V. Bastos, Prego — Limltago go Amita da Unigo — inconstitucionelia: manitesta— Possibiidade de sus uiizacdo imeciata por lodos os membros da Pederagao. Revista de Direto Consttscional e Internacional, r® 38, 2002, p. 241 e 38. ara Produzindo aspectos politicos de organizagéio dessemelhantes entre os esta- dos.®° Por isso, € possivel que certos temas, devido a sua importéncia e suas Particularidades, deixam "pouco espago para inovagao ou perticularizagao por Parte das autoricades estaduais. Inexistente a margem para a disciplina especi: ficamente regional ou local, descaberd falar em vedac&o ao exaurimento pela lel federal."'* Assim, de forma semelhante & matéria do regime da previdéncia so- cial, 0 funcionamento dos consércios publicos, por sua propria nalureza, com- Porta norma geral de ambito nacional de validade 6. Sendo o tema dos consércios ptiblicos inovador e de alta importancia Racional, no poderia ser disciplinado de forma auténama e diferenciada por cada ente federativo, visto que a eficiéncia dos vinculos de cooperagao entre estes depende de uma coordenagao comum. 8° Nos paises demooraticos de or- ganizagdo federativa do mundo moderne, muitos assuntos, que antes eram con- siderados pertencentes &s searas local ou regional, ganharam expresséio nacio- al e chamaram 2o plano 0 Governo central por exigir regulamentagao integrada € uniforme, Isto vale especialmente em areas onde o legislador estadual ainda nao emitiu normas em virtude da novidade ou complexidade dos problemas, come, por exemplo, nos ambitos da defesa do consumidor e do meio ambiente, das licitagSes e do desenvolvimento urbano, onde a legislagéo federal tinha de sermaterialmente mais densa, apesar de a competéncia da Unido ser resirila a normas gereis, Neste sentido, Moreira Neto afirma que as normas gerais tederals, aplicar-se-iam conoreta e diretamente as relagées e siluagoes especificas no &mbito da competéncia acministrativa dos estacios e municipios, sempre que es- tes entes nao hajam exercido sua competéncia concorrente particularizante, Em relagao aos consércios publicos, pode-se constatar que houve, por parte dos estados, um “descaso em seu tratamento exlensivo, implicando @ caréncia de uniformidade da matéria”.®® 7. Em geral,, os estados e municipios, desde @ promulgagéo da Carta de 1988, pouco tém aproveitado, de modo efetivo, as novas possibilidades de legis- lar sobre causas do seu interesse, sendo visivel, até hoje, a acentuada proemi- néncla das normas tederais. ** As dificuldades dos estados para exercerem as t83 Marcelo Labanes C. de Aratjo. O concominio legislative, (Dissertagio de Mesttedo, PPGD- UFPE), 2001, p. 130 164 Flotiano de A. Marques Neto. Os consércios pablicos, Revista de Direito do Estado, n? 2, 2006, . 821; 0 autor utiize como exemplo a Lei Federal sobre Licitagoes (8.636/99). 185 STF — ADIN 2,024-DF, Rel. Min. Sepdiveda Pertence, | 27.10.1989 (Ement: I, 4), 1s8 A Gonzalez Borges, Os consércios pablicos na sua legisiagto reguladiora, inleresse Public, 1 32, 2005, p. 228, 187 Diogo de F, Moreira Neto, Competéncia concorrente limteda: problema da conceltuagéo das ormas gereis, Revista de Informagdo Legistatva,n? 100, 1986, p. 155. 1s Peto Duro, Convénias e consércias acminisrativos: Gesto,teoria e prétice, 2004, p. 72 tse Cl. Verénica B. Guimaraes, As compeléncies federatvas pars 0 contile da poluigéo do ar ‘causada por veicuios aulomotores. In: A, Krell, A aplicagdo co dello ambicntal No Eotedo federativo, 2008, p. 211 ss, FADE | Revista de Diretlo do Estado Ano 2 i?5; 341-305 jardmar 2007 ‘sues competéncias legislativas complementares encontram as suas causas tam bém na jurisprudéncia do STF, que treqentemente considerou assuntos bastan- te sensiveis aos interesses regionais ¢ locais como da competéncia exclusiva da Unio, o que acabou inibindo fortemente as suas iniciatives, "© De qualquer for- ma, existe, atualmente, uma forte pressao por parte dos municipios brasileiros que querem utilizar os instrumentos do consércio public, mas teem fazé-lo por falta de normas préprias ¢ leis estaduais sobre a matéria; por isso, os diplomas legais federais (formais e materiais) assumem também a fungo de precursores modelos para a regulagéo posterior dos entes federativos inferiores, 8. Apesar da limitagao da Unido para promulgar apenas normas gerais sobre muitos assuntos, "ha uma inevitdvel uniformizagao no tratamento de cerias matérias, falo este que nem sempre poderd ser superado pelas normas espect- ficas pera atender as diversidades regionais existentes no Pals'."®" Na verdade, nem todos os temas objetos de normas gerais permitem suplementagéo esta- dual, visto que no se trata apenas da tixagao de principios e direttizes genéri cas, mas também do estabelecimento de regras especificas que devem vigorer €m todo 0 territério nacional. © que torna a Lei n® 11.107/05 especial invalida a critica da pretensa invaséo em seara alheia é que ela visa justamente & viabiliza- 40 técnica de uma mais efetiva descentralizagao administrativa e politica, me- diante o instrumento do consércio pubblico, que constitu “uma forma para o exer- cio de competéncias, por meio do qual tal exercicio dar-se-a em regime de coo- peragéo federative, que é estruturante da ordem constitucional brasileira’. "© V.1. A natureza da regulamentagao de leis e os abusos por parte do Executivo; a “fiel execugao” de uma lei federal sobre normas gerais 1. E notorio que a histéria constitucional do Brasil apresenta uma cons- tante tendéncia de usurpagéo do poder normative por parte do Governo, cuja hipertrofia levou a inumeros casos de interferéncia ou até substituigéo dos Parla- mentos, especialmente na época dos regimes autoritérios e, nas Ultimas duas décadas, também pelos governos democraticos, através da utilizagao desmesu: Tada de medidas provisdrias."®° O Poder Executivo, em todos os tempos, tem avangado, com muita facilidade, pera dentro das searas constitucionalmente re- servadas aos corpos legislativos e desenvolvido um verdadeiro “ativismo legisla 19 Cf, Paulo L. Netto Lobo, Competéncia legisiativa concorrente dos Estados-memibros na Cons: tiigdo de 1968, Fevista de infarmapgo Legislativa,n® 107, 1989, p. 98. 191 A.C. da Cunha Ferraz, Uniao, Estado e Municipio na nova Consttuigéo: Enfoque jriico formal In: A nova Consttuigao paulsta: Perspectvas, 1989. p. 70 12 Flriano de A. Marques Neto, Os conséxcios piblicos, Revista de Direio do Estado, 2, 2006, . 816 (destaques ro original) tes A Emenda 32/2001 inseriu no art, 62, CF, varias resrig6es em relagéo A utlizaczo deste Instrument. 376 0 que se deu também em virtude de um Poder Legislative tibio, em todos Os niveis federativos.'®® Por isso, muitos autores, até hoje, rechagam com vee. mencia qualquer tentativa de estender o poder regulamentar executive, espe- cialmente do Governo Federal. A prépria Carta de 1988, em face destas mas experiéncias, atribui ao Congreso Nacional a competéncia de “sustar os atos ormativos do Poder Executive que exorbitem do poder regulamentar ou dos l- mites de delegagao legisletiva” (art. 49, V), mediante edigao de decreto legislati- vo. Este instrumento poder-se-ia tomar um meio eficaz de inibigao da interlerén. Cie do Poder Executivo nas fungées do Legislative, mas ainda fol pouco ultlizado no Brasil. 2. A base constitucional da edi¢&o do decreto regulamentar da Lei de Consércios Publicos ¢ o art. 84, IV, CF, segundo o qual compete privativamente 20 Presidente da Republica "sancionar, promulgar e fazer publicar as leis. bem como expedir decretos e regulamentos para sua fie! execugao” (destaque nos- 0). Este “regulamento de execugéo” ja fazia parte da Carta brasileira de 1824 (art, 102, XII), havendo, porém, desde enléo, grandes variagoes sobre "o grau da amplitude do que se entende por execugo": tudo indica, contudo, que, nos dias de hoje, deve ser adotado “um conceito amplo de execugéo, mais compativel com @ complexidade da sociedade contempordnea”. Com certeza, as areas da griaedo @ da execupao do Direito, que jamais devem ser confundidas, também “no se apresentam em planos estanques*.'®? 