Você está na página 1de 84

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS VIII


LICENCIATURA PLENA EM PEDAGOGIA
HABILITAÇÃO EM GESTÃO E DOCÊNCIA DE PROJETOS EDUCATIVOS

ECOLOGIA HUMANA: PERCEPÇÃO E SABERES


AMBIENTAIS DOS QUEBRADORES DE PEDRAS
DO RIO DO SAL.

FRANCISCO ALVES DOS SANTOS

Paulo Afonso – BA

fev/2010
1

FRANCISCO ALVES DOS SANTOS

ECOLOGIA HUMANA: PERCEPÇÃO E SABERES


AMBIENTAIS DOS QUEBRADORES DE PEDRAS
DO RIO DO SAL.

Monografia apresentada ao curso de Licenciatura em


Pedagogia: Habilitação em Gestão e Docência de
Projetos Educativos da Universidade do Estado da
Bahia – UNEB Campus VIII. Paulo Afonso - BA.
como requisito para obtenção do título de
Graduação.

Orientador: Prof. Aldo Carvalho da Silva

Paulo Afonso – BA

Fev/2010
Márcia Maria Feitosa Ferraz moura - CRB/BA - 1609

S235e SANTOS, Francisco Alves dos.


Ecologia humana: percepção e saberes ambientais dos
quebradores de pedras do Rio do Sal.
/Francisco Alves dos Santos.
Paulo Afonso - BA: 2010. 82f.
Orientador: Aldo Carvalho da Silva.
Monografia (Graduação) - Universidade do Estado da
Bahia - UNEB. Curso: Pedagogia com Habilitação em Gestão
e Docência de Projetos Educativos.

1. Ecologia Humana 2. Percepção Ambiental


3. Quebradores de Pedra I. Título

CDD – 363.7
2

FRANCISCO ALVES DOS SANTOS

ECOLOGIA HUMANA: PERCEPÇÃO E SABERES


AMBIENTAIS DOS QUEBRADORES DE PEDRAS
DO RIO DO SAL.

Monografia submetida à banca examinadora composta por docentes da Universidade do


Estado da Bahia – UNEB, como parte dos requisitos necessários para obtenção do título de
Licenciado em Pedagogia com Habilitação em Gestão e Docência de Projetos Educativos.

Data de aprovação: 27/02/2010

Banca Examinadora:

________________________________
Prof. Esp. Aldo Carvalho da Silva
(Orientador)

________________________________
Prof. Esp. Eloi Lago Nascimento
(Professor da Disciplina)

________________________________
Prof. Dra. Cleonice Vergne
(Convidada)
3

Dedico a minha esposa Andréa Patrícia, eterna


companheira e apoiadora de todas as horas, Exemplo de
excelência, perseverança e sabedoria... “[...] um rio que
passou na minha vida, e meu coração se deixou levar.”
4

AGRADECIMENTOS

A realização deste Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) tornou-se possível graças à


colaboração e apoio de diversas pessoas, às quais sou extremamente grato. Agradeço:

As minhas excelentes professoras Dra. Maria Eliete Santiago da UFPE e Iêda Balog da
UNEB, pelos seus ensinamentos sobre a Metodologia da Pesquisa Científica, e outros
conhecimentos afins e indispensáveis para a realização deste TCC.

Ao primoroso Professor Eloi Lago Nascimento pelas suas correções, consultorias e


disponibilidade de atender às demandas da produção deste TCC.

À extraordinária Professora Dra. Cleonice Vergne, pelo aprendizado da arte que me


levou a este TCC, com seu grande saber da arqueologia e da formação da consciência
crítica da história, sem jamais perder a ternura e elegância que lhe é peculiar.

Ao meu orientador o formidável Professor Aldo Carvalho da Silva pela sua amizade que
me rendeu muitos saberes na longa jornada da vida, e pela sua ajuda nos conhecimentos
pertinentes que contribuíram de forma inequívoca e substancial ao desenvolvimento
deste estudo desde sua gênesis.

Ao respeitável Professor Dr. Juracy Marques por ter lançado o desafio de estudar a
realidade das pessoas que habitam o Complexo Arqueológico de Paulo Afonso, e
também pela sua colaboração no aporte de conteúdos que compões este trabalho.

Aos meus colegas de turma, por me propiciar momentos de longos debates e trocas de
sabres e descontração dentro ou fora da sala de aula.

Ao amigo de fé Jackson Santos e a minha grande amiga Bárbara Soraya dos Santos pela
significativa companhia na pesquisa de campo, sem a qual ajuda nem todos os
significados expostos aqui eu teria revelado.

Especialmente, aos Quebradores de Pedras do Rio do Sal, sobretudo aos mais vividos,
que aqui humildemente represento na alma deste texto, pessoas maravilhosas cuja
dignidade e história de vida valorizam o meu trabalho de pesquisador. Tiraram de mim
algumas lágrimas quando me senti impotente de não contribuir muito mais com as suas
causas, mas nunca foi pela piedade, pois dela esses preciosos homens nunca precisaram,
mas sim por terem me feito acender tantas luzes com seus testemunhos e suas
sabedorias, estas que compulsoriamente me atirarem diante do significado de
humanidade.
5

“Cada geração desenha seu perfil e seu


entorno. Cada geração inventa sua identidade
e circunstâncias. Cada geração escava seu
rosto e sua paisagem. Somos tão responsáveis
pelo olhar que contempla como pelo
panorama contemplado”.

(Luiz Fernandes Galino)


6

SANTOS, Francisco Alves dos. ECOLOGIA HUMANA: PERCEPÇÃO E SABERES


AMBIENTAIS DOS QUEBRADORES DE PEDRAS DO RIO DO SAL. 2010. 82p.
Monografia (Licenciatura em Pedagogia: Habilitação em Gestão e Docência de Projetos
Educativos) Universidade do Estado da Bahia – UNEB Campus VIII. Paulo Afonso. BA.

RESUMO

Os estudos sobre a percepção ambiental vêm ganhando cada vez mais ênfase nos meios
acadêmicos, sobretudo nas pesquisas ambientais realizadas pelos eco-pedagogos na busca de
significados, valores, atitudes, sentimentos e experiências dos indivíduos com o seu meio.
Com efeito, As teorias da complexidade, do holismo, ecologia humana, ecopedagogia, etc.,
fundamentam a inter-relação do meio ambiente natural, a sociedade e a subjetividade humana.
Nesta perspectiva, buscou-se neste TCC analisar a percepção ambiental e os saberes
ambientais dos Quebradores de Pedras do Rio do Sal e as problemáticas ambientais das áreas
de convívio situadas no Complexo Arqueológico de Paulo Afonso. A pesquisa utilizou-se da
abordagem fenomenológica, por meio de levantamentos bibliográficos, entrevistas, registros
fotográficos e observações, conforme estabelecido pela mais atualizada metodologia da
pesquisa qualitativa. Os dados levantados mostram que os sujeitos têm baixíssima
escolaridade; que são remanescentes de famílias tradicionais que habitam a região há quase
dois séculos; e, deixaram as suas atividades econômicas agropastoris e de pesca para
atenderem à demanda da lavra de pedras que alimentaram o desenvolvimento econômico da
região baseada no parque industrial de geração de energia elétrica cuja atividade foi
embargada para proteger as pinturas rupestres. As análises concluíram que os Quebradores de
Pedras detêm significativos saberes ambientais e grande potencial de desenvolverem
atividades sustentáveis a nível local, Os resultados encontrados são de fundamental
importância, pois servem como base para as intervenções necessárias tanto para a
ecopedagogia quanto para uma gestão ambiental participativa e eficaz, observando as nuances
da realidade das pessoas com seu meio.

Palavras-chave: Ecologia Humana; Percepção Ambiental; e, Quebrador de Pedra.


7

SANTOS, Francisco Alves dos. HUMAN ECOLOGY: ENVIRONMENTAL


PERCEPTION AND KNOWLEDGE OF STONEMASON SAL RIVER. 2010. 82p.
Monograph (Degree in Education: Specialization in Management and Teaching Education
Project) University of Bahia – UNEB Campus VIII. Paulo Afonso - BA.

ABSTRACT

Studies of environmental perception, are gaining more and more emphasis on academics,
especially in environmental research carried out by eco-educators in search of meanings,
values, attitudes, feelings and experiences of individuals with their environment. Indeed,
theories of complexity, holism, human ecology, eco pedagogy, etc., underlying the inter-
relationship of the natural environment, society and human subjectivity. Accordingly, we
sought to examine the TCC in environmental awareness and knowledge of environmental
Smasher Rio do Sal and the environmental problems of living areas located in the Paulo
Afonso Archaeological Complex. The research used a phenomenological approach, by means
of literature surveys, interviews, photographic records and observations, as established by the
most current methodology of qualitative research. The data collected show that the subjects
have very low education, that are reminiscent of traditional families that live in the nearly two
centuries, and left their economic activities, grazing and fishing to meet the demand of the
mined stones that have fueled economic development region-based industrial park to generate
electricity which activity was enjoined to protect the paintings. The analysis concluded that
the stonemason has significant environmental knowledge and great potential to develop
sustainable activities at local level, The results are of fundamental importance because they
serve as the basis for the necessary interventions for both pedagogy and for environmental
management and participatory effective, observing the nuances of the reality of people with
their environment.

Keywords: Human Ecology, Environmental Perception, and Stonemason.


8

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Fotografias e figuras

Figura 1: Esquema Dimensões de Meio Ambiente ............................................................ 18


Figura 2: Esquema teórico do processo perceptivo ........................................................... 27
Figura 3: Esquema da percepção ambiental ................................................................... 28
Figura 4: Área do Complexo Arqueológico de Paulo Afonso............................................. 33
Figura 5: Vale do Rio do Sal com vista para o povoado ................................................... 34
Figura 6: “Mares de pedra” – Margem direita do Rio do Sal ............................................. 34
Figura 7: Quebrador de pedras junto a um amontoado de rachões .................................... 35
Figura 8: Sítio 98 – figura antropomorfa .......................................................................... 36
Figura 9: Pintura rupestre com ponteiro de aço encravado.................................................36
Figura 10: Quebrador de pedras trabalhando ....................................................................40
Figura 11: Pilha de paralelepípedos ....................................................................................40
Figura 12: Linha do Tempo da pesquisa (coleta de dados) ........................................... 50
Figura 13: Simulação de pintura rupestre perdida ......................................................... 63
Figura 14: Pedra do lenço – Sítio 86 ............................................................................... 63
Figura 15: Pirâmide de Maslow ................................................................................................... 65
9

LISTA DE TABELAS e GRÁFICOS

Tabela 1: Caracterização dos paradigmas da pesquisa .............................................................. 48


Gráfico 1: Escolaridade dos quebradores de pedras do Rio do Sal ...................................... 58
Gráfico 2: Quebradores que afirmam ter trabalhado com pedras pintadas .......................... 69
Gráfico 3: Evolução do reconhecimento do valor histórico das pedras pintadas ................. 72
Gráfico 4: Percepção de danos ambiental em função da atividade .................................... 73
Gráfico 6: Quebradores com partes do corpo afetadas pelos acidentes .............................................. 76
10

LISTA DE SÍMBOLOS, NOMENCLATURAS E ABREVIAÇÕES

AGENDHA = Assessoria e Gestão em Estudos da Natureza Desenvolvimento Humano e


Agroecologia.

CAAPA = Centro de Arqueologia e Antropologia de Paulo Afonso.

CHESF = Companhia Hidroelétrica do São Francisco.

DMA = “Departamento de Meio Ambiente” do Município de Paulo Afonso.

EA = Educação Ambiental.

ONU = Organização das Nações Unidas.

TCC = Trabalho de Conclusão de Curso.

UFPE = Universidade Federal de Pernambuco.

UNEB = Universidade do Estado da Bahia.

UNESCO = Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura


11

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................... 13

2 ECOLOGIA E MEIO AMBIENTE .......................................................... 18


2.1 DA ECOLOGIA À TEIA DA VIDA 18
2.2 A QUESTÃO AMBIENTAL 19
2.3 A CRISE SÓCIO-AMBIENTAL 21
2.4 A SUBJETIVIDADE EM MEIO À CRISE AMBIENTAL 23
2.5 O VALOR SÓCIO-AMBIENTAL 24
2.6 A ÉTICA E A CIDADANIA AMBIENTAL 25
2.7 O TRABALHO E O MEIO AMBIENTE 25
2.8 A PERCEPÇÃO AMBIENTAL 26

3 A INTERVENÇÃO ECOPEDAGÓGICA ............................................... 29


3.1 A EDUCAÇÃO AMBIENTAL 29
3.2 A ECOPEDAGOGIA CRÍTICA 31

4 CONTEXTO HISTÓRICO/GEOGRÁFICO E HUMANO ................... 33


4.1 CARACTERIZAÇÃO DO ESPAÇO GEOGRÁFICO 33
4.2 O SENTIDO DA PRÉ-HISTÓRIA NO CONTEXTO 36
4.3 GEOGRAFIA CULTURAL E SABERES AMBIENTAIS 38
4.4 O OFÍCIO DE QUEBRADOR DE PEDRAS 40
4.5 AS TEORIAS DA COMPLEXIDADE 43
4.5.1 Do monismo ontológico à razão dialética ....................................................... 43
4.5.2 A Visão Sistêmica, o Holismo e a Complexidade ........................................... 45

5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS............................................. 47
5.1 SOBRE A DELIMITAÇÃO DA ÁREA PESQUISADA 47
5.2 SOBRE A CARACTERIZAÇÃO DO OBJETO DE PESQUISA 47
5.3 SOBRE A CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA QUALITATIVA 48
12

5.3.1 Paradigma de Pesquisa Qualitativa ................................................................ 48


5.3.2 Pesquisa etnográfica ......................................................................................... 49
5.4 SOBRE O CARÁTER DE ESTUDO EXPLORATÓRIO 50
5.5 SOBRE AS TÉCNICAS PARA A COLETA DOS DADOS 50
5.5.1 Do Questionário ................................................................................................ 51
5.5.2 Da Entrevista .................................................................................................... 51
5.5.3 Da identidade dos entrevistados ...................................................................... 51
5.5.4 Da observação ................................................................................................... 51
5.6 SOBRE A PESQUISA BIBLIOGRÁFICA 52
5.7 SOBRE A ANÁLISE DOCUMENTAL E DE CONTEÚDO 53
5.8 SOBRE OS CRITÉRIOS DE QUALIDADE DA PESQUISA 54
5.9 SOBRE A CARACTERIZAÇÃO DO ESTUDO DE CASO 55
5.10 SOBRE OS RECURSOS INSTRUMENTAIS 56

6 ANÁLISE DOS RESULTADOS ............................................................... 57


6.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS E DADOS EDUCACIONAIS 57
6.2 A INFLUÊNCIA DOS SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS 59
6.3 OS FATORES AMBIENTAIS 61
6.4 O SENTIDO DA PERCEPÇÃO AMBIENTAL 65
6.5 EFEITOS SÓCIO-ECONÔMICO-AMBIENTAIS 67
6.6 O VALOR AMBIENTAL/PATRIMONIAL 68
6.7 A MEDIDA DA INTERVENÇÃO ECOPEDAGÓGICA 72
6.8 A SITUAÇÃO ATUAL 74

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................... 77

8 REFERÊNCIAS .......................................................................................... 78
13

1 INTRODUÇÃO

Duas grandes questões inquietaram a humanidade desde que os seres humanos tomaram
consciência da própria existência: A primeira delas se refere à fantástica máquina do Ente
vivente, conexo a uma lógica de sobrevivência natural, perfeitamente adaptado ao mundo
existente sensível, e indissociavelmente integrado a todos os fenômenos cósmicos; e a
segunda alude ao imenso abismo que habita a alma do Ser transcendente, desconexo, ilógico e
metafísico, desgarrado num mundo existencial intangível, uno e desintegrado no Ser em si, tal
alma que é a morada de todos os saberes e que ao mesmo tempo, paradoxalmente, faz-se
incognoscível.

Estas duas grandes questões da humanidade que confrontam o holismo1 ecológico e o


monismo ontológico2 estão no cerne deste trabalho monográfico, por um lado enquanto nos
deparamos com uma questão ambiental resultante das ações antrópicas de uma população que
ficou conhecida mundialmente como “Quebradores de Pedras do Complexo Arqueológico de
Paulo Afonso”. A referida questão ambiental advêm das demandas pela sobrevivência
objetiva das pessoas em uma relação predatória do meio ambiente, e por outro lado enquanto,
este mesmo espaço guarda um tesouro, este que é um patrimônio de arte rupestre e
conseguinte testemunho incomensurável da construção e desenvolvimento do espírito
humano, elevado ao status de herança histórica da humanidade, e que grava em suas linhas a
alma de um povo primitivo ainda muito pouco estudado, cujo destino se encontra hoje sob as
demandas de uma nova comunidade que aparentemente julga, pondera e decide sob a sua total

1
Holismo (grego holos, todo) “A abordagem holística pode ser definida de maneira aproximada como aquela
que considera as infinitas interações entre os diversos componentes de um sistema complexo. Alguns autores
têm chamado esta visão do funcionamento das coisas do Universo como abordagem sistêmica. As áreas em que
esta abordagem pode ser aplicada variam desde a astrofísica até a gestão de negócios, mas uma área onde o
holismo é particularmente útil é a ciência da natureza. A natureza pode ser considerada como um sistema
complexo e para que o homem entenda os processos que regem sua dinâmica é necessário abordá-la com uma
visão multifocal. (...) a abordagem holística pode facilitar de maneira significativa o entendimento dos processos
ambientais. O não entendimento de todos os fatores que afetam a dinâmica de um sistema complexo pode levar a
conclusões errôneas". Fonte: WASSERMA & ALVES, 2004.
2
Chama-se de monismo (do grego monis, "um") às teorias filosóficas que defendem a unidade da realidade
como um todo (em metafísica) ou a identidade entre mente e corpo (em filosofia da mente) por oposição ao
dualismo ou ao pluralismo, à diversidade da realidade em geral. No monismo um oposto se reduz ao outro, em
detrimento de uma unidade maior e absoluta. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Monismo. Ontologia (em grego
ontos e logoi, "conhecimento do ser") é a parte da filosofia que trata da natureza do ser, da realidade, da
existência dos entes e das questões metafísicas em geral. A ontologia trata do ser enquanto ser, isto é, do ser
concebido como tendo uma natureza comum que é inerente a todos e a cada um dos seres. Costuma ser
confundida com metafísica. Conquanto tenham certa comunhão ou interseção em objeto de estudo, nenhuma das
duas áreas é subconjunto lógico da outra, ainda que na identidade. Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ontológico.
14

destruição e/ou preservação segundo valores resultantes das ações de subsistência vinculadas
ao modelo de desenvolvimento econômico neoliberal da pós-modernidade pauloafonsina.

Tal conflito entre o existente e o existencial, põe-se de forma radical nas contradições sócio-
econômico-ambientais e espirituais das mulheres e homens que hoje habitam o referido
espaço do Complexo Arqueológico. Neste universo particular, extremamente intricado e
complexo da comunidade do Rio do Sal, vivem 56 famílias (AGENDHA, 2007) de
quebradores de pedras, mergulhados em condições adversas, submetidas política e
ideologicamente às situações de demandas econômicas que se contrapõem às tradições dos
seus antepassados, distanciando cada dia mais das raízes históricas, remodelando o modus
vivendi3 em detrimento da qualidade de vida das pessoas e da sustentabilidade ambiental.

Em meio a esta realidade, em que sobreveio a descoberta científica que mudaria para sempre
a relação das pessoas com o seu território de identidade, as pinturas rupestres dos Sítios
Arqueológicos pairam como uma força reguladora: O livre acesso das áreas antes mineradas
desorganizadamente, agora é recinto restrito de pesquisa científica e visitação; por Lei4, deve
ser preservado, os intelectuais afirmam que o valor histórico cultural é incomensurável, mas, e
as gentes quebradoras de pedras... Como podemos mensurar a crise em que foram
compulsoriamente atiradas? Em que se transformou suas crenças e valores? O que pensam
disso tudo? Que saberes ambientais tradicionais ainda sobrevivem? É provável que existam
saberes ambientais ancestrais preservacionistas, outra hipótese é que após o início da quebra
de pedras não tenha sido construída uma nova educação patrimonial conservacionista. Por
isso objetivamos conhecer a percepção e os saberes ambientais dos quebradores de pedras da
comunidade Rio do Sal; captar e analisar as essências desses saberes; avaliar os efeitos sócio-
econômico-ambientais da desconstrução da cultura de quebra de pedras; Investigar em que
medida a intervenção educacional ecopedagógica da ONG AGENDHA interferiu na formação
da consciência ambiental crítica; aferir o nível de valoração ambiental/patrimonial dos sítios
arqueológicos pelo público estudado; examinar a relação dialética entre as demandas da
sobrevivência objetiva e a consciência ambiental subjetiva; analisar as falas do público

3 Modus vivendi é uma frase em latim que significa um acordo entre partes cujas opiniões diferem, de tal
maneira que elas concordam em discordar. Modus quer dizer modo, maneira, atitude, caráter; Vivendi quer dizer
viver. Juntas, modus vivendi insinua uma acomodação na disputa entre partes para permitir vida em conjunto.
Normalmente descreve arranjos informais e temporários em negócios políticos. Por exemplo, quando dois lados
alcançam um modus vivendi em relação a territórios disputados, apesar de incompatibilidades políticas,
históricas ou culturais, que uma acomodação das diferenças respectivas é estabelecida por causa de contingência.
Este senso do termo foi usado como uma pedra angular na filosofia política de John Gray. Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Modus_vivendi
4 LEI Nº 3.924, de 26 de julho de 1961. Dispõe sobre os monumentos arqueológicos e pré-históricos.
15

estudado e extrair o significado qualitativo com relação aos Sítios Arqueológicos e as


vivências da comunidade. Apesar de situar tantos desafios, entendemos que o conhecimento
desta relação dinâmica e dialética em seu perfil pluridimensional, associando os aspectos
econômico, político, cultural, social e ecológico da questão ambiental, é da maior importância
científica, em que pese captar as suas essências para a construção de saberes úteis e
impulsionadores de transformações que visem a sua sustentabilidade.

