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MARIA JOSE FERAOS HESPANHA ‘waka, Mambo do CES 0d Deco Since Gea" O CORPO, A DOENCGA E O MEDICO REPRESENTAGOES E PRATICAS SOCIAIS NUMA ALDEIA Ao soda axdeterminanee socials ‘anon proprios do senso comm mmedicga por parte da popviagdo de ‘Una afdels saad mur ares ent ‘bana, aA. dase conta dos ‘diteranciados de reproventagaes feceelaeten do cove, da ence pondees to modelo mesic Indior"recuru’ aon agen doa cago sctunizade de eas ‘nip desaparecimento des catego: Basvades na prelate ae fs: ‘ies eegnidvas'e des pastoos vale. fas, dos recufoce'e doe agentes. PPV covertra sin Populagao portuguesa, particu- larmente na area dos culdados primarios de sade, deu um salto em frente na ultima década, Uma nova e mais arrojada politica de saide baseada na implantacdo de um servico nacional descentralizado e gratuito, uma tilosotia de prestacao {de'culdados primarios assente na integragao e planeamento a nivel local das accdes de saude basica, a reestruturacao do aparelho oficial da saude, desde as direcgoes gerais até aos contros de sade © a criagao da carreira de clinica geral constituem alguns das marcos principals 6a muganga. Esta nova realidade trouxe consigo ou tornou mais agu- dos 08 problemas de desajustamento entre a procura que se dlitige 20s servicos, sobretudo aos servigos peritericos, @ a resposta que estes sto capazes de dar. Pondo de parte o conjunto de limitacoas institucionais que tem pesado —e de que mancira — sobre esses servicos, reduzindo-Ihes a capacidade de resposta e fazendo recair sobre eles a imagem, cada ver mais nitida para a opiniao publica, de inoperancia e de excesso de burocracia, pareceu- -me importante analisar os factores de desajustamento que, do lado da procura, explicam as distorcoes @ a relativa inet- cidncia dos servigos médicos. Algumas manifestagdes desse Introdugao 195 196 Maria José Ferros Mospanha ddesajustamento sao bem conhecidas e constituem um impor- tante tema de reflexao: capitacao elevada das consultas médicas, sobreconsumo de medicamentos e de meios auxilia~ fos de diagndstice, excessive peso des motives administati yor de consulta ‘A actuagao do Estado, dominada principalmente por pre- ocupagoes orcamentais, tom consistido até aqui praticamente ‘na adopgao de medidas para reduzir forgadamente a procura, dificultando © acesso as consultas @ encarecendo os servigos {@ 08 medicamentos, ou para limitar a autonomia do médico de prescrever os exames © 0s tratamentos que entenda necessérios. A medida que os problemas se avolumam torna- -se cada vez mais claro que as suas causas radicam mais, undo e tom de ser compreendidas num outro contexto: o das . A care # 0 alimento que da forca, por exceléncia, merecendo ser bem regada @ temperada. O peixe sno puxa carrocas, salvo 0 bacalhau que «nao ¢ peixer ‘A balata, 0 feljdo, as massas @ o arroz s4o acompanhamentos. Indispensavels destinados =encher 2 barrigas, enquanto a boroa serve para stapar os buracos» ‘Quanto ao vino, sobretudo 0 vinho tinto, ele @ também uum elemento fortificante muito valorizado, Dé-se as criangas para «ganharem cor», a0s doontes «para arrebitarem», &s gri- vidas «para fazer bom leltes, a0 -pessoal» para strabalhar com mais vontade» e, em geral, bebe-se spara manter a rijura». 0 vacabulério de que se dispoe para descrever as son- ‘sac0es corporais ¢ muito limitado e, por essa raza, 0 recurso ‘a imagens ¢ analogias retiradas do quotidiano 6 particular ‘mente elevado, Apenas alguns exemplos: «parecem formigas: a fazer estervedouro na testa, «0 estorvilhadoiro na coxa, parecem cobras @ rabiar, tenho aqui um pito no peito tenho um pito a plar nas costas», «uma grande panelada no peitor, «08 pulmdes parecem uma concertinas, «um clo a comer e a roer na ancay. Por vezes trata-se formas de expresso perfeitamente consagradas e generalizacas que atravessam todos 08 grupos da populagto ( Por muito curiosas que sejam estas expressdes, 0 inte- fesse do médico em conhecé-las tom por objective analisar até que ponto as analogias ou as imagens que séo utilizadas ‘no discurso do doante traduzem uma particular representagao do organisme que condiciona em certo sentido os proprios Ccomportamentos dese doente. As queixas de ansiedade, por ‘exemplo, andam trequentemente associadas a ideia de que 0s nervas se localizam em determinadas partes do corpo (sna boca da cabega», «no coragaos, «no intestino», wnas coxas & has dobradicas das pernas-, «t superticio-) @ entram brusca- mente em actividade, causando o mal-estar. Por isso se pro- ‘cura um remédio para stirar os nervos» —Uma outra manifestagao detectada @ @ «vergonhar de ‘estar doente, um sinal de fraqueza tisica considerado social- mente desclassifieador. «Tenho dores ¢ finedouros na cabega, mais dores finas e fixas nas llhargas. Ate tenho vergonha do me queixar tanto» (A. C., viiva, 79 anos) (?). Nem todas as doencas desclassificam igualmente, sendo que algumas, podem mesmo ser avaliadas positivamente (vg. as doengas de homem vitils), mas os individuos sotrendo de doengas pul monares, de perturbagoes lintaticas ou de outros males que ineapacitem para o trabalho =nfo prestam para nada: Perante 0 médico, contudo, as queixas s80 frequente- ‘mente avolumadas, sobretudo se se trata de obter o vates- impecnto do scabulvio mi ota por bore Seavegra ra us toe 2ovto- pur “tate propoato, que 0 culto morbido da hipocon- ‘arectoianram de certo mos a cao ea pro dat srcasads ora ote "Mix eo tinal dos anon 20. Gre Chron fave (9973). 0 Corpo, a Doenge "eo Medica 201 202 Maria José Ferros Hespanha tado» ou a

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