3. Do pont de vista técnico, falam em favor do poder regulamenter, por um lado, as dificuldades de se aprovarem leis minuciosas, @ por outro, a “expe- riénoia acumulada do aparato butocratico para resolver numerosas questées do ordem pratica’."** © poder regulamentar possui também cardter democratico, visto que autovincula @ atividade da Administracéo Publica, no seu relaciona. mento com os cidados: em vez de a burocracia decidir com vasta liberdade sobre cada caso, a chefia do Executivo, através do regulamento — isto é: uma norma juridica de caréter geral—, “interpreta, atribui, especifica, dé o seu enten- Gimento e diz prospectivamente o que ela vai fazer”, 2 Carlos Bde Siquelra Castro, A Constivigéo abertae os dretos fundamentals, 2003, . 215 € 185 M, Paula D. Bucci, Direito acminisrativo @ polticas publicas, 2006, p. 168 e ss. IE,Ct Catlos E. Pugliesl, As medidas proviscras e o limite da reserva normative do governo no Sisiema presidencialbrasiloro, 2006, p. 183. A.C. de Cunha Fertaz elms que, em iclagae ave ‘Caulamentos de execucdo, esta decisto do Congresso deve set lomada na base de um vise oe mga kcade, sem levar em considerago espectos polticos de conveniencia e oportunidade (Con, Ie ene poderes: 0 poder congressual de suster ates do poder Executvo. 1034, p. 9a. ce) pate Citi. O poder regulamentar auténome do Presidente de Repibics: A especie ‘gulamentar criada pele EC n* 32/2001, 2005, p. 85 e ss., com teleréncia a Alexancle & oe Nraate, (Aaéncias reguiadoras e a evolupéo do dire administralivo econémico, 2002, p44) ‘Nuno Pigatra (A seperaeéo dos poderes como doutrna e principio conciucionel, 1969) p. ayy Cl J, Adércio L. Sampaio, A Consttuipgo reinventads pe 460. 19 Sérgio de A, Feria, A Jwisdi¢o constitucional, 2002, p regulagao como expresso do poder normative governamental In FRDE | Revista de Direto do Estado Ano? nPS:341-895 janfmar 2007 a7 4. No entanto, nao ha divida de que as fronteiras entre 0 poder de legislar @ 0 de regulamentar séo ténues, tema sobre o qual jé relletiu Rui Barbosa, para quem '@ Constituigdo nitidamente separa da funcao de legislar a de regular, cometendo cada uma, como primitiva, a um 86 poder. Mas, as duas, verdade seja, nao se Podem considerar substancialmente distintas e rigorosamente delimilaveis. Do regular ao legislar, do legislar ao regulamentar, nem sempre so claras as raias, Entre as duas competéncias medeia umia zona de tronteira indecisa, mista, por ventura comum, em que ora as leis regulamentam, ora os regulamentos legis lam ‘Ao mesmo tempo, grande parte dos autores nacionais era sempre incisi- va em destacar os limites de qualquer atividade normativa por parte do Executi vo. Assim, Pontes de Miranda alegava:"” “Se 0 regulament cria direitos ou obrigagoes novas, estranhas & lei, ou faz revie verem diteitos, deveres, pretensdes, obrigagoes, agdes Ou excecoes, que a lel ‘pagou, ¢ inconstitucional. Por exemplo: se faz exempliicativo o que & taxativo, ou vice-versa. Téo-pouco pode ele imitar, mocificar ou ampliar direitos, deveres, Pretensées, obrigagbes, agdes ou excegdes, Nao pode facullar 6 que na lel se Profbe, nem ihe procurar excegdes & proibigao, salvo se esto implicitas, 5. Hely L. Meirelles também entendia que o regulemento nao poderia “contrariar a lei, nem restringir ou ampliar suas disposig6es", mas somente “ex Plicita-la", dentro dos limites por ela tragados." Ao mesmo tempo, observava que © decreto regulamentar teria “a mesma normatividade da lei, desde que nao ul- trapasse a algada regulamentar de que dispée 0 Executivo (...). Assim, se uma faculdade ou atribuicdo esta implicita no texto legal, o regulamento ndo exorbita '4, se Ihe der forma articulada e explicita.""”? Até hoje, esta ligdo praticamente incontestada na doutrina nacional. Na mesma linha, Celso Bastos’”® destacou que os regulamentos presidenciais podem “agregar elementos & norma legal, pare tornar suas ob 1908s de mais facil apli- Caco. Sao insuscetivels, entretanto, de criar obrigagdes novas, sendo apenas aptos a desenvolver as existentes na lei...) No Seu aspect material, puis, na particularidade do cardter genérico abstrato de suas disposigdes, a lee o regu lamento se assemelham, Cessam, contudo, al suas afinidades. No mais, dferem Eros Fi Grau ¢ S. Sérvulo da Cunha, Estudos de citeto constiucional em homenagem a J. Afonso a Siva, 2003, p. 35. 0 Fui Barbosa, Comentéris & Constiuicdo Federal brasileira, v. 1, p. 409 e ss,, apud Carlos R. Siqusira Casto, Funeao normativaregultéria. In: . 8, de Aragao, O poder normative das aoeneles reguledoras, 2008, a° 59, 171. C. Pontes de Miranda, Comentarios & Constuigéo de 1946, 1. I, 1963, p. 121 {72 Hely Lopes Metolas, Direito adminisiatvo brastre, 1969, pp. 108 ¢ 185 (a citada ecicao & 2 ima redigida pelo prépio autor, que feleceu em 1990) "79 Celso R. Bastos, Curso de dieito consitucional, 1989, p. $71 378 Corrmacmente ambas as eepécies normativas, malgrado as dilculdades da Courrina em explicar, com rigor, as discrepancias que se sera 4 ic aGunde Loewenstein, « competénoia de delegagao normativa, na aso poder oenal 82 reeria ao ato de concesséo —doParlamento so crane Taine Poder de eteiuar as requlameniagses necessdrias pares execugdo (Aus vrarun@).realizaeko (urchidhrung), eletuaggo (Vollcteng) 5 aplicagao (An- pode ).das leis emitidas pelas assembigias eleitas polo Severs Entretenio, Seto, oe car lel conceituagao ¢ delimtagao dagule soe, note fava a crea arsiderado execupao ou apicacao de uma lel Keleor ese Cap 8O, cer a soe Diteito, na maioria dos casos, também uma fone aa sua apli- S282. come consequiencia imediata do fato de que tose nes criador de Direito Geve Ser determinado pela ordem juridica, até por tonne de ciferentes niveis, Dara ele “a questio de saber se um ato é criagao oo aplicagao de Direlto 6, na Yerdade, de todo independente da questao de Sabor act que grau 0 érgo atuan- ipenas os atos pelos quais nao se estabelece norma alguma podem ser mera aplicacao de Direlio."5 7” Moreira Neto, no timo ponto da sua famosa “liste” de caracteristicas das normas gerais da competéncia concorrente limitada, alega que caberia so- Geral goes Cstedos editarem normas especticas para que lele federais de cunho Geral Possam ser aplicadas em seus respectivos amibites Politicos, © que as pré- Frets Popes Set2is ecltadas pela Unido ndo poderiam ser norneg de aplicagao gireta.* No mesmo sentido, Ataliba atirmava que c Fegulamento nao pode criar Obrigagbes para terceitos que nao séo suborcinados hierdrquicos do chefe do Poder Executivo que o editou'", abriganco o a vidores federais, mas néo aos iam atingidos "s blico”, isto &, por via indireta, *n Monte limites em que estes “terceitos” sao colhidos pe. dia que toda vez que a lei fixava as pendence nensten, Veriassungslefro, 1959, p. 211. "As assembidias hoje s8o recrutads pre. Ponderanterente por Bo especialisas ¢, po isso, via de remra, teens inespane ene Na Acmnisragdo Pablica cada Yer mee menace fato que os da tee ns eazes 8 Saborar toes os detahesleenicos noe ec eH aplicagao prética ds leis na vida real" (op. oft) 175 Hens Kelsen, Teoria geral do "1 (Coimbra), 1962, p. 87 6 se, da noes yk Morea Nate, Compettncia concrrete lntade: © problema a conceituagao Cisse aera, Rewte oe inomacae Legislative aor ieee Ace lnvocande a ligeo oe cae eee (Tatado des Consitugdes Brasoras Fogo. eee, il 1958, p. 255 e ss.) rebeal naentuc®: 80 lertar doin crterios para identi es, ‘eras, faz @ importante ‘essalve: “Mas em nada disto estare lenie © seletivo, que poss Setvr de eritéio nico para declot rie 0 gue sejam normas gerais eo que eejen noes especiais ov especiias® (op. ct, p. 1a2.0 ce 77 Geraldo Ataliba, Republica @ Consituigéo, 2004, p. 190 Grete © do Ested, 1988, pp. 185 @ 386; Teove pure do dire, ADE | RevistadeDisiode Estado Ano? n85:34%-905 fantnar 2007 379 condiges para exercer um direto, em relagdo a "pessoas alheias” & Administra- 80, era necesséria uma regulamentagao da forma pela qual esta iria providen- Ciar a plena realizago da vontade legal, acrescentando: “Ora, isto ¢ feito pelo ro- gulamento, que, além de preencher esta funcéo, ainda tema virtude de— desde Que observados os mandamentos legais — obrigar terceiros, tornando ndo so ossivels como féceis as relagdes e 0 entrosamento entre améquina eestes.""