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at DESENVOLVIMENTO ECONOMICO Nali de Jesus de Souza a DESENVOLVIMENTO ECONOMICO oonmeee 53 Edicd&o Revisada SAO PAULO EDITORA ATLAS S.A. - 2007 Copyright © 1992 by Editora Atlas S.A. rnin ” 1. ed. 1993; 2. ed. 1995; 3. ed. 1997; 4. ed. 1999; f + 5. ed. 2005, 2. reimpressao 2007 a > 4 Capa: Leonardo Hermano = ‘Composigao: Formato Servigos de Editoragio $/C Ltda. Dados Internacionais de Catalogagao na Publicagao (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Souza, Nali de Jesus de Desenvolvimento econémico / Nali de Jesus de Souza - 5. ed. - 2. reimpr. - So Paulo : Atlas, 2007. Varios colaboradores, ISBN 978-85-224-4038-2 1. Comércio exterior 2. Desenvolvimento econdmico 3. Desenvolvimento econémico ~ Filosofia 4. Desenvolvimento rural - Brasil 5. Economia ~ Brasil 6. Paises em desenvolvi- mento ~ Condicées econémicas I. Titulo. 95.0310 CDU-338.9 indice para catdlogo sistematico: 1. Desenvolvimento econémico 338.9 ‘TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - E proibida a reprodugao total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violacao dos direitos de autor (Lei n® 9610/98) é crime estabelecido pelo artigo 184 do Cédigo Penal. Depésito legal na Biblioteca Nacional conforme Decreto n* 1.825, de 20 de dezembro de 1907. Impresso no Brasil/Printed in Brazil a Editora Atlas S.A. Rua Conselheiro Nébias, 1384 (Campos Elisios) 1203-904 Sao Paulo (SP) Tel.: (0__11) 3357-9144 (PABX) wwwEditoraAtlas.com.br Sumario Preficio 4 quinta edigdo, xiii 1 DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, 1 1.1 _Origens da questo do desenvolvimento econémico, 1 1.1.1 Origens teéricas, 1 1.1.2 Origem nas crises econémicas, 2 1.1.3 Origem nos estudos empfricos na América Latina, 4 1.2 Conceito de desenvolvimento econémico, 5 Crescimento e desenvolvimento, 5 Desenvolvimento como mudanga de estrutura, 6 Desenvolvimento e meio ambiente, 7 Pobreza, miséria e subdesenvolvimento, 9 1.3 _Indicadores de desenvolvimento econémico, 13 Indicadores econdmicos globais do desenvolvimento mundial, 14 Nutrigdo e expectativa de vida, 14 Indicadores econdmicos e de infra-estrutura do desenvolvimento mundial, 16 1.3.4 {indices de desenvolvimento humano mundial, 17 1.4 Estrutura de uma economia subdesenvolvida, 18 1.5 _Estrangulamentos do desenvolvimento, 23 Questées para reflexdo e discussiio, 26 2 _DESENVOLVIMENTO EM UMA PERSPECTIVA HISTORICA, 28 2.1 Revolugio Industrial na Inglaterra, 28 2.1.1 Fase oligopolista da Revolugao Industrial, 31 vi DESENVOLVIMENTO ECONOMICO 2.1.2 Reduciio da hegemonia inglesa, 33 2.2. Desenvolvimento dos EUA, 35 2.2.1 Migracdes e inovagées tecnolégicas, 36 2.2.2 A Grande Depressio, 39 2.3. Desenvolvimento do Japao, 41 2.3.1 Estratégias da restauragao, 43 2.3.2 Imperialismo japonés, 44 2.3.3. O Plano Marshall e a recuperacao da economia japonesa, 46 2.3.4 Especulacdo imobilidria dos anos de 1990, 48 2.4 Conclusdo, 50 Questées para reflexiio e discussdo, 52 DESENVOLVIMENTO SEGUNDO OS ECONOMISTAS CLASSICOS, 54 3.1 Os precursores: mercantilistas e fisiocratas, 54 3.1.1 Mercantilistas, 54 3.1.2 Fisiocratas, 56 3.2 Desenvolvimento segundo Adam Smith, 58 3.2.1 A filosofia da psicologia individual, 58 3.2.2 Ariqueza das nagdes, 59 3.2.3 O crescimento de longo prazo, 62 3.3. Desenvolvimento segundo David Ricardo, 65 3.3.1 Teoria da renda da terra, 66 3.3.2. Adinamica da economia ricardiana, 71 3.3.3 Doutrina das vantagens comparativas, 75 3.3.4 Impossibilidade de superprodugao: a Lei de Say, 76 3.4 Conclusio, 78 Questées para reflextio e discussdo, 79 DESENVOLVIMENTO SEGUNDO A CONCEPGAO MARXISTA, 80 4.1. Principais categorias do modelo marxista, 81 4.1.1 Composigio organica do capital, 82 4.1.2. Exército industrial de reserva, 83 4.1.3 Tendéncia decrescente da taxa de lucro, 84 4.1.4 Esquemas de reprodugio, 85 4.2. Crises do sistema capitalista , 88 4.2.1 Crises derivadas da queda da taxa de lucro, 89 4.2.2 Crises de realizacao, 90 4.2.3 Crises de subconsumo, 93 SUMARIO 4.3 Conclusio, 96 Questées para reflexdo e discussdo, 99 DESENVOLVIMENTO SEGUNDO MALTHUS, KEYNES E KALECKI, 101 5.1 A visio de Malthus, 101 5.1.1 Malthus e o princfpio da demanda efetiva, 102 5.1.2 Criticas de Malthus a lei de Say, 103 5.1.3. Fatores da acumulacao segundo Malthus, 105 5.2 Abordagem keynesiana, 107 5.2.1 Equilfbrio com desemprego, 108 5.2.2 Eficiéncia marginal do capital, 110 5.2.3. O papel das expectativas, 112 5.3 Modelos de inspiragao keynesiana, 113 5.3.1 Modelo de Domar, 114 5.3.2 Modelo de Harrod, 115 5.3.3. Modelo de Kaldor, 117 5.4. Kalecki e o financiamento do desenvolvimento, 119 5.4.1 Financiamento em uma economia aberta e com governo, 120 5.4.2 A insuficiéncia da ajuda internacional, 122 5.4.3 Outros estrangulamentos do desenvolvimento, 123 5.5 Conclusao, 123 Questdes para reflexdio e discussiio, 125 DESENVOLVIMENTO NA VISAO SCHUMPETERIANA, 126 6.1 0 fluxo circular e seu rompimento, 126 6.1.1 Novas combinagées, 127 6.1.2 — Papel do empresario inovador, 128 6.1.3 Natureza e funcao do crédito, 130 6.2. Apresentagio formal da economia schumpeteriana, 132 6.3 Ciclos econémicos em Schumpeter, 134 6.3.1 Prosperidade, 135 6.3.2 — Recessio e depressio, 136 63.3 Declinio do capitalismo, 137 6.4 Adaptacéo da teoria schumpeteriana aos paises subdesenvolvidos, 138 6.4.1 Teoria do desenvolvimento derivado, 139 6.4.2 _ Efeito deslocamento e escala das inovacdes, 141 6.4.3 Desenvolvimento empresarial na América Latina , 142 65 Schumpeter, teoria evoluciondria e abordagem neo-schumpeteriana, 144 vii viii pesenvorvimento EcoNOMICO 6.5.1 Destruigao criadora e adaptacao, 145 6.5.2 Governo e teoria evoluciondria, 146 6.5.3 Abordagem neo-schumpeteriana, 147 6.6 Conclusao, 148 Questées para reflexiio e discussdo, 150 7 DESENVOLVIMENTO POR SUBSTITUIGAO DE IMPORTAGOES, A CEPAL E 0 DESENVOLVIMENTISMO NO BRASIL, 151 7.1 Crescimento por substituicio de importagées, 151 7.1.1 Vantagens da substituigao de importagées, 153 7.1.2 — Criticas a substituicao de importagées, 154 7.2 Pensamento da CEPAL: as teses de Prebisch e Singer, 156 7.2.1 Estratégias de desenvolvimento para a América Latina, 158 7.2.2 Limites da industrializagdo: algumas idéias da CEPAL, 159 7.2.3 Atese de Hans Singer, 162 7.2.4 Criticas as teses de Prebisch/Singer, 163 7.2.5 Teoria da dependéncia: uma abordagem neocepalina, 164 7.3 Pensamento econdmico brasileiro, 168 7.3.1 ° Pensamento neoliberal de Eugénio Gudin, 168 7.3.2 Pensamento desenvolvimentista, 169 7.3.3 Rangel e a corrente socialista, 171 7.4 Conclusio, 172 Questées para reflextio e discussdo, 174 8 _ ESTRATEGIAS DE INDUSTRIALIZAGAO E DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, 176 8.1. Crescimento equilibrado ou estratégia do grande impulso, 176 8.1.1 _ Proposta de Rosenstein-Rodan para a Europa Oriental, 177 8.1.2 Nurkse e o rompimento do circulo vicioso da pobreza, 177 8.1.3 Vantagens e desvantagens do crescimento diversificado, 179 8.2 Crescimento desequilibrado como estratégia de desenvélvimento, 180 8.2.1 A teoria dos pélos de crescimento de Francois Perroux, 180 8.2.2 Desenvolvimento como cadeia de desequilibrios, 182 8.3 _Interdependéncia tecnolégica e industrializacao, 185 8.3.1 Encadeamentos na matriz de insumo-produto, 185 8.3.2 Encadeamentos e equilibrio da balanca comercial, 188 8.3.3 Mensuragao dos efeitos de encadeamento, 190 8.4 Teoria da integragdo econémica, 194 n SUMARIO 8.4.1 _ Integracio intersetorial, 195 8.4.2 _ Beneficios da integracdo econdmica, 196 8.5 Conclusao, 197 Questées para reflexiio e discussdo, 199 AGRICULTURA E DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, 200 9.1 Papel da agricultura no desenvolvimento, 200 9.1.1 Modelo do impacto urbano-industrial, 200 9.1.2 Fungdes da agricultura no desenvolvimento, 201 9.1.3. Contribuigées extra-mercado da agricultura, 202 9.2 Agricultura e dualismo tecnolégico, 204 9.2.1 Desenvolvimento com oferta limitada de mao-de-obra, 