"Porm, primeira dificuldade, primeira aporia, se os senhores quiserem: se isso
que vem, em nossa direo, se isso deve constituir um acontecimento, no devemos v-lo vir. Um acontecimento o que vem; a vinda do outro como acontecimento s um acontecimento digno desse nome, isto , um acontecimento disruptivo, inaugural, singular, na medida em que precisamente no o vemos vir. Um acontecimento que antecipamos, que vemos vir, que pr-vemos, no um acontecimento: em todo caso, um acontecimento cuja acontecimentalidade neutralizada, precisamente, amortecida, detida pela antecipao. A experincia, e voltarei equivocidade desse conceito de experincia de que tanto se falou esta manh, a experincia do acontecimento uma experincia passiva, rumo qual, e eu diria contra a qual, acontece o que no se v vir, e que de sada totalmente imprevisvel, no pode ser predito; prprio do conceito de acontecimento que ele venha sobre ns de maneira absolutamente surpreendente, inesperadamente. Se os olhos so o que so para ns, tal como se dispesm em nossos rostos, digo nossos rostos, os rostos humanos (pois nem todos os olhos esto e veem frente, h animais cujos olhos lhes permitem ver de lado e atrs, mas nossos olhos veem frente e tm o que chamamos de horizonte), o acontecimento sempre corre o risco de ser em certa medida neutralizado; vemos vir as coisas desde o fundo do horizonte. Assim que h ou na medida em que h um horizonte sobre cujo fundo vemos vir alguma coisa, nada vem, nada vem que merea o nome de acontecimento; o que vem na horizontal, isto , o que nos faz face e vem em nossa direo avanando ali onde o vemos vir, isso no acontece. Isso no acontece no sentido forte e estrito do advento do que vem, seja alguma coisa ou algum, o que ou quem, o que ou quem em "isto vem". No devemos v-lo vir, e, portanto, o acontecimento no tem horizonte; s h acontecimento ali onde h horizonte."