® 8. Como ja expusemos, na Alemanha, a doutrina e jurisprudéncia pés- guerra sempre aceitaram que es leis de quadro podiam conter também dispo: tivos diretamente aplicéveis, n€o sendo elas restritas a mere “orientagéo" dos le- gisladores subnacionais. Isto se deve também ac fato de que, ao contrério do art. 10 da Carta de Weimer, que ainda falava em “legislaco principiologica” (Grund. satzgesetzgebung), 0 art. 75 da Lei Fundamental de Bonn passou a empregar a expresso da “legislagao de quadro" ou "de moldura” (Rahmengesetzgebung), Em relag&o a esta mudanga terminolégica, é de observer que, a0 contrario des principios, que normalmente se ditigem aos legisladores, “as normas gerais vol lam-se também & cisciplina das relag6es juridicas substanciais entre os indivi duos" e, assim, podem ter effcdcia direta e aplicabilidade imeciata em termos de aplicagéo as relagbes concretas que regerao.1”° E, se é verdade que o sistema das competéncias concorrentes limitadas constante das Cartas brasileiras de 1934 € 1946 foi nitidamente influenciado pela Constituigéo alema de 1919, tam- bém no pode haver duvida de que o sistema de competéncias concebido pelo art. 24 da CF de 1988 teve como modelo de inspirac&o 0 da Lei Fundamental de 1949, V.2. A necessidade de adequagao do principio da separagado dos Poderes a realidade do Estado Social moderno 1. Em geral, pode-se afirmar que o principio constitucional da separaggo dos Poderes, consagrado como cldusula pétrea no art. 60, § 4%, Ill, da Carta bra- sileira de 1988, deve assumir uma “nogéo menos mitificadora e mais pragmati- a", pois convive com outros principios com os quais pode colidir. Parece que a viséo classica de supremacia absoluta do Legislativo, muitas vezes, “torna-se dogma (ou até mesmo ideologia), o que faz com que alguns autores tentem vis- lumbrar questées atuals com as lentes do pasado”, jé que, em virtude do au- mento da legitimidade democrética do Executivo pelo voto popular, o poder re- gulamentar néo pode ser mais tratado como se fosse "um grande mal para a hu- manidade"; no entanto, sempre devem ser respeitados os seus limites ¢ efetive das as formas de seu controle, para que ‘a liberdade dos particulares nao seja cerceada pela tirania do administrador publico". 1° 178 Op. cl. p. 138 € ss.. (destaques no original). 178 Ci, Diogo de F: Morera Neto, ap, cf p. 157 ¢ ss. assim também: Luls C. Alcolarado, Lictepso € contrato edminisirativo, 2000, p, 35 e ss. tee André R, Cyto, © péder regulemeniar euténomo do Presidente da Repitblice, 208, pp. 24 © 33-39 e ss.. (Destaques no eriginal). 60 2, Jé nos anos 60 do século passado, Loewenstein afirmave que “nada ‘mostra com mais clareza a superagao da tradicional tripartite ‘separagéo dos po- eres do que a posigéo do governo no proceso legislative", ao qual o Executivo estaria “ligado de forma inseperével", sendo “quase obrigado a assumir a lide: ranga na tomada de deciséo politica” e de "aceitar a responsabilidade pela exe- cugao das decis6es tomadas, a qual, via de regra, também veste a roupagem da legislagao’."*" Nessa linha de raciocinio, torna-se preciso redefini 0 alcence da maxima "administrar é aplicar a lei de offcio" (Seatyra Fagundes), visto que a ges- '20 piblica, hoje, néo se pode mais resumir isso. Tal concepgtc restrtiva, que resulta numa demasiada limitagao do conteddo material dos regulamentos exe- cutivos para execugao das leis, parece encontrar a sua base “num resquicio de medo de um poder sem legitimidade e controle demooraticos”."®2 3. Também entre os constitucionalistas da Republica de Weimar era forte a idéia de que a conquista da soberania popularno novo regime democratico era inconciliével com a vetusta teoria da diviséo dos Poderes ¢ teria levado a um ionismo parlamentar unificador de Poderes”."®* No periode pés-guerra, 0 BVeriG concedeu eos érgaos de cada Poder estatal um intocdvel “espago nu- clear funcional” (funktionelle Kerbereichslehre), 0 que fol criticado, invocando- Se 0s exemplos das “leis-medida” e “leis-plano", que normatizam casos concre- tos, €, por outro lado, as multiplas formas de legislagao executiva por decretos, estatutos, regulamentos etc., que inviabilizam uma delimitag&o nitida das esferas de atuagao entre os Poderes Legislative e Executivo, Isto levaria & necessidade de voltar a compreender a separagao dos Poderes no seu sentido original: como Principio final-racional, adequaco aos valores @ ao sentido de formagao e mode- la¢éo politica de uma sociedade concreta, num determinedo contexto histérico, isto €, como “forma empirica de coordenagdio”. "4 4, De igual forma, a “teoria racional das funges juridicas", de matiz kel- seniana, por ter caréter meramente /6gico, néo dé espaco para um principio de separagdo de Poderes que analise a disttibuigéo @ o balanceamento do poder estatal sob aspectos valorativos, mas crie um sistema meramente formal da divi- so de competéncias e dependéncias entre diferentes érgéos publicos, que no permite mais @ pergunta pelas razdes materiais de sua contiguracao no caso onereto."® No entanto, como 0 fundamento da reserva de lel formal é 0 exerch clo do poder pelo povo (através do Poder Legislativo), ela deve ser compreendi- 101 Karl Loewenstein, Verfassungeletre, 1959, p. 205, 182 André R. Cytino, op. cit, pp. 43 € s8., 87 e ss 1s *Gewaltenvereinigender pariementarischer Monismus" (Richard Thoma), que estave sob & Ife influéncia do pensamento radical-democralico de Rousseau e em deliimerio dae concep p68 de Locke e Montesquieu, oriundas das condlgdes do Estado monérqulce: ct, Hane Delt Horn, Gewaltentellge Demokraie, demokralische Gewaltentelung: Uberlegungen 2u einer Orge- risationsmaxime des Vertaseungsstaales, Archiv des offentichen lech, Bd. 127-9, 2002, p. $61 184 Op. cit, pp. 445 € 58. e454 © Op. cit, pp. 443 e ss, ADE | Revisiade Diretodo Estado Ano2 r#5;341-995 janimar 2007 a no seu sentido substanciat, isto &, como "reserva democraticamente intensif cada". Assim, a crescente especializag&o das fungdes dos éraaos estaiais leva 8 uma “estratiicagao de normas, consoante 0 papel que cumpram no sistema luridico"; este fato ndo esvazia o principio da reserva legal formal, mas éfruto da endéncia generalizada de uma flexibilizagao da produgao normativa no moder- no Estado intervencionista, 5. Na realidade governamental das democracias modernas, os proces- os de tomada de deciséo esto cada vez mais impregnados por “atos coopera. tives", através dos queis a chefia do Executive negocia e pactua direlamente ‘com os representantes dos partidos de oposigao e os atores da propria socieda- de civil (empresérrios, sindicatos, instituicoes cientiticas, associagoes etc) Este comportamento amplamente aceito é conseqiéncia da auloridade técnica e da osi¢ao dominante do governo no processo legislativo e, apesar de que, muitas vezes, leve até ume “aniecipacdo félica” de decisoes parlamentares, no pode ser consideradio uma violago do principio da “idelidade dos érgaos constitucio. nais" (Verfassungsorgantreue), 1” V.3. O sistema brasileiro de execugao das leis dos diferentes niveis federativos; a forma conereta da aplicagao da Lei de Consércios Publicos 1. No Brasil, o sisteria administrativo tem a sua base no principio da exe- cupao imediata, © que significa que os quadros de funciondrios da Uniao, dos estados e dos municipios, respectivamente, executam, a principio, apenas os Gispositivos legals da sua prépria esfera.® Diterentemente, a Lei Fundamental alemé (art. 83) estabelece que “os estados executardo as leis federais como me- ‘eria propria’; nessa tarefe, as Administracoes estadusis ainda podem delegar tarefas aos municipios e &s “circunscri¢des intermunicipais” (Kreise), para che- gar a uma implementacéo descentralizada e mais efetiva das leis federais o es- taduais. 2. Vale ressaltar, neste ponto, que, segundo o sistema brasileiro, é veda- Go a legislagao da Unio determinar que estados e municipios ajam em certo sentido; a sue vinculagao as leis federais, no sentido de dever obedecé-las, no te Cl. Gabriel de M. Galvéo, Fundamentos¢ limites. ‘aut6namas federais, 2008, p. 73-60. 