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A BOA GENTE

por Alessandro de Paula


A boa gente pega um bronzeado sob o sol do paraso original,
aquele do qual voc foi banido muito antes de nascer.
A boa gente faz banquete, piquenique e bacanal, como voc pode ver na
tev.
A boa gente faz muito dinheiro, em dlar, euro e impostos coletados s por
voc existir.
A boa gente est com o sorriso em dia e voc no tem mais dentes pra
sorrir.
A boa gente est viajando,
comendo, fodendo e fazendo selfies em estaes de esqui nos Alpes suos.
A boa gente est fazendo cara de paisagem e aumenta seus dramas e
salrios,
mas nunca dorme numa cama de pregos como o resto,
os comedores de restos.
A boa gente excitada esfrega seus genitais potentes
na sua cara de pobre demente,
e considera seu nobre mijo, merda e gozo a definitiva soluo
para os problemas de uma gente cada vez menos gente.
A boa gente o abuso,
o sangue que escorre entre as pernas
da menina estuprada e viciada em crack.
A boa gente crocodilo.
A boa gente o absurdo kafkiano,
so os senhores do castelo que no querem receber voc.
A boa gente vai aos teatros de elite
e chora com o drama do garoto Montecchio e da menina Capuleto,
sem se importar em sufocar o moleque favelado com m educao
ou se seus pais morrem em corredores de hospitais
ou em sangrentas vendetas policiais.
A boa gente constri shoppings e frequenta restaurantes da moda,
enquanto voc acha foda o vestido da madame,
o terno importado do senhor.
Ento voc passa ali na frente e vo reclamar do seu odor:
Quelle horreur!
Depois eles iro correr atrs, dizendo que voc tem de colaborar.
Acontece de vez em quando mais ou menos de dois em dois anos ,
voc precisa confiar, tudo isto vai mudar, no vo mais esporrar na sua
cara,
nunca mais...
E voc, igual a um cordeirinho, aceita a ajudinha parca e o falso carinho
e diz o doutor vai consertar.
A boa gente est na sombra, protegida do sol forte do inferno que criou,
aquele ao qual voc foi condenado muito antes de nascer.

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