205 9.2.2 Exportacdo de capitais e importagio de mao-de-obra, 208 9.2.3 Gastos do desenvolvimento, 209 9.3 Agricultura e crescimento econdmico no Brasil, 210 9.3.1 As funcOes da agricultura no desenvolvimento econdmico brasileiro, 211 9.3.2 Abastecimento e exportacao, 213 93.3 Mobilidade da mao-de-obra ¢ agroindiistria, 217 9.3.4 Transferéncia de recursos e expansio do mercado, 220 94 Conclusao, 222 Questées para reflexdo e discussdo, 224 RENT-SEEKING: A BUSCA DE GANHOS IMPRODUTIVOS E O DESENVOLVIMENTO, 226 10.1 Renda econémica e bem-estar social, 226 10.2 Formagio e mensuragao do rent-seeking, 229 10.2.1 Niveis de rent-seeking, 231 10.2.2 Mensuracdo do rent-seeking, 232 10.3 Rent-seeking e desenvolvimento, 235 10.3.1. Rent-seeking ¢ a classe estatal, 235 10.3.2 Aperfeigoamentos institucionais, 237 10.3.3 Papel do excedente de renda e do Estado, 240 10.4 Conclusio, 241 Questées para reflexdio e discussdo, 244 OUTRAS ABORDAGENS DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, 245 41.1 Teoria evolucionaria do desenvolvimento econémico, 245 ix X _DESENVOLVIMENTO ECONOMICO 11.1.1 Evolugio das espécies, 245 11.1.2 Etapas do desenvolvimento de Rostow, 246 11.13. Teoria evolucionéria de Guha, 248 11.2. Desindustrializaco das economias avancadas, 254 11.2.1 Desempenho econdmico do Reino Unido, 255 11.2.2 Fatores de oferta da desindustrializacdo, 256 1123 Fatores de demanda da desindustrializacio, 259 11.2.4 Desindustrializagdo e desenvolvimento econdmico, 261 11.3 Modelos neocléssicos de crescimento econdmico, 263 11.3.1 Modelo de Meade, 263 11.3.2 Modelo de Solow, 264 11.33. Teoria de crescimento com progresso técnico endégeno, 265 11.4 Conclusao, 266 Questées para reflexdio e discusso, 268 12 COMERCIO INTERNACIONAL E DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, 270 12.1 Crescimento pela expanstio das exportacbes, 270 12.2. Teoria da base exportadora, 273 12.2.1 Testes empiricos sobre a teoria da base exportadora, 275 12.2.2 Efeitos de uma variagdo das exportagdes sobre 0 produto total, 276 12.2.3 Papel do setor de mercado interno, 277 12.3 0 exescimento econémico de economias em desenvolvimento, 278 12.3.1 Grescimento econémico da india, 279 12.3.2 Crescimento econémico da China, 284 12.33 Crescimento econdmico da Coréia do Sul, 269 12.4 Conclusio, 293 Questées para reflextio e discussao, 294 CONSIDERAGOES FINAIS, 296 Bibliografia, 303 RELAGAO DE QUADROS, TABELAS E FIGURAS Xi RELAGAO DE QUADROS, TABELAS E FIGURAS Quadros Quadro 8.1 Matriz de insumo-produto, M, para dois setores (2 x 2), 186 Quadro 8.2 Matriz 2 x 2 dos coeficientes técnicos diretos de insumo-produto, A, 186 Quadro 8.3 Matriz 2 x 2 dos coeficientes técnicos diretos e indiretos de insumo- produto, K, 187 ‘Quadro 8.4 Relagdes de insumo-produto de cinco indtistrias ficticias de uma economia I, 189 Quadro 8.5 — Matriz de coeficientes de produto, A*, para dois setores, 191 ‘Tabelas Tebela 1.1 Brasil: populagdo total, populacao pobre e populacao indigente (milhdes de pessoas), 11 ‘Tabela 1.2 Estrutura da economia no periodo inicial, 25 ‘Tebela 1.3. Estrutura da economia no periodo final, 26 Tabela 2.1 _ Indicadores econémicos do Japao em comparagéo com alguns paises (délares de 1999 e %), 49 Tebela 3.1 _Deslocamento da margem extensiva para terras menos férteis, na concepcao do modelo ricardiano, 67 Tabela3.2 —Situacdo de cada drea de cultivo quando a margem extensiva encontra-se nas terras do tipo E, 69 ‘Tebela 3.3 Numero de horas necessdrias para produzir uma unidade de tecido e uma unidade de vinho em Portugal e na Inglaterra, 76 Tebela 5.1 Valor atual de um fluxo de renda a varias taxas de desconto, 110 ‘Tebela 12.1 Indicadores econdmicos da india e Brasil, 1980/1990 e 1990/1999, 283 Tabela 12.2 _Crescimento demogréfico e econémico de um grupo de pafses em desenvolvimento, 1980/1999, 287 Figura l.1 —_Estrutura de uma economia subdesenvolvida, 20 Fgura 5.1 Eficiéncia marginal do investimento, 112 "Figura 6.1 _Flutuagdes econdmicas de longo prazo, 134 Fgura 8.1 0 circulo vicioso do subdesenvolvimento de Nurkse, 178 Figura 8.2 _Estratégias seqiienciais do crescimento desequilibrado de Hirschman, 184 Figura 9.1 Funcdo de producao agricola com oferta ilimitada de mao-de-obra, 206 Figura 9.2 Equilibrio no mercado de trabalho, 207 Figura 10.1 Custo de oportunidade e quase-renda no curto prazo, 227 Figura 10.2 Excedente do consumidor e excedente do produtor, 228 xdi_DESENVoLVIMENTO ECONOMICO Figura 10.3 Figura 10.4 Figura 10.5 Figura 12.1 Figura 12.2 Tridngulo da perda do bem-estar, com oferta perfeitamente eldstica, 233 Triangulo da perda do bem-estar, com oferta menos elistica, 233 Custo social de um imposto de importagio, 234 Bfeitos de variacées das exportagées sobre o produto, 276 Efeitos de uma mudanca na propensio da regidio a absorver o seu proprio produto, 277 Prefacio 4 Quinta Edicdo ‘No final do século 19, poucas cidades possufam abastecimento de 4gua, saneamento ‘= Saminacio publica; a satide piiblica era precéria, as taxas de mortalidade muito altas e ‘= pessoas possufam baixa expectativa de vida. No século 20 a Humanidade conheceu um ‘resessso sem precedentes em todas as areas, com melhorias significativas dos niveis de S==- desenvolvimento. Os governos passaram a intervir diretamente na economia a partir ‘= Grande Depressio e, sobretudo, apés a II Guerra Mundial. Durante a Guerra Fria os ‘SEA consolidaram sua hegemonia em todo mundo a partir da economia de guerra. Sssterou-se a corrida espacial com os soviéticos conquistando o espago sideral e depois ‘@ smericanos chegando a Lua. __ 4Guerra Fria contribuiu para marginalizar os paises subdesenvolvidos que cresciam ‘=semente. Para aumentar as chances de progresso, a Europa uniu-se em torno do Mer- ‘Ss Comum, formado inicialmente pelo Grupo dos Seis. A Inglaterra, ausente desse grupo, ‘Sezsnizou-se em torno da Comunidade Britanica, formada pela maioria das ex-col6nias, + Unio Soviética nao suportou os efeitos da disputa ideolégica. Diante das dificuldades ‘Sssebmicas, surgiu a perestrdica (reestruturacao), em 1985, sob a lideranca de Gorba- ==, due iniciou o didlogo com os EUA e se aproximou da China. Em 1990, ele aceitou ‘@=eificacdo das duas Alemanhas e, em 1991, a Unido Soviética foi dissolvida. A rede mundial de computadores, concebida em 1968 nos meios militares dos EUA, ‘SSsadiu-se em todo o mundo nos anos de 1980 e 1990, contribuindo decisivamente para ‘s=Suzir os custos da informacao. O microcomputador e a Internet talvez sejam as princi- xiv DESENVOLVIMENTO ECONOMICO Pais invengGes do final do século 20. Elas possibilitaram a globalizacao dos capitais e do sistema produtivo, Pela teoria do ciclo do produto, as empresas deslocam filiais para areas com menores custos, quando 0 produto niio pade mais ser obtido com luero no centro inovador. Os contatos entre filiais e matrizes ficaram facilitados com o desenvolvimenty da Internet, da informética e do telefone celular, e com a reducao dos custos de transpor- tes. As grandes empresas inovadoras produzem de imediato nos mais distantes paises do mundo onde a mao-de-obra é mais barata e os incentivos de toda a espécie sio matores, Com a globalizagao e a reducio dos custos da informagéio, aumentou substancialmente 4 mobilidade internacional de capitais. Capitais aplicados em um pais podem, no mesmo dia, ser transferidos para o outro lado do mundo. Esses capitais voldteis Provocaram a Crise do México em 1994, quando varios bilhdes de délares sairam desse pats em poucos dias, espalhando a crise para outras economias. Para faciitar os negécios em eseale mun, dial, 0s paises foram induzidos a abrir os mercados aos bancos estrangeiros, O Tesouro dos EUA, o FMI e 0 Banco Mundial geraram o Gonsenso de Washington, segundo o qual os paises deveriam dar prioridade a privatizayao, desregulamentagao e abertura de suas economias. Assim, o Banco Mundial passou a exigir estabilidade no lugar de estimular o crescimento das economias em desenvolvimento, Em seu livro A globalisagao e seus maleficios, Stiglitz (2003), Prémio Nobel de Eco- nomia de 2001, considera que o FMI faz exigéncias muito dificeis de serem seguidas pe- los palses pobres e que o Estado vem deixando de exercer um papel mais ative e iui a0 desenvolvimento econdmico. Segundo ele, os interesses da comunidade financeina inter- hacional forain colocados na frente dos interesses das nagoes mais pobres. 