127 Ci. Vel Mende, Kooperatves Reglerungshandeln: Verlassungsletve vor der Herauetorderung konseneorientierter Politkmodelle, Archiv des offentichen Rechts, Bd. 127-4, 2002, p- 668 exe 128 José Afonso da Siva, Curso de are constitucional positive, 2008, p. 480 € ssc autor entende 08 dispositivs do at. 23, parégreto (nico, ¢ do art. 241, CF, como excagées ao sisterna tedlats Je execugdo de servicas adotado pela Federacao brasileira (op. eit. p 461). we Sobre este tema, que seré tratado aciante, vide Andreas J. Krell, O municipio no Brasil € na ‘Alemanta: Direito © Adminisirapao Publica comperadios, 2003, p. 5:78. rbuipdo de poder nermative as autarquias 62 significa @ obrigagao de implementar e executar ativamente essas normas."® ‘Aqui, @ garantia constitucional tradicionalmente forte da autonomia administrati- va dos integrantes da Federagéo (art. 18, caput, CF) impede que leis de niveis Superiores possam impor a érgaos de entes inferiores um *camportamento ati vo", COMO, v.9., a criago de secretarias e conselhos, elaboragao de pianos, cria 80 de cargos ou prestagso de determinados servigos. Por isso, ha muitas leis lederais (chamadas de “nacionais") que formulam Poliicas Nacionais para os respectivos setores administrativos e prevéem uma integragao dos estados & Municipios brasileiros em Sistemas Nacionais,""" os quais, porém, devem ser Qualificados como meras molduras institucionais, que precisam ser preenchidas através de consércios publicos, convénios e outros tipos de acordos, a serem livremente negociados € celebrados entre os entes tederados, como prevé o att 241, CF 3. Por falta de obrigatoriedade legal da participagao ative dos estados © municipios nestes sistemas, estes funcionam somente mediante o uso de “meios indutivos”, isto 6, @ oferta de ajuda material através de programas e fundos, sob & condigo de que 0s governos interessados tomem as providéncias administra. tivas concebidas nas leis superiores. Esta participagao induzida, no entanto, nao ossul caréter juridicamente vinculativo, podendo os integrantes abandoner os sistemas a qualquer momento, o que contribui para a sua instabilidade, Esta si juagdo evidencia @ suma importancia e necessidade imediata de uma regula. mentagao homogénee e, de boa parte, nacionalmente uniformizada, dos constr. clos publicos, jé que a participacéo dos estados e municipios em determinados Gonsércios ndo pode ser prescrita por lei superior, como acontece em outros pa ses, 4. 0 proprio Congreso Nacional brasileiro achou por bem dotar a Lei n? 11.107/05 de um contedido material bastante resumido e “enxuto", reduzindo os 4B artigos, que ainda compunham o Projeto de Lei n? 3,884/04, para 21 artigos do texto legal promulgado. Isto néo significa que os érgaos legislatives da Unido arama inten¢&o (ou @ obrigacao) de deixar para os estados federados @ regu. {ementagae dos (poucos) itens temticos tratados na prépria Lei, visto que quase todos os detalhes ligados a formagao, operacao, gestao e controle dos consor. cios publicos necessitam de uma disciplina uniformizada no pals inteiro. Porta. \o, parece ser coerente que varios dispositivos, que ainda constavam do referido Projeto de Lei, passaram a integrar o texto da Minuta do Decreto presidencisl om exame. A escolha legitima de Gividir @ Lei de Consorcios em uma parte formal (Parlementar) © um parte material (executiva) serviu também pata garanti a nse iP, One Alemanna, = impexténcia dessa dein fol expressamenteenfaizada pelo Tuna! Adminisirtve Federal (Bundesverwelungsgerichf cl. BVEIGE n° £9. p So «86 iSlowanenemble, nas éreas da Sadde (SUS: art. 200, CF: Lei n® 8.080/00), da Melo Ambiente GiSat Lel rt 6.9961: Decroton#89.274/80), do Gerenclamento dos Recureee Fichee hea Ti SAsae?), do Trans (Lei r# 9.503087; Decrelo ri 4.71109), da Seguranga Almere vege Toner a Cel 11.846/08), des Armas (SINARM: Len 9.497897: Dectelo n® 220987) wan Vigiléncia Senitéria (Lei n? 9.782)50) DE | Revista de Direto do Estado Ano? 1°5: 341-305 janfmar 2007 283 possibilidade de sua atualizagao no futuro—imprescindivel em virtude da eleva- da dinémica sociceconémica —, sem a necessidade de caminhar pelo demora- do processo legislativo formal 5. Em nivel da Teoria do Direito, distingue-se entre a observanciae a im- osieao das leis: a primeira ¢ dada onde se age conforme a norma lagel, sem que haja uma ‘atitude sancionatéria impositiva’ de um orgéo estatal; a segunda, também considerada de execueéo (em sentido estrito), “surge exatamente como Feagéo concreta @ comportamentos que contrariem os preceitos legais, desti- nando-se & manutengao do direito ou ao restabelecimento da ordem violada’. © No entanto, ¢ de frisar que a Lei de Consércios Publicos néo seré executada atr vés dos tipicos “atos da Administragao", om que @ autoridade competente atue decidindo sobre situagoes que envolvem particulares, que se encontram numa Posigao de subordinagéo a ela, mas que a sua aplicagao se daré no contexto da Celebragéo de contratos acministrativos, os quais se destinam a realizacao de servigos ¢ obras puiblicos.' Neste sentido, Jellinek, jé hé cerca de um século, alegava que "na maior parte dos casos, as ordens do Estado se transformam em atos oragas & obediéncia dos individuos e das associagoes, que nao séo titula- res dos Orgos do Estado, € esta execugao nao 6 fungéo do Estado, mas antes um [ato individual ou corporativo”, 18. No Brasil de hoje, esta em plena formagao um “novo Direito Adminis- trativo’, que abre espagos maiores paraa negociagéo.e a concertacaono interior da Administragao Publica, incluindo-se 0 uso cada vez mais freqUente do contra- io instrumentos similares. ®° Os consércios ptiblicos preconizados pela Lei n? 11.107/05 representam instrumentos tipicos da emergente Administracéo Publi- ca consensual,'® sendo explicita a incluséo deste novo instrumento de gestéo nna categoria contratual."®” Para poder delinear os limites materiais de uma regu- lamentacao para a “fie! execugéo" desta Lei por decreto presidencial, surge @ Pergunta: por quem e como esta lei de organizacao administrativa sera executa- a, tornando-se preciso analisar quais serao os érggos administrativos incumbi- dos de sua aplicaggo e os procedimentos a serem adotados, 6. Na Alemanha, instituiggo e contetido dos estatutos das "associagoes finalisticas" (Zweckverbéinde) — que sao comparaveis aos consércios brasilei- te Marcelo Neves, A constticionalizaggo simbélice, 1094, p. 43, com reteréncia a Nikles Luh. ‘mann, Rechissoziologie, 1987, p. 267, 188 Cf. Marcos Bernardes de Mello, Teoria do fatojuraco: plano de existéncie, 2007, p. 187 ¢ ss 114 Jelinek, Georg. Teoria general de! Estado (1911), México: Fondo de Culture, 2000, p. 549 385 Cl, Wiacimir A. Ribeito, As escolas de governo e 0 “nove direlto edministativ", In: J. M.B. Carneiro @ A, Amorim, Escolas de governo € gestae municipal, 2008, p. 149 © ¢2, }8® Cl, Diogo de F. Moreira Neto, Novos insttutos consensuale da ago administrative, Revista de Diteito Administrative, r® 231, 2008, p, 152. 