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Jacques Derrida - "Pensar em No Ver"

"Porm, primeira dificuldade, primeira aporia, se os senhores quiserem: se isso


que vem, em nossa direo, se isso deve constituir um acontecimento, no devemos
v-lo vir. Um acontecimento o que vem; a vinda do outro como acontecimento s
um acontecimento digno desse nome, isto , um acontecimento disruptivo,
inaugural, singular, na medida em que precisamente no o vemos vir. Um
acontecimento que antecipamos, que vemos vir, que pr-vemos, no um
acontecimento: em todo caso, um acontecimento cuja acontecimentalidade
neutralizada, precisamente, amortecida, detida pela antecipao. A experincia, e
voltarei equivocidade desse conceito de experincia de que tanto se falou esta
manh, a experincia do acontecimento uma experincia passiva, rumo qual, e
eu diria contra a qual, acontece o que no se v vir, e que de sada totalmente
imprevisvel, no pode ser predito; prprio do conceito de acontecimento que ele
venha sobre ns de maneira absolutamente surpreendente, inesperadamente. Se os
olhos so o que so para ns, tal como se dispesm em nossos rostos, digo nossos
rostos, os rostos humanos (pois nem todos os olhos esto e veem frente, h
animais cujos olhos lhes permitem ver de lado e atrs, mas nossos olhos veem
frente e tm o que chamamos de horizonte), o acontecimento sempre corre o risco
de ser em certa medida neutralizado; vemos vir as coisas desde o fundo do
horizonte. Assim que h ou na medida em que h um horizonte sobre cujo fundo
vemos vir alguma coisa, nada vem, nada vem que merea o nome de
acontecimento; o que vem na horizontal, isto , o que nos faz face e vem em nossa
direo avanando ali onde o vemos vir, isso no acontece. Isso no acontece no
sentido forte e estrito do advento do que vem, seja alguma coisa ou algum, o que
ou quem, o que ou quem em "isto vem". No devemos v-lo vir, e, portanto, o
acontecimento no tem horizonte; s h acontecimento ali onde h horizonte."

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