Na esfera acadêmica, as percepções e os saberes das populações tradicionais, de fundo de


pasto e pescadores artesanais vêm conquistando cada vez mais espaço. Tal valorização rende
grande projeção, pois quase sempre revelam que estas comunidades vivem comumente mais
integradas ao meio natural e apresentam culturas conservacionistas a despeito destas que nos
deparamos nos cenários urbanos. Apesar da dificuldade de caracterizar o grupamento humano
de quebradores de pedras como “tradicional”, Marques & Vergne nos seus diversos trabalhos
publicados, acenam para uma historicidade que reconhece esta gente como remanescente de
uma população historicamente estabelecida na área do Rio do Sal, de modo que este estudo se
torna ainda mais interessante pro mundo acadêmico, por ajudar na compreensão de uma
transformação social de grande amplitude em curto espaço de tempo, podendo ainda abrir
margem para uma nova pesquisa sociológica desta dinâmica social específica.

Considerando ainda, que a realidade deste conflito socio-econômico-ambiental, possa ser em


primeira medida comparada a uma relação de conflito ambiental clássico, o qual,
aparentemente poderia ser compreendido de modo genérico comparativo com outros
exemplos afins, todavia, visto com um olhar colimado, revela uma especificidade que a torna
excepcionalmente interessante para a investigação científica. Por isso, a busca do saber sobre
o que pensa a comunidade dos quebradores de pedra do Rio do Sal sobre o ambiente em que
vivem e o que estes pensamentos e atitudes têm em relação à descoberta dos Sítios
Arqueológicos, é certamente o ponto de partida para todas as outras questões ainda não
desveladas, o que faz deste trabalho monográfico uma fonte de sinais para guiar o pensamento
científico aplicável a realidade específica daquela comunidade nos moldes da ecopedagogia,
ambientologia, antropologia, sociologia, economia, etc. o que conseqüentemente amplia
significativamente a responsabilidade desta autoria com a precisão das informações objetivas,
e principalmente, com relação aos saberes ambientais destes sujeitos estudados, quais seriam
os seus significados qualitativos.
16

O presente trabalho teve a sua raiz em dezembro do ano de 2006, quando olhando para esta
realidade e logo me identificando com ela, que eu resolvi compreendê-la melhor. Tal espírito
científico me instigou e impulsionou para a escolha do tema sobre a “percepção e os saberes
ambientais dos quebradores de pedras da comunidade rio do sal” como essência desta
monografia, de modo que colecionei deste então todas as informações sobre o caso dos
quebradores de pedras, trabalhei durante dois anos como funcionário público responsável pela
política ambiental do município de Paulo Afonso junto a esta comunidade, momento em que
tive a oportunidade de coordenar uma equipe multidisciplinar que produziu diversas pesquisas
e diagnósticos sócio-econômico-ambientais em parceria com a UNEB – CAAPA e
AGENDHA no ano de 2007.

Também é importante lembrar, que este intrincado contexto de proeminente complexidade, o


qual istricto sensu5 se trata do território de identidade da comunidade dos quebradores de
pedras, precisa urgente e irremediavelmente de proteção para a garantia da existência
daquelas pessoas e do equilíbrio natural do meio ambiente em que estão inseridas, assim
como, garantir a existência da memória ancestral e salvaguarda da nossa memória
contemporânea. Neste sentido, este trabalho poderá contribuir para embasar caminhos
pedagógicos para uma provável ação Educacional Ambiental Crítica na gestão desse espaço
de grande relevância ambiental e histórica e a sua utilização para mediação de conflitos no
processo de gestão socioambiental participativa daquela comunidade.

Faz-se necessário, lato-sensu6, lembrar também, que estamos extasiados diante do


conhecimento que revela o planeta Terra em crise ambiental decorrente das ações antrópicas.
Tal ênfase nos obrigou ao desenvolvimento de uma nova ética, a ética ambiental, que surge
numa tentativa quase desesperada de reverter os danos ambientais em escala planetária e
preservar aquilo que ainda nos resta em âmbito local. Eis aqui o alcance e relevo dessa nossa
missão doméstica.

Este trabalho foi estruturado de forma extremamente simples, sintetizando em linguagem


clara e acessível até mesmo as teorias mais complexas. Tratamos no início dos assuntos
relacionados com a Ecologia e o meio ambiente desde o conceito de ecologia até a

5 Stricto sensu é uma expressão em latim que significa literalmente em sentido estrito. Também se refere ao
nível de pós-graduação que titula o estudante como mestre e doutor em determinado campo do conhecimento.
Denota, neste último caso, um tema mais específico do que o lato sensu. Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Stricto_sensu.
6 Lato sensu é uma expressão em latim que significa literalmente em sentido amplo. Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Lato_sensu.
17

compreensão da percepção ambiental. Em seguida vemos a análise das intervenções


pedagógicas junto aos pesquisados. Logo depois temos uma descrição analítica do contexto
histórico e geográfico da pesquisa e suas influências na construção dos saberes ambientais. A
monografia apresenta na seqüência as metodologias e suas justificativas, para em seguida
finalizar com a apresentação dos dados coletados e suas respectivas análises e conclusões.
18

2 ECOLOGIA E MEIO AMBIENTE

2.1 DA ECOLOGIA À TEIA DA VIDA

Segundo Begon (et al, 1996) ecologia é a ciência que estuda a interação entre os organismos e
o meio. Ecologia é uma palavra derivada do grego oikos, “casa” ou “habitação”, e o sufixo
“logos”, se traduz como “estudo”. Assim temos o significado de ecologia como a “ciência do
habitat”. O termo foi utilizado usado pela primeira vez por Ernest Haeckel em 1866, todavia
Acot (1990), afirma que o mesmo termo apareceu pela primeira vez num tratado de Eugen
Warming em 1895 que versava sobre a geobotânica geral. Somente a partir do século XX,
com o aparecimento dos trabalhos desenvolvidos por Clements e Cowles passou a existir a
caracterização de uma ecologia dinâmica cognominada “Botânica/ecologia das sucessões”.
Tansley e introduziu um novo nome com significado a esta especificidade o qual chamou de
“ecossistema” e que servia para caracterizar comunidades vegetais e animais, oque resultou
numa compreensão de dinamismo das comunidades vivas.

A conseqüência principal desta definição foi a mudança de entendimento evolucionista


Darwinista para uma compreensão mais complexa das transformações que ocorrem nas
biocenoses devido a interesses econômicos que atribuem valor aos agrossistemas, e a
racionalização da gestão ambiental. Assim o pensamento sistêmico resignifica o ambiente que
passa a ser interpretado como relações de interdependências entre os fatores abióticos e
bióticos.

Com Ekblaw, a análise sistêmica dessa dinâmica também passou a considera a relação
humano/meio, dando início ao enfoque da ecologia humana (Figura 1). Esta junção é dita por

Produto da transformação do meio


para criar condições de habilidade
Natural
Tudo que circunda
o indivíduo

Ambiente Cultural

Artificial
Artes, valores, crenças

Figura 1: Esquema Dimensões de Meio Ambiente.


19

Acot, como “tentativas díspares e artificiais para integrar os conceitos e os métodos de uma
ciência natural em pleno desenvolvimento àqueles das ciências humanas” (ACOT, 1990). O
esforço faz da ecologia uma ciência integrada com a sociologia, economia e a política e passa
a focalizar duas novas percepções: comunidade e rede.

Através da sua obra “A teia da vida”, Capra (1996), vê na concepção de rede a chave para a
elucidação da própria natureza da vida. Podendo relacionar as análises sobre o crescimento
populacional, os modelos de produção, etc. Esta compreensão ampla da ecologia está no cerne
dos movimentos ambientalistas, os quais exercem uma extraordinária força no sentido de
presumir valor científico à preservação de diversos ecossistemas e vincular medidas de
políticas públicas e a criação de áreas de preservação ambiental que se transformaram em
laboratórios de pesquisas ecológicas de fundamental importância científica.

Mas ainda sobrevive a ruptura entre as ações humanas e as conseqüências destas no meio,
sustentada pela fé de que a sobrevivência humana depende mais da tecnologia do que dos
recursos naturais. No senso comum, também ainda sobrevive à crença nas providências
divinas como salvaguarda da humanidade, para todos estes problemas enfrentados pelas
mulheres e homens. Contudo Schwarz & Schwarz, afirma que a ecologia “não propõe
soluções, sejam práticas ou idealistas, para os problemas de nosso tempo; seu objetivo mais
profundo não é conhecer, mas sim conscientizar” (SCHWARZ & SCHWARZ, 1990).

Assim, munidos desta base teórica, podemos trabalhar neste TCC a idéia de que os problemas
ambientais da realidade estudada devem ser encarados como problemas econômicos,
ideológicos e políticos, cujo conjunto de preceitos nos permite analisar as demandas
científicas emergentes da pesquisa junto aos nossos quebradores de pedras. Inspirados em
Capra (1996, 2002) percorremos caminhos mais apropriados e nos aproximarmos da natureza
sócio-ambiental destes sujeitos pesquisados, para aprender acerca da sua complexidade “não
por meio da dominação e do controle, mas sim, por meio do respeito, da cooperação e do
diálogo” (CAPRA, 1996).

2.2 A QUESTÃO AMBIENTAL

A questão ambiental está no cerne da problematização estudada neste TTC, quando situamos
os quebradores de pedras num contexto sócio-ambiental vestido de uma terrível situação de
intranqüilidade social assentada sobre um espaço afligido por seriíssimo desequilíbrio
20

ambiental, a qual desperta atenção especial da comunidade científica na atualidade. Porém a


questão ambiental que hora afeta os sujeitos desta pesquisa não parece ser contrafeita ou um
fenômeno novo, sobretudo as suas causas antrópicas em que o “Ser” humano se projeta como
predominador sobre o “Ente” natureza.

A concepção dominadora do mundo tem raízes pré-históricas. Encontramos vários registros


antigos que mostram a relação humano-natureza, em que aquele tenta subjugar esta. Escolhi o
fragmento seguinte da mitologia Cananéia, que é bem conhecido do mundo cristão ocidental
por fazer parte dos escritos da tradição sagrada:

“Criou, pois, Eloim o homem à sua imagem; (...) homem e


mulher os criou. Então Eloim os abençoou e lhes disse:
Frutificai e multiplicai-vos; enchei a terra e sujeitai-a; dominai
sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os
animais que se arrastam sobre a terra. Disse-lhes mais: Eis que
vos tenho dado todas as ervas que produzem semente, as quais
se acham sobre a face de toda a terra, bem como todas as
árvores em que há fruto que dê semente; ser-vos-ão para
mantimento. E a todos os animais da terra, a todas as aves do
céu e a todo ser vivente que se arrasta sobre a
terra...”.(Gênesis 27 a 30) grifo meu.

Tal concepção de homem dominante é originária de um antropocentrismo demasiado e


resultou de levar a humanidade à conduta predatória, consumista e irracional que não somente
põe em risco o ambiente e tudo o mais que ele contém, mas também a sua própria
sobrevivência (SEARA FILHO, 1988).

A questão ambiental neste momento da história humana passar a existir, destarte como um
tema condescendente que colabora para conscientizar as mulheres e homens sobre seus papeis
como elemento central dos processos sócio-econômico-ambientais emergentes, o agente que
transforma e é transformado e é herdeiro de suas ações (PMF/SME, 2004). Segundo LEFF
(2001) esse procedimento de conscientização movimenta as pessoas na tomada de decisões,
contíguo com a mudança dos métodos de concepção, análise e formação, a partir do ponto de
vista holístico e enfoques interdisciplinares e não da maneira tradicional cartesiana como um
ajuntamento de partes dissociadas.

Por outro lado, Segundo Lima (1999), a questão ambiental acrescenta à realidade científica
atual um jeito inovador que amplia a nossa habilidade de ponderar/relacionar as diversas
realidades interligadas como bem demonstrou Capra (1996), e, de maneira especial por alertar
para a imperativa e inadiável mudança atitudinal efetiva que garanta a ininterrupção da vida
21

no longo prazo. No contexto de um em um sistema social caracterizado pela desigualdade e


insustentabilidade tal como estudamos aqui, Lima (ibidem) ainda assegura que as ameaças
sócio-políticas e econômicas cada vez mais amplificam os imperativos ambientais, sobretudo
àqueles pautados na gestão ambiental dos recursos vitais e finitos como a energia, a água e o
solo na extensão das suas múltiplas dimensões políticas e éticas. (LIMA, 1999)

Outrossim, Conforme diz Carvalho (1991), imbuídas da conseqüente razão da causa


ambiental, motora da necessidade urgente de tomada de decisão e ação, as Nações Unidas a
partir da Conferência de Estocolmo em 1972, criaram mecanismos de gestão dos problemas
ambientais. Esses mecanismos têm basicamente uma “leitura correta” do problema e indica o
sentido de sua abordagem, mas é alvo de severas críticas dos ambientalistas em função da
excessiva contaminação ideológica da questão ambiental, que está plantada na perspectiva
liberal e nos valores do capital. Essa leitura da ONU discorre da realidade sistêmica, pois
deveria se pautar na articulação sócio-econômico-ético-político-ambiental, nas relações
sociais e na subjetividade humana, como bem demonstrou Guatarri (2001).

2.3 A CRISE SÓCIO-AMBIENTAL

Quase todas as pessoas em algum momento, através das diversas fontes da informação:
manchetes e matérias dos jornais e das revistas, das chamadas e reportagens das emissoras de
rádios e televisão ou simplesmente de boca a boca, tomou conhecimento da existência dos
danos causados às pessoas e ao meio ambiente pela ação humana. Tais danos, sobretudo
originados pelo consumismo resultante do espírito capitalista foram por um bom tempo
desconhecidos. Imaginava-se que o desenvolvimentismo econômico resolveria todos os
problemas da população mundial, com um definitivo controle humano sobre a natureza, mas
felizmente se foram os românticos tempos em que vigorava a ignorância das suas mazelas que
também envenenam a alma, quando nos incute a idéia de segurança e esperança.

A idéia de progresso acelerado em prol do bem estar para todos também teve o seu
crepúsculo, sobreveio a escuridão das suas traiçoeiras armadilhas, fizeram tombar as mulheres
e homens que os confiaram as suas vivências. Alguns aprenderam rápido pela experiência
empírica própria ou alheia, entretanto a maioria ainda se encontra alienada dos riscos aos que
estão submetidas e dos danos causados ao meio ambiente, desassistidas pela letargia das
nossas políticas públicas e embaladas pelo desejo de retorno rápido dos seus investimentos e
deveras rendidas a campanhas publicitárias inconseqüentes. Com efeito, por generalização
22

dessas idéias, parece razoável afirmar que a crise sócio-ambiental dos quebradores de pedras
do Rio do Sal, está confinada, uma vez garantida as devidas peculiaridades e proporções,
nesta conjuntura sinistra. Neste mote, precisamos sustentar a nossa análise em parâmetros
seguros que nos conceitue a crise sócio-ambiental dos nossos pesquisados. Tal amparo teórico
encontramos em Leff e Farias nas considerações abaixo.

De acordo com Leff (1999) “a questão ambiental emerge como uma crise de civilização”
pode-se expor que a crise ambiental é extraordinariamente mais significativa e terrível que
qualquer crise econômica que tanto desperta o interesse do mundo globalizado. O
aprofundamento da crise sócio-ambiental notada, sobretudo pelo diagnóstico da situação
climática do planeta, não deixa dúvidas quanto à necessidade de se expandir em nível
planetário a consciência ecológica. Apesar do discurso científico se portar como grande porta-
voz da crise ambiental, esta crise não é tão somente uma categoria científica, ela abarca todas
as esferas da vida, porque se refere à própria sustentação da vida no planeta. As rupturas da
crise ambiental põe todos os paradigmas do conhecimento em cheque, bem como os modelos
societários da vida moderna, obriga-nos a reconstrução da racionalidade social norteada por
outros valores e saberes que possibilitem novos modelos sustentáveis de produção, e novas
formas de organização democrática e a resignificação cultural.

Para Farias (2008) a crise sócio-ambiental, não pode ser compreendida analiticamente em
cenários distintos, um cenário cultural e um cenário natural, diz o autor que “o homem faz
parte da natureza”, e não é um entendimento simples de relação de causa e efeito, mais uma
complexa relação que reúne o ente biológico, a pessoa da sociedade e o ser da subjetividade.
Como conseqüência dessa complexidade, Farias afirma que “a degradação da sociedade é
uma faceta da crise ambiental”. Ela se torna imperativa nos compelindo a “enxergar os laços
sócio-culturais como relações ecológicas”, onde a natureza está indissociavelmente ligada à
cultura.

Esta idéia que produz a nova consciência da crise sócio-ambiental nos ajuda a problematizar
as estruturas que configuram a representação da natureza na visão dos quebradores de pedras
aqui pesquisados levando em conta a sua cultura e sua subjetividade, assim se ampliam as
possibilidades de liberar o pensamento ecológico para torná-lo mais crítico e, por conseguinte,
mais eficaz do ponto de vista de seu contorno social.
23

2.4 A SUBJETIVIDADE EM MEIO À CRISE AMBIENTAL

As teorias científicas da modernidade tentam recuperar a unidade básica do universo.


Decisivamente, no campo desse desafio, as teses ligadas à subjetividade e seu espaço na
natureza são do mesmo modo consideradas importantes. No mote das idéias sobre a
compreensão da subjetividade, Oliveira (2005) afirma que a subjetividade é o conceito
induzido das “propriedades que o ser humano não poderia deixar de ter sem deixar de ser o
que é”, e apresenta três formas básicas recorrentes de abordagem: o fisicalismo, as filosofias
da finitude, e o pragmatismo.

Segundo Oliveira (ibidem), O fisicalismo é a “descrição físico-naturalista da subjetividade” e


tem seu foco no comportamento e é representado principalmente pela Teoria Behaviorista; Na
tese de que os fenômenos mentais se confundem com funções neurofisiológicas e é
representado pela Teoria da Identidade; e, na idéia que o intelectual é a mera manifestação do
funcionamento perfeito do neurofisiológico.

Oliveira (et. seq.) diz que as filosofias da finitude se fundam na tese de que “nossa
consciência não é fundamento de si mesma, não constitui o princípio fundamental do pensar e
do agir”. Tal contingência quer dizer que “não somos fundamento de nós mesmos”, esta tese
propõe que a produção dos sujeitos é resultado de uma construção social e histórica, dessa
forma a essência humana é o produto das condições de sua constituição.

Já o pragmatismo, diz Oliveira (et. seq.), se caracteriza como a idéia de que o sujeito é visto
como “aquele que, interpretando sinais, interpreta o mundo que ele tem através da mediação
destes sinais”. Assim o sujeito se constitui através da linguagem e ação em redes
interpretativas, e fornece os esquemas de interpretação de si e do mundo a sua volta.

Não obstante, Oliveira (et. seq.) busca interpretar a subjetividade a partir de referenciais de
síntese e amplia os fundamentos do ser humano na totalidade. A esse projeto reconstitutivo
racional do ser humano Oliveira denomina de ontologia regional transcendentalmente
mediada, empreendimento este, que através de argumentos reflexivos funda uma ontologia
regional que pressupõe o núcleo metafísico da reflexão filosófica incondicionada, uma razão
objetiva absoluta e um princípio universal de inteligibilidade de tudo. Oliveira ainda afirma
que nessa ontologia regional, a corporalidade se sobreleva como estrutura basal da existência
humana, e se manifesta em dois aspectos: no caráter corporal-orgânico que nos coloca no
mesmo status dos demais seres do mundo; e, segundo, numa configuração corporal-biológica,
24

onde “não podemos olhar para nosso próprio corpo como simples objeto em meio a tantos
outros”, num mundo marcado pela necessidade de ter de adquirir as condições da própria
existência.

Já para Guattari (2001) o subjetivismo entende o homem enquanto ser psíquico envolvido e
envolvente e não como um objeto no/do meio. Sem a consciência da sua subjetividade, o
homem deixa, paulatinamente, de se perceber como um ser complexo, dual, para se coisificar,
um objeto manipulável ao sabor das tendências ideológicas, mormente à cultura consumista,
sendo exortado a suplantar sua realidade da qual subsiste para adentrar ao subjetivo
estereotipado e alienador.

Esta relação da subjetividade com uma exterioridade imperante em meio à crise ambiental já
faz parte da vida cotidiana dos quebradores de pedras aqui estudados, por isso entendemos
que a nossa análise não deve se furtar de considerar todas as suas dimensões sintéticas.