181 “Ar. 380 conscio pico seré consituldo por conralo cua celebragdo dependeré de prévia subscipto de protocolo de intengdes.” Ci. Odete Medaur © Gustavo J de Olvela, Conereee pPiblicos: comentarios & Lei 11.107/2005, 2006, pp. 24 ¢ 46 © se see fos — esto sujeitos ao controle dos "érgaos de superviséo" dos governos esta- Guais, que fiscalizam o cumprimento da legislagao pelos municipios, pelas cit ‘cunscrig6es intermunicipais @ outras entidades pUblicas de niveis local e regio. nal. © sistema brasileiro é diferente: aqui ndo existem mecenismos de “tutela" institucionalizada, pois os atos normativos locals entram em vigor sem controle Prévio de orgées superiores, podendo somente ser anulados pelo Poder Judicié. Tio. Ao mesmo tempo, 0 Ministério Publico (federal e estadual) esté exercendo um crescente controle neste sentido, efetuando “notificagdes recomendatérias’ Ge 6rgaos publicos, quando constata que atos normativos e administrativos con- trariam a legislagao vigente, especialmente no que ciz respeito a eficiente pres- tag&o dos servicos publicos, na base do ert. 129, CF." 7. O termo da “execugao" contido no art. 84, IV, CF, deve ser entendido (Pele menos a prior) no sentido da aplicagao da norma legal, o que significa a Sua “realizago no mundo da vida’, mediante produgao de atos individuais de Cra8os administrativos, que subsumem os atos fatos reais sob os respectivos tipos legais, emitindo sangdes, ordens, probigbes, permissées, efetuando regis- ttos etc." Todavia, é de frisar que a Lei n# 11,107/05, no que diz respeito a sua execugao, representa uma lei atfpice: ela no prevé sangées™ @ ndo sera pro- Priamente “aplicada” por érgéos administrativos, no sentido do emprego de atos Preventivos ou repressivos etc., prescrevendo a disciplina da gesto associada de services publicos num “contrato de programa”; este, por sue vez, deve ser autorizado anteriormente pelos entes federativos num ‘protocolo de intenges” ©, em seguida, constar no "contrato de consércio publico". O cumprimento des- {as etapes formais constitui a condigao juridica pela atuagéo do consércio no Tespectivo émbito administrative. 8. Segundo Oliveira da Silva, a Lei de Consércios estabelece dois planos Gistintos de abordagem: 0 da contratualizapéoe o da personalizacao. a natureza Contratual do consércio emerge do texto legel, que o define como “acordo de vontades firmaco entre entes federativos" (aris. 3; 4, Xil, § 3% 12 € 13, § 5%); no ‘Segundo plano, atende-se a necessidade de capacitar 0 consércio publico @ braticer ates © negécios juridicos vélidos, estabelecendo a opgéio de funcionar através da criagao de uma personalidade juridica de Direito Publico (denomina. {o2 "At. 128, Sto fungOes insitucionals do Ministéio Pablico: II —zelar pelo eletivo tespetio dos Poderes Publcos © dos servos de relevancla publica ace alreltos assequrados nesta Genstion G20, promovendo as medidas necessérias a sua garanta: VI — expect neliioagOes nos proce ‘Gimentes adminisirativos de sua competéncia, requisitande inlormagbes ¢ documentos pere ine “Uilos, na forma da lel complementar respective, 129 Nao € objeto deste perecer aisculr detelhes das formas © condigoes dentro des queis se Produ 0 so de subsuneac: apenes sela lerbradea @teoria eobre a incicéncia de norma jules de Pontes de Miranda, stusizada por Marcos Bernardes de Mello (op. cll. p. 74 © ee) i Neste contexto, fla-se de um “aiveyci entre o Dirello Administrativo © os paradigmas de Nova esto Pablica" visto que este ramo juriico “lem um vasto campo de inldéncia, Geede ot doce de fomento, de servigos pubicos, de ailvidades econtmicas, de pole, pessando pela regulagas €-Bala sangécrs ef. Fabio M. Osério, Direto administrative cancionador, 2008, p. 76 (desiaenes ress0s). FRDE | Revista de Direto do Estado Ano? n?:941-885 fanmar 2007 285 da associacao publica), ou de Diteito Privado (art. 6°) 2" Isto significa que a apli- cacao da Lei n# 11.107/05 se dara no sentido de que qualquer estrutura consor- cial existunte tera de se enquadrar nos seus ditames, caso contrario n&o poderé gozer das vantagens criadas por ela, como a aquisi¢&o de personalidade jurid 22 e, por conseqUéncia, a possibilidade de receber atribuigdes em relagao & Prestagao de servigos publicos; assim, a Lei serd aplicada por parte dos entes estatais apenas no momento da prépria criagéo dos consorcios. Caso estes neo respeitem as normas federais, a san¢dondo sera a nulidade do ajuste ou a nega- G80 de sua aprovagao formal, mas 0 seu ndo-reconhecimento por parte da Unigo, que resultaré na impossibilidace de uma participagao direta do ente cen- tral ou do repasse de verbas, Assim, os consorcios que néo atenderem as exi- gencias da Lei federal e seu decreto regulamentar néo perderdo, necessaria. ‘mente, a sua validade juridica, mas n&o poderao exercer determinadas fungées. V.4. A importancia da questao dos limites da delegagao legal de poder normativo no Brasil 1. 0 art, 20 da Lei n® 11.107/05 estabelece: "O Poder Executive da Unio Fegulamentard o disposto nesta Lei, inclusive as normas gerais de contabilidade publica que sero observadas pelos consércios piblicos para que sua gestéo financeira e orgamentéiria se realize na conformidade dos pressupostos da res- Ponsabilidade fiscal.” Ao lado dos fundamentos do poder regulamentar do Poder Executivo, que s8o de ordem pratica, hist6rica e juridica,* é comum a classili- cacao dos regulamentos em internos, cujos efeitos juridicos esto restritos a es- fera administrativa do ente estetal de que emanam, ¢ externos, que produzem efeitos em relagao a outras pessoas politicas ou em relagio a particulares. Os regulamentos externos mais comuns so, sem divida, os de execueao (ou com- plementares), que tém a fungao de pormenorizer, detalhar e complementar 0 contetido das respectivas leis, instrumentalizando a sua execugéo, explicitando seus comandos e interpretando os seus conceitos.°® 2. Em todos os paises democrattioos, @ delegacao de atribuig6es entre o Parlamenio € © Governo tornou-se uma necessidade para solucionar os proble- mas que surgem nas modernas sociedades complexas. Neste sentido, o fend- meno mundial da “deslegalizagao"™ (au *delegiticagao")® indica a transferén- 421 Cleber D. Olvera da Siva, Consideraetes sobre a fulura regulementagso da lei geral dos {cons6rclos pubiicos,disponive em: hitp/Jus2.Uol.cam br/doutrinallexio apd 7063 [aceeco- oe 2006), 202 Carlos E. Puglisi, As mectilas proviscvas @o mite da reserve normativa do governo ne sistema presidencial brasileiro, 2006, p. 151 ¢ ss Cl Clémerson M. Cleve, Atvdade legisativa do Poder Executive, 2000, pp. 291-8; Diogo F 0 Amaral, Curso de cireto aciminisiatvo, vl, 2001, pp. 159 e 163, 71 Sobre 0 fendmeno da deslegaizagéo no Estedo moderno, vide, André R. Cyrina. O poder ‘regulamenter auiénomo do Presidente ae epublica, 2005, ». 183 e 58. +96 Giuseppe Vergottn, A *delegificago”e 2 sua incidéncie no sistema das fontes do Direto. i 986 cla da disciplina de determinadas matérias da esfera legislativa para a do gover- No, © que faz crescer 0 poder regulamentar do Estado administrativo, que, muitas vezes, abusa dos seus poderes normativos, até em virtude da demora exagere- da na produgo das leis parlamentares.*° Por toda parte, discute-se atualmente 4 questo se o procedimento tradicional de produgao legislativa, baseado na realidade do Estado Liberal cléssico, ainda corresponde aos desafios de um ‘cumprimento eficiente das tarefas do moderno Estado Social intervencionista € em que medida se tornou necessdria a sua complementagao por formas mais flexivels de produgao juridica."” Na medida em que o poder estatal deve res- Ponder, de forma mais eficiente, aos avangos técnicos e cientificos, justifica-se a elevagao da margem de deciséo em favor do Executive.” As conseqléncias desta tendéncia de deslegalizaco, no Brasil, esto causando polémica, sobre- tudona discuss sobre o poder normativo das Agéncias Reguladoras, as quais, sem duvida, devem atuar com respeito esirito as normas legals definidoras de suas fungées, nao Ihes cabendo regulamentar matéria para a qual inexista um prévio conceito genérico em sua lei instituidora °° 3. No entanto, é de frisar que a Constituigdo de 1988 nao repetiu a ex- presse vedacdo da delegacao de atribuig6es entre os trés Poderes, ainda pre- sente nas Cartas anteriores, Principal argumento dos que negam a constitucio- nalidade de regulamentos “delegados" por lei ¢ 0 art. 25, |, do ADCT, de 1988, que revogou todos os cispositivos legais que atribuam ou deleguem a orgéo do Poder Executive competéncia assinalada pela Constituic&o 20 Congresso Na- cional, especialmente no que tange @ a0 normativa. Todavia, ja em 1948, quando vigorave a vedagao da delegacao do poder normativo, o STF#"° jg enfa- tizou que esta tinna de ser entendida de acordo com as demais normas constitu= cionais e ceder onde dificultava 0 exercicio de um preceito de ordem geral da Carta Magna. Este mandamento de uma interpretaco sisteméttica coerente do texto da Lei Maior como um todo se aplica também ao dispositivo do art. 25, ADCT, e encontra respaldo no principio hermenéutico da unidade da Constitu'- 40, que expressa "a