0 préprio Banco Mundial considera que a globalizacio gerou perdedores, que sao os paises pobres que no aderiram A globalizacdo, envolvendo dois bilhées de pessoas. Esses paises correm 0 rises de se tornar marginais em relacéo a economia mundial, com redugao de renda ¢ aumen- to da pobreza. Porém, ele afirma que os paises em desenvolvimento que aderiram 2 glo- balizagdo, envolvendo cerca de trés bilhes de pessoas, passaram a exportar predominan- femente produtos manufaturados e servicos, que reduziu a pobreza, A S* edigo deste livro foi amplamente revisada; os dados relativos aos diferentes patses foram atualizados. No Capitulo 1, foram acrescentados meio ambiente © pobreza Enovos indicadores de desenvolvimento. No Capitulo 3, a segdo de Ricardo passou a contar com a doutrina das vantagens comparativas e a Lei de Say. A seco sobre Keynes, no Capitulo 5, foi ampliada com a andlise do equilibrio com desemprego e da eficiéneie marginal do capital. A secio sobre Schumpeter e a teoria evoluciondria foi transferida de Capitulo 11 para o Capitulo 6, acrescentando-se também a abordagem neo-schumpete- ‘ana. Da mesma forma, o Capitulo 7 inicia-se com a abordagem do crescimento com een, nomia fechada transferida do Capitulo 12. No Capitulo 8, incluiu-se a teoria dos pélos de crescimento de Perroux ¢ ampliou-se a andlise do cireulo vicioso da pobreza de Nurkse, Os demais Capitulos foram aperfeicoados e os dados atualizados. Na Conclusao, enfati- zamse as principais modificagdes da teoria do desenvolvimento e da economia mundial. Néo obstante a riqueza que vem sendo gerada no mundo, as pessoas que passam fome ainda se contam aos bilhdes. O setor produtivo ainda nao foi capaz de gerar empregos e alimentos baratos para a populagao pobre. Em seu livro Desenvolvimento como liberdade, PREFACIO A QUINTA EDIGAQ = XW (2000, p. 18) afirma que a pobreza extrema retira das pessoas “a liberdade de saciar de obter uma nutricio satisfatéria ou remédios para doencas tratdveis, a oportu- de vestir-se ou morar de modo apropriado, de ter acesso & agua tratada ou sanea- _ Textos complementares a alguns capitulos esto disponiveis ao piiblico em geral, ser acessados através do site da editora: . © Autor ¢ grato pelo apoio institucional proporcionado pelo Niicleo de Estudos e — NEP (Economia) e pelo Mestrado em Economia do Desenvolvimento do De- Economia da PUCRS. Porto Alegre, outubro de 2004. O Autor Desenvolvimento Econémico Desenvolvimento econémico é um tema que emergiu somente no século XX. O obje- tivo daqueles que se ocupavam com as finangas puiblicas era aumentar 0 poder econémi- co e militar do soberano, Raramente havia a preocupacdo com a melhoria das condigées de vida do povo, apesar do analfabetismo generalizado, dos surtos de fome e dos altos niveis de mortalidade. Muitas vezes, a populagdo era dizimada por epidemias provoca- das por falta de higiene. A necessidade de seguranga superava objetivos econémicos sociais. As viagens eram perigosas e as agressdes estrangeiras freqiientes. No caso do re- gime feudal, procurava-se combinar a seguranca do povo com a subsisténcia do Senhor. Esse sistema manteve um equilibrio secular, mas dificultava as mudangas necessérias a0 desenvolvimento econémico. O surgimento do Estado nacional moderno, o Renascimen- to eas grandes descobertas maritimas revolucionaram as relagdes econémicas. As rique- zas coloniais desempenharam importante papel na expansiio das economias nacionais européias. 1.1 Origens da questao do desenvolvimento econémico A questo do desenvolvimento econdmico tem raizes tedricas e empiticas, origina- das na maior parte dos casos das crises econémicas do sistema capitalista. 1.1.1 Origens tedricas Alguns autores acreditam que se encontra no pacto colonial, derivado do pensamen- to mercantilista, a origem do subdesenvolvimento contemporaneo. Em relacao as me- t6poles, a grande falha do sistema evidenciou-se por se ter atribuido importdncia de- masiada ao afluxo de metais preciosos como fator da riqueza nacional. Procurando maximizar os saldos da balanca comercial, repudiava-se implicitamente o papel que as importacées poderiam ter no desenvolvimento manufatureiro interno. Como reacao a0 mercantilismo, surgiram no século 18 as escolas fisiocrdtica na Franga e a cldssica na 2 _DESENVOLVIMENTO ECONOMICO Inglaterra, que passaram a se preocupar objetivamente com os problemas do crescimen- to e da distribuigdo. O tema crescimento econdmico emerge com vigor com Adam Smith. O autor procu- ra identificar os fatores da formagao da riqueza nacional; explica como 0 mereado opera e qual a importancia do aumento do tamanho dos mercados para reduzir os custos mé- dios (efeito escala) e permitir a producao com lucros. Expandindo-se os mercados, au- mentam a renda e o emprego. O desenvolvimento ocorre com 0 aumento da proporcao dos trabalhadores produtivos em relacao aos improdutivos; pela reducao do desemprego e elevacio da renda média do conjunto da populago. Mais tarde Schumpeter diferen- ciou crescimento de desenvolvimento, sendo este provocado pelas inovagées adotadas pelo empresdrio, com a ajuda do crédito. 1.1.2 Origem nas crises econémicas No mundo real, a abordagem do desenvolvimento, como problema, ficou mais enfati- zada a partir das flutuagdes econémicas do século 19; a concentragao da renda e da rique za em nivel mundial, agravada com o surgimento de alguns poucos paises industrializa- dos, tornou mais evidente a disparidade entre nacées ricas e pobres. Mesmo no interior das nagées industrializadas, tornou-se mais saliente o desnivel do desenvolvimento entre re- xgides e classes sociais. A nocao de desenvolvimento, atrelada & questo da distribuigio, pas- sou a ser ento mais enfatizada em todos os paises. Durante as fases de ocorréncia de on- das de inovages (tear mecAnico, maquina a vapor, petréleo, eletricidade, informatica, In- ternet, telefonia mével), a economia dos paises inovadores cresce de modo muito mais acelerado. Expandem-se a renda, 0 emprego eo nivel de bem-estar da populacao. Em ou- tros periodos, com as inovagées caindo no dominio piiblico, o nivel da atividade se reduz as empresas despedem trabalhadores. O fenémeno repercute nos setores interligados e a crise se generaliza, primeiro em recessao, depois em depressao (ver cap. 6). A Grande Depressao dos anos de 1930, decorrente da queda da Bolsa de Nova lor- que, colocou em evidéncia o grande drama social do desemprego. Tornou-se mais pre- mente a aco do Estado na economia, realizando investimentos diretos e manipulando politicas anticiclicas, com a finalidade de reduzir o desemprego e amenizar as repercus- sdes sociais das flutuagdes econdmicas. Constatou-se que as crises desenrolaram-se com intensidades varidveis, segundo os diferentes setores e regides. Nos surtos, o produto cres- ce, beneficiando a todos; nas crises, ele se contrai, prejudicando especialmente os assala- riados e as pequenas empresas. Os agentes econdmicos tém necessidades basicas que naio podem deixar de ser satisfeitas. Desse modo, tanto a estabilidade torna-se condicao ne- cessaria ao desenvolvimento econémico, como o crescimento precisa ocorrer em ritmo suficiente para atender As reivindicagées das diferentes classes sociais, regides e paises. A questéo do desenvolvimento econémico também ficou mais evidente, no final dos anos de 1930, com a aplicagio da Contabilidade Nacional, nascida com a teoria keyne- siana, Com ela, passou-se a comparar a renda per capita dos