2.5 O VALOR SÓCIO-AMBIENTAL

A valoração sócio-ambiental nasce como resultado do desenvolvimento da consciência


ecológica de que o meio ambiente é um ecossistema. Para Edgar Morin (1981) esta
consciência deve levar em conta a totalidade viva auto-organizada por si ou espontânea, e
principalmente a “consciência da dependência da nossa independência”, cujo significado
remete à relação fundamental com o ecossistema, que leva o “Ser” a rejeitar a visão de um
mundo-objeto e do “homem insular", ou seja, do homem ilhado e independente. Claro que
esta visão de valor ambiental rejeita a idéia radical de valoração econômica pura do meio
ambiente, em que o vê apenas como fontes de recursos, e que se tem constituído em um
extenso campo de pesquisas teóricas e trabalhos acadêmicos, visivelmente, por se tratar de
uma saída teórica que agrada o capital. Morin (ibidem) fala de um valor moral com
significado sócio-ambiental, e também, com esta acepção da consciência ecológica expõe a
sua complexidade nos termos das teorias dos sistemas. Esta base teórica de valor ambiental
holística se conecta na teia da vida de Capra (1996) e, por conseguinte se aplica dentro das
nossas expectativas de interpretar tal valor nas nossas análises feitas neste TCC.
25

2.6 A ÉTICA E A CIDADANIA AMBIENTAL

A Construção da Cidadania Ambiental é um dos desafios mais complexos da nossa sociedade


contemporânea, já que esta edificação passa pela desconstrução radical das bases ideológicas
que sustentam o modelo desenvolvimentista do capital.

A formação de valores e atitudes se funde na base do processo de construção da cidadania. É


imutável e irreversível a forma de construção da cidadania por via educação ambiental, que
deve abranger as dimensões contraditórias da sociedade, por se tratar de um processo
dialético.

A construção da cidadania ambiental pode sobrevir quando contemplar os diferentes


caminhos e ações específicas. Esta construção se caracteriza como o processo que reconhece
os seres humanos como seres que pertencem a uma cadeia zoológica que evoluiu num
processo complexo, lento e deslumbrante e que por fim ascendeu ao status de “Ser” que se
incorpora a sua natureza.

Para a construção da cidadania não podemos negligenciar com a importância dos Valores
Humanos. Martinelli (1998) afirma que “os valores humanos são os fundamentos éticos e
espirituais que constituem a consciência humana, tornando a vida algo digna ser vivida e nos
permitem constatar que não somos superanimais mas supraconscientes”.

Martinelli também considera fundamental para a à formação da cidadania: a solidariedade; a


cooperação; a participação e a responsabilidade. Com esses saberes os sujeitos despertam a
compreensão da importância da existência de cada ser vivo na manutenção da vida no planeta
e também o respeito à vida em essência, com todas as suas nuances e diferentes
manifestações.

2.7 O TRABALHO E O MEIO AMBIENTE

A questão da relação do trabalho com o meio ambiente é o principal ponto de tensão vivido
pelos quebradores de pedras do Rio do Sal. Este nosso trabalho, mantendo a coerência da
investigação e análise holísticas, encontrou sufrágio teórico nas idéias de Colombo (1993).
Colombo que na relação entre capital e trabalho, o capital tem todas as vantagens, fazendo do
trabalho uma mera mercadoria e não um valor moral. Explica por exemplo a causa
26

fundamental dos quebradores de pedras estudados se encontrarem na situação de


marginalizados e desclassificados.

Colombo (ibidem), inspirado no materialismo dialético marxista, diz que o capital se defende
com a retórica de que “todos têm chances iguais, direitos iguais e que todos são livres”, mas
essa tese não se confirma na prática, pois os trabalhadores estão sujeitos à fome, desabrigados,
não conseguem ser profissionais liberais e, muito menos, ser empresários, contrariando a
essência do discurso liberal, um discurso teórico e do interesse ideológico do capital
(COLOMBO, 1993).

Teresinha Burnham (1993) fala do trabalho como mediador da relação que as mulheres e
homens estabelecem com a natureza e os outros semelhantes, portanto mediador da
historicidade do conhecimento humano. Para Chauí (2007), o trabalho também é mediador da
apropriação da natureza, da produção material e organização cultural na história, portanto,
dialético histórico-crítico. Sendo assim, com as reflexões aqui empreendidas, partimos do
pressuposto de que a tradição dialética consagrada por Marx, aliada a dialética existencialista
de Sartre, é instrumento teórico-metodológico que busca a explicação ecologicamente viável e
socialmente justa da realidade dos quebradores de pedras, por meio de uma análise exercida
“com vistas à superação dos dualismos entre cultura, natureza e capitalismo” (LOUREIRO, 2009).

2.8 A PERCEPÇÃO AMBIENTAL

Segundo o Wikicionário (http://pt.wiktionary.org/wiki/percepção) “percepção é uma palavra


derivada do infinitivo latino percipere ("apreender pelos sentidos"). A percepção é definida
no dicionário Mini-Aurélio como o ato, efeito ou faculdade de perceber. Assim diferenciando
a percepção externa da interna. O caráter sensorial é o que liga o Ser humano aos aspectos
biológicos tanto quanto aos aspectos sócio-culturais. (MARIN, OLIVEIRA E COMAR, 2003
e 2005). De tal modo: a combinação dos sentidos no reconhecimento de um objeto; a
recepção de um estímulo; a faculdade de conhecer independentemente dos sentidos; a
sensação; a intuição; o ato ou operação da inteligência; a representação intelectual; e, a idéia,
são formas de percepção, as quais no sentido ambiental estão intimamente ligadas à cultura,
história, experiência pessoal, tempo e espaço geográfico de cada pessoa, etc. E é neste sentido
que tomamos como base teórica para a leitura do nosso objeto de pesquisa.
27

Del Rio (1996) elaborou um esquema teórico (Figura 2) que mostra como a percepção se dá
através de mecanismos perceptivos e cognitivos. Para Del Rio (ibidem) a mente desempenha
parte ativa na construção da realidade percebida e, por conseguinte, define a conduta do
observador. Os esquemas de representação da realidade são organizados através de imagens
mentais, com atributos específicos e únicos do ponto de vista fenomenológico.

Figura 2: Esquema teórico do processo perceptivo. Fonte: DEL RIO, 1996.

Segundo Palma (2005) para que o sujeito possa de fato perceber algo, é essencial que este
“possua algum tipo de interesse no objeto de percepção”. As crenças e valores desses sujeitos,
ou seja, os seus paradigmas são alicerces basais desse interesse, construindo em cada ser
humano uma percepção única para o mesmo objeto observado. Já Okamoto (1996, apud
Palma, 2005) afirma que

“Pela mente seletiva, diante de um bombardeio de estímulos,


são selecionados os aspectos de interesse ou que tenham
chamado a atenção, e só aí que ocorre a percepção (imagem) e
a consciência (pensamento, sentimento), resultando em uma
resposta que conduz a um comportamento”

Ribeiro (2004, apud Silva, 2006), destaca o aspecto social da percepção ambiental, afirmando
que esta percepção não está necessariamente ligada à natureza, mas a inteligibilidade da
relação dos sujeitos consigo mesmo e com as outras pessoas, enquanto Pinheiro (2004)
destaca os valores dos sujeitos na formação da percepção ambiental, considerando o
emocional, o sensorial, o vivencial e o racional num processo bidirecional realimentada pela
satisfação do interesse (Figura 3).
28

Figura 3: Esquema da percepção ambiental segundo Pinheiro (2004)

Através de seus estudos, Lynch criou o conceito de “imagens ambientais” que aparecem como
resultado da interatividade observador e seu ambiente. (LYNCH, 1999). O meio possui sua
realidade específica, enquanto o observador, seleciona, processa e constitui o saber em
conformidade com seus objetivos.

Com fins de estudar a percepção ambiental com base no comportamento do observador em


relação ao objeto surgiu a Psicologia Ambiental, a qual é entendida por Moser (2005), como o
"estudo das inter-relações entre o indivíduo e seu ambiente físico e social, nas suas dimensões
espaciais e temporais". (MOSER, 2005). Vê-se na psicologia ambiental o seu caráter
bidirecional, enfocando o diálogo do sujeito, através de suas percepções e comportamentos,
com o seu contexto sócio-ambiental. (CARVALHO, 1993). Desse modo se conforma um
sistema aberto onde o ambiente é simultaneamente determinante e determinado, pois tanto o
meio como o sujeito são ponderados nas análises.

David e Weinstein (1987, apud Carvalho, 1993) observam que o ambiente físico comunica a
intenção e os valores das pessoas nele inseridas, portanto traduzem um caráter simbólico. O
contexto sócio-ambiental está no sujeito em que o ambiente físico se situa. O cenário é
denunciador do comportamento dos sujeitos.

Com base nestas linhas teóricas, podemos refletir sobre a percepção ambiental dos
quebradores de pedras com base em muitas facetas, tanto da leitura das palavras ditas, do
comportamento enquanto testemunhas das duas histórias tanto quanto da leitura dos objetos
que compõem os seus contextos.
29

3 A INTERVENÇÃO ECOPEDAGÓGICA

3.1 A EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Ainda existe no nosso país alguma dificuldade de fundamentação conceitual com a prática
pedagógica específica à educação ambiental, por isso estendemos a nossa busca por diversas
outras fontes, capazes de teorizar sobre as nossas intenções de realizar este trabalho holístico.
No caso da temática ambiental, de passagem, podemos estimar a existência, atualmente, de
cerca de 800 trabalhos de pesquisa (dissertações e teses) produzidos no Brasil, a maioria dos
quais publicados a partir de 1990. Todavia, existem muitos problemas de acesso a esta
produção acadêmica, devido à pouca publicação dos trabalhos, inclusive na própria academia
(ALVES, 1992; ALVES-MAZZOTTI e GEWANDSZNAJDER, 2002; GATTI, 2003).

Neste trabalho, com a finalidade de analisar as conseqüências das intervenções educacionais


patrimoniais/ambientais da UNEB-CAAPA e AGENDHA junto a comunidade dos
quebradores de pedras do Rio do Sal, me inspirei especialmente na pedagogia de Paulo Freire
(1982, 1991 e 1996 passim), cuja principal estratégia epistemológica é a interação dialógica
dos sujeitos entre si e com a realidade.

A Educação Ambiental pode contribuir com a construção da consciência ambiental dos


sujeitos pesquisados de duas formas: não-formal e informal pela ação direta das instituições
interessadas nos sítios arqueológicos ou formalmente pela escola local que atende
quebradores de pedras ou seus familiares. Cada uma dessas formas carregada de seus
conceitos com distintas linhas teóricas, e perspectivas ideológicas, antropológicas e políticas.

A Educação Ambiental exclusivamente feita nos moldes formais tradicionais não é suficiente
para resolver os problemas ambientais, mas feita com completude é condição indispensável.
Esta idéia pode ser complementada por Leff (1999) quando diz que “os valores ambientais se
induzem por diferentes meios e não só dentro dos processos educativos formais”.

Ab‟Saber (1993), concebe a Educação ambiental como aquela que garante um compromisso
futuro, envolvendo uma filosofia com novas idéias comportamentais, tanto do ponto de vista
individual quanto coletivo”. Ramificando o alcance destas idéias, Garcia Muñoz (2002) diz
que as concepções de Educação Ambiental são diversas e variadas, pois dependem das
concepções que seus praticantes têm de Educação, de Ambiente e de Sociedade. Ou seja, as
30

concepções de Educação Ambiental sofrem as mais variadas interferências assumindo


distintos matizes das diferentes condições de sua produção, especialmente, das propostas
produzidas e veiculadas pelas ONG‟s, mídia, empresas, etc. (GARCIA MUÑOZ, 2002).

As intervenções educacionais patrimoniais/ambientais da UNEB-CAAPA e Agendha são


permeadas de forte teor cidadão com nítido enfoque na ecologia humana, mas na educação
formal, de modo geral, Sorrentino (1997) afirma que privilegia a articulação com o currículo
do Ensino de Ciências naturais; apresentando nítidos vínculos com temas relacionados à
Ecologia; “a discussão de problemas ambientais, em sua maioria com forte conotação técnica,
relacionada a concepções biológicas” (SORRENTINO, 1997). Valentin (2004) coaduna com
a visão de Sorrentino quando diz que, “de modo mais significativo, grande parte das ações e
das pesquisas em Educação Ambiental se relacionam com as escolas, seus professores e os
escolares, em especial do Ensino Fundamental” (VALENTIN, 2004).

Amparando as intervenções educacionais patrimoniais/ambientais da UNEB-CAAPA e


Agendha, Coutinho (1991) reforça a idéia de que a Educação Ambiental precisa ir além de
mais uma simples disciplina dentro da estrutura curricular. A ação da educação ambiental não
deve se restringir aos limites da proteção da natureza, nem muito menos pelas ações pontuais
do dia da árvore e Semana do Meio Ambiente, deve sim, avançar na perspectiva histórica do
materialismo dialético marxista, com bases sólidas para a construção de uma visão exeqüível
de futuro, impedindo a reprodução dos erros e enganos cometidos até então. Neste sentido, a
educação ambiental deve buscar formar uma consciência ecológica que seja ao mesmo tempo
uma consciência social e política, cuja profundidade e complexidade, sendo bem construída
no processo de reflexão-ação-reflexão (FREIRE, 1982), têm a força necessária para a
mobilização transformadora e torna o sujeito em sua prática comprometido com a questão
socioambiental. Para Morin (1981) é plausível auxiliar o sujeito na sua tomada de
consciência, entretanto diz que este auxílio é limitado, na medida em que a conscientização é
um ato reflexivo que só o sujeito pode realizar.

Teitelbaum (1978) afirma que o processo de conscientização que a educação ambiental


promove tem três dimensões: “a) como prática social concreta; b) como assunção de uma
personalidade nacional, que em seu próprio âmbito busca a realização de seu destino
histórico, com independência, justiça e liberdade; c) como integrantes de uma comunidade
internacional que luta pela realização dos ideais de justiça, solidariedade e paz”. Fica
entendido nas entrelinhas que através da educação ambiental é crível despertar no indivíduo
31

uma pretensão assente de mudar a realidade presente e construir um futuro diverso naquilo
que lhe incumbe, na sua parcela individual de transformação, que advém a partir de
comportamentos, modos, e ações responsáveis de cuidado e respeito, criando assim a
consciência ecológica e a compreensão da evolução do ambiente em sua totalidade, esta que
se dá pela manifestação sensível do êxito da educação ambiental. Fica também revelado o
valor dos avanços possíveis, fundamentais para consolidar a confiança do sujeito no processo
de evolução gradual e contínuo. Conferindo unanimidade a esse tema, Pádua & Tabanez
(1997) também se referem à educação ambiental como uma ferramenta capaz de desenvolver
essa mudança de comportamento da sociedade.

O papel da Educação Ambiental é enfatizado no Capítulo 36 da AGENDA 21 - Promoção do


Ensino, da Conscientização e do Treinamento: “Para ser eficaz, o ensino sobre meio ambiente
e desenvolvimento deve abordar a dinâmica do desenvolvimento do meio físico/biológico e
do socioeconômico e do desenvolvimento humano (que pode incluir o espiritual), deve
integrar-se holisticamente em todas as disciplinas e empregar métodos formais, „não formais‟
e informais e meios efetivos de comunicação” (Agenda 21).

3.2 A ECOPEDAGOGIA CRÍTICA

Para Moacir Gadotti (2000) a educação problematizadora de Paulo Freire foi a chave teórica
para o nascimento da Ecopedagogia. Gadotti (idem, ibidem)) se lembra das principais linhas
pedagógicas onde diz que “a pedagogia tradicional centrava-se na espiritualidade, a pedagogia
da escola nova, na democracia e a tecnicista, na neutralidade científica. A Ecopedagogia
centra-se na relação entre os sujeitos que aprendem juntos em comunhão” (Freire apud
Gadotti, 2000). Gadotti afirma ainda que a ecopedagogia “é sobre tudo uma pedagogia ética
(GADOTTI, 2000). Avanzi (2004) complementa a idéia de Gadotti ligando a Ecopedagogia à
mudança na mentalidade em relação à qualidade de vida.

Segundo Gadotti (2000): A Educação Ambiental clássica, limitou-se ao ambiente externo com
temas relacionados às plantas e animais sem se confrontar com os valores sociais,
desprezando a questão da “politicidade da educação e do conhecimento” (GADOTTI, 2000).
Sendo assim, a Ecopedagogia se opõe à Educação Ambiental expositiva, enunciativa e
impositiva, focada nos conteúdos, “visando persuadir a respeito da conveniência da doutrina
ecológica” (GUTIÉRREZ & PRADO apud AVANZI, 2004).
32

Para MEDINA; SANTOS (1999) os sujeitos só conseguirão mudar sua maneira de pensar o
ambiental se o novo saber ambiental não permanecer alheio às novas condições de seu
contexto, exigindo da ecopedagogia formal ou não formal propostas inovadoras e criativas
adaptadas à realidade local e que permitam formar efetivamente o cidadão reflexivo, crítico e
participativo, apto para se tornar autônomo e protagonista das transformações de seu meio.
Para reforçar o viés da ecopedagogia, REIGOTA (1997) diz que educação ambiental deve
estimular a ética nas relações sócio-econômico-políticas, e que se fundamente no diálogo
entre gerações e culturas.
33

4 CONTEXTO HISTÓRICO/GEOGRÁFICO E HUMANO

4.1 CARACTERIZAÇÃO DO ESPAÇO GEOGRÁFICO

O Complexo Arqueológico de Paulo Afonso, Estado da Bahia, (Figura 4) está Localizado no


pediplano sertanejo, margeando a calha da zona final do trecho submédio e platô do Cânion do
Rio São Francisco, micro-região do sertão setentrional baiano, inserida na Região de Xingó
(VERGNE & MARQUES, 2009) e faz parte da Ecorregião do Raso da Catarina. Esta área é
considerada uma das áreas mais ricas em se tratando da existência de registros gráficos
rupestres do Brasil, onde já se descobriu mais de uma centena de sítios,

“classifica-se como paisagem notável tanto em função dos


afloramentos graníticos que lhe dão uma especificidade em
relação às áreas circunvizinhas, assim como, sua flora, fauna e
demais componentes típicos da biodiversidade da Ecorregião
do Raso da Catarina e do Bioma da Caatinga, fatos que lhe
concedem o caráter de patrimônio arqueológico e patrimônio
paisagístico” (AGENDHA, 2007).

Figura 4: Área do Complexo Arqueológico de Paulo Afonso – foto: Google Earth. Edição frankalsaber.
34

Este espaço sertanejo do Rio do Sal, em diversos aspectos, principalmente pela presença das
pedras (Figura 5 e Figura 6), se assemelha àquele descrito por Euclides da Cunha em “Os
sertões”:

“A pedra, aflorando em lajedos horizontais, mal movimenta o


solo, esgarçando a tênue capa das areias que o revestem, (...) e
nos trechos em que se operou a decomposição in situ do
granito, originando algumas manchas argilosas, as copas
virentes dos ouricurizeiros circuitam parêntesis breves abertos
na aridez geral, (...) e mais longe desaparecem sob acervos de
blocos, com a imagem perfeita desses "mares de pedra" tão
característicos dos lugares” (CUNHA, 2005).

Figura 5: Vale do Rio do Sal com vista para o Figura 6: “Mares de pedra” – Margem direita do Rio
povoado. Foto: frankalsaber do Sal a montante do povoado. Foto: frankalsaber

Esta paisagem única faz parte do Corredor Ecológico da Caatinga que é constituído por um
mosaico de terras com os mais diversificados usos, que vão desde “parques e reservas até
áreas com uso menos intensivo, e extensão de 5,9 milhões de hectares de caatinga,
distribuídos em 40 municípios de cinco estados da região Nordeste, e que são gerenciadas de
maneira integrada para garantir a sobrevivência do maior número possível de espécies através
da manutenção da conectividade daquela região”. A formação de um corredor ecológico é
estrategicamente apropriada onde existem áreas devastadas ou sofrendo de grande ameaça ao
equilíbrio natural. Nesta situação se encontra o Complexo Arqueológico de Paulo Afonso, que
abriga vários Sítios de Pinturas Rupestres, que segundo os estudos de Verne estão pode ter até
9.000 anos de existência (AGENDHA, 2007).

As pedras de lajeiros e matacões de granito, que afloram em toda a região do Rio do Sal, são
classificados como de excelente qualidade para fins industriais por possibilitar a produção de
placas de granitos polidos de muita resistência física à abrasão e de grande beleza estética, já
35

foi muita utilizada para fins de exportação, mas pela formação cristalina intrínseca que lhes
confere a facilidade da produção de paralelepípedos por meios artesanais com fins menos
nobres como base de pavimentação de estradas, estas pedras se tornaram alvo fácil para a sua
extração mineral. Segundo Vergne e Marques (passim), as demandas de empresas que se
estabeleceram na região, sobretudo a CHESF, através das empresas subcontratadas, serviram
de impulso para a mineração das referidas pedras no contexto da pressão econômica
desenvolvimentista que atravessava o Brasil desde a era Vargas.

Figura 7: Sítio 41- CAAPA – Quebrador de pedras junto a um amontoado de rachões (fragmentos de pedras)
onde existia um matacão7 de granito com pinturas rupestres. Foto editada com mosaico: frankalsaber.

Os quebradores de pedras aparecem dentro deste contexto histórico. Primeiro impulsionados à


mudança de atividade econômica pela promessa esperançosa de dias melhores, através de

7 Matacão: s.m.Geol. - Também conhecido por seu nome em inglês Boulder, são grandes blocos arredondados,
diâmetro maior que 256 mm, produzidos pelo processo de intemperismo químico, conhecido como esfoliação
esferoidal ou pelo desgaste de blocos arrastados por correntes fluviais. Em geral os matacões formados por
erosão fluvial são menores dos que os formados pelo intemperismo químico, além de serem encontrados em
ambientes de sedimentação, longe de sua área fonte, ao passo que os matacões formados por esfoliação
esferoidal são autóctones, tendo sofrido pouco transporte, estando mais sujeito á ação da gravidade e do
rastejamento (creeping) do solo onde se formou. Fonte:
http://www.dicionario.pro.br/dicionario/index.php/Matacão
36

maiores ganhos financeiros que suplantariam as atividades tradicionais ali existentes, como a
criação de caprinos, a agricultura e a pesca (VERGNE e MARQUES, 2009). O interesse
econômico da mineração de pedras no Rio do Sal foi sustentado por uma ideologia capitalista
que sobrevive até os dias de hoje, e que se expressa nas idéias de desvalorização da paisagem
natural e das atividades tradicionais, na promessa de ganhos mais fáceis, na desconstrução
cultural, na projeção de cenários lúgubres e de terror, e, sobretudo, na falta de criatividade
política para concepção de alternativas sócio-econômicas.