necessidade de olhar nunca somente a norma individual, ‘Sendo sempre também @ conexdo total na qual ela deve ser colocada; todas as SR. de Barros e Femando A. Zivell, Direto constitueional — Estudos em homenagem @ M. 6 Ferrera Filho, 1989, p. 168 @ se. ‘16 Nao $e Weta aqui da “delegagéo legislative” em sentido esiri, que ¢ 2 “outorga temporaria parcial e concicionada do exercicio da competéncia legerante leita pelo Poder Levislative« out Poder’ ci, Bruno Brodbekier, Poder regulementar da Adminisiragao Publica, Revista de Direito ‘Administrativo, 1® 238, 2003, p. 147, como € 0 caso das "leis delogadas" (arl, 68, CF) ‘2 Fritz Ossenbohi, Rechtsquellen und Rechisbindungen der Verwaltung. In: H-U. Erichsen e D. Ehlers, Allgemeines Verweitungsrech, 2002, p. 142.6 $8 ‘8 Lothar Michael, £1 Estado constitucional cooperante, i: F. Balaguer Ct tucional y cultura —~ Estudios em hom. a P. Haber, 2004, p. 333, 22 Guilherme P. de Moraes, Readequagao conetitucionel do Estadio modemo, 2008, p. 43 @ ss, 210 No julgamento do Habeas Corpus n 30,355 (Rel. Min, Orczimbo Nonato). én, Derecho Const FADE | Revista de Direlodo Estado Ano2 n°6:341-306 jantmar 2007 normes constitucionais devem ser interpretadas de tal modo que contradigdes ‘com outras normas constitucionais sejam evitadas".?1" 4. £, ainda que o art. 84, pardgrafo nico, CF, néo preveja expressamente a delegagéio da competéncia regulamenta (inciso IV da norma) por parte do Pre- sidente da Reptiblica, os decretos do Chefe do Executivo também podem preci- sar, para o seu maior detalhamento, de uma ulterior regulamentago por outros 6rgaos administrativos, seja através de resolugdes, portarias ou instrug6es nor- mativas. Prova disso ¢ o proprio art. 87, I, CF, segundo 0 qual compete ao Minis- tro de Estado "expedir instrugbes para a execugao das leis, decretos e regula mentos" 2" podendo haver, assim, atos de regulamentagéo de primeiroe de se gundo grau2"* 5. Cleve destaca que a order juridica brasileira admite apenas os regu- lamentos executives secundum e intra legem, ponderando, ao mesmo tempo, que “no atual momento hist6rico, em face do processo de ‘administrativizagao pelo qual passa o direito, é natural que os decretos regulamentares assumam Uma importéncia considerével, contribuindo, inclusive, para @ colaboracao entre os Poderes Executivo ¢ Legislativo. O territério da operacionalizagéo técnica da lei, no mundo de hoje, talvez constitua 0 espago por exceléncia da atividade re- ula mentar do Presidente da Repdblica."?"* Bandeire de Mello também rechaca, até hoje, com veeméncia, qualquer possibilidade de regulamentos delegados em favor de érgéios executives, inclusive o Presidente da Republica, tendo por preocupagéo principal a experiéncia dos abusos constantes do poder normative 1elos governos; nessa linha, afirma que o principio da estrita legalidade talvez ‘no desempenhe tao transcendente papel efetivo em outros sistemas juridicos, mas no Direito brasileiro é, sem duvida, prinofpio de fulgurante importancia’.?'* 6. Entretanto, pouco ajuda a tentativa de delimitag&o da abrangéncia mi terial do regulamento em relagao & lei mediante a afirmagao de que aquele “ja- mais pode inovar a ordem juridica’, visto que uma norma editada pelo Poder Exe- cutivo, que néo pudesse trazer nenhuma novidade em relagéo @ lei parlamentar a ser regulamentada, perderia simplesmente a sua razéo de ser."® Na verdade, néo € 86 a lei que inove: “na maiorie das hipéteses, néo se pode executar sem que se crie algo de novo, algo que acrescente", o que significa que o decreto regulamentar pode, em certa medida, também ampliare completar a lel, “segun: 211 Luis Roberto Berroso, Inlerpretagto e aplicago da Constituiggo, 2004, p. 196 e ss; J.J. Gomes Cnatiho, Dieito conetitucional e teorla de Consttuigso, 1997, p. 1096 e ss.; Konrad Hesse, Elementos de direto consitucional da Republica Federel da Alemanha, 1998, p. 65 12 Bruno Brodbekier, op. clt, p. 147. 213 Cl, José dos §, Carvalho Fi, Manual de alrelto administrativo, 200%, p. 36 e ss. 214 Climerson M, Cleve, Alividade legislative do Poder Executivo, 2000, p. 300 ss. 25 Celso A, Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrative, 2006, p. 390 6 88. 16 Glauco M. Guerra, Prineiplo da legalidede e poder normativo: diemas da sutonomie regula mente. In: Alexandre, de Atego, O poder normativo des agéncias reguladoras, 2008, p. 92-123, 308 do o seu espirito € 0 seu contetido, sobretudo nos aspectos que a propria le, expressa ou implicitamente, outorga a esfera regulamentar (destaques nos- 08).2"" Por derradeiro, a requlamentagéo néo pode mais ser reduzida a uma ati- vidade que s6 repete 0 conteddo da respectiva lei, um “mero elemento de sua execugao" e "procedimento de sua aplicago".*"® Na feigao de um regulamento de execugio haverd sempre — ressalvando-se as hipoteses da reserva de lel formal absoluta) —maiores ou menores espagos para uma atividade criativa 2" sendo que este pode até “conter norma nova, desde que néo contrarie a ordem legal vigente ¢ seja necesséria a plena execucao do diploma regulamentado* 2 7. Sem duvida, os decretos executivos, no Brasil, esto a caminho de as- Sumir @ fungao de verdadeitos instrumentos de delegagéo entre os Poderes, & ‘do somente (como antes) a de vefculos para a regulamentagdo administrativa Ge leis." Esta sendo paulatinamente ultrapassada a doutrina® que sempre te- Cusou a permissibilidade constitucional de decretos de delegagao e queria per. mit apenas o8 decretos regulamentares stricto sensu. Nessa linha, Binen- bojm observa que muitas leis federais “furtam-se a tarela de regular pormenoti- Zadamente determinadas matérias", deixando para decretos presidenciais 6 ou- fos atos regulamentares de entes administrativos “largo campo de conforma. 40", fenémeno que ele chama de “quase delegacéo legislativa”, igado & "dou- ttina da deslegalizagao que ver ganhando destaque no Brasil", Para o autor, 217 Destaque no original: ct. André R. Cyrino, O poder regulamentar auténamo do Presidente da Reptiblica, 2008, p. 83-88, com releréncia 8 obra cléseica de M. Seabre Fagundes (O controle 08 ats adiminisratves pelo Poder Judicério, 1967), que, apesat de ter delendido sempre um Coneeito restrito de execueao legel por decreto executvo, também admila Gue "e Bmbito Go poder ‘egulamentar pode variar conforme mais ou menos minudente for a lel tequlameniads”. Nomeorno sentido Caio Tacito, Comissao de valores mobiléros. Poder tegulamentat In: Temas de colo ublico: Estudos e pareceres, 1997, p. 1.078, 210 Assim ainde 0 ligéo de Oswaldo Arana Bandeire de Mello, Princpios gerais de diveito ‘administrativa, v1, 1968, p. 311 ees. 218 Gustavo Binenbojm, Um teori do direiio administrative: Diretos lundamentais, democracia @ Constiucionalizaeao, 2006, p, 158 e ss. 42 Sérglo Ferraz, Regulamento, In: 3 Estudos de Dieito, 1977, p. 117 @ 6s, apud G. Binenbojm, 0p. cit, p. 159. 2 Na viso desta tinha Goutrinsria, capltaneada por Alexandre S, de Aregéo (Agéncias regule oras @ a evolupéo do dire adminisvative econdmico, 2002. p. 97 & ss), © prinelvo da eliconce ‘stl. 87, caput, CF) representa 0 mais importante objetivo da Reforma Acministiaiva Brasileira, @ Je levou & “temodelacao das fungdes da Administtagto Publics no Estado conlompordnest © ‘quem néo mais compete simplesmente execuiaras lis, mas, sobreludo, selisiazer of interessee Coletivos (cl. A conceprao pés-posltvisla do principio da legalidade, Revisia de Direto Acme, ttalvo,n# 286, 2004, p53). 722 Ex: Miclor R. Leubé, O regulamenio no sigtema |uricico bresileio, Revista de Informapao Legislative, n€ 119, 1993, p. 139 e ss; Luciano F Leite, O regulemente no dreito brasileiro. 