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MOVIMENTOS SOCIAIS E POLITICA - releituras contemporaneas INTRODUCAO, Breno Bringel” Maria Vietbria E:spiivira”™ A pergunte “Tem a politica algum sentido”, Jangada por Hannah Arendt hé mais de cinquenta anos, tomna-se cada dia mais atual, Obviamente, a pergunta nao 6 nova, mas, feita hoje, incorpora contoros que nao tinha décadas atrés, Para te6ri- cos politicos contempordneos como Jacques Ranciére, o ema obsessivo do “fim” e, entre eles, “fim da politica”, esta relacionado & subtracao do politico. Subtracao que, segundo o autor fran- cés, pode ser descrita de duas maneiras: por um lado, como uma redugio do politico & sua funcio consensual, pacificadora de nexo entre os indivi- duos ea coletividade, ao descarregé-los do peso e dos simbolos da diviso social; por outro lado, como uma supressio dos simbolos da divisdo po- * Reguieador do Departamento de Citels Pllc Il edo ‘de Betudoe Contemporineos da América Latina inversidade Complutense de Made ~ Espana. Trcullad de Ciencias Poltucas y Sociologia, Campus de Somosaguas sin = 28223. Pozuelo de Alaredn - Madsl = Expanha. Brenobringel@shotmall.com Doutora em Cidncia @ Filosofia da Educagdo. Mestra ‘em Clncias Soca. Professora Adjunia de Depariamento ‘deCincla Politica oda Pés-Graduacio om Clénclas Soe ‘isda Universidade Federal da Baha, [Kua Aristides Novis, 197- Cp: 40.210-000, Federacéo. Salvador ~ Bahia Brasil. vicloria@utba br Iitica em beneficio da expansao e do dinamismo proprio da sociedade, Nesse sentido, a pacificagao reciproca do social ¢ do politico ¢ um velho assun- to que a politica provavelmente conheceu desde sempre como sua esséncia paradoxal. Segundo ele, talvez 0 “fim da politica” nao seja outra coisa que sua consumagao, a consumagao sempre jovern de sua velhice; é esse fim sempre jovem quea politica associou sempre ao pensamento da fundagao. ‘Naatualidade, a desafeigao pela politica ja nao é provocada tanto por uma atitude totalitéria, mas pelo incremento das distdncias ¢ pelo afiangamento de um “paradoxo democrético”, que pode ser resumido na idéia de que o ideal demo- ‘ratico nao tem rival, mas os regimes que o reivin- dicam suscitam fortes criticas e reticéncias. A po- litica se associa, assim, & desconfianga, e emergem. interpretagées variadas sobre os efeitos do cresci- mento do individualismo, o deciinio da vontade politica ¢ dos horizontes universalistas, 0 inere- mento do distanciamento entre elites ¢ 0 povo, etc. Para Rosanvallon, em seu livro Gontre-démocratie, ‘grande problema da “politica na era da desconti- aD DOSSIE Canto GRH, Sal sno GRH, Salvador, 21, n. 58, p 418422, Set/Dez, 2008 anga” nao é 0 da passividade ou da despolitizagao (entendida como um menor interesse pelos assun- tos piiblicos ¢ um declinio da atividade cidada), ‘mas o da “impolitica”, ou seja, da falta de apreen- sio global dos problemas ligados & organizagao de ‘um mundo comum, Para esse autor, o aumento da distancia entre a“sociedade civil” eas instituigoes delinearia uma espécie de “contrapolitica’, funda- da sobre o controle, a oposigao ea diminuigio dos poderes que jé nao se buscam conquistar de forma prioritéria, Em suma, uma politica de caréter reativo, que ndo serviria para estruturar esusten- taruma proposta coletiva. Porém esse cardter defensivo ¢ o controle soba poli nao pode nublaro am- plo leque do repertério politico, seus variados ato- res ¢ lugares de enunciagéo. f interessante notar que a distingao conceitual entre a politica (relacio- nada, maiormente, ao ambitoestatal¢ institucional) © o politico (a dimenséo que vai além do estatal ou do institucional, sem necessariamente estar confi- nadaaum determinado lugar) vem se consolidan- do, com diferentes matizes, na teoria politica. Ao ‘mesmo tempo, 6 uma distingao itil para se pensa- rem os espagos de atuacao politica dos movimen- tos sociais contemporéneos. Se, com essa distin- io, pode-se dividir, em termos analiticos, ofend- ‘meno politico em dois momentos fundamentais (0 da criagao eo da reprodugao de sentido), também. 6 possivel pensara acio dos movimentos sociais nesse espelho, a partir de uma tensao continua entre o insliluinte ¢ o instituido, o endégeno ¢ 0 exégeno, o local eo global. Desde instituigio académica dos movimen- tos sociais como objeto de estudo na década de 1960, varias teorias e paradigmas vem abordando o tema a partir de diferentes perspectivas. Das divisdes @ fraturas classicas entre as diferentes abordagens, passamos a um periodo de maior imbricagao, onde o didlogo disciplinar e de saberes torna-se um pré- roquisito fundamental para a construgio de andl ses mais complexas ¢ acordes com a realidade. As “worias cléssicas” das movimentos s maioria centradas no ambito do Estado-nacio, v ica democratic: ciais,em sua MOVIMENTOS SOCIAISEPOLITICA. sendo revisitadas devido a um pujante ativismo {ransnacional. Emergem novas lentes analiticas ¢ (ou) serenovam velhas ferramentas. Este dossié da revista Cademno CRH pretende contribuircom algumas reflexées quefomentem uma revisio das agées coletivas-e dos movimentos sociais, como objeto de estudo na contemporaneidade, As- pira a “revisitar” algumas categorias e abordagens classicas” que foram pra debate brasileiro durante a década de 1990, ¢intro-

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