O interesse científico pelo patrimônio histórico das pinturas rupestres (Figura 8 e Figura 9) se
tornou a principal bandeira de investida dos ambientalistas para a preservação do patrimônio
natural. Mas foi a ação dos órgãos de defesa do meio ambiente e a pressão da comunidade
científica que bastou a mineração do Rio do Sal e de toda a região do Complexo
Arqueológico, atirando os quebradores de pedras num equivocado dilema que confronta
sobrevivência e ciência. Tal equívoco ainda reveste a alma dos quebradores de pedras e suas
famílias, e paira como uma das principais ameaças às ações transformadoras até então
propostas.

Figura 8: Sítio 98 – figura antropomorfa escolhida Figura 9: Sítio 23 – CAAPA – Pintura rupestre com
como símbolo do CAAPA – foto editada contraste: ponteiro de aço encravado. Foto: frankalsaber.
frankalsaber

4.2 O SENTIDO DA PRÉ-HISTÓRIA NO CONTEXTO

Na antiguidade primitiva da humanidade, a forma de explorar os recursos naturais estava,


sobremaneira, relacionada com a visão mítica que mulheres e homens tinham da natureza.
Neste sentido, de acordo com Drew (passim), o homem primitivo atribuía os fenômenos
37

naturais e até mesmo a própria natureza às divindades, “(...) e, portanto, ela devia ser temida,
respeitada e aplacada” (DREW, 2002). Com o aparecimento da civilização ocidental, a visão
mítica se transformou, mas guardou a sua essência.

Sobreveio a filosofia e o pensamento humano revalorizou a forma mítica pura do olhar sobre
a natureza. Os pensadores acrescentaram novas bases e novos significados racionais para a
interpretação dos fenômenos naturais. Mas não se trata somente de um olhar sobre o
ambiente, é também um sentir, e é também subjetividade. Neste universo particular da
antiguidade, outros fatores determinaram a inter-relação humano/natureza, conforme nos diz
Aristóteles (1985), valores como a felicidade e a riqueza possuíam outros significados
distintos dos nossos valores contemporâneos. A felicidade podia ser alcançada por meio de
coisas muito mais simples nas relações sociais e no acesso limitado de recursos naturais que
lhes garantisse a sobrevivência. Não fazia sentido nem fazia parte dos anseios das mulheres e
homens primitivos as idéias de acumulação de riqueza e de conquista de coisas supérfluas.

Mas para autores como Morin e Kern (2001), “a pré-história não se extinguiu, foi
exterminada”. As mulheres e homens criadores da cultura e da sociedade humana foram
vitimados por um genocídio8 peremptório de transformação sociológica, causado pelos seus
próprios descendentes que progrediram, fenômeno comparado a um parricídio9.

Os senhores dos exércitos na expressão dos todos poderosos deuses sedentos de sangue, e
suas conseqüências terríficas genocidas é o marco do aparecimento da história. Quantas idéias
que interrogam os mistérios do mundo não foram perdidas?

Morin e Kern (ibidem) nos ajudam a compreender o sentido da pré-história na história dos
quebradores de pedras do Rio do Sal, pois estas idéias nos fazem refletir sobre o mesmo
destino trágico dos registros rupestres, mesmo que aqui o contexto seja outro, do qual não
temos nenhum motivo para imputá-los quaisquer dolos, mas fica valendo o significado que a
alma do povo primitivo continua a ser consumida pelos nossos modos ditos civilizados.

8
Genocídio (por vezes designado por limpeza étnica, embora esta última designação tenha vindo a ser preterida
devido à conotação positiva da palavra "limpeza") tem sido definido como sendo o assassinato deliberado de
pessoas motivado por diferenças étnicas, nacionais, raciais, religiosas e (por vezes) políticas. Há algum
desacordo, entre os diversos autores, quanto ao facto de se designar ou não como genocídio os assassinatos em
massa por motivos políticos. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Genocídio.
9
O parricídio consiste no ato de uma pessoa matar seu próprio pai. Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Parricídio.
38

4.3 GEOGRAFIA CULTURAL E SABERES AMBIENTAIS

O presente trabalho, também está fundamentado na Geografia Cultural Humanística, no


sentido de descrever e interpretar a geograficidade e os saberes ambientais da comunidade dos
quebradores de pedras do Rio do Sal. O olhar clínico da ecopedagogia, sobre a geograficidade
socioambiental desta comunidade, através da interpretação das suas grandezas quantitativas e
elucidação dos seus significados qualitativos, através da metodologia que aqui propomos, nos
acendeu muitas luzes, que servirão de grande ajuda para a construção de saberes destinados a
comunidade acadêmica em toda instância. Ao mesmo tempo, tal como menciona Santos
(2008), a finalidade da produção desse saber se identificou com a dinâmica social, e o desafio
do saber se insere no contexto das necessidades das comunidades, podendo ser traduzida em
resposta positiva para as pessoas do local estudado.

A partir da análise da literatura disponível, pude a priori verificar que o discurso das
instituições públicas relacionado com o Complexo Arqueológico de Paulo Afonso está
revestido de um caráter cidadão, porém se desvenda essencialmente ideológico no sentido
marxista do termo, ou seja, de falseamento da realidade. Também, a pressa com que esta
academia, por nobríssimos motivos, publicou as suas observações sobre a realidade daquelas
referidas comunidades, sobretudo as que se referem aos quebradores de pedras, fez com que
em muitos momentos se dispensasse propositalmente o rigor técnico-científico, VERGNE &
MARQUES (2009, p.7) assim deixando este espaço para o aprofundamento deste
conhecimento específico.

A Geografia Cultural Humanística se estende a um saber ético-social, possibilita a


comunidade tecer sua auto-crítica a partir de um saber emancipador, construindo sujeitos
capazes de julgar a realidade na acepção do pensamento freireano. Neste sentido, o saber
motiva o despertar à política quando promove a superação do silêncio do dominado,
tornando-o sujeito das lutas pela transformação social. Assim, na visão de Severino (2008) a
universidade se apresenta como um dos principais caminhos na construção destes saberes os
quais se destinam a prestar serviço à sociedade no contexto da qual ela encontra estabelecida.
(SEVERINO, 2008).

Milton Santos (1997) reforça esta idéia de que não se pode sair da realidade que desafia o
saber local das comunidades e que abrange diferentes âmbitos sócio-econômico-ambientais e
da política. Diz Santos (ibidem) que “o saber tem conseqüências concretas na sociedade” que
passa a exigir mudanças até mesmo da metodologia científica para que esta passe a dá conta
39

do problema das culturas e os seus múltiplos contextos onde elas são construídas. Assim se
põe a geograficidade socioambiental como um destes grandes esforços da academia no
cumprimento da sua missão social.

Ainda segundo Milton Santos (ibidem), a geograficidade induz uma análise geográfica numa
dimensão da existência, pois aproxima o estudo geográfico do mundo vivido. Amparando
ainda mais este pensamento, Relph (1979) diz que através do conceito de geograficidade, o
lugar encerra todas as respostas e experiências que temos de ambientes na qual vivem as
comunidades como espaço de existência e coexistência, através da leitura das necessidades
existenciais, dentre elas: meio-ambiente, localização, posição, mobilidade, interação com o
meio e as outras pessoas, etc.

Para conhecer a geograficidade sócio-ambiental, a percepção e os saberes ambientais


tradicionais da comunidade de quebradores de pedras do Rio do Sal, ainda encontrei apoio
teórico na obra de Dardel (1990). Diz este autor que a

“geograficidade refere-se às várias maneiras pelas quais


sentimos e conhecemos ambientes em todas suas formas, refere-
se ao relacionamento com os espaços e as paisagens,
construídas e naturais, que são as bases e recursos das
habilidades do homem e para os quais há uma fixação
existencial” (DARDEL, 1990).

Faz-se necessária esta base teórica, entre tantos outros argumentos de Milton Santos (1982 e
1997) impossíveis de situar aqui neste espaço tão breve, para elucidar a complexidade dos
saberes sócio-ambientais da comunidade estudada a fim de desvelar e expressar os seus níveis
de abstração diferenciados e as possibilidades operacionais relacionadas com estes saberes.
Para Milton Santos (1982) "o espaço é acumulação desigual de tempos", por isso, para captar
e analisar as essências dos saberes ambientais locais da referida comunidade, temos que
conceber espaço como heranças desta comunidade. O mesmo Milton Santos (1997) vai se
referir a estes saberes ambientais locais como efeito de diferentes ritmos e coexistências
nestes lugares, os quais co-relacionam diversas configurações de coexistir, da cultura material
e resultando num complexo espaço geográfico rico de heranças e de novas possibilidades.

Dentre tantos outros autores consultados, escolhi a visão de Leff (2006) para ancorar a
investigação deste TCC no viés sócio-ambiental. Segundo Leff (ibidem) o ambiente pode ser
definido como uma "visão das relações complexas e sinérgicas gerada pela articulação dos
processos de ordem física, biológica, termodinâmica, econômica, política e cultural". De
40

acordo com este pensamento, o sentido do habitat é ressignificado como suporte ecológico e
do habitar como forma de inscrição da cultura no espaço geográfico. Ainda segundo Leff
(ibidem), para compreender a complexidade destas relações que envolvem o mundo natural e
o humano “(…) seria necessário elaborar formas de avaliação qualitativa dos métodos da
complexidade da ciência pós-normal, desobrigando-a dos princípios da ciência positiva”
(LEFF, 2006). Por isso a teoria de Henrique Leff foi deveras significativa em nossa jornada
para ajudar a interpretar as diversas leituras que demandam desta pesquisa.

4.4 O OFÍCIO DE QUEBRADOR DE PEDRAS

Segundo Childe (1966) A quebra de pedras foi certamente uma das mais antigas atividades do
gênero humano (Figura 10 e Figura 11), esta remota atividade ocorreu no período
denominado de “idade da pedra10”. A paleontologia em geral, afirma que este período
começou na África há mais de 2,5 milhões de anos, com a aparição da primeira ferramenta
humana (ou pré-humana) de pedra lascada. A habilidade de cortar pedras até mesmo inspirou
o nome da espécie Homo habilis11 cujo nome significa "homem habilidoso".

Figura 10: Quebrador de pedras trabalhando próximo Figura 11: Pilha de paralelepípedos. Foto:
do Sítio 41 - CAAPA. Foto: frankalsaber frankalsaber

10
A Idade da Pedra é o período da Pré-História durante o qual, os seres humanos criaram ferramentas de pedra,
sendo a tecnologia mais avançada naquele então. A madeira, os ossos e outros materiais também foram
utilizados (cornos, cestos, cordas, couro...), mas a pedra (e, em particular, diversas rochas de rotura conchóide,
como o sílex, o quartzo, o quartzito, a obsidiana...) foi utilizada para fabricar ferramentas e armas, de corte ou
percussão. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Idade_da_Pedra#cite_ref-0.
11
Homo habilis é uma espécie de hominídeo que viveu no princípio do Plistocénico (1,5 a 2 milhões de anos).
Foi o primeiro a construir e utilizar ferramentas de pedra lascada, o que lhe valeu o nome específico: habilis, o
habilidoso . Suas ferramentas eram feitas de ossos, madeira, e principalmente a pedra (lascada). Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Homo_habilis.
41

Os principais escritos sacros do mundo ocidental tem exemplos da atividade de quebrador de


pedras. Recortei os seguintes exemplos da Tanach12 judaica:

“Depois disse o Senhor a Moisés: Eis que eu tenho chamado por


nome a Bezalel, filho de Uri, filho de Hur, da tribo de Judá, e o
enchi do espírito de Deus, no tocante à sabedoria, ao
entendimento, à ciência e a todo ofício, para inventar obras
artísticas, e trabalhar em ouro, em prata e em bronze, e em
lavramento de pedras para engastar, e em entalhadura de
madeira, enfim para trabalhar em todo ofício”. (Êxodo, 31: 1-5)

“Por ordem do rei eles cortaram grandes pedras, de grande


preço, para fundarem a casa em pedras lavradas. [...] E
edificava-se a casa com pedras lavradas na pedreira”. (I
Reis,5:17 e 6:7). Grifos meus.

Também na tradição islâmica encontramos diversos contos e em que o ofício de quebrador de


pedras é ressaltado como estes que se seguem:

“Disse-lhe o Profeta Mohammad “Quem deixou suas mãos


assim?” Ele lhe respondeu: “Ó, Profeta de Alah, eu trabalho
como quebrador de pedras com uma marreta e uma pá para
sustentar minha família”. Então, o Profeta beijou a sua mão e
lhe disse: “Esta mão jamais será queimada pelo fogo.” (Fonte:
PRINCÍPIOS ISLÂMICOS - Instituto Brasileiro de Estudos
Islâmicos. 1http://www.ibeipr.com.br/discursos.php?id_discurso=37.)

E entalhais habilmente casas (de pedras) nas montanhas. Temei,


pois, a Alah, e obedecei-me! (25ª Surata "Al Furcan13": 149-
150). Grifos meus.

As sociedades orientais também preservaram nas suas tradições, um pouco da história e


contos que homenageiam os quebradores de pedras. Exemplo disso vemos a seguir num trecho
retirado do livro “Três Fábulas Budistas para Crianças” de Bruno Pacheco.

12
Tanakh ou Tanach (em hebraico ‫ )ך״נת‬é um acrônimo utilizado dentro do judaísmo para denominar seu
conjunto principal de livros sagrados, sendo o mais próximo do que se pode chamar de uma Bíblia Judaica.
13
25ª Surata do Al Corão "Al Furcan” significa “O DISCERNIMENTO”.
42

O quebrador de pedras

Era uma vez um simples quebrador de pedras que estava insatisfeito consigo mesmo e com
sua posição na vida.

Um dia ele passou em frente a uma rica casa de um comerciante. Através do portal aberto,
ele viu muitos objetos valiosos e luxuosos e importantes figuras que freqüentavam a mansão.
"Quão poderoso é este mercador!" pensou o quebrador de pedras.

Ele ficou muito invejoso disso e desejou que ele pudesse ser como o comerciante. Para sua
grande surpresa ele repentinamente tornou-se o comerciante, usufruindo mais luxos e poder
do que ele jamais tinha imaginado, embora fosse invejado e detestado por todos aqueles
menos poderosos e ricos do que ele.

Um dia um alto oficial do governo passou à sua frente na rua, carregado em uma liteira de
seda, acompanhado por submissos atendentes e escoltado por soldados, que batiam gongos
para afastar a plebe. Todos, não importa quão ricos, tinham que se curvar à sua passagem.

"Quão poderoso é este oficial!" ele pensou. "Gostaria de poder ser um alto oficial!” Então
ele tornou-se o alto oficial, carregado em sua liteira de seda para qualquer lugar que fosse
temido e odiado pelas pessoas à sua volta.

Era um dia de verão quente, e o oficial sentiu-se muito desconfortável na suada liteira de
seda. Ele olhou para o Sol. Este fulgia orgulhoso no céu, indiferente pela sua reles presença
abaixo.

"Quão poderoso é o Sol!" ele pensou. "Gostaria de ser o Sol!” Então ele tornou-se o Sol.
Brilhando ferozmente, lançando seus raios para a terra sobre tudo e todos, crestando os
campos, amaldiçoado pelos fazendeiros e trabalhadores. Mas um dia uma gigantesca nuvem
negra ficou entre ele e a terra, e seu calor não mais pôde alcançar o chão e tudo sobre ele.

"Quão poderosa é a nuvem de tempestade!" ele pensou "Gostaria de ser uma nuvem!” Então
ele tornou-se a nuvem, inundando com chuva campos e vilas, causando temor a todos. Mas
repentinamente ele percebeu que estava sendo empurrado para longe com uma força
descomunal, e soube que era o vento que fazia isso.

"Quão poderoso é o Vento!" ele pensou. "Gostaria de ser o vento!” Então ele tornou-se o
vento de furacão, soprando as telhas dos telhados das casas, desenraizando árvores, temido
e odiado por todas as criaturas na terra. Mas em determinado momento ele encontrou algo
que ele não foi capaz de mover nem um milímetro, não importasse o quanto ele soprasse em
sua volta, lançando-lhe rajadas de ar. Ele viu que o objeto era uma grande e alta rocha.

"Quão poderosa é a rocha!" ele pensou."Gostaria de ser uma rocha!"Então ele tornou-se a
rocha. Mais poderoso do que qualquer outra coisa na terra, eterno, inamovível. Mas
enquanto ele estava lá, orgulhoso pela sua força, ele ouviu o som de um martelo batendo em
um cinzel sobre uma dura superfície, e sentiu a si mesmo sendo despedaçado. "O que
poderia ser mais poderoso do que uma rocha?!?" pensou surpreso.

Então ele olhou para baixo e viu a figura de um quebrador de pedras.

(Fábula Budista de Autor desconhecido)


43

4.5 AS TEORIAS DA COMPLEXIDADE

4.5.1 Do monismo ontológico à razão dialética

O ser é a negação do conhecer e conhecer chega a ser pela


negação do ser (Sartre, 2002).

A nossa análise investigatória deste TCC, no sentido de conhecer as essências da percepção e


dos saberes ambientais dos quebradores de pedras do Rio do Sal, para ser mais completa e
com profundidade teórica capaz de elucidar as questões levantadas durante a pesquisa, não
poderia deixar de passar pelas considerações e fundamentos da razão dialética que entrelaça o
monismo ontológico e holismo ecológico. Já que neste nosso trabalho, a compreensão
buscada passa pela análise das vivências e relações sócio-ambientais. Neste intento
encontramos forte densidade teórica nas idéias de Bookchin, Foucault, Leff e Sartre.

Segundo Leff (2006) o monismo apareceu com o propósito de estabelecer um campo teórico
unificado para compreender o processo evolutivo e o funcionamento da natureza. As
conclusões de Leff são inspiradas nas teorias de Bookchin, que busca fundar a “ecologia
social” em um “monismo ontológico”. Nesta linha teórica, as categorias da natureza e do ser,
segundo Bookchin apud Leff, “o natural, o cultural e o social perdem sua especificidade
ontológica e epistemológica”, assim a “natureza da natureza” se confunde com as formas do
ser.

O que estes autores querem dizer especificamente é que o “humano” deve ser compreendido
como natural, ao contrário do que diz a tese marxista que considera que existe uma dicotomia
entre o mundo natural e o humano. Para Bookchin in Leff as produções humanas como o
pensamento, a cultura e a história devem ser vistos como uma espécie de "segunda natureza",
esta derivada organicamente da primeira natureza, e que ambas coexistem dialeticamente.
Porém Leff critica a teoria naturalista de Bookchin entendendo que ela não pode apreender o
"ponto de inflexão" onde a cultura emerge da natureza, considerando irredutível a diferença
entre o “Ente” real e o “Ser” simbólico.

Entretanto o pensamento de Leff e de Bookchin também encontra pontos de concordâncias


teóricas com relação à teoria dialética da natureza, tal como esta idéia de repelir a
“racionalidade científica que aprecia a realidade social como uma codificação de dados”, sem
ponderar que estes são a “objetivação de uma determinada visão do mundo, uma construção
44

social do real”. Estes pensamentos de Leff e de Bookchin se tornam ainda mais precisos
quando comparamos às idéias de Sartre sobre o monismo e a dialética.

A crítica de Sartre ao monismo ontológico e ao naturalismo dialético aparece em sua “Crítica


da razão dialética”, este pensador fala que “o caráter crítico da razão dialética é a forma de
pensamento que torna inteligível a ação humana no contexto da história”. Mas avalia que a
própria dialética do materialismo histórico não se auto-situa dentro do contexto histórico,
indagando pelas vias que consentem a esta forma de pensamento abranger o "histórico real".
Eis o seu traço paradoxal14 de “ser ao mesmo tempo a única verdade da história e uma total
indeterminação da verdade”. (Sartre, 2002).

Esse paradoxo do pensamento dialético é particularmente pertinente na nossa análise deste


TCC, pois nos permite ponderar sobre as contradições dos sujeitos pesquisados, diante do
questionamento deste status teórico e de seu sentido praxiológico15. No nosso caso, a análise
dialética da realidade dos quebradores de pedras, passa pela expressão do que é o universo
total daquela realidade, não se limita a orientar a investigação, nem a prejulgar as formas de
aparição dos objetos e ao mesmo tempo, o movimento do real e o do nosso pensamento. Neste
sentido analítico, o mundo dos quebradores de pedras é visto além de um método e um saber
sobre o movimento no objeto, ou seja, uma análise que considera a abrangência sistêmica e
holística das suas representações.

Ainda encontramos um promissor reforço nesta base teórica no pensamento de Michel


Foucault, achado numa entrevista deste autor que foi publicada com o título de L'homme est-il
mort? [O homem está morto?]. Na oportunidade Foucault apresenta preocupações com a
perigosa tentação da razão analítica do século XVII que era caracterizada essencialmente por
sua referência à natureza. Foucault destaca a razão dialética, por esta ter se desenvolvido
especialmente em referência à existência, ou seja, ao problema das “relações do indivíduo à
sociedade, da consciência à história, da práxis à vida, do sentido ao sem sentido, do vivo ao
inerte”. Tal base teórica aplicada às nossas análises, sem dúvida eleva a nossa compreensão
integral dos sujeitos objeto deste trabalho.