1408 221 Segundo M. Sylvie Z. DiPietro (Direto aciminisratve, 2002, p. 69), a ainea @ do art. 84, Vi, GF. inseride peta EC n® 32/2001, que etribu ao Presidente @ compeléncia privativa de tispor eobre ‘orgenizagéo @ luncionamento da adminisragdo federal, teria restabelecido o regulamonto suis ‘Ramone Dire brasileto; vie taribém; Gustavo Binenboim, op. ci, p. 160.6 s8 André, Gyro, 0p. cit, p. 129 es, ADE | Revista do Direto do Estado Ano2 n®6: 841-305 jantmar 2007 Ideia de “Tiel cumprimento deve ser lida cum grano salis, eis que nao se pode reduzir a atividade administrative requiamentar a uma simples aplicaggo mecd- nica da lei". Ao mesmo tempo, enfatiza que ao regulamento de execugso nao 6 permitido operar efeitos ultra, contra ou praeter legern, devendo ele sempre ter 0 lim de *desenvolver os textos legais", ¢ conclui que “os regulamenis previstos no art. 84, IV, CF, admitem um conceito amplo de execug&o, néio havendo, salvo casos de reserva absoluta de lei, execugao sem criagao". 2 8, Esta tendéncia é confirmada pela crescente pratica do legislador fede- ral de criar normas que anunciam a edigao de decretos regulamentares, mencio- nando os aspectos teméticos a serem tratados, o que, a principio, seria supér- fluo, j@ que o art. 84, IV, CF, atribui esta competéncia ao Presidente da Republica. Tais dispositivos legais sobre a regulamentagao, hoje, nao podem ser entendidos apenas como “condicéo suspensiva da execugéo da norma lagal, deixando os seus efeitos pendentes até a expedicao do ato do Executivo’.° Sao esclarece- doras, nesse contexto, as palavres de Nunes Leal,” para quem os regulamen- tos presidenciais de execuede, previstos no art. 74, a, da Carta de 1937, no necessitavam de cléusule legislativa especial autorizadora, entatizando que es tes regulamentos estavam integralmente subordinados a respectiva lei, n&o po- dendo contrariar os seus dispositivos. Entretanto, ele entendia que essa veritice: 80 de legalidade néo podie ser to rigorosa relativemente aos regulamentos, Cuja expedicao era autorizada ou delegada por disposicao da propria le, jé que ’0 julgamenio da legalidade dos regulamentos désse tipo depende essencial- mente do alcance dos térmos da autorizagéo. (..) Se a autorizagao contida na lei mais ampla, deixando certa margem de arbitrio ou discrigao 20 poder executi- vo, © exame da legalidade do regulamento expedido nessa conformidade tera de ser mais benevolente, “2” 9. E, apesar do fato de @ Carta de 1988 no conter um permissivo expll- cito correspondente ao art. 12 da Lei Meior de 1937, é de ressallar que o texto da alual Conslituigao brasileira néo repetiva proibigao de delegagao entre os Pode- res, que ainds constava das Cartas de 1967/69 (art 6, pardgrafo Unico), de 1946 (ar. 36, § 28) e de 1934 (art. 3°, § 12), faio que levou Siqueira Castro & alitmagao de que “o postulado da intransteribilidacle das competéncias orgénicas, além de formal mente jé suprimido do sistema constitucional patio, foi alvo através dos tempos e tipica mutago constitucional (..), na medida em que a trajetGria de tal postu: lado ‘em nossa evolugao poltico-institucional retrata sua acomodagao s novas ‘mentalidades da cultura poliica e juridica emergentes no apés-querra neste sé. culo findante,"2* 2 Gustavo Binenbojm, op. cit, pp. 134 e 187 a 6s., com reteréncla a Carlos M, da S. Velloso, Do poder regulamentar. In: Temas’ de direito pubico, 1997, p. 445, s Assim, sinda, Hely L. Meielles, Direto eeliristrativo brasileiro, 1989, p. 108. ts Ainda que datem de 1945, época da vigéncie da Conelluigfo autoriéria do Estado Novo brasileiro, ideologia & que 0 eminente jurisia noteriamante sempre se opunha com veeméncia, 7 V. Nunes Leal, Problemas de areito publico e outtas problemas, v. 1, 1997, p. 80 ¢ ss. es Carlos R, de Siquelra Castro, A Constivicéo aberta e os direitos fundamentais, 2003, p. 206. 00 10. Ao contrério da situagao brasileira, onde néohé necessidade damen- 90 especifica aos limites matérias de possiveis atos normativos reguiamentares No respectivo texto legal, a Lei Fundamental alema, no seu art. 80, n? 1, reza: ‘0 Governo Federal, um Ministro Federal ou os governos estaduais poderfio ser autorizados por lei a promulgarem decretos. A lei determinara conteddo, objetivo ® extensdo da aulorizagao outorgada. O decreto deverd indicar 0 dispositive le gal que o fundamenta, Se a lei previr a possibilidade de se subdelegar essa au- lorizagao, a subdelegacao deverd ser efetuada por decreto. Destarte, o sistema juridico alemao aceita a formulacdo de exigéncias técnicas fora dos conceitos indeterminados do texto das leis formais somente quando ha uma referéncia legal expressa e bem definida as normas do Executi- vo, também como consequéncia das decisbes do BVeriG, que estabeleceu a chamada “exigéncia de determinacao" (Bestimmtheitsgebot) ern relagao as leis parlamentares, que devem fixar 0 contetido, o objetivo e a abrangéncia da res- Pectiva delegacéo aos governos ou érgaos administrativos.* 11, Nesse contexto, Ossenbthi destaca que as constituigbes dos moder- nos Estados democraticos costumam abrir ao legislador o caminho da transfe- réncia parcial do poder normativo ao Poder Execulivo, que exerce esta compe- tencia legislative através da edigéo de decretos, os quais so, como fontes ju dicas derivadas, expresséo de uma produgao legislativa delegada, de uma des- concentraco da legislacao. Como regulamentos estatais gerais e abstratos dos 6rgos de Governo e da Administragao, eles representam — igualmente as leis. formais — fontes juridicas, das quais emane o Direito universalmente vinculativo, tanto para o cidadao quanto para o administrador ¢ 0 juiz 2% V.5. A importancia do principio da “reserva da lei” formale material 1. Segundo o principio da "reserve da lei" (Vorbehalt des Gesetzes), co- rolério dos principios democratico e da legalidade, atos estatais capazes de ale- tar diretamente os direitos dos individuos devem encontrar a sua base numa lei Origem histérica deste principio, a partir do século XVI, era a exigéncia da bur- guesia ascendente de que qualquer medida executiva do monarca, que atingia a sua liberdade e propriedade, devia ter 1undamentagao numa decisao do Parla- mento." No contexto do moderne Estado Democratico de Direito, a teoria da reserva da lel ainda ganhou relevancia maior, sendo hoje quase unanimidade na doutrina dos paises ocidentais que a regulamentagao dos assuntos sensiveis em 229 Fritz Ossenb0hl, Rechisquellen und Rechisbincungen der Verwaltung. In: H.-U. Erichsen e D. Ehlers, Allgemeines Verwaltungerechi, 2002, p. 149: Hans vl. Woll, Otto Bachol e Rolf Slober, Verwatungsrech!— Bd. 1, 1999, § 25, Rr. 32. 420 Fitz Ossenb0hi, op. cit, p. 147 11 J.J. Gomes Canotilho, Dirito constitucianal e feoria da Constuip&o, 1997. p. 696 e ss. RDE | Revista de Direito do Estado Ano 2 n®5:341-395 janimar 2007 391 relagéo aos direitos fundamentais, em principio, deve ser reservada aos repre- sentantes diretamente escolhidos pelo povo, em virtude de sua maior legitima- 20 democrética. Em outras palavras: a reserva da lei formal é sobretudo aplica- vel a medidas que causem restrigoes as posigdes jusfundamentais das pes: soas 2.Na Alemanha pés-guerra, 0 BVerfG desenvolveu a “teoria da essencia- lidade" (Wesentlichkeitstheorie), que representa uma interpretac&o reforcada e, ‘20 mesmo tempo, afinada do principio de reserva da lel formal: derivada do prin- cipio democratico, ela exige uma reserva parlamentar para todas as decisées estatais consideradas “essenciais". A definigao deste conceito é determinada Pela questo de se esté sendo atingida, de forma mais ou menos inlensiva, a esfera de vide dos cidadaos protegida pelos direitos fundamentais.°° Entretan- to, a dificuldade sempre parece ser responder racional e objetivamente a per- gunta: quais assuntos so tao importantes que precisam ser regulamentados pelo proprio Parlamento, 3. Em 1985, Ataliba, apesar de enfatizar que a Constituigéio do Brasil, em principio, no tolerava “que 0 Executive exerca qualquer tipo de competéncia normative inaugural, nem mesmo em matéria administrativa", resseltou que “como fulcro de tudo — peda de toque do sistema, chave de abébada de toda 8 construgao normativa — sempre esté a liberdade humana, como direlto funda- mental do homem e do cidadé (...)". Em relagao a atribuigéio do Presidente da Republica de requlamentar a execugao das leis federais, ele entendia que a re- dago constitucional deste poder “patenteia, evidencia e explicita a visceral su- bordinagao do regulamento a lei", cujo “objetivo precipuo — conatural &s con- quistas politicas que se consubstanciam no Estado moderno — é precisamente. © de impedir que o Executive possa estabelecer, por ato seu, restricoes a liber- dade e a propriedade dos individuos’.2 4. Afirmou Pontes de Miranda, ha meio século, que “os nossos tempos reclamam a lei que dé direitos, ¢ n&o 80 a lei que se limite com éles, — a lei que seja avango do Estado, ndo 86 @ lei que 0 Estado faz dentro do que se Ihe per- ‘282 C1, Gustavo Binenboj, Uma teoria do dteto acminisvatno: Diretos fundamentais, demacracia € constitucionallzago, 2006, p. 150, +32 Nas decisoes: BVerIGE nf 58, pp. 257, 268 ¢ ss. (expulséo de classe na escola} 1? 