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Projeto_romances@yahoo.com.br
Jéssica Logan
Este Livro faz parte do Projeto_Romances, sem fins lucrativos e de fãs para fãs. A
comercialização deste produto é estritamente proibida
Sem estar realmente apaixonada, Kim se casou com Martin Ste. Croix, o francês
charmoso e sensual que havia conhecido no Havaí. Mas, logo após o casamento, Martin
sumiu, deixando Kim intrigada e preocupada.
Passados alguns meses, ele estava de volta, transformado numa pessoa diferente. Não
queria explicar seu desaparecimento, só garantia a Kim que ainda a amava. Nos
braços dele, ela agora tremia de paixão e descobria o significado do amor. Por que,
então, sentia, no fundo da sua alma, que aquele homem não era seu marido?
Quem seria o estranho, que se apoderara da identidade de Martin?
CAPITULO I
CAPITULO II
Kim girou a chave, para dar a partida. O carro rosnou, estremeceu, mas morreu.
Embora fosse uma ótima motorista, ela estava muito abalada para agir corretamente e
apertou, impaciente, o acelerador. Finalmente percebeu que tinha deixado o veículo
afogar.
Irritada, ela praguejou, e inclinou-se para puxar a alavanca que fechava o capô.
Fazia anos que não afogava o motor de um carro, mas sabia como proceder.
Estava tão distraída, que só percebeu os dois homens quando estavam bem perto dela.
Ted Kalama sorriu, depois virou-se para Martin, fez-lhe um aceno de despedida e
caminhou para o terminal.
- Ted é o mecânico do grupo, mas ele precisa viajar agora. Vamos ver o que eu
consigo. Tenho modestos conhecimentos mecânicos - Martin disse, um sorriso dançando
em seus olhos.
Aproximou-se da janela do motorista, tirou os dedos aflitos de Kim da alavanca e
puxou a argola, soltando o capô com incrível facilidade. Ele se virou sorrindo para
ela.
- É só uma questão de forca, chérie. Agora vamos ver o que há - falou, apontando o
motor com um gesto de cabeça.
- Eu deixei o carro afogar, mas seja bem-vindo - Kim respondeu, com uma calma que
estava longe de sentir.
Com agilidade, ele foi até a frente do carro e levantou o capo, seus olhos nunca
deixando os de Kim.
A intrépida policial da corporação de San Diego sentiu o coração dar um salto no
peito, e irritada percebeu que corava sob o efeito do incrível charme de Martin.
Não se lembrava de ter ficado tão abalada por causa de um homem, e já fazia anos
que ela não se ruborizava assim! Quem trabalha no meio de policiais, perde logo
estes hábitos virginais.
Os olhos de Martin brilhavam intensamente. Ele curvou-se sobre o motor e Kim ficou
admirando aquele corpo soberbo, os músculos tensos por causa da posição deixando-a
fascinada. Quando ele apareceu outra vez, com o filtro na mão, ela baixou os olhos
para esconder a crescente confusão que sentia.
- Tente ligar o carro outra vez, srta. Wells. Eu vou bloquear a saída de ar.
Kim obedeceu imediatamente, tentando sorrir para ele. E estava tão envolvida que
não percebeu quando ele desligou uma das velas.
Cinco minutos depois, ela desistiu. Martin Ste. Croix viu o desanimo estampado em
seu rosto e fechou novamente o capô. Meteu a mão no bolso da calça e puxou um
enorme lenço branco, onde limpou as mãos.
- Não vai mais conseguir tirar a graxa deste lenço! - protestou Kim, mas Martin
contestou, galante:
- É um preço muito baixo que estou pagando. Raramente os deuses permitem que eu
venha em socorro de uma donzela tão encantadora. Na verdade, estou até agradecido.
- Suponho que está acostumado a salvar donzelas que afogam carros...
- E uma de minhas ocupações favoritas - ele respondeu rindo.
- E o que o leva a pensar que eu vou permitir que continue com está curiosa
ocupação? Posso muito bem resolver os meus problemas.
- Deus do céu! Não venha me dizer que depois de eu revirar o mundo atrás da mulher
ideal, quando eu a encontro, ela é uma feminista de primeira linha! - Martin
brincou, fazendo uma careta, e Kim acabou rindo.
- Martin olhou-a extasiado por uma fração de segundo, mas logo seus olhos cinzentos
e duros voltaram a brilhar normalmente. Com cavalheirismo, abriu a porta para que
ela saltasse.