diferentes paises e a classifi- c4-los como “ricos” ou “pobres”, dependendo do valor dessa renda média. Com a publi- cacao de outros indicadores, os paises “pobres” passaram a ser caracterizados como “sub- desenvolvidos” também por apresentarem crescimento econémico insuficiente e instavel, alto grau de analfabetismo, elevadas taxas de natalidade e de mortalidade infantil, pre- DESENVOLVIMENTO ECONOMICO | 3 dominancia da agricultura como atividade principal, insuficiéncia de capital e de certos sccursos naturais, diminuto mercado interno, baixa produtividade, instabilidade politica cre. Assim como a Grande Depresséo mostrou que politicas monetarias ¢ fiscais dos g0- Semos tornam-se imprescindiveis para amenizar as crises, a publicagio de alguns diag- éstieos pela Organizacdo das Nagées Unidas (ONU) e pelo Banco Mundial, a partir da Segunda Guerra Mundial, provocou o grande despertar nos paises subdesenvolvidos (Myr- Gal, 1968, p. 156), que passaram a reivindicar maior volume de ajuda econ6mica dos paises ricos nos féruns internacionais. Com 0 aperfeicoamento das estatisticas oficiais e a divulgagao desses estudos, cons- tatow se que 2/3 da populacao mundial, classificados como “pobres”, possuiam renda per capita bastante inferior aquela da minoria dos paises “ricos”, geradores de 5/6 da produ- o mundial. A miséria nos: paises “pobres”, sem dhivida o maior problema econémico Tnundial, tornou urgente o estudo das “causas da pobreza das nagbes”. Combater esse problema passow a ser uma questo econdmica, humanitaria ¢ politica (Meier ¢ Baldwin, 1968, p. 25). Nesse sentido, técnicos do Banco Mundial acreditam que nao basta a reali- zagio de investimentos produtivos e de infra-estrutura para reduzir a pobreza no curt prazo. O problema é de tamanha magnitude e urgéncia, que se tornam necessérias agdes Sumanitdrias diretas nos focos de pobreza, a fim de combater a fome e as doencas ¢ re- duzir as disparidades internacionais do nivel de renda. ‘Apés a Segunda Guerra Mundial, a macroeconomia keynesiana passou a ser aplica- da em todo o mundo, Contudo, verificou-se sua inadequagao para explicar 0 desenvolvi- mento, por ser este um fendmeno de longo prazo. Os economistas buscaram, entéo, na Historia Econémica os elementos para a formacio de uma “teoria do desenvolvimento”. ‘A principal constatacao foi a de que o subdesenvolvimento deriva do desenvolvimento, isto é&da expansio do capitalismo mundial em sua fase oligopolista (Furtado, 1961, p. 180- 191). A teoria do imperialismo também havia concluido que as economias “pobres” nao se poderiam desenvolver se nao rompessem os vinculos coloniais com os paises de economia dominante. Tais vinculos, observaram os adeptos da teoria do imperialismo e da teoria da dependéncia, tornavam-se cada vez mais fortes com a troca desigual e com 0 aumento dos fluxos internacionais de capitais.? De outra parte, periodicamente eles ficavam refor- cados pelas aliancas entre o capital internacional e as classes dominantes internas, que, em troca, recebiam apoio externo para a manutencao do status quo e para se manterem no poder. Emibora essas teorias sejam passiveis de criticas, verificou-se que, de fato, o princi- pal entrave ao desenvolvimento era de natureza politica, pois se reservava aos paises pobres uma posicdo subalterna no contexto da divisio internacional do trabalho. Desse modo, eles deveriam continuar produzindo matérias-primas estratégicas a baixo custo para fins militares (Segunda Guerra Mundial, Guerra da Coréia e Guerra Fria, no contexto da doutrina da solidariedade continental) e alimentos baratos para alimentar os trabalhado- 1 Para maiores esclarecimentos sobre este ponto, veja no Capitulo 2 a parte referente @ Revolucdo Industrial na Inglaterra. 2 Como aumento da circulacio internacional dos capitais volateis, pela reducao dos custos da informagio (desenvolvimento da informatica e Internet, sobretudo), os paises menos desenvolvidos ficaram mais vulnerdveis as crises externas. 4 _DESENVOLVIMENTO ECONOMICO res dos pa(ses centrais e nao deprimir sua taxa de lucro. Essa abordagem hist6rica, feita sobretudo por marxistas, provocou uma reacao dos economistas da corrente mais tradi- cional nos anos de 1940 e 1950. Estes tiltimos passaram a refutar a teoria do imperialis- mo ea teoria da dependéncia com teorias alternativas. Construfram modelos nos quais identificaram a escassez de capital como a causa fundamental do subdesenvolvimento. Os autores de inspiracdo neocldssica enfatizavam, como estratégia de crescimento e desen- volvimento, o incremento da taxa de poupanca interna, o afluxo de capitais externos e a expansao das exportagées, fatores mais tarde aceitos pela maioria das correntes de pen- samento. 1.1.3. Origem nos estudos empiricos na América Latina Simultaneamente, no fim dos anos de 1940 e inicio dos anos de 1950, economistas dos paises pobres comegaram a elaborar diagnésticos da realidade de seus paises, como objetivo de captar recursos dos paises desenvolvidos, sobretudo dos EUA, e implementar planos de desenvolvimento. Na América Latina, a idéia dos economistas da CEPAL era a de que os norte-americanos estabelecessem para a regiao algo parecido com o Plano Marshall, elaborado para a reconstrugéo da Europa, devastada pela guerra.° No inicio, a abordagem dos economistas da CEPAL foi muito criticada, porque contrariava os interes- ses da divisdo internacional do trabalho, segundo a qual cada pais deveria especializar- se na produgao daqueles bens para os quais apresentasse vantagens comparativas de custo. Em outras palavras, os paises subdesenvolvidos nao deveriam industrializar-se, mas con- tinuar produzindo alimentos e matérias-primas para a exportacao e importar bens ma- nufaturados para consumo interno. Os economistas cepalinos partiram da critica acirra- da A doutrina das vantagens comparativas de Ricardo, que dava um fundamento econd- mico 4 dominagao politica e que prolongava o estado de “subdesenvolvimento” dos paf- ses “pobres”. Esses paises, principalmente Brasil, México e india, adotaram com visivel sucesso uma politica de industrializacao por substituicéo de importagoes. Os paises industrializados, tendo perdido participacao no mercado interno desses paises, procuraram exportar capi- tais de risco, mediante a implantaco de filiais de suas empresas a fim de reconquistar os mercados. No plano da politica interna, em meados da década de 1950, substituiu-se a alianca do capitalismo internacional com o latifiindio feudal por uma alianga com os gru- pos industriais emergentes e com o Estado nacional intervencionista (Cardoso ¢ Faletto, 1975, cap. 6). O grande afluxo de investimentos externos diretos intensificou o desen- volvimento industrial de paises como Brasil e México. Empresas multinacionais passaram a participar do mercado interno desses paises, recebendo os mesmos incentivos das em- presas nacionais. O debate sobre o desenvolvimento econdmico, no Brasil, tomou forma com os estu- dos da Comissao Mista Brasil-EUA (1951/1953) e do Grupo Misto BNDE-CEPAL (1953/ 1955), que forneceram elementos para os planos nacionais subseqiientes. O relatorio da 3 _ Esse plano, executado entre 1948 e 1951, no auge da Guerra Fria, serviu para recupe- rar e expandir o sistema produtivo europeu, consolidar a penetracio do capital norte-americano na Europa e bloquear 0 avango do comunismo no Ocidente. DESENVOLVIMENTO ECONOMICO = 5S Comisséo Mista salientou que o ritmo de crescimento industrial, desde a década de 1940, era trés vezes superior ao da agricultura e que o Brasil jé possu‘a amplo setor de merca. do interno, justificando a producao em larga escala. Entre os problemas, a Comissao Mis. % Brasil-EUA apontou a caréncia de infra-estrutura (energia, transportes, comunicagées), Producao agricola insuficiente, sobretudo de alimentos, oligopolizacéo da comercializa. $0 agricola etc. Sugeriu, entre outros pontos, que se incentivasse o ingresso de capitais Sstrangeiros e que se adotasse uma politica cambial favoravel nesse sentido. A Comissao Mista elaborou uma politica de desenvolvimento semelhante da CEPAL, com a vanta, gem “de produzir projetos de investimentos que respondiam diretamente as necessida. Ges de acumulacao industrial no Brasil". De outra parte, tratava-se de “sugestées praticas Sue foram amplamente acatadas pelo governo brasileiro...” (Mantega, 1987, p. 69). 