14
Um paradoxo é uma declaração aparentemente verdadeira que leva a uma contradição lógica, ou a uma
situação que contradiz a intuição comum. Em termos simples, um paradoxo é "o oposto do que alguém pensa ser
a verdade". Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Paradoxo
15
Relativo às ações e conduta humanas. Fonte: http://www.dicio.com.br/praxiologico/
45

4.5.2 A Visão Sistêmica, o Holismo e a Complexidade

Neste TCC entendemos a priori que a compreensão da complexidade estudada deve ser
analisada à luz da Visão Sistêmica como forma de superação do cartesianismo. Para apoiar
este intento encontrei fundamento na obra de Capra (1982): “As Conexões Ocultas”, o qual
nos ensina que

“o reconhecimento da natureza não-linear de toda a dinâmica


de sistemas é a própria essência da consciência ecológica, a
essência da “sabedoria sistêmica” [...]. A sabedoria sistêmica
baseia-se num profundo respeito pela sabedoria da natureza, a
qual é totalmente compatível com os insights da ecologia
moderna” (CAPRA, 1982).

A visão sistêmica permite que possamos compreender o mundo natural como algo em que
tudo está relacionado a tudo numa teia que reúne toda a complexidade cósmica. Diz Capra: “o
Homo sapiens que às vezes se comporta como „Homo demens’” precisa construir a
consciência de que há uma densa interdependência entre os mundos: biológico, físico-químico
e o social. A ação antrópica exerce grande poder transformador através das suas concepções
culturais, e transforma radicalmente os sistemas naturais sem respeitar as suas peculiaridades
e dinâmicas intrínsecas que podem resultar em danos irreversíveis e irrecuperáveis. Capra
afirma que esta ação “pode acarretar um colapso na dinâmica planetária” (CAPRA, 1982).

O que faz esta compreensão ampla de ser humano e natureza é a visão holística. Smuts (1926)
considera que “o holismo é o Fator fundamental pela origem e o progresso de conjunto no
Universo. O todo não é mera soma das partes, mas delas depende. As partes compõem o todo,
mas “é o todo que determina o comportamento das partes”. Através do entendimento
sistêmico, tudo aflui para uma “sabedoria sistêmica”. Esta visão, que está aberta a qualquer
área do conhecimento, passa proporcionar extraordinárias oportunidades para a criatividade, a
iniciativa e o espírito empreendedor da humanidade.

Apesar de aparentemente inatingível, a complexidade da visão holística não deve inviabilizar


a ação correta do ser humano, pois este, somente veio a sofrer os malefícios das ações
antrópicas muito recentemente na história da humanidade, o que denota muita capacidade de
sobrevivência. Na verdade, o conceito de complexidade está mais ligado à maneira de como
percebemos o mundo em seus diversos aspectos e os vários desafios que o movimentam e se
inter-relacionam designando consecutivamente novos contextos, e não como sinônimo de
complicado, obscuro e incognoscível. Por isso o conhecimento sistêmico não pode ser
46

negligenciado, a exatidão com os conceitos e a transparência ao problematizar as questões


ambientais, sobretudo aquelas com graves conseqüências econômicas e políticas, é uma das
medidas mais importantes de coerência dessa nossa complexa análise sobre a percepção e
saberes ambientais dos quebradores de pedras do Rio do Sal. E esta não é uma empreitada
estéril, também não é neutra, pois afrontamos os atuais cenários nebulosos, não em função da
falta de ciência, pois esta até transborda, mas em decorrência das diversas e conflitantes
opções ideológicas que permeiam as relações sociais e a subjetividade humana presente nos
sujeitos estudados.

Esta articulação sistêmica e inter-relacional do social e do humano nós encontramos nas três
ecologias de Guattari (2001). Segundo este autor, somente uma articulação ético-política entre
“o meio-ambiente, as relações sociais e a subjetividade humana” é que poderia esclarecer com
profundidade as questões que analisamos neste trabalho. A esta conexão entre as três
ecologias dá-se o nome de “ecosofia”.
47

5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para dar conta de modo objetivo e preciso da complexidade deste trabalho monográfico,
adotei a sugestão atualíssima de roteiro elaborada por Creswell (2007) cuja estrutura de dados
do projeto de pesquisa é o mais apropriado para os paradigmas de pesquisa propostos abaixo.
Com relação à metodologia mais apropriada para esta pesquisa, dentre os vários autores
consultados, optei por alguns que sintetizavam aquilo que considerei o foco das metas a serem
alcançadas ao longo dos estudos e coleta de dados e que constam da relação de referências
bibliográficas expostas no final deste texto.

5.1 SOBRE A DELIMITAÇÃO DA ÁREA PESQUISADA

A nossa pesquisa se deu no âmbito restrito da comunidade dos quebradores de pedras residentes
no povoado Rio do Sal, muito embora o alcance das observações extrapolasse a área urbana do
referido povoado para as antigas áreas de mineração que rodeia o mesmo povoado e também
nas margens próximas a Estrada da Mão Direita. A título de observação também foram
visitados os sítios: 23, 28, 41 e 98 – Cadastramento do CAAPA. (VERGNE & MARQUES,
2009).

5.2 SOBRE A CARACTERIZAÇÃO DO OBJETO DE PESQUISA

O objeto de pesquisa deste TCC é o quebrador de pedras. Segundo diagnóstico realizado pela
ONG AGENDHA, CAAPA – UNEB e DMA em 2007: A comunidade de quebradores de
pedras do Rio do Sal é composta por 56 famílias; As pessoas destas comunidades moram em
casas sem saneamento básico nem coleta de lixo; Apesar de morarem nas margens do São
Francisco, cinco destas famílias sequer tem acesso à água encanada; 87% são analfabetos ou
não concluíram a 4ª série do ensino fundamental; e o trabalho sempre foi realizado sem nenhum
amparo do Ministério do Trabalho e onde quase 60% dos quebradores já sofreram acidentes
graves e até mutilações.

Foram realizadas visitas ao povoado do Rio do Sal, onde os sujeitos selecionados desta
pesquisa, compreendendo 16 pessoas sendo, 11 quebradores de pedras e 5 mulheres
familiares, com faixa etária entre 21 e 69 anos, foram entrevistados e responderam a
48

questionários semi-estruturados SEVERINO (2008). O critério de seleção obedeceu às


técnicas para a coleta dos dados vistas abaixo no item 3.5.

5.3 SOBRE A CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA QUALITATIVA

5.3.1 Paradigma de Pesquisa Qualitativa

Este estudo eco-pedagógico sobre a percepção e os saberes ambientais dos quebradores de


pedras da comunidade rio do sal foi caracterizado como pesquisa qualitativa, pois se enquadra
nas peculiaridades desse tipo, tal como descritas por LÜDKE e ANDRÉ (1986) e
reconsideradas por BOGDAN e BIKLEN (1994). Para reafirmar esta categoria recorri
principalmente à obra clássica e ao mesmo tempo atualíssima de Severino (2008), que ressalta
o paradigma epistemológico da investigação na área de Ciências Humanas e a distingue de
uma investigação na Área de Ciências Naturais representado pelo “positivismo comteano”. A
tabela abaixo sintetiza bem a caracterização de Severino.

Paradigmas Epistemológicos da Pesquisa

Componente Qualitativa Quantitativa

Hipótese Indutiva Dedutiva

Amostra Intencional, Pequena Aleatória, Grande

Ambiente Mundo Real Laboratório

Coleta de dados O pesquisador Os instrumentos

Delineamento Flexível Inflexível

Análise de dados Interpretativa Estatística

Tabela 1: Caracterização dos paradigmas da pesquisa

A metodologia mais apropriada à investigação neste trabalho foi a pesquisa qualitativa com
objetivo exploratório. Dessa forma pudemos elucidar um riquíssimo universo de percepções,
significados, aspirações, crenças, valores e atitudes, relacionados à percepção e aos saberes
ambientais dos quebradores de pedras da área pesquisada, segundo encontramos definido na
obra de Deslandes (1994). Dessa ótica, a pesquisa qualitativa viabiliza a investigação como
fonte direta de dados no ambiente natural como afirmado por Dias e Manem in Deslandes
(ibidem), o que corresponde a um ambiente mais profundo das relações, dos fenômenos e dos
49

processos inter-relacionais que não podem ser restringidos à operacionalização de variáveis


numéricas. Ainda segundo Dias e Manem apud Deslandes (ibidem), a pesquisa qualitativa é
uma pesquisa descritiva e de caráter interpretativo na qual o investigantes se interessam mais
pelos procedimentos do que pelos resultados, questionam os dados de maneira indutiva e
privilegiam o significado. No segmento proposto delimitado e focal de relações sociais da
comunidade de quebradores de pedras do Rio do Sal inserida no Complexo Arqueológico de
Paulo Afonso.

Foram utilizadas na pesquisa atividades interpretativas para quais não há privilégios ou


valorizações de uma sobre outras. Dessa forma, é perfeitamente previsível que dentro do
conjunto de prática, apareçam as possíveis constantes tensões e contradições antevistas nos
métodos e interpretações utilizados (DENZIN, LINCOLN, 2006; MINAYO, 2008). Segundo
Severino (2008) foi também uma pesquisa “Dialética”, eis que se baseia em pressupostos
relacionados à condição humana e as condutas das mulheres & homens. Foi, pois sim,
dialética por estar ligada à "investigação antropológica", em decorrência da ligação com
realidade da existência humana.

Diante da classificação apresentada no quadro acima (

Tabela 1), SEVERINO (ibidem) e também por Lakatos e Marconi (2007), a abordagem de
método indutivo pode ser empregada neste TCC, por ser a mais adequada para dar cabo das
peculiaridades da pesquisa. O método utilizado foi o comparativo, já que se refere à
investigação de uma comunidade vivendo em ambientes diversificados, examinando as suas
semelhanças e diferenças, neste caso comparando-se comunidades “com” & “sem” gestão
ambiental sustentável por exemplo.

5.3.2 Pesquisa etnográfica

Esta pesquisa monográfica é também etnográfica porque presa pela importância de que os
sujeitos sejam observados em seu ambiente natural. Tal confiança se ampara no pensamento
de Triviños (1987) no qual se acredita que a “mudança de ambiente tem o poder de interferir
no padrão do comportamento dos indivíduos”. (TRIVIÑOS, 1987). Investiga-se por meio da
etnografia entender a extensão dos significados culturais nas suas ações e manifestações
dentro de um determinado contexto sócio-ambiental. A aplicação deste método nesta pesquisa
filtrou alguns objetivos conforme definidos por Lüdke (1986): interpretar, perceber o que
ocorre no objeto pesquisado, ilustrar as perspectivas dos participantes, e, conhecer a realidade
50

socioambiental no trabalho de construção teórica,e neste caso transcendendo o micro mundo,


acompanhando os diversos fios que o vincula às estruturas macrossociais. Neste sentido, na
nossa pesquisa buscou-se desvendar todos os pormenores presentes na situação estudada e dar
significado aos dados recolhidos por meio da metodologia de coleta de dados.

5.4 SOBRE O CARÁTER DE ESTUDO EXPLORATÓRIO

Este TCC se caracteriza como um estudo exploratório, pois, buscou levantar informações,
delimitar o campo de trabalho, mapear as condições de manifestações do objeto da pesquisa
SEVERINO (2008), GIL (1996), desse modo a pesquisa exploratória pode proporcionar maior
familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais claro, através da descoberta de
intuições e do aprimoramento de idéias.

5.5 SOBRE AS TÉCNICAS PARA A COLETA DOS DADOS

A coleta dos dados foi de minha inteira responsabilidade e ocorreu no período de março de
2007 a janeiro 2010 (Figura 12). As técnicas e instrumentos utilizados no trabalho de campo
com fins de coletar dados para cumprir com os objetivos da pesquisa foram as seguintes:
observação, entrevista, questionário, fotografia, gravação de áudio e filmagem. Quanto à
amostragem, dado o seu caráter exploratório de pesquisa qualitativa deste TCC, abordaram-se
pequenos grupos de entrevistados. Os sujeitos foram envolvidos de modo intencional
conforme roteiro prévio em que se considerou a diversidade ocupacional do grupo.

Figura 12: Linha do Tempo da pesquisa (coleta de dados) – Ilustração: frankalsaber


51

5.5.1 Do Questionário

Nesta pesquisa, alguns dados objetivos foram coletados por meio de um questionário
estruturado com perguntas claras e objetivas, contendo “questões, sistematicamente
articuladas, que se destinaram a levantar informações escritas por parte dos sujeitos
pesquisados, de forma a conhecer a opinião dos mesmos sobre os assuntos em questão.”
SEVERINO (2008).

5.5.2 Da Entrevista

As informações desta pesquisa qualitativa foram coletadas por meio de um gravador de áudio
no formato mp3. Os depoimentos dos participantes foram gravados e posteriormente
analisados com base no método de análise documental e de conteúdo do item 4.5. De acordo
com a técnica de entrevista diretiva de Severino (2008), coletamos informações, por meio dos
sujeitos entrevistados, sobre os assuntos afins, visando apreender o que os sujeitos pensam,
sabem, representam, fazem, argumentam acerca dos assuntos relacionados com o tema deste
trabalho. SEVERINO (2008).

5.5.3 Da identidade dos entrevistados

A identidade dos sujeitos entrevistados foi preservada, pois neste propósito específico,
buscou-se, através da oralidade, uma compreensão da dimensão social da comunidade
estudada, expressa na história de vida dos sujeitos que integram a pesquisa. (SEVERINO,
2008). Os nomes que aparecem são fictícios e ligados á realidade a ser conhecida. Ex.: Seo
Pedro, Seo Pedreira, Seo Rocha, Dona Jurema, etc.

5.5.4 Da observação

Parte dos dados coletados nesta pesquisa foi obtida através da observação. No intuito de
definir bem a melhor metodologia de observação, recorri aos autores Danton (2002) e
Severino (2008). Primeiro foi preciso diferenciar a Observação Sistemática da Observação
Participante: A Observação Sistemática é mais adequadamente utilizada nas Técnicas
Quantitativas, onde o observador, equipado com câmaras e/ou uma listagem de
comportamentos, registra as ocorrências dos objetos pesquisados durante um período de
tempo (DANTON, 2002); Já Observação Participante foi entendida como a mais adequada
52

para a nossa pesquisa por se adequar melhor as Técnicas Qualitativas. Para Danton (ibidem) e
Severino (ibidem), a Observação Participante é arranjada por meio do contato direto do
pesquisador com o fenômeno/objeto observado. Através desta técnica, procura-se
compreender o sentido e os significados que os atores atribuem aos fatos.

Foi alinhando o nosso trabalho com estas idéias de Danton e Severino que encontramos os
caminhos para registrar os fenômenos relacionados com os quebradores de pedras, tanto
pautados nos comportamentos e gestuais dos sujeitos quanto das suas interações com o meio
em que vivem.

5.6 SOBRE A PESQUISA BIBLIOGRÁFICA

Conforme dizem Cervo e Bervian (1983) a pesquisa bibliográfica “busca conhecer e analisar
as contribuições culturais ou cientificas do passado, existentes sobre um determinado tema ou
problema.” Neste caso, busquei as fontes de pesquisas já existentes com referência ao
complexo Arqueológico de Paulo Afonso, principalmente aquelas que foram realizadas por
Marques e Vergne. Esse procedimento teve como finalidade fundamentar e/ou comparar o
trabalho aqui proposto com os dados e categorias já trabalhados por estes pesquisadores
SEVERINO (2008). Também, utilizei-me das fontes de pesquisa que realizei junto com a
ONG AGENDHA desde o ano de 2007, ano em que conheci mais profundamente a
comunidade dos quebradores de pedras.

Segundo Gil (2007) a pesquisa bibliográfica tem sua ampla utilização nas ciências sociais por
ser eficiente no “estudo comparativo de grandes agrupamentos sociais, separados pelo espaço
e pelo tempo” GIL (2007). Nesta especificidade de TCC, Gil (ibidem) afirma que o método da
pesquisa bibliográfica oferece larga vantagem sobre outros métodos quando permite ao
investigador a “cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que poderia
pesquisar diretamente”. Qual vantagem se fortalece em vista dos cenários socioambientais
que envolvem as comunidades do Complexo Arqueológico de Paulo Afonso, com previsão de
concatenação de dados muito dispersos pelo espaço dadas as condições ambientais da área a
ser pesquisada. Para a compreensão dos assuntos correlatos: meio-ambiente, ecopedagogia,
complexidade e holismo, etc., apontei breves considerações no item “3” supracitado que trata
sobre o referencial teórico.
53

5.7 SOBRE A ANÁLISE DOCUMENTAL E DE CONTEÚDO

De acordo com (TRIVIÑOS, 1987) a qualidade e profundidade de um exame e análise


documental é diretamente proporcional ao domínio, que o pesquisador detém dos elementos
teóricos envolvidos nos documentos estudados. Por isso neste intento realizei uma análise
documental revisitada meticulosamente a fim de construir um diálogo estreito entre a literatura e
os dados coletados com foco nos resultados esperados.

Os dados devidamente arranjados foram submetidos à análise qualitativa seguindo os


princípios da análise de conteúdo, cuja metodologia de análise e tratamento das informações
procurei “compreender criticamente o sentido manifesto ou oculto das comunicações,
buscando captar o significado das mensagens” SEVERINO (2008). Nesta análise qualitativa
foram adotados os passos propostos por Minayo (2008), na qual os dados passaram por
análise categorial temática, ponderando-se sobre as características comuns ou que se
relacionam procurando a realização de articulações entre os dados e as referências teóricas
adotadas. Por assim dizer seguindo a seqüência: Ordenação dos dados, mapeamento dos
dados, Classificação dos dados e Análise final.

Considerando as especificidades deste TCC, tendo em vista as categorias de análise documental e


revisão bibliográfica de Minayo (ibidem) acima, foi levado em conta o processo de categorização
descrito por Bardin (2004), o qual possibilitou a condensação de dados brutos em categorias
operacionais vistas logo abaixo.

Categorias ordenadas para proceder a avaliação dos dados

 A concepção de meio ambiente: ampla, considerando a complexidade sistêmica e


compreensão holística envolvendo a interdependência entre o meio antrópico e o meio
natural;
 A perspectiva: coerente com a concepção de meio ambiente com enfoque na
sustentabilidade;
 O alargamento da compreensão de ecologia humana em suas múltiplas e complexas
relações, envolvendo aspectos biológicos, psicológicos, econômicos, jurídicos,
políticos, sócio-culturais, científicos, e éticos;
 A referência teórico-metodológica: significados e conteúdos;
 O paradigma epistemológico: a capacidade do pesquisador de relacionar criticamente
as referências teórico-metodológicas aos dados coletados da pesquisa.
54

 A dimensão política: a percepção dialética da perspectiva histórico-social como campo


de interesses e lutas e respectivos condicionamentos que moldam a subjetividade e as
relações no cotidiano;
 O princípio ecopedagógico crítico: desconstrução da crença que a informação, por si
só, é capaz de transformar comportamentos individuais/sociais e promova uma análise
problematizadora da relação humana-natureza;
 A subjetividade das representações sociais relacionadas com as percepções e os
saberes ambientais da comunidade estudada;
 As políticas públicas: Análise das ações educativas, econômicas e sociais dos
governos e da sociedade direcionadas à realidade local estudada;
 O modelo de vivência: As estratégias de sobrevivência das gentes caatingueiras
delimitadas por este TCC;

5.8 SOBRE OS CRITÉRIOS DE QUALIDADE DA PESQUISA

Defini previamente como Critérios de Qualidade da Pesquisa, considerando a natureza sui


generis da pesquisa qualitativa, aqueles critérios que foram definidos por Lienert (1989),
sendo estes os principais: objetividade, fidedignidade, validade, utilidade, economia de
esforço, normatização e comparabilidade.

Steinke (2000) questiona como certos critérios de qualidade se aplicam à pesquisa qualitativa,
neste nosso caso, se aplica bem a idéia de Steinke (ibidem) de adaptar critérios da pesquisa
quantitativa para determinar a qualidade da pesquisa qualitativa específica. Miles e Huberman
(1994) descrevem uma série de critérios que estabelecem tais adaptações que se refere Steinke
(ibidem). Grunenberg (2001) tambem realizou uma meta-análise de pesquisas qualitativas das
ciências sociais visando esquadrinhar a qualidade da pesquisa qualitativa, o que resultou na
criação de uma lista de critérios de qualidade.

Fazendo um apanhado sintético de consenso entre as considerações de Steinke (2000),


Grunenberg (2001), Mayring (2002), Miles e Huberman (1994), adotei os seguintes critérios,
na forma interrogativa, para embasar o processo avaliativo da nossa pesquisa: As perguntas da
pesquisa foram claramente formuladas em relação à realidade das comunidades estudadas?O
delineamento da pesquisa foi consistente com o seu objetivo geral? Os paradigmas e as
construções analíticas foram bem explicitadas? A posição teórica e as expectativas dos
problemas da pesquisa foram explicitadas? Foram adotadas regras explícitas nos
55

procedimentos metodológicos e analíticos? Os procedimentos metodológicos e analíticos


foram bem documentados? Os dados foram coletados em todos os contextos socioambientais
da comunidade estudada? O detalhamento da análise leva em conta resultados inesperados e
opostos aos esperados? A análise dos resultados leva em conta outras possibilidades de
interpretação? Os resultados são/ou não congruentes com as perspectivas teóricas? Explicitou-
se a teoria proveniente dos dados e esta pode ser utilizada em outros contextos? Os resultados
estão disponíveis para a comunidade acadêmica? Os resultados instigam ações
ecopedagógicas futuras?

