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Entrevista marco anrontozaco UCAS SOUZA E MARIANA BARROS E preciso arriscar muito mais 0 eltor da Universidade de’Sa0 Paulo diz que o sis pesquisadores estavels na carreira, que-nada criam édico Marco Antonio Zago as: sumiu en janeiro a:reitoria de uma instituigio que j4 teve melhores: A Universidade de Paulo (USP) perdeuposi tantes n¢ ve uma dramitica crise ternacionais, vi nanceira ¢ sai sm outta. Za: es. Na escala de preocupagoes desse paulista de BE rigui, 0 descon! a lingua in sa! pelos alunos ceupa hoje 0 pri meiro lugar (“Inglés € a ferramenta de precisardo para trabalhar g balmente”). A fatta de ousadia dos pes quisadores ca predominincia da cultu: ra sindicalista na vida univer outros entraves que tiram 0 sono do reitor, Zago falou a VEJA em seu gabi netena Cidade Universitaria. uma ent fe para entral >, ve sol -cimento ria sio AUSP perdeu onze posigées no recente ranking de reputacao universi- taria da revista britanica Times Higher Edueation e na lista das melhores caiu da 158° posiedo para a faixa que vai da 2264 a 250%, 0 que explica essa queda Nada. As oscilagdes sio normaise nio a significativa de representam muda alidade, Além de sifica Oes sio obviamente relativas e, se al guns do saltos de qualidade, isso po: de de mio nec seminar a queda de outros que joraram. Por sariament ‘outro lado, os indic ‘uja natureza pode ser ape. Mas a USP caiu também na listagem deste ano da britanica QS Rankings Foi ultrapassada pela Pontificia Ui versidade Catélica (PUC) do Chile co- moa melhor da América Latina. Os dimensoes, misses e focos diferen: s estamos em segundo agora, mas'a USP tem 92000 estudantes. A PUC do Chile tem 22000 alunos¢ um orgamento expressivo para 0 seu ta. Oreoo a AeamodA etindo experime a CUS Et CE Ce Pes Se ea Cr cend Ue ag Entrevista MARCO ANTONIO ZAGO manho: Para mim, a quedi nessa lista Tatino-americana ndo significa nada. A USP continua sendo a universidade mais relevante da América Latina. Mas claro que hé problemas. Sobretu do porque ao temos ensino secundé rio de qualidade io Brasil. © aluno que traz da escola dificuldades de ever bem, compreender textos e fa- er cdilculos basicos ndo poder ter ‘um bom desempenho no ensino supe- rior. Outra questo deriva do fato de as universidades brasileiras enfrenta- rem enormes diffeuldades de gestio. Seria muito meltior se howeesse um ‘orgamente anual definido a prerro- gativa de contratar ou demitir de acordo com o desempentho. Porém, 0 foco na qualidade na meritocracia algo estranho & administracio do en- sino superior no Brasil. A estabilidade precoce de professores ¢ funciondrios paralisa as coisas. Isso no existe em nenhum outro lugar do mundo. O.que 6 preciso para a USP implantar o modelo que privilegia a meritocra- cla? Isso depende de questées politicas ede leis federais, Mas, internaniente, € preciso abandonar a dindmica de sin- dicalismo na vida universitaria Nao & facil dar esse passo, Mas cle € essen- cial e jd foi dado em outros paises. O que a USP esté fazendo para aper- feicoar o sistema de avaliagao de pro- fessores? Infelizmentc, ainda nio se definiu claramente como avaliar 0 de- ‘Sempenho dos docentes na USP. Por isso, criamos um grupo de trabalho para determinar 0 que deve ser enten- dido como exceléncia. Nao basta vert ficar se o pesquisador estd publicando traballios ou nao. Ha outras formas de analise, como a pradugio de patentes, de material critico ea realizagho de debates. AUSP leva em conta 0 mérito a0 con- tratar professores? Em lugares como Harvard ou o Instituto de Tecnologia de Massachusetts, o MIT, os diretores das universidades contratam pesqui- sadores pagando o saldirio que cons deram que eles valem. Aqui, isso nio 0 foco na qualidade ena meritocracia nao predomina na administracao do ensino superior no pais. Ha estabilidade precoce de professores e funcionatios, algo que nao existe em outro lugar99 € possivel. Nao temos diferenciagio salarial. Nao oferecemos premiagdes. Portanto, o ‘inico mecanismo de eon- trole — ¢ que nao tem sido usado com muita eflciéngia —€ a promocio. ‘Mas sho concursos €m que'6 profis- nal concorre com ele mesmo, caso. da livre-docéncia, ou com os demais, ‘caso das vagas de professor titular Ha vantagens salariais nos dois casos, ‘Um programa instituido em 2011 crieu a progressao horizontal, sistema ‘em que profissional passa de doutor ‘1 para doutor 2 ¢ vai evoluindo. As mudangas no pressupdem aprovagio de uma banea, e os aumentos sala {que proporciona sio menos significa tivos. E'cedo ainda para saber se isso Surtiu o efeito desejado. Criamos tam- bém um grupo para propor mudangas no regime de dedicagdo exclusiva, re- ‘endo eritérios de promocao ¢ pro gressdona carrelr O sistema atual compromete a inova- 402 Os pesquisadores precisam se atriscar mais, sairda zona de confor- to qule 05 leva a projetos de sucesso ‘arantido dé antemao. Ora, isso per- mite que a vida deles transcorra sem surpresas muito positivas ou negati- ‘vas, 0 tempo passa, eles criam Vineu= tos estivels e passim a dispor de wma atrutura do peaquina, Park gua? Paw ccontinuarem repetindo experimentos Consayeados. Tudo hem que 1a. 8 ceria tari, eonteini para prograc: SO, MAS NAO € essa aboTdageM que produ2 grandes e decisivas descober. tas. Sem salto no escuro ndo surgem avangos revolucionarios. Os que se arriscam mais sao Sempre os mais jo- yens, Depois eles se casam, tém fi- Ihos, ficam mais prudentes, ea sist ma aceita, Atualmente, no Brasil, tan~ to as universidades quanto as ager cias de pesquisa premiam a prudéncia, cinibem a inova¢ao. Recentemente, 110 alunos do progra- ma Ciéncia sem Fronteiras retorna- ram ao Brasil por no terem fluéncia ‘em inglés. Como essa deficiéncia afe- ta.a produgio académica? Esse pro- bblema no Giéneia sem Fronteiras ser- viu de alerta para todos. Ele.é resul- tante também da ma qualidade do en- sino secunditio, De modo geral,-um estudante da PUG do Ghile teve acessa.ao ensino médio dé maior qua= lidadte'e, diferentemente’do brasileiro, jdichega a fuculdade competente em inglés. Mas nfo podemos nos esque var do problema. Quando o graduan- do recebero diploma, ele trabalhard em uma sociedade global em que o in glés€ necessério: Posso dizer quea prioridade niimero I da USP hoje é {garantir o conhecimento da lingua in- sglesa para os seus alunos, J4 neste tno; 1 USP ofetecera aulaside ingl aos estudantes da graduacio em par ceria com 0 British Council. AUSP atualmente compromete 105% do que capta com a folha de paga- mento ¢ esté préxima da insolvéncia, 0 senhor fazia parte do Conselho Uni- versitario que aprovou as contas da ‘gestao anterior. Como se chegou a ‘essa situagdo? © Conselho Universiti rid nao tinha conseiéncia dessa situa- io financeira, Durante todo 0 segun- do-semestte do ano passado ndo hou- ve reunides do Conselho Universita rio. Nemo prdprio orgamento foi dis- cutide ¢-eprovada.ifivemos de apro- Ta TasmEvUNHO;OIa | vOIo viclo neste ano, Esses fatos nao foram discutidos, ninguém tinha informa- bes reais, Precisamos investigar onde tais decisdes foram tomadas e onde as informagdes pararam de circular. Para isso, resolvemos contratar uma audi-_ toria externa para buscar respostas a essas perguntas. Essa historia precisa ser contada de maneira formal. Mas no é que a universidade se encontra em estado de insolvéncia. Huma dificuldade financeira’ eae tural que seré resolvida. Como reduzir as despesas? Temos de Jembrar que nas universidades publi- cas é possivel contratar, mas nao de- Initir, Entéo, a primeira medida foi conter a Sangria, Suspendemos obras em andamento ¢ revogamos um pedi do feito pela gestdo anterior de Uratagio de mais 535 docentes. Nao estou falando de corrupgao, mas de tomada de decisbes. Temos de ever como chegamos a esse ponto ¢ evitar novos equi vocos. Por que no Brasil nao se adota o prin- cipio 6bvio e