1.2 Conceito de desenvolvimento econdmico Nao existe uma definicao universalmente aceita de desenvolvimento. Uma primeira Sorrente de economistas, de inspiragéo mais tedrica, considera crescimento como sinéni- mo de desenvolvimento, J4 uma segunda corrente, voltada para a realidade empiica, en. fende que o crescimento é condicao indispensavel para o desenvolvimento, mas nao é con. Sisao suficiente. No primeiro grupo, enquadram-se os modelos de crescimento de tradigao Reoclassica, como os de Meade e Solow, e os de inspiracéo mais keynesiana, como os de Harrod, Domar e Kaldor. Na segunda corrente, economistas como Lewis (1969), Hirsch. man (1974), Myrdal (1968) e Nurkse (1957), embora com raizes ortodoxas, realizaram andlises e elaboraram modelos mais préximos da realidade das economias subdesenvolvi. Gas.‘ Para os economistas que associam crescimento com desenvolvimento, um pais é sub. desenvolvido porque cresce menos do que os desenvolvidos, embora apresente recursos ecios0s, como terra e mio-de-obra. Ele nao utiliza integralmente os fatores de producdo e que dispée e, portanto, a economia expande-se abaixo de suas possibilidades, 1.2.1 Crescimento e desenvolvimento Asociados a essa nocdo, emergem os modelos que enfatizam apenas a acumulagéo de capital, solucao simplificadora da realidade, que coloca todos os paises dentro da mesma problematica. A idéia é de que o crescimento econdmico, distribuindo diretamente a ren. da entre os proprietdrios dos fatores de produc&o, engendra automaticamente a melho. fia dos padrées de vida e o desenvolvimento econémico. Contudo, a experiéneia tem de. monstrado que o desenvolvimento econémico nao pode ser confundido com crescimen- %, Porque os frutos dessa expansio nem sempre beneficiam a economia como um todo ¢ © conjunto da populacéo. Mesmo que a economia cresca a taxas relativamente elevadas, odesemprego pode nao estar diminuindo na rapidez necessédria, tendo em vista a tendéncia contempordnea de robotizacao e de informatizacdo do processo produtivo. Associado ao g*), sistematicamente, a renda per capita sobe no lon- 0 prazo, o que seria a primeira definigéo de desenvolvimento. No entanto, uma qualifi- cac&o mais acurada precisaria ser feita quanto ao numerador e ao denominador da rela- do que define a renda per capita (renda nacional/populagio nacional). Quanto a renda, a questdo é saber como ela se distribui entre as pessoas e se as ra- tes de seu crescimento se devem A construcdo de habitacSes populates ou de equipa- mentos militares, ao aumento das horas de trabalho ou a maior produtividade. Em rela- 40 4 populagao, o simples aumento da renda nao indica, necessariamente, se ela se en- contra melhor ou pior em termos de satide, educagao e conforto; uma possivel melhoria no nivel de bem-estar das pessoas é apenas inferida pela elevacao da renda per capita. Uma definicdo mais completa de desenvolvimento exige, portanto, outras indicades de como estd se comportando no tempo, tanto o produto como a populagao, em termos de maior produtividade e melhores niveis de bem-estar social. 1.2.3. Desenvolvimento e meio ambiente Uma definigao completa de desenvolvimento envolve, além da melhoria de indica- __ dores econémicos e sociais, a questo da preservacao do meio ambiente. Com 0 tempo, 0 __ctescimento econdmico tende a esgotar os recursos produtivos escassos, através de sua __nologia, geralmente agricolas e de consumo interno, vendidos ou nao no mercado. O setor de sub- | __sisténcia ¢ aquele em que as unidades produtoras sao geralmente familiares e produzem basica- mente para consumo préprio. Como este tiltimo setor vende eventualmente alguma parte da pro- ducao no mercado, os termos tradicional e subsisténcia podem se confundir. Esses setores podem também ser denominados setor arcaico, em oposigéo ao setor moderno, com alta intensidade de capital e tecnologia. Compreende-se como setor informal aquele nao registrado legalmente, podendo ser de subsisténcia ou nao ee 8 _DESENVOLVIMENTO ECONOMICO utilizagao indiscriminada. Por exemplo, o crescimento econémico acelerado pode provo- car o desmantelamento de florestas, a exaustdo de reservas minerais e a extingao de cer- tas espécies de peixes. A atividade agricola tende a ocupar vastas 4reas de terras onde se encontravam florestas. A urbanizacao explosiva resultante tem provocado o esgotamen- to das fontes de agua potdvel. A atividade produtiva pode também poluir os mananciais de Agua, infestar o ar atmosférico, interferindo no préprio clima e no regime de chuvas, ‘0 que afeta a satide da populacao. Em outras palavras, desenvolvimento sustentdvel é 0 que preserva o meio ambiente, sobretudo os recursos naturais nao renovaveis. Preocupada com a questo ambiental, a ONU realizou uma conferéncia no Rio de Janeiro, em 1992, para discutir 0 tema, envolvendo 172 chefes de Estado. No final da conferéncia, foi elaborada a Agenda 21, em que cada chefe de Estado se comprometeu a defender em seus respectivos paises um conjunto de pontos, visando atacar o problema ambiental. Foi constatada a necessidade de adotar uma nova aco global, visando mobilizar toda a sociedade para os problemas sociais e ambientais, pois nao basta apenas a acao do Es- tado, mesmo que ele possa contar com a ajuda do setor privado. Nesse sentido, é muito importante desenvolver a consciéncia social e ambiental do conjunto da populagao. Nas acées mais efetivas contra a miséria e a preservacao do meio ambiente, é fundamental a participacdo de organizacées nao governamentais, de grupos de trabalho voluntario e de cooperativas e associagées de bairro. Em 1997, a ONU realizou uma convengo em Kyoto, no Japao, para tratar da mudan- a de clima no mundo. Foi elaborado 0 Protocolo de Kyoto, segundo o qual os paises in- dustrializados se comprometeriam a reduzir suas emissdes combinadas de gases do efeito estufa em pelo menos 5% em relagio aos niveis de 1990 até o periodo de 2008/2012. Em 1990, os paises desenvolvidos eram responséveis por 55% das emissées totais de diéxido de carbono na atmosfera, cabendo aos EUA 25% desse total. Um dos meios para alcangar esse objetivo seria através da reforma do sistema de energia e de transportes e do uso de fontes renovaveis de energia, entre outros mecanismos. Os EUA negaram-se a assinar 0 Protocolo de Kyoto, alegando que seria prejudicial 4 economia norte-americana. Em 2002, a Ciipula Mundial para o Desenvolvimento Sustentavel, formada por re- presentantes de 200 paises, reuniu-se em Johannesburgo (Africa do Sul), onde discutiu o desenvolvimento sustentdvel. Ela procurou conciliar crescimento econémico, justiga so- cial e protecdo do meio ambiente. Estabeleceu-se a meta de reduzir pela metade, até 2015, o nimero de pessoas que ganham até um délar por dia e o nimero de pessoas sem aces- so a dgua potdvel e saneamento basico. Para o combate a pobreza, uma das estratégias projetadas foi o estabelecimento de um fundo de solidariedade internacional. Teme-se que o desmatamento e a poluicao dos mananciais de 4gua potavel prejudi- quem a fauna e a flora, provocando mudangas climaticas. Os otimistas pensam que o pré- prio desenvolvimento tecnolégico ajudard a preservar o meio ambiente e que nas tiltimas décadas melhorou sensivelmente o nivel de poluicao do ar e da 4gua nos paises desen- volvidos. Isso resultou da conscientizacao geral e da acao reguladora do poder publico. Por volta de 1972 0 Congresso dos EUA aprovou a Lei do Ar Limpo, 0 que ajudou a redu- zir a emissao de didxido de enxofre na atmosfera. Hé décadas a Franca possui uma Lei das Aguas, que controla o uso racional das aguas internas, a fim de melhorar a qualidade da Agua potavel para uso da populacdo francesa. A poluigao gera externalidades negati- vas porque afeta a qualidade de bens piiblicos, como florestas, rios e o ar atmosférico, 0 DESENVOLVIMENTO ECONOMICO = 9 que aumenta os custos sociais. Uma sugestado seria cobrar uma taxa dos agentes poluido- res e incentivar o desenvolvimento de tecnologias limpas, com 0 objetivo de melhorar a qualidade do meio ambiente.