5.9 SOBRE A CARACTERIZAÇÃO DO ESTUDO DE CASO

Esta nossa pesquisa qualitativa se enquadra nas definições e conceitos de um Estudo de Caso,
considerado como uma das mais relevantes segundo os autores Triviños (1987) e Severino
(2008). Este tipo de pesquisa analisa os dados mais profundamente e exige do pesquisador
uma abordagem com objetividade e coerência para não cair no erro de se constituir em
julgamentos equivocados a respeito do caso observado, “é uma categoria de pesquisa cujo
objeto é uma unidade que se analisa aprofundadamente” (TRIVIÑOS 1987).

Complementando esta caracterização, Severino (2008) diz que o Estudo de Caso deve se
concentrar em um caso particular, que precisa ser representativo, para viabilizar e
“fundamentar uma generalização em situações análogas, autorizando inferências.” Severino
também diz que é fundamental que o pesquisador faça as suas anotações com rigor e
observando o máximo de contigüidade dos elementos da realidade observada,

(...) se o investigador, envolvido numa perspectiva de


inquisição qualitativa, não é capaz de compreender essas
dimensões do comportamento do sujeito, derivadas,
principalmente, do contexto cultural, pode observar um
fenômeno e explicá-lo equivocadamente. (TRIVIÑOS, 1987)

A delimitação da comunidade de quebradores de pedras do Rio do Sal se enquadra


perfeitamente no tipo de estudo de caso, também porque segundo Triviños (1987), determina
duas circunstâncias: a natureza e a abrangência da unidade, formada por um grupo em
particular cujas vivências são objetivos deste estudo.
56

5.10 SOBRE OS RECURSOS INSTRUMENTAIS

Para a realização deste TCC foram utilizados os seguintes recursos instrumentais:

 Bibliografia teórico metodológica aqui neste TCC citada;


 Transporte com veículo próprio para deslocamento até as comunidades;
 Roteiro e questionários impressos;
 Equipamentos de registros de mídia fotográfica, filmagem, gravação de áudio e GPS;
 Computador pessoal portátil com software instalados para edição de textos, imagens,
vídeos e mapeamento cartográfico.
57

6 ANÁLISE DOS RESULTADOS

"As pessoas aprendem a partir de suas experiências e a


partir dos seus erros, e já que elas mesmo sofrerão com
as conseqüências dos seus possíveis erros no processo,
cresce a sua consciência de responsabilidade para com
as próprias ações" (Thiollent).

6.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS E DADOS EDUCACIONAIS

Desde o início deste trabalho cogitamos: Como poderíamos mensurar a crise em que foram
compulsoriamente atiradas as famílias dos quebradores de pedras? O que pensam de tudo isso
que interfere radicalmente nas suas vidas? Será mesmo que existem saberes ambientais
ancestrais preservacionistas ou será que foram perdidos? Será também que após o início da
quebra de pedras foi construída uma nova educação patrimonial no sentido conservacionista?
Como podemos analisar essa realidade socioambiental para tentar conhecer as suas
percepções e seus saberes ambientais, suas vivências, seus valores e crenças que os fazem
sujeitos que despertaram à atenção do mundo.

No texto que se segue, está o resultado da busca destas indagações e tantas outras
considerações que se foram adentrando na medida em que novas questões permeavam o
universo de possibilidades daquela realidade estudada. Procurei sem me privar de nenhum dos
níveis de exame e de crítica à luz da visão sistêmica, alcançar os fins deste trabalho a partir da
observação e da analise das falas do público estudado com o intuito de extrair o significado
qualitativo, mas também desvelar o seu teor sociológico naquilo que diz respeito ao caráter
ideológico-político.

Esta análise dos resultados foi construída a partir dos dados obtidos durante as diversas etapas
desta pesquisa. Procurei dá ênfase ao exame das falas e dissertar sobre os seus significados,
comparando com os dados mais antigos para estabelecer um diálogo entre os conteúdos a fim
de encontrar suas semelhanças e contradições. Aqui também faço referência a dados objetivos
que foram tomados de algumas falas sem a pretensão de torná-los estatísticos, por meio dos
questionários aplicados ou de fontes já publicadas tal como o Diagnóstico Aplicado com as
Famílias do Complexo Arqueológico de Paulo Afonso/BA. 2007do qual fui protagonista junto
com a ONG AGENDHA e as instituições parceiras: CAAPA-UNEB e DMA.
58

A primeira consideração é com relação à escolaridade dos quebradores de pedras (Gráfico 1)


que se confirmaram muito baixa em comparação com os níveis de educação formal
recomendado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura –
UNESCO16. Para que esta categoria profissional pudesse, dentro da lógica dos mercados,
assumir postos de liderança ou migrar para outra profissão.

Gráfico 1: Escolaridade dos quebradores de pedras do Rio do Sal

O analfabetismo brasileiro com um dos piores índices das Américas, na casa de 10%, atinge
as massas de trabalhadores de modo geral, pior até que os 8,4% da Colômbia e 8% do
México, por exemplo (LOURES, 2007). Já na realidade da comunidade dos pesquisados, esta
taxa sobe vertiginosamente para 39% sem qualquer estudo, e este número fica ainda pior
quando somado ao número de analfabetos funcionais17, neste caso a taxa sobe para 74% do
grupo humano estudado. Além disso, a escolaridade média desta população é de apenas 2,9
anos, somente 5% concluiu o ensino fundamental, 3,5% o ensino médio e nenhum chegou a
cursar o ensino superior.

16
A UNESCO (em inglês United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization) é um organismo
especializado do sistema das Nações Unidas. A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (UNESCO) fundou-se a 16 de Novembro de 1945 com o objectivo de contribuir para a paz e segurança
no mundo mediante a educação, a ciência, a cultura e as comunicações. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/
Organização_das_Nações_Unidas_para_a_Educação,_a_Ciência_e_a_Cultura
17
Analfabeto funcional é a denominação dada à pessoa que, mesmo com a capacidade de decodificar
minimamente as letras, geralmente frases, sentenças e textos curtos; e os números, não desenvolve a habilidade
de interpretação de textos e de fazer as operações matemáticas. Também é definido como analfabeto funcional o
individuo maior de quinze anos e que possui escolaridade inferior a quatro anos, embora essa definição não seja
muito precisa, já que existem analfabetos funcionais com nível superior de escolaridade. Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Analfabetismo_funcional
59

6.2 A INFLUÊNCIA DOS SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS

Evidentemente que o nosso olhar científico se volta para o Complexo Arqueológico de Paulo
Afonso graças à descoberta das pinturas rupestres, a despeito do que ocorre com outras
comunidades como: Salgadinho, Alagadiço, Juá, Várzea, São José, entre tantos outros
povoados pertencentes a esta jurisdição municipal. Mas apesar desta atenção especial da
comunidade científica, a população do Rio do Sal, sobretudo a dos quebradores de pedras,
ainda não se beneficiou deste fato nos sentidos e significados que foram expostos pelos
sujeitos pesquisados. A partir da leitura desta realidade embasada pela visão sistêmica da sua
complexidade, buscamos avaliar a contribuição da descoberta dos Sítios de Arte Rupestre
para a construção da consciência ambiental dos quebradores de pedras.

Encontramos a ligação dos quebradores de pedras com as pinturas rupestres em dois


momentos históricos. No primeiro momento, as pedras pintadas não faziam parte de um
pensar crítico sobre o seu significado patrimonial e não despertava a atenção das pessoas de
modo geral com relação a sua importância histórico-cultural, por isso não foi possível de
imediato encontrar um elo de ligação entre as pinturas rupestres e os saberes ambientais
tradicionais. Esta desconexão se observa de modo unanime nas falas das pessoas
entrevistadas, sobretudo, na observação da práxis cotidiana. A relação dos saberes ambientais
tradicionais sugere está intimamente relacionada com as necessidades imediatas de
sobrevivência das famílias, cujo modus vivendi está intimamente ligado as atividades
agrícolas de sequeiro e criação de caprinos no modelo extensivo.

A partir da leitura das falas dos sujeitos, verificou-se que o conhecimento das pinturas
rupestres se dava, sobretudo por caçadores que adentravam os lajeiros de granito da região,
quando em primeira instância sequer desvelavam a existência de pinturas como de origem
antrópica. Já nesta fala de Seo Pedreira (2009):

“nunca me interessei por essas pedras marcadas, porque não


sabia dessas coisas. Eu mesmo pensava que era riscos de
crianças”, (Seo PEDREIRA, 2009)

temos a leitura de que não havia um interesse por parte daquelas pessoas, o conhecimento das
pinturas em alguns casos podem sugerir mera brincadeira de crianças, provavelmente pelas
insígnias indecifráveis dos traços rupestres.

Num segundo momento, pôde ser verificado que os quebradores de pedras passaram
aparentemente a ter uma noção do significado patrimonial/ambiental das pedras pintadas,
60

porém tais pensamentos não se transformaram ainda num valor ambiental comunitário, já que
neste tocante encontramos severas contradições permeando as falas dos entrevistados.

Careceu, pois sim da nossa parte, um imenso esforço pautado no método escolhido de analise
das falas, para que pudéssemos recuperar a trajetória da construção das percepções e saberes
ambientais daqueles sujeitos estudados e a relação com o conhecimento das pinturas
rupestres. Foi preciso muita cautela para distinguir um saber ancestral de um novo saber
emergente da crise ambiental/patrimonial que ora atravessam os quebradores de pedras,
graças à interrupção das atividades de mineração emplacadas pelos órgãos de defesa do meio
ambiente e do patrimônio histórico/cultural.

A primeira revelação neste sentido está relacionada com o conteúdo do dado apanhado.
Entendemos que referência a fenômenos desconexos da situação legal e da ação dos
pesquisadores do CAAPA teriam grande chance de ser um saber ancestral ou deste saber
resultante. No mesmo sentido, para se detectar um saber ancestral, em grande medida, se
desvela na linguagem do sujeito, nas suas referências na linha de tempo, tal como alusão à
antiguidade como exemplo, e ainda nos termos da fala em que não detectamos a
“contaminação”, no bom sentido, das intervenções educacionais dos pesquisadores e
ambientalistas acontecidas no período que se sucedeu a descoberta arqueologia do CAAPA há
aproximadamente dez anos.

Outra vertente de análises se voltou à compreensão daquilo que podemos classificar como um
saber profissional relacionado com a natureza do trabalho do quebrador de pedras. Tal
significado podermos, por exemplo, extrair da seguinte fala:

“A produção é variada de acordo com a natureza da pedra”


(Seo PEDRO, 2009).

Na fala do Seo Pedro está evidente um saber ambiental sobre a natureza intrínseca da pedra,
representada na linguagem que os geólogos classificariam como dureza18, clivagem19, etc.

18
Na ciência dos materiais, dureza é a propriedade característica de um material sólido, que expressa sua
resistência a deformações permanentes e está diretamente relacionada com a força de ligação dos átomos.
Basicamente, a dureza pode ser avaliada a partir da capacidade de um material "riscar" o outro, como na popular
escala de Mohs para os minerais, que é uma tabela arbitrada de 1 a 10 na qual figuram alguns desses em escala
crescente a partir do talco ao diamante. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Dureza.
19
Clivagem em mineralogia é a forma como muitos minerais se quebram seguindo planos relacionados com a
estrutura molecular interna, paralelos às possíveis faces do cristal que formariam. A clivagem é descrita em
cinco modalidades: desde pobre, como na bornite; moderada; boa; perfeita; e proeminente, como nas micas. Os
tipos de clivagem são descritos pelo número e direcção dos planos de clivagem. Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Clivagem_%28mineralogia%29.
61

Logo, vemos o quanto o quebrador de pedras tem um saber ambiental determinante para a sua
atitude profissional. Ele desenvolveu a sensibilidade intuitiva/prática de selecionar as matérias
primas de trabalho, conforme demanda dos preceitos da qualidade, eficiência operacional e
rentabilidade econômica.

A descoberta dos sítios arqueológicos contribuíram em larga medida para reestruturar a ação
de lavratura das pedras pintadas. Na fala do Seo Rocha (2009)

“Essas pinturas estão tudo em Paulo Afonso nos calçamento”,


(Seo ROCHA, 2009)

podemos deduzir que existe um saber patrimonial desregulado com relação ao valor histórico
entendido pela academia, mas também mostra o lado propositado do minerador no intento de
destruir o referido patrimônio, entretanto, o dolo não pode ser configurado de imediato sem
levar em conta as nuances da realidade dos sujeitos em que pese à ponderação das noções de
valor cultural e valor econômico vigentes na alma desse povo.

6.3 OS FATORES AMBIENTAIS

A formação geológica da paisagem do Rio do Sal também desperta a curiosidade dos


quebradores de pedras. Falando sobre a “Pedra do Navio” disse Seo Pedreira...

“Dizem que estas pedras se formou no dilúvio... não foi?” (Seo


PEDREIRA, 2009)

É claro que não respondi sequer baseado em alguma das teorias científicas evolucionistas que
explicam a origem da crosta terrestre e os solos como um demorado processo físico-químico
envolvendo muitas reações e processos erosivos (Dicionário Enciclopédico de Mineralogia e
Geologia, 1980), mas não parece ser, ainda que embasada numa mitologia semita um saber
explicativo de caráter científico?

É claro que Seo Pedreira tem o saber sobre o dilúvio como resultado da tradição religiosa, que
provavelmente seu sentimento de existência das coisas pode ser explicado pela intervenção
metafísica na realidade física através do poder da divindade cristã, tal como um artista esculpe
intencionalmente a forma desejada. Mas a leitura imediata, seja pela forma interrogativa das
palavras, seja pela expressão facial que transmite a dúvida, entendo que não se tratou de uma
afirmação. Tal saber ambiental do Seo Pedreira tem certamente uma raiz científica nata. Na
cabeça do homem, existe uma tentativa de relacionar causa e efeito, nas entrelinhas, algo que
62

moldou outro algo preexistente, no mesmo sentido que afirma a geologia que os processos
erosivos desenharam as atuais formações rochosas na rocha bruta primitiva. Sendo assim, o
saber local sobre os processos de formação da paisagem que a comunidade dos quebradores
de pedras está inserida, pode ser validada como pretexto para a conscientização ambiental, já
que guardaria na sua essência os significados estruturantes do ambientalismo enquanto
ciência.

Em nossa tentativa de estabelecer um diálogo sobre os saberes ambientais dos quebradores de


pedras e as pinturas rupestres, Perguntamos a Seo Pedreira se ele tinha lembrança de uma
alguma pintura que tenha sido destruída antes da chegada dos pesquisadores a região, ele
acabou nos revelando um testemunho histórico. Apontando na direção onde se localiza o sítio
86 (VERGNE & MARQUES, 2009, p. 169) lugar onde o entrevistado dizia ainda existir a
“pedra do lenço” (ver Figura 14), ele disse:

“Tinha uma pintura dessas numa pedra, mas ela já foi


destruída... era assim: (desenhou no chão uma seqüência de
oitos três oitos “888” e disse:) era assim três oitos iscritin... e
era grande assim”, fazendo com as mãos um gesto que media
cerca de 25 - 30cm”. (Seo Pedreira, 2009).

Indagado sobre quanto tempo faz que tal pintura foi destruída, ele revelou ser de

“mais de trinta anos... no tempo que eu era criança... eu


sempre via as pinturas...”. (Seo Pedreira, 2009).

Numa outra anotação da nossa conversa Seo Pedreira tinha dito que aquelas figuras eram
coisas conhecidas desde o tempo dos seus avós. Naquele caso testemunhado por Seo Pedreira,
os fatos ocorreram cerca de vinte anos antes da chegada da equipe de pesquisadores
comandada por Cleonice Vergne.

A nossa pesquisa revelou que o conhecimento da existência das pinturas é pelo menos tão
antigo quanto os ancestrais dos sujeitos pesquisados, podendo ser situada no tempo do final
do século XIX, mas a origem das pinturas não parecia ser uma preocupação importante dos
habitantes da região. Perguntado sobre a origem das pinturas rupestres, Seo Pedreira disse:
63

Figura 13 - Simulação de pintura rupestre perdida Figura 14 – Pedra do lenço – Sítio 86


segundo Seo Pedreira

“eu não sei não... tem um povo aí que disse ter sido lampião ...
mas eu acho que não foi não... meu avô que era irmão do avô
de Maria Bonita, já contava histórias dessas pinturas...
lampião andou muito por aqui mas ele ôxe... num tinha nada a
ver com essas pinturas... isso já está aí a “milhões de
anos”!...”

Noutro trecho da conversa ele afirmou:

“Essa tinta num sai com nada... nem com chuva nem com sol
quente... num sai nem com fogo... eita tinta danada... vai saber
do ela é feita? Ôxe! ela é coisa da pedra mesmo...” (Seo
PEDREIRA, 2009).

As palavras de Seo Pedreira tem o mesmo significado essencial daquelas proferidas pelo Seo
Pedro:

“Essas pinturas não se acabam não, deu o cupim, botaram fogo


em cima e não se acabam” (Seo PEDRO, 2009).

Essas revelações de Seo Pedreira nos dá margem para diversas análises tanto de natureza
histórico-cultural quanto de natureza físico-ambiental. Do ponto de vista histórico, Seo
Pedreira, desvincula a origem das pinturas da história do cangaço, e na sua fala convicta dá fé
das conclusões científicas da arqueologia, muito embora com um referencial de tempo
destorcido. Tal distorção da contagem do tempo dita como “milhões de anos”, faz-nos
concluir que o saber científico da geologia e arqueologia pode ter contribuído para a formação
deste saber ambiental, sem que estes saberes tivessem sido assimilados na escala de eventos
aceitos pela comunidade científica. “Milhões de anos” parece ter para o Seo Pedreira o
significado de muito antigo, um tempo insondável para sua cabeça, porém revela um saber
64

póstumo das pesquisas dos cientistas, e um gesto de confiança nestas informações. No


momento que falava de tais idéias, Seo Pedreira parecia inquieto com a conseqüência de tais
conhecimentos, mas a sua segurança apontava numa direção que seu saber não cogitava a
contradição com os saberes tradicionais remanescentes dos seus ancestrais.

Quando se referiu à qualidade das tintas utilizadas na pintura, com relação à durabilidade e à
resistência, tais preparos que resistiriam ao tempo, o sol, a chuva, ao cupim e ao fogo, Seo
Pedreira e Seo Pedro, através da ênfase na entonação da voz e expressão das mãos, atribuíram
grande valor de domínio tecnológico aquelas gerações rupestres descobertas por Vergne.
Quando diz que a pintura é coisa da pedra mesmo, no sentido ambiental, atribui nas
entrelinhas aos pintores das pedras o poder de transformá-las intrinsecamente, mesmo que
seja na sua cor aparente. Sem querer, por outros motivos, Seo Pedreira fala de um saber
científico descoberto pelos arqueólogos como tendo aquelas pinturas matéria primas tiradas
das rochas ricas em óxido de ferro tais como a hematita estudadas por Martin (2005). Na
visão do homem, um profundo respeito pela obra que ele admira, contrariando sobremaneira o
relato geral dos quebradores de pedras que desvalorizam as pinturas em detrimento da
possibilidade de transformação das pedras pintadas em blocos de pedras como um produto
comercial, Independente da interpretação ideológico-sócio-política do caso.

Seo Pedreira tem na verdade a cara do homem comum, do quebrador de pedras que se
encontra numa encruzilhada existencial, tem todos os potenciais humanistas para o
reconhecimento da obra histórico-cultural das pinturas rupestres, apenas pondera, na ordem da
prioridade, que parece responder a escala de hierarquia de necessidades de Maslow20 (Figura
15), para a manutenção objetiva da vida. Apesar do discurso comum dos quebradores, que a
quebra de pedras é a única fonte de renda daquelas famílias, fica o sentimento de um

20
A hierarquia de necessidades de Abraham Harold Maslow, é uma divisão hierárquica em que as necessidades
de nível mais baixo devem ser satisfeitas antes das necessidades de nível mais alto. Cada um tem de "escalar"
uma hierarquia de necessidades para atingir a sua auto-realização. Maslow define um conjunto de cinco
necessidades descritos na pirâmide: 1) necessidades fisiológicas (básicas), tais como a fome, a sede, o sono, o
sexo, a excreção, o abrigo; 2) necessidades de segurança, que vão da simples necessidade de sentir-se seguro
dentro de uma casa a formas mais elaboradas de segurança como um emprego estável, um plano de saúde ou um
seguro de vida; 3) necessidades sociais ou de amor, afeto, afeição e sentimentos tais como os de pertencer a um
grupo ou fazer parte de um clube; 4) necessidades de estima, que passam por duas vertentes, o reconhecimento
das nossas capacidades pessoais e o reconhecimento dos outros face à nossa capacidade de adequação às funções
que desempenhamos; e 5) necessidades de auto-realização, em que o indivíduo procura tornar-se aquilo que ele
pode ser: "What humans can be, they must be: they must be true to their own nature!". É neste último patamar
da pirâmide que Maslow considera que a pessoa tem que ser coerente com aquilo que é na realidade "... temos
de ser tudo o que somos capazes de ser, desenvolver os nossos potenciais".
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Hierarquia_de_necessidades_de_Maslow
65

significado oculto que revelaria se tratar de fato da única fonte de renda posta pela conjuntura
sócio-política.