- Este carro e alugado, não é? - Kim concordou e ele prosseguiu: - Então, não há
problema. A companhia deve ter um balcão aqui no terminal. Vamos entregar o
problema para eles e você poderá voltar comigo.
Logo Kim seguia de volta ao lado de Martin Ste. Croix, divertida e aborrecida ao
mesmo tempo. As recepcionistas, fascinadas pelo encanto irresistível do rapaz,
tinham concordado em facilitar os procedimentos, e ele aceitava quase com
indiferença tanta dedicação.
Quando se aproximaram do velho jipe, que os levaria de volta, ela se preparou para
subir, mas Martin segurou-a pela cintura.
- Permita-me - disse ele, enquanto a fazia girar para ele. Instintivamente, Kim se
agarrou a ele para manter o equilíbrio, sentindo os músculos de ferro se retesarem,
sob a pele curtida pelo sol. Surpresa, levantou os olhos para ele.
Martin a olhava com uma expressão estranha e Kim recuou, assustada. Uma veia na
garganta dele pulsava fortemente e seu hálito morno roçava pelos cabelos dela,
soltos do coque ligeiro em que os tinha prendido.
Por alguns segundos, Kim Matthews esqueceu de respirar. Nunca em sua vida tivera
tanta consciência da presença de um homem viril. Apelou para sua habitual frieza:
- Eu... você. . . - E baixando o olhar. - Eu posso subir sozinha, obrigada.
- Não duvido. Mas quer me negar o prazer de ajudá-Ia? - O sorriso era brilhante e
um pouco zombeteiro; felizmente Kim não percebeu que não era inteiramente sincere
desconfiava que Martin Ste. Croix estava um pouco confuso com suas próprias reações.
- Mas precisa me segurar... tão junto?
Ele sorriu e baixou os olhos para onde suas mãos grandes e fortes se agarravam ao
corpo dela.
- Nunca tinha encontrado uma mulher com uma cintura tão fina - murmurou ele,
fazendo o sangue de Kim circular mais depressa.
Ela engoliu em seco, enquanto Martin a observava atentamente.
- Eu não gostaria que nada acontecesse para está obra-prima da natureza - Martin
disse e levantou-a como se ela fosse uma pena.
- Pronta, srta. Wells? - ele perguntou, quando, por sua vez, subia no jipe com
movimentos ágeis. Olhou para o rosto perturbado da moca com leve zombaria.
- Meu nome e Kim - ela disse, cruzando as mãos no colo tentando em vão neutralizar
a forte impressão que aquele homem lhe causava. Não ia dizer que não era filha de
Jack Wells. Não era da conta dele! Mas, por outro lado, não gostava nada que ele
pensasse nela como srta. Wells.
- Kim. Eu sou Martin. - Ele guiava com segurança através da pequena cidade. - Na
certa, Kim é apelido.
- Meu nome de batismo é Kimberly - ela explicou.
Observou-o com interesse. Ombros largos, cintura estreita, longas pernas,
musculosas e ágeis. O pescoço bronzeado pelo sol dos trópicos suportava uma cabeça
de traços clássicos que completavam sua figura espetacular.
- Você deve ser destes homens bem machões, que adoram proteger as mulheres - ela o
provocou.
- Isto não é justo. Golpe baixo! - protestou ele alegremente. - Você me conhece há
menos de duas horas. Não pode avaliar o meu caráter e formar uma opinião firme a
meu respeito, ainda.
- Ah, posso sim - ela reagiu, notando o humor na voz dele. - Você definitivamente é
um machão. E também é arrogante e deve achar que é um dos presentes de Deus para
as mulheres, isto eu ainda preciso descobrir. - Parou abruptamente, avisada pelo
brilho de aço dos olhos dele.
- Que é isto, Kim?... - ele protestou -, e logo quando eu procurei me controlar ao
Máximo. Acredite, não foi fácil. . .
Mas, de repente, sua expressão mudou. E Kim lutou para dominar a atração poderosa
que começava a sentir por ele. Depois, com o olhar vibrante, ele continuou:
- Porque você feriu meus sentimentos, está condenada a passar uma noite comigo.
Está noite, mademoiselle. Aceita?
- Sinto, mas já tenho um compromisso.
- Na batata?
- Na batata? - repetiu ela, achando graça. - Onde foi que descobriu está gíria tão
antiga?
Era uma gíria usada pelos garotos de escola, e era estranho escutá-la na linguagem
impecável daquele homem. Deu uma gargalhada bem-humorada.