48, p: 89, 126 € ss. (veator nuclear de Kalkar}:r? 40, p, 237, 249 (procedimento de protegae na exeeugac onal) rf 33, p. 125, 158 e ss. (médico especializada); vide Georg Nolte, Ermachligung der Exelutive 2ur Rechtsetzung: Lehven aus der deutschen und der amekanischen Eriatwung, Archi des otfentichen Rechts, Bd. 118-3, 1903, p, 400. z Geraldo Alsliba, Republica e Constiviczo, 2004, p. 133 e ss.. ctando Celso A. Bandeita de Mello (Feviste de Diretto Pubiico, r? 52-54, p. 44) O aulee chega a alegar que “o regime juricico dos decretos reguiementares 86 pode ser dessumido da Consiitulgao. Todas as contribvigdes do ircto compared sto inserviveis [si], porque essa competéncia em cade Estado & reguieda de lum modo; em cada contexlo tem uma dimenséo. A civulgagéo inedvertida que equi se tem felto da douttine estrangeira 56 tem contibulde para baralhar os espittos e fementat os abuses, excess0s € arbivariedades do Eslado” (op. oft. p. 187) 02 mite, @ lei que dé © no s6 @ que pede ou que retira’ ° Nessa linha, alega Grau que o principio de legalidade, em sentido formel, somente deve ter aplicacéo aos casos que envolvem “uma situagao subjetiva do particular, sobre @ quel tenha incidencia um efeito de extingao ou limitagaio", e nao "no caso da atividade de programagao do Estado de oultos entes publicos, que néo se exprimem em atos autoritarios” ® Para Mendes, o principio da reserva legal no permite “au- torizagées legislativas puras ou incondicionadas, de nitido e inconfuncivel caré- ter renunciativo", que adotem “cléusulas de conteudo abdicatorio ou demissé- fio"; ao mesmo tempo, informa que a doutrina dominante e o STF entendem legi timas as autorizagdes fundadas no enunciado da lel formal, de que “constassem 08 standards, isto ¢, 0s principios juridicos inerentes & espécie legislativa’ =” 5. Nos EUA, é comum a aprovagao de leis que utiizam termos amplos € gerais e deixam a tarefa de sua suplementagdo a regulamentos baixados pelo Govern (standards ou legislation of skeleton type). Como elas podem repre- sentar também uma forma de delegagao distarcada, o Judicidrio norte-america- 1 exige que 0 Legislativo estabelega “standards suficientemente quiadoras da aco executive’. Nos anos 80, 0 vustice Rehnquist reafirmou a validade do prinefpio da proibigao de delegagac legislativa para assuntos que ja foram dis- cutidos no proceso legislativo, mas cuja solugao ficou em aberto. Nesta hipéte- se, auténticos problemas de polltca legislativa nao poderiam ser repassados Administragao, visto que o sentido da proibigao de delegagao jazia justamente na obrigagao de o legislador parlamentar efetuar as “escolhas importantes de politica social’, tendo em vista a sua responsabilidade perante a vontade popu- lar. Entretanto, 2 Suprema Corte voltou @ permitir delegacdes legislativas abran- gentes ao Exeoutivo, reconhecendo-as como “inevitéveis", em face da crescente complexidade da sociedade moderna; esta atitude funcional encontra guerida na sua propria political question doctrine, segunda a qual deve ser evitado 0 exercicio de controle judicial no ambito de assuntos genuinamente "politicos" 2 6. No caso da formagao, contratagéo ¢ do controle de consércios publi- 0s, no ha tangéncia imediata de direitos fundamentals individuais ou coletivos da populagéo. Trate-se de uma questao de desenho institucional, que objetiva faciltar a cooperacéo entre os entes federados. E, ainda que o émbito da organi- F.C. Pontes de Miranda, Comentarios & Consttuigso de 1946, 1, 1963, p. 962 (cesteques ro original). 220 E10s A. Grau, O dretio posto e 0 cireto pressuposto, 2003, p. 174, com reteréncia a Tércio Sampaio Ferrez Jr, A telacd0 meiafim na Teoria geral do dreio adminisiraivo, Revista de Direto Piblco, n° 61, 1982, p. 27 ‘2 Gilmar F, Mendes, Quosi6es fundamentals de técnica legislative, Revista Thmestral de Dreto PPoblco, n° 1/1993, p. 263; 0 autor relete-se aos seguintes juigados do STF: MS 17.145 — Re! Min. Gongalves de Oliveira (RTJ 50/572) e RE 76,729 — Fee, Min. Alomar Baleeiro (RTS 71/477). 28 Cl. Charles Pessanha, © Poder Execulivo eo processo legislativo nas Consltulooes brasletae leoriae prétice. In: L. Werneck Vianna, A democracia @ os irés paderes no Bras 2003, p. 182. 49 Cl. Georg Nolte, op. ct, p. 387 © g8.; nesta linha permissive, a Sugreme Count, em 1963, até invelidou 0 “velo leglsiatvo" contra delegacdes normativas ao Executive, DE | Revista de Direlto do Estado Ano2.n?S:341-995 jen/mer 2007 za¢80 administraliva no esteja excluldo da viruléncia do principio da reserva da 'ei formal,2* 6 precigo atribuir-ine um tratamiento diferenciado, uma *tedefinig&o dos seus dominios", que permita a normatizagao de uma parte do assunto por ato executive (“reserva da lei material’). O cidadéo, neste caso, nao solre uma redugao nos seus direitos, mas sera 0 beneficiado do aumento da eficiéncia na Prestaco conjunta dos servicos publicos mediante consércios. Neste sentido, 0 Gecreto néo tem a finalidade de substituira lei formal," mas apenas de desone- ré-la de detalhes téonico-espectiicos. O poder regulamentar do Executive é, por- tanto, no epenas legitimo, mas indispensavel e ndo leva a uma perda de poder do Parlamento, mas, ao contrério, o restitui a sua genuina fungéio de tomer as verdadeiras decisbes politicas norteadoras para a sociedade. VI. Conclusées: respostas aos quesitos. Na base da andlise juridica acima reelizada, passo a responder aos cin- 0 quesitos formulados na presente consulta: 1. Sim. O préprio conceito das normas gerais, tanto nas dreas teméticas das competéncias legislativas concorrentes (art. 24, CF) quanto nas competén- Cias privativas tederais (art. 22, CF), nfo impede que a Uniao também edite regu lamentos para a execugao das respectivas leis. Negar a possibilidade da exis- (éncia de um decreto regulamentar de lei federal sobre normas gerais significa contundir os limites das competéncias normativas federativas nos niveis vertical @ horizontal. Se os dispositivos de uma lei da Unio néo ultrapassam as balizas Ge normas ou diretrizes gerais, por cuidar de aspectos que exigem tratamento Nacional homogéneo e uniformizado, sem que peculiaridades regionais e locais {ustifiquem uma normatizagéio descentralizada (regional e/ou local), o respectivo Gecreto regulamentar € capaz de cumprir as mesmas condicées. Uma norma juridica, s6 pelo fato de ter sido editada pelo Executivo (e no pelo Legislativo), nao perde, auiomaticamente, a sua aptidéo de ser também uma norma geral, Porém dotada de um contecido material mais denso. 2. Os dispositivos do Decreto regulamentar a Lei n? 11.107/05 devem ser observados tanto por parte da Adminisiragaio da Unido quanto dos orgdios este- Guais ou municipais. Nao se sustenta a afirmagao de que normas executives re. gulamentares de leis federais néo possam se dirigir também aos niveis governa- mentais inferiores. A teorie das leis nacionais néo encontra respaldo no sistema das competéncias federativas estabelecido pela Carta de 1988 e tampouco con- \ribui para esclarecer a questao da aplicagao obrigatéria do Decreto em andlise, 140 J.J. Gomes Cenoitho, Ditto constiucionel e tecria da Consituigfo, 1997, p. 640. 2 Cl Clarissa S. Siva, Legalidade e regulagéo, 20 Paes, 22 Sobre o fendmeno da atual “crise da lei formal’, vie Paticia Baptista, Transformapées do Sirello administrative, 2003, p. 98 ¢ ss. 20 Fitz Ossenbohl, Rechisquellen und Rechtsbindungen der Verwallung, In: H-U. Erichsen e D. Enlets, Allgemeines Verwaltungsrech, 2002, p. 147. 304

Você também pode gostar