* Outra idéia para preservar o meio ambiente seria pagar pelo gerenciamento am- biental em certas areas estratégicas, como mananciais de 4gua potdvel e margens dos rios, © que pode ser mais barato do que gastar mais tarde com a despoluigao. A conclusao a que se chega é a de que apenas 0 jogo das forcas de mercado nao é sufi servar 0 meio ambiente. 1.2.4 Pobreza, miséria e subdesenvolvimento Um dos principais indicadores de desenvolvimento € 0 ntimero de pessoas pobres, com renda insuficiente para o atendimento das necessidades basicas. Esse indicador afe- ta 0 crescimento do setor de mercado interno, pois sua dimensao depende tanto do ta- manho da populacao, como de seu poder aquisitivo. Esse setor amplia-se, portanto, com a redugao da pobreza. © Banco Mundial estima que a populagao miseravel tenha chega- do a 1,5 bilhao de pessoas em 2003, enquanto em 1990 o numero nao passava de 1,3 bilhdo.” Levando em conta uma renda de até dois délares por dia, chega-se a uma popu- lacdo em todo 0 mundo de 3 bilhdes de pessoas, ou seja, a metade da populacdo mun- dial. O crescimento da pobreza e do grau de desigualdade social agrava-se com as crises econémicas. A crise financeira de 1997 aumentou a populagao miserdvel em 20 milhdes de pessoas na Indonésia, Tailandia e Coréia do Sul. A excecao seria a China, onde essa populacao caiu de 280 milhdes, em 1990, para 125 milhées, em 1997 (Banco Mundial, 2003, Distribuicao de renda). A renda per capita é uma média e no interior de cada pais existe um contingente apreciavel de pessoas sem rendimentos, ou que percebe renda extremamente baixa. Des- se modo, o nivel de miséria no mundo apresenta-se ainda maior, computando-se 0 nti- mero de pessoas miserdveis que vivem abaixo da linha de pobreza em todos os paises. Mesmo em nacées de renda média, e nos préprios paises ricos, existe um conjunto de pessoas que nao recebe renda suficiente para o atendimento de suas necessidades bdsicas. Sao 0s socialmente marginalizados e os desempregados que nao recebem salario-desem- prego. O agravante é de que, nas tiltimas décadas, o padrdo de vida dessa populacao mais Pobre, em termos de renda média, vem diminuindo. Isso se deve 4 expansao demogréfi- ca acelerada, ao crescimento do desemprego e a lenta acumulacéo de capital, tendo em vista, entre outras coisas, a desaceleracao do crescimento econdmico mundial. Desse modo, populagées carentes se formam, nao apenas em certas dreas da Asia e da Africa Central, mas também na periferia das grandes cidades, tanto nos paises mais pobres como nas economias de renda média. Assim, aumentam as epidemias e os indicadores de crimina- lidade, empobrecimento, desnutrigao e evasio escolar. 6 _ Para maiores detalhes acerca da economia do meio ambiente, ver, por exemplo, Cé- nepa in Souza (1996, cap. 16). 7 _ Segundo o Banco Mundial, as pessoas com renda per capita de até US$ 370 sio consi- deradas miserdveis, por nfo conseguirem suprir as necessidades minimas (conceito de paridade do poder de compra de cada pais e délares de 1985). 10 _DESENVOIVIMENTO ECONOMICO Questiona-se o que fazer para atimentar a taxa de crescimento das economias mais pobres e melhorar os indicadores de desenvolvimento, principalmente porque o grande contingente demografico das nacdes mais pobres deveré expandir-se consideravelmente nas proximas décadas. Estimativas do Banco Mundial dao conta de que a populacao dos paises de baixa renda passard dos 3,1 bilhdes de 1993 para 5 milhdes no ano 2025. 0 crescimento demografico nos paises de renda média também ser expressivo, com mais 725 milhées nesse perfodo, contra apenas 96 milhdes de pessoas nos paises ricos (Banco Mundial, 1995).® Cabe ao Estado o papel essencial na organizacao do esforgo de desen- volvimento: regulacéo do crédito; implantagao da infra-estrutura basica; oferta dos ser- vigos sociais basicos, como satide, educagdo e seguranga. Distingue-se a populagio pobre da populaciio miseravel. Sao consideradas pobres aquelas familias que possuem renda familiar apenas para atender as necessidades bési- cas (alimentagao, moradia, vestuario, educagao, transporte, satide e lazer); enquanto as familias que pertencem a populacdo miserdvel ou indigente so aquelas cuja renda fami- liar cobre apenas a alimentacao. No Brasil, tem sido utilizada a renda familiar de um sa- Jario minimo para definir a linha da pobreza e o valor de uma cesta bdsica, inferior ao saldrio minimo, para demarcar a linha da miséria. Definindo a linha de pobreza como o nivel de renda que asscgura um nivel ménimo de consumo de bens ¢ servigos, cm cada Area geografica, Fava concluiu que o nimero de pessoas que vivem abaixo da linha de pobreza no Brasil, no biénio 1974/75, chegava a 34,4% nas areas urbanas e a 38,6% nas reas rurais. A pobreza urbana elevava-se para 54% nas Regides Norte e Centro-Oeste, ficando em torno de 50% no Nordeste. Nas 4reas metropolitanas, esse percentual chega- va a 33% na de Sao Paulo, 32% na do Rio de Janeiro, 31% na de Belo Horizonte e 16,8% na de Porto Alegre (Fava, 1984, p. 105). A Tabela 1.1 mostra que a populagao pobre e indigente no Brasil atingiu um nivel maximo em 1990, no auge do processo inflacionario. A populacao miseravel subiu de 17,4 milhées em 1977 para 30,8 milhdes em 1990, caindo para 21,6 milhdes em 1995, no ini- cio do Plano Real. Esse ntimero se manteve nos anos seguintes em torno de 22 milhées. A populagao pobre aumentou de 40,7 milhées em 1977 para 63,2 milhées em 1990, redu- zindo-se para 50,2 milhdes em 1995, mantendo-se constante até 1998, para aumentar em quase 3 milhées no ano seguinte, por ocasiao do recrudescimento da crise externa, Toda- via, em termos relativos, houve substancial redugao da populacao pobre e indigente no Brasil, depois de 1990, porque a expansdo demogrdfica total superou o crescimento da camada mais pobre da populacao. O indice da populagao indigente na populacdo total caiu de 17,0% em 1977 para 14,1% em 1998, enquanto a relacao entre a populagao po- bre e a populacao total reduziu-se de 39,6% para 32,8% no mesmo periodo. Houve me- lhoria sensivel no bem-estar do conjunto da populacaio, embora esses indices tenham piorado ligeiramente apés 1999. Essa melhoria também pode ser vista pelo indice de de- sigualdade de Gini, que se reduziu de 0,625 em 1977 para 0,596 em 1999, 8 Tendo em vista o crescimento demogréfico e as migragdes em diregao as grandes ci- dades, pode-se imaginar o tamanho gigantesco que terdo em 2050 cidades como Nova lorque, T6- quio, Londres, Sao Paulo, Xangai, Pequim, entre outras. DESENVOLVIMENTO ECONOMICO © A1. Tabela1.1 Brasil: populagdo total, populagdo pobre e populagdo indigente (milhdes de pessoas). no POpuIsgso Populacio Populacto naigenter pobre _indles Indigentet pobre? —— total. ~—Populagéo —-Populagéo ‘de Gini total) total G6) 1977 17,4 40,7 110,7 17,0 39,6 0,625 1981 22,1 50,7 124,3 18,8 43,2 0,587 1985 25,1 56,9 135,1 19,3 43,6 0,601 1990 30,8 63,2 147.5 a4 43,8 0,616 1995 21,6 50,2 159,0 14.6 33,9 0,601 1996 22,4 50,1 161.2 15,0 33,5 0,602 1997 22,5 51,5 163,5 14,8 33,9 0,602 1998 21,7 50,3 165,7 14,1 32,8 0,602 1999 22,6 53,1 168,0 14,5 344 0,596 Fonte: IPEA. Série com base na PNAD do IBGE. Notas: ° Renda familiar suficiente para atender apenas as necessidades de alimentagao. > Renda familiar cobrindo somente as necessidades basicas (alimentaco, moradia, ves- tuério, educagao, transporte, satide e lazer). As