Figura 15: Pirâmide de Maslow – fonte: http://www.merkatus.com.br/10_boletim/maSLOW.gif

6.4 O SENTIDO DA PERCEPÇÃO AMBIENTAL

A percepção ambiental destes homens quebradores de pedras está sujeitada/alienada a


condição econômica da profissão de quebrador de pedras. Seus pensamentos parecem
subestimar/subjugar a paisagem física natural que o rodeia, alvitra impor o seu poder sobre o
inanimado ser rochoso, lhe deslumbra o sentimento estético da arte, avistado/detectado pelo
pesquisador enquanto fazia-lhe a leitura da sua entonação de voz, cuja ênfase lhes confere o
orgulho de ser um artista. Todavia, pudemos verificar o quanto um sentimento eufórico é
alternado por um sentimento depressivo. Seo Pedro navegou rápido para um semblante
combalido ao denunciar que “o pó da pedra faz mal à saúde”, disse também que o tal pó
“causa um monte de doenças”, e ainda complementou com testemunhos de outros males
físicos como a exaustão do corpo e “dores na coluna” (Seo PEDRO, 2009). Neste relato do
Seo Pedro pudemos desvendar o seu significado ambiental, no momento em que se sobreleva
o juízo das conseqüências maléficas à saúde causada pela inalação do pó da pedra que causa a
silicose21. Este saber ambiental certamente foi induzido pela consciência da própria dor e suas

21
A silicose é uma forma de pneumoconiose causada pela inalação de finas partículas de sílica cristalina e
caracterizada por inflamação e cicatrização em forma de lesões nodulares nos lóbulos superiores do pulmão.
Provoca, na sua forma aguda, dificuldades respiratórias, febre e cianose. Pode ser confundida como edema
pulmonar, pneumonia ou tuberculose. Foi identificada pela primeira vez por Ramazzini, em 1705. A silicose
comumente afeta os mineiros, após anos de inalação da sílica presente no ar dos túneis e galerias. A sílica se
deposita nos alvéolos pulmonares furando células e rompendo os lisossomos que derramam suas enzimas que
66

limitações, quando o sujeito imaginou a relação de causa e efeito e desenvolveu a conclusão


cognitiva de sua teoria. O semblante do Seo Pedro também revela a decepção do desamparo
social por não ter sido jamais este velho homem assistido pelos órgãos de saúde do estado.

Tal fala do Seo Pedro de dezembro de 2009, confere semelhança com as falas registradas na
pesquisa diagnóstica realizada em 2007 a partir de outras fontes. Seo Rocha disse naquela
oportunidade que

“Devido o trabalho pesado, os braços, colunas e pernas


adoecem com freqüência. Tem posto de saúde, mas não
oferecem exames necessário. O Posto é pequeno, tem agente de
saúde e médicos, mas não tem exames. Lá não tem ambulância
pra os acidentados e nem pra ninguém! (...) Ocorrem muitos
acidentes. Tem gente que já perdeu o braço, a mão, os dedos,
têm cortes por nosso corpo e não em atendimento, não tem
plano de saúde e os empreiteiros não ajuda nessa hora, não
tem a assistência devida”;

ou neste outro testemunho:

“o pó da pedra prejudica a saúde, no decorrer dos anos esse pó


vai entrando no nariz e causando um monte de doenças. Dar
uma exaustão do corpo, dores na coluna e dinheiro não dá
para pagar tratamento. Sofrimento com dores na coluna que
fica comprometida com os movimentos, pois as vezes tem que
tirar pedra dois metros de altura e com 50 quilos e ainda
carregar a pedra” (Seo ROCHA, 2007).

Nestas outras falas também se evidenciam o saber ambiental do Seo Rocha sobre as
conseqüências desastrosas da ação humana contra o meio ambiente. Mas parece não ter sido
suficiente a sua percepção dos riscos a que se submetia, sendo assim, entendemos que Seo
Rocha também se submeteu à onda transformadora imposta pela pressão demandada das
obras crecimentistas das hidroelétricas de Paulo Afonso e alargamento da construção civil em
torno destas obras. Não parece ter chegado até o Rio do Sal a onda do modelo econômico

destroem os alvéolos. A silicose causa dificuldade respiratória e baixa oxigenação do sangue, provocando
tontura, fraqueza e náuseas, incapacitando o trabalhador. A silicose além de ser a mais antiga e mais grave das
doenças pulmonares relacionadas é também a mais prevalente à inalação de poeiras minerais. É uma fibrose
pulmonar nodular causada pela inalação de poeiras contendo partículas finas de sílica livre cristalina que leva de
meses a décadas para se manifestar. Com uma evolução progressiva e irreversível a Silicose é considerada uma
doença ocupacional que causa graves transtornos de saúde ao trabalhado e pode provocar incapacidade para o
trabalho, aumento dos riscos de tuberculose, invalidez e, com certa freqüência, ter relação com a causa do óbito
do paciente. A descrição da doença já foi relatada há muitos séculos, no entanto a possibilidade de prevenção só
foi cogitada a partir do século XX. A importância da prevenção e do combate à silicose motivou a Organização
Mundial de Saúde (OMS) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) a lançarem em 1995, conjuntamente,
um programa de erradicação da Silicose. As três formas mais importantes da sílica cristalina, do ponto de vista
da saúde ocupacional são o quartzo, a tridimita e a cristobalita. Estas três formas de sílica também são chamadas
de sílica livre ou sílica não combinada para distingüí-las dos demais silicatos. Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Silicose
67

desenvolvimentista, tão somente adentrou a essência daquela ideologia na sua forma mais
inumana.

6.5 EFEITOS SÓCIO-ECONÔMICO-AMBIENTAIS

Este trabalho também se inscreve no contexto de uma questão socioambiental que vem
despertando muitas inquietações e crescente interesse social. Os últimos dez anos desde a
descoberta científica dos sítios arqueológicos têm testemunhado o caráter problemático que
reveste a relação entre a comunidade de quebradores de pedras e o meio ambiente.

A questão ambiental, neste contexto, brota do conjunto de contradições resultantes das


interações internas do grupo de quebradores com o sistema social e deste com o meio
envolvente. Do ponto de vista da ecologia humana, são situações marcadas pelo conflito,
esgotamento e destrutividade que se expressam: nos limites materiais do crescimento
econômico dos indivíduos; na expansão urbana e demográfica do povoado; na tendência a
perda da biodiversidade e esgotamento dos recursos naturais e energéticos não-renováveis; no
impasse das iniciativas públicas descontínuas que refletem os interesses partidários
divergentes que nutrem e tornam crônicos os processos de exclusão social dos quebradores de
pedras; no acrescentamento do desemprego estrutural tal como se revelou na fala de Seo
Pedro (2007):

“A gente não tem salário. Tem um ordenado pelo trabalho das


pedras que só dá para as coisas principais como pagar água e
energia. Não tem dia certo pra receber e nem sempre o
ordenado é conforme o trabalho. É um trabalho exploratório,
por produção, não tem carteira assinada, mas é assim mesmo,
se não trabalhar, não ganha (...) é uma vida dura, de trabalho
pesado, cansaço físico e mental e todo dia o sol vai tirando o
nosso vigor”. (Seo PEDRO, 2007).

São todas realidades que comprometem, em particular, o andamento da vida humana com
dignidade, e ameaçam a continuidade dos projetos de melhorias pensada pelos pesquisadores
e ambientalistas e que padecem de estagnação pela madorna da conjuntura política.

De fato, a questão ambiental do Rio do Sal revela o retrato de uma crise pluridimensional que
aponta para o depauperamento do modelo de gestão ambiental da sociedade que a produz,
desproporcionalmente, mais problemas que soluções e, onde as “soluções propostas”, por sua
parcialidade, limitação, jogo de interesses ou má fé, findam se constituindo em nova fonte de
problemas que só aumentam a crise relacional dos quebradores de pedras com seu meio.
68

6.6 O VALOR AMBIENTAL/PATRIMONIAL

Proteger o meio ambiente significa salvar o nosso futuro, o futuro das pessoas e o futuro das
espécies da biosfera terrestre. Cuidar do meio ambiente é responsabilidade de todos diz o
Artigo 255 da Constituição Federal, mas como poderia ser a contribuição dos quebradores de
pedras neste processo holístico de saber/atitude ambiental. Sabendo que as escolas em que
seus filhos estão matriculados são amostras da realidade social, e que a atividade de
“quebração de pedras” é uma demanda da sociedade urbana que dispões de diversos argentes
de persuasão e efetivação dos negócios com as pedras lavradas, e que envolve acima de tudo o
interesse do mesmo poder que deveria controlar os usos adequados das fontes minerais?
Questão como esta está distante de ser respondida no âmbito de um trabalho monográfico
como este.

Já foi amplamente divulgado que os quebradores de pedras já destruíram cerca de 40% dos
sítios rupestres do Complexo Arqueológico de Paulo Afonso. O que pouquíssima gente sabe é
que os mesmos quebradores não estavam ali deliberadamente destruindo um patrimônio
histórico. Essa leitura pode ser fundamentada nas análises sobre a percepção ambiental dos
quebradores com relação ao seu ato/trabalho. Perguntados se conheciam o valor
patrimonial/ambiental das pinturas/pedras, todos disseram que não, já quando perguntados se
lavraram pedras contendo pinturas os entrevistados responderam (Gráfico 2): 15% disse que
sim, 8% que não conheciam, 53% disse que não tinha certeza, os demais 24% não quiseram
falar nem aparentemente se sentiram confortáveis com o assunto.

Anotamos algumas falas que expõe esta realidade: Seo Pedro:

“Pra mim essas pedras marcadas num tem nenhum valor ...
elas assim não vale nada.... agora quando tá tudo bem
cortadinha... aí tem valor... porque só assim que alguém
compra” (Seo PEDRO, 2007).

ou Seo Pedreira:

“Essas pinturas já causaram muitos problemas pra gente. pra


mim elas não era nada” e ainda Seo Rocha: “Pra mim a
quebra da pedra não ofende em nada a natureza, por que
pedra não sente nada. Em cima da pedra não cria nem mato
ruim... ninguém come pedra, mas nós vive de pedra cortada...
agora tem gente que trata as pedras como se elas vivesse, eu
nunca ouvi falar nisso, nunca pensei que fosse assim... só agora
a gente começa a saber que é errado destruir essas pedras
porque é da natureza... mais eu mesmo ainda não entendo!”
69

Gráfico 2: Quebradores que afirmam ter trabalhado com pedras pintadas

Nestes depoimentos, fica evidente que o valor patrimonial histórico cultural, pelo menos
enquanto não houve a chegada dos pesquisadores não havia sido construído como um valor
social. Novamente nos vemos diante de um caminho estreito que aparentemente sinaliza na
direção do valor econômico de curto prazo. Em outros momentos as falas sugerem que o
esforço dos pesquisadores e ambientalistas soava como uma ameaça ou desgraça na vida
daqueles homens, pois foi unânime o testemunho de que lhe tiraram o seu “meio de vida”.

Desse modo os objetivos de elucidar algumas questões nesta pesquisa, nos levaram a outras
questões simplesmente sem resposta. Porque estas pessoas viam “coisas-ruins” ou figuras
sinistras em quem se lhe apresentava como protetor? A resposta não é superficialmente
porque lhe tiraram o “meio de vida”? Qual a noção exata de proteção que emerge do
sentimento do quebrador de pedras? A proteção pode ser compreendida como a manutenção
da sua sobrevivência? Qual discurso merece mais confiança, o dos ambientalistas ou dos
“clientes”? Porque acreditar que os quebradores ao saberem que estava proibida a lavra de
pedras continuaram no ofício por má fé? Meramente continuaram pela falta de alternativa?
Porque foram persuadidos/alienados pelos interesses econômicos da cadeia produtiva de
paralelepípedos que movimenta milhões de Reais na economia local? A partir de alguma
dessas ou outras hipóteses podemos atribuir arbítrio aos quebradores de pedras? Muito se
precisa entrar na alma do “Ser” para reclamar aclarações para tantas dúvidas.

Mas não é só de fragmentar pedra que vive o homem pedreiro, também neste homem mora
um espírito ambientalista, sua preocupação com certos problemas ambientais em muito
suplanta em sabedoria algumas equivocadas conclusões de acadêmicos. A sensibilidade de
70

detectar problemas ambientais é uma dessas qualidades encontradas nas falas dos
entrevistados. Por exemplo, neste fragmento do Seo Pedreira com relação ao assoreamento
do cânion do São Francisco: Disse Seo Pedreira

“-Um “engenheiro”... (numa fala, ou “especialista” noutro


momento) da Chesf, no tempo que eu tinha vinte anos, me disse
que esse rio vai se aterrar e que a gente ia ficar sem água só ia
ter água nas enchentes... e parece que tá acontecendo mesmo...
me dissero outro dia, não lembro mais... que este quêno tá
ficando cada vez mais razo... ah! Quem me disse foi os
pescador, aqui ó, meus vizinhos que vão pegá peixe aqui pra
baixo do rio”. (Seo Pedreira, 2009).

Seo Pedreira fala com convicção, tem medo real das conseqüências daquele tipo de desastre,
ele pode imaginar a tragédia que é viver sem a água do Rio, mas porque o homem civilizado
urbano se comporta como os habitantes da Ilha de Páscoa22? Se o assoreamento do cânion do
São Francisco incomoda um quebrador de pedras, porque estamos tranqüilos demais com o
nosso destino, tanto quanto o extinto povo Rapa Nui da citada ilha, esperando virar cinzas
nossa ultima árvore essencial para fazer canoa e sair para navegar.

Durante a nossa entrevista, ouviu-se um estampido de arma de fogo, logo paramos uns
instantes para assuntar sobre o fato... Seo Pedreira adiantou-se em dizer:

“Isso foi um tiro de espingarda... É os caçadores matando


rolinhas23 (Columbina sp.). Taí uma coisa que eu não faço
mais, já fiz num nego, mais acho que os bichim deve viver...”
(Seo PEDREIRA, 2009).

Com relação ao mesmo assunto Seo Pedro (2007) já tinha registrado o tema com a declaração:

“O pessoal da cidade é que vem pra cá caçar, Nós daqui


mesmo gosta mesmo é de pescar” (Seo PEDRO, 2007).

A partir da leitura das suas atitudes e valores ambientais, podemos verificar que a relação
direta dos quebradores de pedras com o meio ambiente, está, enquanto testemunho, muito

22
A ilha de Páscoa é uma ilha da Polinésia oriental, localizada no sul do Oceano Pacífico (27º 09' latitude Sul e
109º 27' longitude Oeste). Está situada a 3.700 km de distância da costa oeste do Chile e sua população é de
3.791 habitantes (censo 2002), 3.304 dos quais vivem na capital Hanga Roa. Famosa por suas enormes estátuas
de pedra, faz parte da V Região de Valparaíso, pertencente ao Chile. Em rapanui, o idioma local, é denominada
Rapa Nui ("ilha grande"), Te pito o te henúa ("umbigo do mundo") e Mata ki te rangi ("olhos fixados no céu").
Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ilha_de_P%C3%A1scoa
23
Rolinha é uma ave da família Columbidae, subfamília Columbinae, mesma subfamília dos típicos pombos,
mas pertence a um gênero diferente: Columbina. Registra-se também no Brasil a rolinha-vaqueira ou rola-
vaqueira, pertencente a um gênero diferente do Columbina. Trata-se da Uropelia campestris. Portanto, no Brasil,
encontram-se aves com o nome popular "rolinha" em espécies do gênero Columbina e Uropelia. Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Rolinha.
71

mais conservadora do que se poderia supor no início da realização deste TCC. Trata-se de
perceber nestes testemunhos os princípios dominantes ou idéias diretrizes que governam as
atitudes diante da vida e do mundo; portanto, de uma cosmovisão, e de crenças
profundamente enraizadas na alma humana que o experimento científico demonstra serem
feitos psíquicos inelutáveis24. Tão inevitável que, quando velhos sistemas fracassam, são de
pronto, criados outros novos.

A percepção ambiental vista com o rigor conservador a qual alimenta as teorias de equilíbrio
sustentável, parece neste estudo de caso ser um fenômeno social de valor sócio-ambiental, se
bem considerado o método de alcance generalizador das exposições. A seguinte análise tem
por base a fala de algumas mulheres, sejam de esposas, companheiras ou filhas dos
quebradores de pedras. Não foi possível rastrear o modo como se deu a construção destes
saberes neste curto espaço/tempo de pesquisa, podemos supor que provavelmente a aquisição
dos saberes ambientais destas mulheres se deu na práxis do trabalho familiar, pois são
diretamente relacionados com as labutas necessárias à sobrevivência daquelas pessoas.

Dona Pedrita (2007) fez um relato completo das espécies vegetais e animais existentes na
região.

“Do meio ambiente lá tem muito mato, muita pedra, árvore,


tem tudo, tem bicho, cabeça, sabiá, coleirinha, saguim. Nas
pedras tem lagartixa e aquele do oião (coruja). Tem muita
cobra, jibóia (só no mês passado mataram 4), coral, cascavel,
corredeira, cobra verde, cobra preta. Tem plantas, algaroba,
angico, perero, cantigueira, jurema, velandi. As pedras também
fazem parte da natureza”. (Dona PEDRITA, 2007)

Nas palavras reafirmadas em entrevista recente (dez/2009) por outras moradoras do lugar,
mostram a mesma linha temática e a mesma capacidade de síntese. Nestas ultimas palavras
vem à tona o significado de natureza para aquela comunidade, sendo possível perceber a
relação direta com a vida humana, as representações ambientais são fortemente ligadas à
utilidade econômica que a comunidade estabeleceu ou tem ligação com os mitos religiosos,
tal como a reação às serpentes como possuidoras de um mal intrínseco e que deve ser
eliminada. Podemos ver que as preocupações ecológicas fazem parte do imaginário da
comunidade, mas, neste ultimo caso, lhe escapa o significado utilitário de ecossistema, assim
o valor ambiental dos ofídios fica ainda diminuído frente à tradição de fé.

24
Que não pode ser negado, evitado ou impedido. Fonte:
http://pt.wiktionary.org/wiki/inelut%C3%A1vel
72

A primeira vista parece uma visão cartesiana, mas as vivências, observadas nos atos e nas
palavras que não foram ditas pelas entrevistadas, aparecem como ponto de vista
prevalentemente holista e nos encaminham para uma compreensão sistêmica e para um
holismo ecológico e ético. Com efeito, as falas das entrevistadas explicam a vida em termos
que transcende o meramente mundo físico-químico e o vitalismo, lugar onde nenhum tipo de
análise racional seja possível sem considerar o nível do todo. Dona Pedrita dá pistas das
relações sócio-econômica-ambientais em todo momento, e nos ensina que nossa vida está ali
também deparada, e que é igualmente vulnerável no bojo da compreensão reveladora da crise
sócio-ambiental que aquela comunidade atravessa.

6.7 A MEDIDA DA INTERVENÇÃO ECOPEDAGÓGICA

O trabalho educativo feito pela AGENDHA, CAAPA e DMA provou ter contribuído em alto
grau para a formação de uma geração consciente em afinidade com o seu papel como cidadão
voltado para uma valoração ética, sócio-econômica e ambiental. A partir das informações dos
pesquisados avaliamos a evolução do reconhecimento de valor histórico das pedras pintadas
comparando com os dados levantados em 2007 antes das atividades de sensibilização coletiva
das famílias dos quebradores de pedras. Perguntados se consideravam as pedras como algo
importante e que deveria ser preservada 46% disse que sim em dezembro de 2009 contra 27%
em março de 2007(Gráfico 3).

Gráfico 3: Evolução do reconhecimento do valor histórico das pedras pintadas


Nº de quebradores de pedras que responderam “NÃO (vermelho) e SIM (azul)”.

No (Gráfico 4) aparece a percepção dos quebradores quanto aos danos ambiental em função
da atividade de mineração de pedras. Neste caso vemos que o nível de escolarização interfere
73

no sentido diretamente proporcional com a construção da consciência ambiental. Mas de todo


modo mostra que a ação educativa patrimonial/ambiental deixou os índices em números
significativos, com 70% de percepção que a atividade pedreira causa dano ambiental entre os
sem estudo até a unanimidade entre aqueles com escolarização de nível médio. Esta realidade
se transparece no seguinte testemunho de Seo Pedro:

“Pra mim, o valor dessas pinturas só vim saber depois que


chegou esse pessoal da faculdade” (Seo PEDRO, 2009).

Gráfico 4: Percepção de danos ambiental em função da atividade de mineração de pedras


(Percentual de quebradores em relação à escolaridade)

Os dados são ainda mais significativos se considerarmos que o ano de 2009 foi o pior dos
últimos dez anos, segundo testemunho unânime dos quebradores de pedras, em relação às
políticas públicas efetivas no sentido da mitigação dos efeitos sócio-econômicos. O fato é
extremamente intrigante quando toda a sociedade reconhece que as ações preventivas saem do
ponto de vista financeiro, mais barato para os governos, para as instituições privadas e para
toda coletividade, quando sabemos que os custos das ações remediadoras das agressões
ambientais e desamparo social são exorbitantes.

Essa irracionalidade nega a possibilidade de existir um projeto prospectivo gerador de


mudanças sociais no seio da comunidade dos quebradores de pedras do Rio do Sal. A
educação patrimonial/ambiental, fundada nos princípios frereanos da autonomia do sujeito,
através do seu processo dialético, oferece princípios gerais para perceber/orientar a trans-
formação do real. Sem dúvida, essa lógica já provou a sua capacidade de apreender a
realidade do conhecimento concreto e da ação eficiente de construção dos saberes necessários
à cidadania ambiental.
74

O impacto indiscutivelmente positivo de uma ação educativa tão singela como aquela
supracitada, diante das possibilidades e potencialidades, nos leva a recomendar como política
pública de longo prazo, pois, nesta conjuntura econômico-ambiental dos quebradores de
pedras aqui estudados, para conseguir viver nas próximas décadas deste século XXI, esses
homens pedreiros necessitarão cada vez mais aprender sobre os processos ecológicos, se
capacitarem para atividades sustentáveis, e conhecer o ambiente e as relações dinâmicas que
constituem os ecossistemas locais e globais, processos estes que Capra (1996; 2002)
denomina “alfabetização ecológica”. Esta alfabetização harmoniza a casa de todos os seres
vivos que completam a extraordinária teia de relações interdependentes. Quanto às atividades
potenciais, estas já são bem conhecidas desde 2007 (Gráfico 5) a partir do desejo de mudança
dos próprios sujeitos mineradores de pedras.