justo de cobrar mensall- dade nas universidades pablicas da- ueles que podem pagar? A cobrance de mensalidade no é, a meu ver, uma alternativa para o financiamento da liniversidade pitblica no atual momen- to. No caso da USP em particular, sou Contra a cobranga se 0 objetivo visado for obter uma nova € significativa fon- tede recursos, Ha intimeros exemplos dc iniciativas na dred’ pitblica que mostram que, quando sé introduz uma fonte de financiamento, ela logo deixa de ser adicional para se transformar em substituta, Muitas pessoas, no en- tanto, defendem o ensino pago como forma de justiga social ¢ argumentam que isso poderia aumentar a inclusao, pois quem pode pagar ajuda a subsi- iar quem nao tem condicdes para is- So. Se lembrarmos que a USP € finan- Giada com recursos piblicos arrecada- os de pobres € ricos, o argumento da Justiga social ganha forga. Pessoal- mente, temo que um ensino pago na USP possa representar nao um avango, mas um entrave a inelusio, Mesmo se associado 4 oferta de bol- sas de estudo a quem nao pode pa- gar? Sim. Em Sao Paulo, 460 000 es- tudantes coneluem 0 ensino secundé- rio por ano. Destes, 82% vem dees- ‘cols pliblicas. Mas, quando se exa- mina 0 corte socioecondmico entre os aprovados para a USP, a relacio se in- verte. A inversio comeca ji na inseri- ‘cdo para o vestibular. Apenas 37% dos vestibulandos da USP sfo egres- sos da rede piiblica. A maioria dos alunos das escolas piiblicas jé se ex- clui naturalmente e nem sequer se anima a prestar.o exame vestibular para.a USP: Esse quadro permanece apesar dos nossos esforcos dé propa: ganda ¢ do programa de convites a ‘alunos de escolas piiblicas para visi- tar a.universidade, Muitos perguntam: quanto teriam de pagar para estudar na USP. Se cobrarmos mensalidade, ‘como explicaremos ao aluino que vem ‘de uma escola da periferia que, caso ele seja aprovado, ainda tera de fazer ‘outro concurso para tentar obter uma bolsa? Ele dira: “Bom, nesta aqui nao di mesmo” Q que o senhor pensa da atual politi- ea de cotas? Estou convencido de que "pA outeae malas qua-ninam maa faramy _com metade dos alunos egressa da re- Fie BaD RON fama.4 90 USP orth adotandegne forma de BA. uo. Doode 0 ana paseada, n oat te que vem de escola publica ganha uum aeréseimo de pontos na nota do ‘vestibular c, aditivamento, sendo pre- srdo ou indigena, tem outro scimo. Essa bonificagio pode re~ presentar 25% da nota, o que ¢bas- tante em uma disputa acirrada como a que temos. Ameta¢ chegar de piblica. Por enquanto, no temos queixas de ee ‘0s alunos favorecidos pelo bonus social ou racial estejam tendo maior dificuldade para acompa- “nhar 05 cursos ou sofrendo qualquer forma de segregacio. senhor acha razoavel que uma em cada duas vagas nas universidades fe- derais seja preenchida por critérios indiferentes a0 mérito, como determi- nado pela attial Lei de Cotas? A ques- tao central « seguinte: 0 que seria um critério-meritocrlico para a sele- io de alunos para a universidade? stamosacostumados-« responder ‘que €.a avaliagao do seu desempenho ‘no Vestibular. 56 que o vestibular nio revela os melhores talentos, apenas os mais preparados para ele. Para um aluno da rede ptiblica, a chance de bon desempenho é reduzida. [sso nfo denota falta de talento, mas de opor- tunldade, Por iso, sou fayorivel a examinar a seleeko para a tinivers de com base em mais de um critério, de forma que Outros talentos, além do Ircino para o vestibular, possam set avaliados de: modo mais justo ¢ eficaz. O que falta. eee da USP ‘ganbar um Nobel? Nio tenho, isso como meta. Temos € de dar melhor condiclo de trabalho aos pesquisadores e reduzir as tarefss administrativas e burosréticas ‘AS condic6es para fazer pesquisa comipetitiva estao no estabelecimento de um ambiente favoravel, com parcerias ‘Como 5 que temos hoje. Nao dé para criar pesquisa de qualidade isoladamente, . ‘vela 2SDE TONG ION] 15

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