melhorias desses indicadores de pobreza ainda so bastante timidas, para que 0 pais deixe de ser considerado subdesenvolvido. O grau de pobreza no Brasil é mais ele- vado do que o de pafses com renda per capita similar (Barros, Henriques & Mendonga, 2000, p. 126); da mesma forma, comparagées pelo indice de Gini mostram que as desi- gualdades entre as classes sociais no Brasil esto entre as maiores do mundo. Subdesenvolvimento Portanto, subdesenvolvimento pode ser definido por crescimento econdmico insufi- ciente em relacao ao crescimento demografico (g < g*), por sua irregularidade e pela concentracao da renda e da riqueza, implicando um mimero considerdvel de pessoas pobres e miserdveis em relacdo A populaco total. Os indices sociais e ambientais mos- tram-se desfavordveis, quando comparados com os mesmos indices de paises mais desen- volvidos. As estruturas econémicas permanecem inadequadas & adoco de inovacées tec- nolégicas e ao crescimento econdmico sistematico, podendo perdurar formas pré-capita- listas em algumas regides e setores. Pode-se afirmar também que a economia permanece subdesenvolvida quando sub- siste o dualismo estrutural, embora desapareca a economia de subsisténcia. Ocorrer4, portanto, apenas uma mudanga de cardter desse dualismo. No interior do setor indus- trial, algumas induistrias crescem de modo acelerado, com base em modernas técnicas, enquanto outras adotam formas tradicionais de produgao e de administrac&o. Em outras 12 _DESENVOLVIMENTO ECONOMICO palavras, a antiga forma dualista “economia moderna capitalista” e “economia atrasada nao capitalista” passa para o interior do préprio setor industrial, distinguindo-se as em- presas com tecnologia mais moderna e alta relacdo capital/trabalho, e as empresas mais tradicionais, com tecnologias relativamente mais antigas e mao-de-obra intensiva, de baixa qualificacdo. A forma dual também poderé estender-se a outros segmentos da economia ¢ ao modo de vida da populacdo, em fungao da concentracao da renda. Cria-se uma dis- crepancia crescente entre capacidade de arrecadagdo insuficiente do setor publico e ne- cessidades de investimentos em infra-estruturas econdmicas e sociais. ‘As empresas tendem a se concentrar nos centros mais bem dotados com infra-es- truturas, 0 que aumenta as desigualdades regionais. O lento crescimento do emprego do setor privado leva os governos a expandir o seu quadro de funcionarios, 0 que au- menta o déficit piblico. O crescimento das despesas com pessoal e com 0 pagamento da divida publica reduz ainda mais o investimento governamental, deteriorando de maneira cumulativa a oferta de infra-estruturas, como estradas, energia, saneamento bdsico, educacao, seguranca etc, Desse modo, cresce ainda mais o mimero de pessoas que vivem abaixo da linha da pobreza, concomitantemente com a industrializagéo e a modernizagao da agricultura. Expande-se também a populacao que se acotovela nas cidades, formando favelas, aumentando os gastos puiblicos, ainda insuficientes para o atendimento das pessoas de mais baixa renda. Por conseguinte, aumentam os seqiies- tros, assaltos a bancos, prostituicéo, menores nas ruas, subnutrigao, analfabetismo e demais indices-de subdesenvolvimento. ‘A economia subdesenvolvida caracteriza-se, ainda, pela instabilidade e pela depen- déncia econémica, tecnoldgica e financeira em relagdo aos pafses desenvolvidos. A base exportadora, insuficiente e instavel, nem sempre consegue causar impactos significativos no setor de mercado interno. A capacidade de barganha nos mercados externos mostra- se diminuta 4 medida que a concorréncia aumenta, com o ingresso nesses mercados de paises mais competitivos. A formacdo de capital é insuficiente pelo baixo nivel de renda e discriminagao contra os capitais externos. Altas taxas de inflagao e restrices orcamenté- rias inibem o investimento publico em setores estratégicos e na rea social, explicando 0 reduzido crescimento econémico, os pontos de estrangulamento e a pobreza da grande maioria da populacao. De outra parte, os indicadores relativos a mudangas estruturais (produto industrial/ produto total, ou produto agricola/produto total) nem sempre implicam melhorias so- ciais. Entre 1970/1993, por exemplo, a participacao do setor industrial no PNB dos pai- ses de baixa renda aumentou de 28% para 35%, com a taxa de urbanizacao passando de 18% para 28%. Nesse perfodo, expandiu-se a importagao de cereais e reduziu-se a pro- dugao de alimentos per capita na maior parte dos paises de baixa renda (Banco Mundial, 1995, p. 184 e 186). A industrializagao acelerada desses pafses provocou maior éxodo rural-urbano, com aumento da demanda de alimentos, sem a conseqiiente expansfio da oferta, o que gerou maiores taxas de inflaco. Contudo, nos anos de 1990 os governantes mostraram uma postura de maior conscientizacao acerca da necessidade do desenvolvi- mento econdmico, melhorando os indicadores sociais de uma forma quase generalizada, apesar das dificuldades econdmicas da maioria dos pafses subdesenvolvidos. Para expandir a oferta de alimentos para os trabalhadores urbanos, a economia em desenvolvimento precisa aumentar a produtividade da terra e do trabalho. O incremento da produtividade agricola depende do uso de insumos modernos, da introducao de no- DESENVOLVIMENTO ECONOMICO =—-13. vas variedades de cultivo, assim como de irrigacao, crédito e extensao rural.? Com pro- Stesso tecnolégico na agricultura, aumenta-se a produgio, o que reduz os precos dos ali- mentos, estimula a industrializagio e melhora as condicdes de vida do conjunto da popu- lacio. 1.3 Indicadores de desenvolvimento econémico” Nos anos de 1990, na América Latina, os indicadores sociais melhoraram, apesar do crescimento da divida externa e da inflacdo. Isso resultou da difusdo da educacdo, da conscientizacao social dos governantes e do aumento da renda per capita. A vida média Passou de 50 para 65 anos; a taxa de mortalidade infantil reduziu-se de 130 por mil para 50 por mil; a educacdo priméria universalizou-se e a taxa de natalidade reduziu-se de 4,5% ara 3%, em funcao do uso generalizado de anticoncepcionais (Hirschman, 1996, p. 881- 890). Esse mesmo fenémeno parece estar ocorrendo em nivel mundial. Entre 1980/98, a taxa de mortalidade de menores de cinco anos caiu nos paises de baixa renda de 177 por mil nascidos vivos, para 107 por mil, e de 79 por mil, para 38 por mil nos paises de renda média. Melhoria similar ocorreu no mimero de matriculas nas escolas primérias e secun- darias (Banco Mundial, 2003). : O crescimento da renda per capita é fundamental para melhorar indicadores sociais. Essa varidvel correlaciona-se com os niveis educacionais e liberdades politicas. Imprensa livre e debate piblico aberto influenciam indicadores de bem-estar (Banco Mundial, 1991, p. 57). A mortalidade infantil declina com o aumento dos niveis de educacao feminina. Maes esclarecidas passam a amamentar os recém nascidos, a esterilizar a mamadeira e a aplicar soro caseiro, o que evita o surgimento de muitas doencas. Porém, além da renda per capita, devem-se considerar indicadores que possam re- fletir melhorias sociais e econ6micas, como alimentacao, atendimento médico e odonto- logico, educagao, seguranga e qualidade do meio ambiente. Medidas destinadas a redu- zir a pobreza podem ser indispensaveis quando for grande 0 contingente de pessoas ca- Tentes. A distribuicao direta de renda através de programas de satide, educacdo e alimen- taco da populacao mais pobre ¢ indispensdvel para a melhoria dos indicadores de de- senvolvimento. 9 A producao de sementes geneticamente modificadas est revolucionando a agricultu- ra em todo 0 mundo, com substanciais ganhos de produtividade. Em 2003, foram cultivados 15,5 milhdes de hectares com mitho geneticamente modificado. Nesse mesmo ano, a produgao de soja transgénica no Brasil foi obtida em 3 milhdes de hectares, sobretudo no Rio Grande do Sul. A pro- dutividade aumenta pela possibilidade de combater as ervas daninhas sem afetar as plantas. Pode- se aplicar plantio direto, com economia de mao-de-obra e capital, o que exige maiores aplicagoes de herbicidas. Os criticos afirmam que os produtos transgénicos podem afetar a satide da popula- sao, embora técnicos tenham afirmado nao haver problemas. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuaria (EMBRAPA) produzird 11 tipos de sementes de soja transgénica, para que a sua oferta nao fique nas maos de uma ou duas empresas multinacionais do setor. 10 Para maiores detalhes, consulte no site da Editora Atlas © texto Indicadores do desenvolvimento mundial. 14 _DESENVOIVIMENTO ECONOMICO 1.3.1 _Indicadores econémicos globais do desenvolvimento mundial Alguns indicadores mostram que o nivel de vida vem aumentando em todo o mun- do. Entre 1988/1993, a expectativa de vida elevou-se de 60 para 62 anos nos paises po- bres, de 66 para 68 nas economias de renda média e de 76 para 77 nos paises ricos. No periodo 1985/1990, nesses paises, o analfabetismo entre adultos reduziu-se, respectiva- mente, de 44% para 41%, de 26% para 17% e de 24% para 14%. Entre 1970/1998, a taxa de mortalidade infantil por mil nascidos vivos reduziu-se substancialmente em todo o mun- do. Assim, entre 1980/1998, essas taxas cairam, respectivamente, de 97 para 68 nos paises pobres, de 60 para 31 nas economias de renda média e de 12 para 6 nos paises ricos (Banco Mundial, 1990, 1995 e 2003). Em 2001, o PIB per capita (ponderado pela paridade do poder de compra de cada pais) variava de US$ 470 em Serra Leoa, o pais mais pobre do mundo, a US$ 34.320 nos EUA, 0 pais mais rico e poderoso." Serra Leoa € 0 pais com o menor indice de Desenvol- vimento Humano (0,275), a mais alta taxa de mortalidade infantil (182 mortes por mil nascidos vivos) e a menor média de vida (34,5 anos) (Banco Mundial, 2003). Nesse mesmo ano, o PIB per capita dos paises de baixa renda foi de US$ 2.230, gru- po no qual se incluem a india (US$ 2.840) e 0 Paquistéo (US$ 1.890), entre outros pai- ses. No grupo das nagées de renda média baixa (US$ 4.674), aparecem o Egito (US$ 3.520), o Paraguai (US$ 5.210) e a Turquia (US$ 5.890). O Brasil (US$ 7.360) encontra- se entre as economias com renda média alta (US$ 11.377), juntamente com o México (US$ 8.430) ea Argentina (US$ 11.320). Entre os paises de alta renda (US$ 26.989), incluem- se os EUA (US$ 34.320) e a maioria dos pafses europeus (Banco Mundial, 2003) Os paises com as maiores taxas de crescimento anual do PIB per capita, entre 1990/ 2001, foram China (8,8%) e Coréia do Sul (4,7%). Nesse mesmo periodo, o PIB per capi- ta se reduziu em alguns paises, como Serra Leoa (~6,6%) e Federagao Russa (-3,5%). No Brasil, ele ainda aumentou 1,4% no perfodo, sendo bastante baixo seu crescimento na Africa do Sul (0,2%), pais que ainda tem graves problemas raciais, e na Suica (0,3%), provavelmente por ter chegado a um alto nivel de desenvolvimento. 1.3.2 Nutrigéo e expectativa de vida Em 1970, a taxa de mortalidade infantil por mil nascidos vivos era relativamente alta mesmo nos paises ricos, sendo igual a 20 por mil nos EUA e a 18 por mil no Reino Unido ¢ Franga. Em 1993, esse indicador reduziu-se para 9 nos EUA e para 7 nos dois tiltimos paises (Banco Mundial, 1995). Entre 1980/1998 houve grande melhoria desse indicador, em razao da vacinacao em massa das criangas. Em 2001, essa taxa era de 127 por mil em paises de baixa renda, 31 por mil em paises de renda média e de apenas 5 por mil nos paises de alta renda (Banco Mundial, 2003). 11. Tradicionalmente, a renda per capita tem sido usada como o principal indicador de desenvolvimento. £ um indicador importante; porém, como média, camufla a distribuigéo de ren- da, nao refletindo o nivel de bem-estar da populacao de baixa renda, que pode ser bastante nume- rosa, Economias com renda muito concentrada, como a dos paises exportadores de petrdleo do Oriente Médio, possuem altas rendas per capita. Existe nesses paises, porém, um mimero reduzi- do de pessoas ricas, com a maioria da populagio vivendo na miséria. DESENVOLVIMENTO ECONOMICO. «15, Nesse mesmo ano, a taxa de mortalidade infantil ainda se apresentava relativamen- te elevada em patses de renda média, como Africa do Sul (56 por mil), Brasil (31 por mil) e México (24 por mil). Nos paises mais pobres essa taxa ainda era muito alta em Serra Leoa (182 por mil) e Angola (154 por mil). Na China, a taxa de mortalidade infantil (31 por mil) é igual A do Brasil; porém, na india, apesar da melhoria significativa dos tiltimos anos, ela ainda se mostra bastante elevada (67 por mil). Além da vacinacao infantil (sarampo, poliomielite), difusao de 4gua tratada, sanea- mento basico e melhorias no sistema de higiene, o combate 4 fome também é fundamen- tal para reduzir a mortalidade infantil. Alimentagao mais adequada ajuda a melhorar a satide e o desempenho escolar das criancas. Maior consumo de carnes elevou a altura média dos adultos nos EUA, Europa e Japao. Maior consumo de proteinas e vitaminas também eleva o indice de massa corporal dos individuos. A eliminacao da desnutrigao crénica nao depende apenas de maior disponibilidade interna de alimentos, mas também do poder aquisitivo da populacao mais pobre e de melhorias no sistema de “S=sibuigso de alimentos. Torna-se fundamental a pesquisa agronbmica para desenvol- ver variedades de alimentos mais produtivas e mais baratas. A manutengao de estoques reguladores de produtos agricolas, por parte do governo, evita crises de abastecimento e Bencto dos precos de géneros de primeira necessidade, favorecendo as populacées mais pobres. Em decorréncia do aumento do nivel de renda, melhor alimentacao e desenvolvimento da medicina, tem se elevado a expectativa de vida ao nascer, a qual oscilava em 2001 en- tre 34,5 anos em Serra Leoa e 81,3 anos no Japao (Banco Mundial, 2003). Entre 1880 e 1980 a expectativa de vida ao nascer nos paises industrializados aumentou de 45 para 75 anos. Grande salto desse indicador ocorreu também no Sri Lanka (Sul da Asia), que subiu de 45 anos, em 1945, para 72 em 1993. Nos paises do Mercosul, em 2001, a expec- tativa de vida ao nascer variava de 67,8 anos no Brasil a 75,8 no Chile. No Paraguai, essa idade era de 70,5 anos, na Argentina 73,9 anos e no Uruguai 75 anos (Banco Mundial, 1991 e 1995). A tecnologia na agroindustria alimentar reduziu os pregos dos alimentos e aumentou a oferta de calorias e proteinas. Os gastos ptiblicos com educacao, em relagao ao PNB, aumentam com o nivel de ren- da: paises de alta renda, 5,4%; paises de renda média alta, 5%; paises de renda média baixa, 3,5%; e paises de baixa renda, 3,3%. Os gastos com satide em relacéo ao PNB, em 2000, também foram crescentes com o nivel de renda dos paises, respectivamente: 6,2%, 3,3%, 3% e 1,3%. A Coréia do Sul gastou 3,8% do PNB com educacao, no periodo; seus gastos com satide em 2000 foram iguais a US$ 899 délares per capita. No Brasil, os gas- tos publicos com satide atingiram US$ 631 délares per capita, no mesmo ano; esse valor foi superior as quantias gastas pelo México (US$ 477) e Federacao Russa (US$ 405); os gastos puiblicos do governo brasileiro com educagao foram de 4,7% do PNB, percentual superior ao de muitos paises de renda média. Com relagao a satide, os gastos per capita do Brasil (US$ 631) somente superam os do México (US$ 477) e Russia (US$ 405). En- tre os pafses sul-americanos, os que mais gastam com satide sao Argentina (US$ 1.091) e Uruguai (US$ 1.007). Entre os paises de alta renda, os maiores gastos per capita com satide ‘sao os dos EUA (US$ 4.499) e Suica (US$ 3.161). Da mesma forma, a taxa de alfabetizacao de pessoas com 15 anos e mais também mostra correlagao direta com os niveis de renda. Em 2001, a taxa de alfabetizagao era de 63% nas economias de baixa renda, 86,6% nas de renda média e de 99% nas de alta ren- |

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