Gráfico 5: Alternativas ao trabalho da quebra de pedras. Fonte: AGENDHA

6.8 A SITUAÇÃO ATUAL

A situação demanda ações urgentes, pois vem se esvaindo a fé na mudança daquela gente,
podemos confirmar facilmente nas palavras de Seo Pedreira (jan/2010):

“As pessoas foram todas embora porque aqui não tem mais
meio de trabalho. Eu só não fui embora, porque já tô veio e
alejado e quem me sustenta é minha filha... meu braço eu não
consigo mais levantar... só se for assim” (Seo Pedreira, 2009).

Num gesto o homem suspendeu o braço direito com ajuda da mão esquerda. A mesma
enfermidade se manifesta ao cumprimentar, pois Seo Pedreira sempre toma a mão esquerda
75

para ajudar a dar a mão destra já sem força e que lhe causa muita dor ao tentar mover. E
continua suas lamentações:

“Faço tarrafa de pescar, é lá um que aparece pra comprar...


mesmo assim uns que compraro ainda não me pagaram.. outro
eu pedi cem, o cara me deu vinte e disse que pagava o resto
depois e ó... ôxe! inté hoje!” (Seo Pedreira, 2009).

Este homem ainda encontra compaixão para o sofrimento de outros povos, quando o
entrevistei pela ultima vez antes desta escrita, ainda estava na mídia a tragédia do terremoto
no Haiti, disse Seo Pedreira: “(...) não gosto nem de ver porque choro”. Mas aqui perto de
nós, quem chora pela tragédia dos quebradores de pedras do Rio do Sal?

A exclusão social desses indivíduos pode ser definida, como um processo de segregação
justificada sob diferentes motivações, sejam elas, por questões políticas, étnicas, econômicas,
religiosas, etárias, entre outras. A partir dessa ótica, o indivíduo necessita cada vez mais estar
sintonizado com as mudanças impostas à sociedade, pelas necessidades do mercado
globalizado, de modo a não ficar à margem dessa mesma sociedade.

Os processos de exclusão dos quebradores de pedras parecem ser os mais devastadores,


gerando toda forma de problemas sociais e criando, na realidade local, os não-empregáveis e
os “descartáveis”, que não conseguiram acompanhar as demandas classificatórias impostas
pelo mercado, ou aqueles que acabaram sendo eliminados devido à idade mais avançada, sob
o pretexto de não terem mais a dinâmica que a atividade exige. Com isso, o que nós vemos é
um aumento da pobreza, tendo como conseqüência a falta de recursos mínimos e a baixa
qualidade de vida devido às péssimas condições de moradia e saúde, em virtude da
degradação ambiental gerada a partir da derrubada das suas antigas áreas verdes ou as de
cultivo sem o mínimo planejamento e infraestrutura.

A crise existencial parece tomar conta da comunidade e se alastra como uma mancha de óleo
no mar. O Poeta Geraldo Carneiro escreveu em seu Manual dos Cinqüenta: “A realidade é
uma alucinação criada pela falta de utopia”, Para um quebrador de pedras, não parece uma
alucinação a sua realidade de desconforto, ira, decepção, insegurança, medo, desnutrição,
doenças, contas sem pagar, desconfiança, etc. E qual seria a sua utopia?

Dona Brita deu outro testemunho dessa realidade sócio-econômica na fala:

“A maioria dos homens foram embora... boa parte dos


trabalhadores voltaram a quebrar pedras no lado alagoano...
76

se o povo se juntasse e falasse, quem sabe? (Dona BRITA,


2009)

No testemunho daquela senhora também estava a ruína da ação descontinuada dos


ambientalistas e pesquisadores quando ela disse: O turismo só vai pro barco e para o local das
pinturas da Dra. Cleonice, mas nunca ninguém olha pra nenhum de nós... a gente aqui meu fíi
tá abandonado”. Já Dona Laje tem uma desconfiança com o trabalho da nossa pesquisa, nas
suas palavras: “O trabalho dos pesquisadores vão resultar em nada”. Porque estaríamos ali
diante de um sujeito pesquisado sendo apanhados com alguma hostilidade, mesmo que
manifesta numa simples ironia? Ela sabe das limitações de uma instituição de ensino como a
UNEB, sobretudo da condição do pesquisador, revela como se pedisse desculpa que estava
desassistida pelo estado, o que visivelmente esta senhora de fato sugere com a sua provocação
é que nós pesquisadores sejamos porta voz da sua indignação.

Na história supracitada, o quebrador de pedras que empresta a mão para o Profeta Mohammad
beijar, tira-o um gesto de compaixão e reconhecimento, a grandeza daquele quebrador de
pedras até o faz se sentir pequeno, assim, o maior líder muçulmano abençoa as mãos calejadas
do homem dizendo que jamais elas seriam “queimadas com fogo”. Na nossa
contemporaneidade o quebrador de pedras ou a sua profissão parece não ter reconhecimento
nem dignidade, são raríssimas as referências de estudos científicos mesmo sendo uma das
mais antigas profissões ela ainda nem é oficialmente regulamentada pelo Estado brasileiro.

Os dados da pesquisa também mostram que os quebradores de pedras continuam expostos a


diversas situações de risco de acidentes (Gráfico 6). Todos já sofreram acidentes leves que
não os afastaram das atividades, 15% já sofreram acidentes graves nos membros superiores,
12% outros acidentes graves nos membros inferiores e 4% acidentaram a face com danos
principalmente aos olhos. Assim caminham os quebradores de Pedras do Rio dos Sal.

Gráfico 6: Quantidade de quebradores com respectivas Partes do corpo afetadas pelos acidentes.
77

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este nosso TCC, com o viés de cidadania, concebe um ensaio de trazer as imagens e
representações ontológicas, que os indivíduos quebradores de pedras constroem de sua
realidade e de seu lugar, e ao mesmo tempo a forma como interpretam suas histórias e
experiências nesse mesmo lugar. Também trazemos revelações sociológicas de um drama
sócio político. Enfim entramos um pouco na alma das percepções ambientais daqueles
sujeitos e demonstramos que ainda existem saberes ambientais ancestrais preservacionistas
confirmando uma das hipóteses iniciais desta pesquisa, mas também podemos reconhecer que
outra nossa hipótese de que após o início da quebra de pedras não tenha sido construída uma
nova cultura patrimonial/ambiental conservacionista, não se confirmou em sua totalidade,
pois encontramos muitos sujeitos preocupados e com discurso que denotam consciência
ambiental nos moldes do sistema de idéias da sustentabilidade.

Os dados levantados mostram claramente que os sujeitos têm baixíssima escolaridade; que
são remanescentes de famílias tradicionais que habitam a região há quase dois séculos; e,
deixaram as suas atividades econômicas agropastoris e de pesca para atenderem a demanda da
lavra de pedras que alimentaram o desenvolvimento econômico da região baseada no parque
industrial de geração de energia elétrica cuja atividade foi embargada para proteger as
pinturas rupestres.

As análises concluem-se por aqui, seguros de que os quebradores de pedras pesquisados


detêm significativos saberes ambientais e grande potencial de desenvolverem atividades
sustentáveis a nível local, bastando que para isso sejam atendidos por políticas públicas
voltadas para a cidadania ambiental.

Enfim, neste arremate, concluímos que os resultados encontrados implicam de vital


importância para o fundamento de novos projetos educativos, pois servem como base para as
intervenções necessárias tanto para a ecopedagogia quanto para uma gestão ambiental
participativa e eficaz, observando as nuances da realidade das pessoas com seu meio.
Todavia, consideramos não uma realidade unitária, onipresente, totalizante e absoluta, mas as
distintas configurações que traduz o imaginário dos sujeitos.
78

8 REFERÊNCIAS

ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS – NBR 14724/2002

ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS – NBR 6023/2002

AB‟SABER, Aziz. A Universidade brasileira na (re)construção da Educação ambiental.


Educação brasileira, Brasília: Editora da UnB, 1993.

ACOT, P. História da Ecologia. Rio de Janeiro: Campus, 1990.

AGENDHA. org. Diagnóstico Aplicado com as Famílias Complexo de Arqueologia de Paulo


Afonso/BA. 2007.

ALVES-MAZZOTTI, A. J. e GEWANDSZNAJDER, F. O método nas Ciências Naturais e Sociais:


pesquisa quantitativa e qualitativa. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002.

ARISTÓTELES, Política. 3º Ed. Tradução de Mario Gama Cury. Brasília: Editora da UnB, 1985

AVANZI, M.R. Ecopedagogia. In: LAYRARGUES, P.P. (coord.). Identidades da educação


ambiental brasileira. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, 2004.

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2004.

BEGON, M.; HARPER, J. L.; TOWNSEND, C. R. Ecology: individuals, populations and


communities. [Ecologia: Indivíduos, populaces e Comunidades]. Blackweel Science, 1996.

BOGDAN, R.; BIKLEN, S. Investigação qualitativa em educação. Porto: Porto Editora, 1994.

BRASIL. LEI Nº 3.924, de 26 de julho de 1961. Dispõe sobre os monumentos arqueológicos e pré-
históricos.1961.

BURNHAM, Terezinha F. Educação ambiental e reconstrução do currículo escolar. Campinas:


Cadernos CEDES, 1993.

CAPRA, Fritjof. A Teia da Vida: uma compreensão científica dos sistemas vivos. São Paulo: Cultrix,
1996.

CAPRA, Fritjof. Conexões ocultas. São Paulo: Cultrix, 2002.

CARVALHO, Isabel, Territorialidade em luta: Uma análise dos discursos ecológicos. Instituto
Florestal, Série Registros, São Paulo: 1991.

CARVALHO, Mara Ignez Campos de. Psicologia Ambiental – Algumas considerações. In:
Psicologia: Teoria e pesquisa. Brasília: 1993.

CUNHA, Euclides da. Os sertões. Campanha de Canudos. (Coleção A Obra Prima de Cada Autor).
São Paulo: Martin Claret, 2005.

CERVO, Amado L. e BERVIAN, Pedro A. Metodologia Científica: Para uso dos estudantes
universitários. 3 ed. São Paulo : McGraw-Hill do Brasil, 1983.
79

CHAUÍ, Marilena. La historia em el pensamiento de Marx.[A história e o pensamento de Marx] In:


BORON, A. A.; AMADEO, J.; CRESWELL, J. Projeto de pesquisa: métodos qualitativo,
quantitativo e misto. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2007.

CHILDE, Vere Gordon. A evolução cultural do homem. Rio de Janeiro, Zahar, 1966.

COLOMBO, Olírio Plínio. Pistas Para Filosofar (II) Questões de ética. 5ª Ed. Porto Alegre:
Evangraf, 1993.

COUTINHO, C.L. Educação ambiental em Paracambi. Jornal Tribuna do Interior. Paracambi, 1991.

DENZIN, N. K. & LINCOLN, Y. S. (Orgs.) Handbook of qualitative research. [Manual do processo


de pesquisa qualitativa] Thousand Oaks: Sage, 2006.

DANTON, Gian. Metodologia Científica: Edição especial para distribuição gratuita pela Internet.
Virtual Books Online M&M Editores Ltda. Pará de Minas – MG. 2002

DEL RIO, Vicente. Cidade da mente, cidade real: percepção ambiental e revitalização na área
portuária do RJ. In: Percepção ambiental: a experiência brasileira. São Paulo: Studio Nobel, 1996.

DESLANDES, S. F. A Construção do projeto de pesquisa. In: MINAYO, M. C. (Org.) Pesquisa


Social. 5 ed. Petrópolis: Vozes, 1994.

Dicionário Enciclopédico de Mineralogia e Geologia. Circulo de Lectores S.A. Barcelona. 1980.

DREW, David. Processos interativos homem-meio ambiente. Tradução de João Alves dos Santos.
Revisão de Suely Bastos. Coordenação editorial de Antonio Christofoletti. 5 ed. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2002.

FARIAS, André Brayner de. Filosofia e Ecologia – Para Uma Educação Ambiental Crítica.
Congresso Internacional de Filosofia: Debate de Idéias e Cidadania. De 14 a 16 de maio de 2008.
Caxias do Sul – RS – Artigo, 2008.

FOUCAULT, Michel. L'homme est-il mort? [O homem está morto?](entrevista com C. Bonnefoy),
Arts et Loisirs, no 38, 15-21, junho de 1966, pp. 8-9. Traduzido a partir de FOUCAULT, Michel. Dits
et Écrits. Paris: Gallimard, 1994, vol. I., p. 540-544, por Marcio Luiz Miotto. Revisão de wanderson
flor do nascimento.

FREIRE, Paulo. Conscientização: Teoria e Prática da Libertação. Uma Introdução ao pensamento


de Paulo Freire. São Paulo: Moraes, 1982.

FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 20 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessidades à prática educativa.São Paulo: Paz e
Terra, 1996.

GADOTTI, M. Pedagogia da Terra. São Paulo: Fundação Peirópolis, 2000.

GARCIA MUÑOZ, C. Principales tendencias y modelos de la Educación Ambiental en el sistema


escolar. Revista Iberoamericana de Educación, Nº 11, Monográfico, Educación Ambiental: teoría y
práctica. P 13 a 74, OEI, Biblioteca Virtual, 1996.

GIL, A.C. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2007.

GRUNENBERG, H. Die Qualität qualitativer Forschung. Eine Metaanalyse erziehungs- und


sozialwissenschaftlicher Forschungsarbeiten. [A qualidade da pesquisa qualitativa. Uma meta-
80

análise de trabalhos de pesquisa das áreas de educação e ciências sociais]. Marburg: Philipps-
Universität. (2001). http://www.maxqda.de/downloads/grunenberg.pdf .Acessado em: em 28/01/2010.

GUATTARI, Félix. As Três Ecologias. 11 ed. Campinas: Papirus, 2001.

LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Metodologia do Trabalho Científico:


Procedimentos Básicos. Pesquisa bibliográfica, Projeto e Relatório. Publicações e Trabalhos
científicos. 7ª ed.. São Paulo: Atlas, 2007.

LAYRARGUES, P. P. (coord.). Identidades da educação ambiental brasileira. Brasília: Ministério


do Meio Ambiente, 2004.

LIMA, Gustavo Ferreira da Costa. Questão ambiental e educação: contribuições para o debate.
Ambiente & Sociedade, Campinas: NEPAM/UNICAMP, 1999.

LEFF, Henrique. Racionalidade ambiental - a reapropriação social da natureza. Rio de Janeiro:


DP&A, 2006.

LEFF, Henrique. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Petrópolis,


RJ: Vozes , 2001.

LIENERT, G. A. Testaufbau und Testanalyse. [Construção e análise de testes]. München:


Psychologie Verlags Union, 1989.

LOUREIRO, Carlos Frederico B. org. Contribuições da teoria marxista para a educação


ambiental crítica. Cedes, Campinas, vol. 29, n. 77, p. 81-97, jan./abr. 2009, Disponível em
http://www.cedes.unicamp.br

LOURES, Rodrigo da Rocha. Educação: A Sociedade em Ação: Prefácio à publicação do


„Fórum Desenvolve Londrina‟ Presidente da FIEP - 19 de novembro de 2007. Disponível em
< http://www.forumdesenvolvelondrina.org/contribuicoes.htm> acessado em Nov/2009.

LYNCH, Kevin. A imagem urbana. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

MARIN, Andreia Aparecida; OLIVEIRA, Haydée Torres; COMAR, Vito. A educação ambiental
num contexto de complexidade do campo teórico da percepção. Interciência. vol. 28, n°10, out.
2003.

MARIN, Andreia Aparecida; OLIVEIRA, Haydée Torres; COMAR, Vito. Percepção imaginário e
educação ambiental. OLAM, Rio Claro, v.5, n.1, p.188-201, maio/2005.

MARTIN, Gabriela. A Antiguidade do Homem no Nordeste do Brasil in Pré-História do Nordeste


do Brasil. 4ª Edição. Recife, PE: Editora Universitária, UFPE, 2005.

MARTIN, Gabriela. Pré-História do Nordeste do Brasil cap. 6 Recife, Editora Universitária UFPE,
1999.

MAYRING, Ph. Einführung in die qualitative Sozialforschung [Introdução à pesquisa social


qualitativa]. (5ª ed.). Weinheim: Beltz, 2002.

MILES, M. B. & HUBERMAN, A. M. Qualitative data analysis: An expanded sourcebook [A análise


qualitativa de dados: livro, uma fonte expandida] (2ª ed). Thousand Oaks: Sage, 1994.
81

MINAYO, Maria C. Souza. O Desafio do Conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 11. ed.
São Paulo: Hucitec, 2008.

MARQUES, Juracy & VERGNE, Cleonice. Pedras Pintadas. Dilemas Socioambientais do Complexo
Arqueológico de Paulo Afonso. Paulo Afonso: Fonte Viva, 2009.

MARTINELLI, Marilu. Aulas de transformação – o programa de educação em valores humanos.


São Paulo: Peirópolis, 1996.

MEDINA, N. M.; SANTOS, E. C. Educação Ambiental: uma metodologia participativa de formação.


Petrópolis: Vozes, 2000.

MORIN, Edgar. Ecologia e Revolução. In: Ecologia - caso de vida ou morte. Lisboa: Moraes
Editores, 1981.

MORIN, Edgar; KERN, Anne Brigitte. Terra-pátria. Tradução de Armando Pereira da Silva. 2. ed.
Lisboa, Portugal: Instituto Piaget, 2001.

MOSER, Gabriel. A Psicologia Ambiental: competência e contornos de uma disciplina. Comentários


a partir das contribuições. Psicol. USP v.16 n.1-2 São Paulo 2005. Disponível em < Psicol. USP v.16
n.1-2 São Paulo 2005>. Acesso em out/2009.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Agenda 21. Rio de Janeiro: Conferência das Nações
Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, 1992.

OLIVEIRA, M. A. (2005). Subjetividade e totalidade: Um confronto com as antropologias


contemporâneas. Anais do Congresso Internacional de Filosofia “Pessoa e Sociedade: Perspectivas
para o século XXI” (pp. 1-23). Braga, Portugal: Universidade Católica de Portugal.

PACHECO, Bruno. Três Fábulas Budistas para Crianças. São Paulo: Record, 2005.

PÁDUA, S. M. & TABANEZ, M. F. Educação Ambiental, caminhos trilhados no Brasil; Brasília:


UnB, 1997.

PALMA, Ivone Rodrigues. Análise da percepção ambiental como instrumento ao planejamento


da educação ambiental. 2005.

PINHEIRO, E. Percepção ambiental e a atividade turística no Parque Estadual do Guartelá –


Tibagi, PR. Dissertação (mestrado). Universidade Federal do Paraná, UFPR. 2004.

REIGOTA, Marcos. Meio Ambiente e Representação Social. 2º Ed. São Paulo. Ed. Cortez, vol. 41.
Coleção Questões da Nossa Época, (1997).

SANTOS, Milton. Pensando o Espaço do Homem. São Paulo: Hucitec, 1982.

SANTOS, Milton. A Natureza do Espaço. Técnica e Tempo. Razão e Emoção. 2º Edição. São
Paulo: Hucitec, l997.

SCHWARZ, W; SCHWARZ, D. Ecologia: alternativa para o futuro. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1990.

SARTRE, Jean-Paul. Crítica da Razão Dialética. Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

SEARA FILHO, G. Educação ambiental formal Floresta e Ambiente Vol. 5(1): 199 - 207, jan./dez.
1998 e não-formal. In: 10 ENCONTRO NACIONAL DE EDUCAÇÃO PARA O MEIO AMBIENTE.
Resumos... Rio de Janeiro, RJ: FBCN/GEA, 1988.
82

SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do Trabalho Científico. 23a ed revista e atualizada. São
Paulo: Cortez, 2008.

SORRENTINO, M. Vinte anos de Tbilisi, cinco da Rio-92: A Educação Ambiental no Brasil.


Debates Socioambientais. São Paulo: CEDEC, ano II, nº. 7:3-5, jun./set 1997.

SMUTS, Ian Christian - Holism and Evolution [Holismo e Evolução], Sul Africano - 1926 .

STEINKE, I. Gütekriterien qualitativer Forschung. [Critérios de qualidade de pesquisa qualitativa].


Em U. Flick, E. von Kardorff & I. Steinke (Orgs.), Qualitative Forschung: Ein, 2000.

TEITELBAUM, A. El papel de la educación ambiental en América Latina. Paris: UNESCO, 1978.

TRIVIÑOS, Augusto N.S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em


educação: 1.ed. São Paulo: Atlas, 1987.

WASSERMA,N Julio C. & ALVES, Albano R. O Holismo Aplicado Ao Conhecimento Ambiental.


ENGEVISTA, v. 6, n. 3, p. 113-120, dez/ 2004. Disponível em: http://www.uff.br/engevista/3
_6Engevista10.pdf.

Frank Al Saber – SANTOS, Francisco Alves dos. Ecologia Humana:


Percepção e Saberes Ambientais dos Quebradores de Pedras do Rio do Sal. 2010. 82p.
Licenciada sob a Creative Commons -Uso Não-Comercial-Vedada a Criação de Obras Derivadas

Você também pode gostar