- Eu tenho uma avó americana que costuma dizer "na batata", quando quer garantir
que uma coisa é exata - Martin. Explicou. - Acho que a gente tem que preservar as
expressões de uma língua.
- Preservar é uma coisa, mas... - Kim calou-se, com os olhos ainda molhados de
tanto rir.
- Na verdade, isto não interessa tanto. - Ele fixou seu olhar irresistível em Kim.
- Vai sair comigo está noite?
- Não, eu não vou sair com você. Viu muito bem que Gil e Luci me convidaram para
jantar.
- Ora, mas você poderia desfazer o compromisso. Eles não se importariam.
- Não!
Martin olhou para aquela linda mulher, tão decidida.
- Então prefere carregar vela a vir comigo?
- Bem, acho que sim.
- Parece que vou ter que passar mais uma noite lendo Shakespeare. . .
Martin parou no cais, próximo ao Beautiful Lady. Desceu e deu a volta no jipe.
Kim saltou antes que ele a ajudasse, receosa de sua reação ao toque daquele homem
perturbador.
- Acho que deve ler um pouco de dicionário - ela gracejou. - Com palavras como "na
batata", você está mesmo encrencado. - Depois, andou rapidamente para o barco,
seguida de perto por ele.
- E eu sempre me orgulhei de me manifestar perfeitamente em varias línguas... - ele
brincou. Depois, com o olhar mais insinuante que conseguiu: - Quando posso
vê-la outra vez?
- Não sei... - Kim subiu pela rampa de acesso. - Eu prometi levar Ricky para
passear. - Martin a observava com um leve sorriso nos lábios sensuais.
- Au revoir, ma belle - ele cumprimentou, acenando alegre para ela e voltando para
o jipe. Kim olhou-o afastar-se, imaginando se iria vê-lo mais uma vez.
- Então chegou, Kim! - Joe Hoffman exclamou subitamente, interrompendo seus
pensamentos. -- Jack fez contato pelo rádio. Quer que você ligue para ele. Bill tem
o recado e o lugar onde você poderá encontrá-lo.
Kim olhou friamente para o homem que tinha sido o capitão do barco de seu pai desde
quando ela tinha doze anos. Ela nunca gostara dele, apesar de saber, que era
competente.
- Obrigada, Joe - respondeu distante, resolvida a não dizer a ele que não tinha a
menor intenção de entrar em contato com o padrasto. - Onde está Ricky?
- Lá embaixo na cozinha, com Vic, eu acho.
Kim agradeceu e desceu a procura do menino.
- Olá mestre-cuca - brincou ela, ao ver o menino saudável e bronzeado, mastigando
um bolo, enquanto observava interessado Vic de Gast, o cozinheiro, mexendo uma
panela.
- Oi, Kim - o menino respondeu. - Você prometeu me ensinar a pegar onda. Quando
vamos?
- Que tal amanhã bem cedo? Vamos pedir a Vic para fazer uma bela cesta de
piquenique e ficaremos fora o dia todo naquela praia enorme, feita especialmente
para se pegar jacaré. Que tal?
- Ele correu para ela, abracando-a.
- Você é a melhor irmã do mundo! - Depois, olhou-a desconfiado. - Papai não está
mais aqui, está?
- Não, vai ser uma festa só para nos dois.
- Eu prometi a Johann que iria ajudá-lo, lá em cima! - exclamou o menino, saindo
correndo. Todos a bordo faziam com que Ricky se sentisse importante, dando tarefas
a ele; assim, o tempo passava facilmente e compensava a indiferença do pai. Não era
o ideal, mas tornava Ricky feliz.
Depois de combinar com Vic sobre a cesta de piquenique para o dia seguinte, Kim
subiu para a agradável tarde tropical e se deitou numa das espreguiçadeiras do
deck, aproveitando a brisa suave que acariciava seu corpo bronzeado. Subitamente
viu-se pensando no audacioso e atraente homem que a trouxera do aeroporto.
Bonito assim, ele provavelmente nunca tivera problemas com mulheres, pensou amarga.
Um só olhar daqueles olhos cinzentos e profundos devia fazer com que as mulheres se
apaixonassem imediatamente.
Dediciu que não queria nada com ele. Entretanto, essa decisão não evitou que ela o
observasse interessada, quando ele apareceu no deck de seu barco. Seu iate, o Sea
Witch, estava ancorado um pouco adiante na baia e Kim podia olhar para ele sem que
ninguém percebesse. Vestido com um short, seu corpo musculoso brilhando ao sol,
Martin se movimentava pelo barco, cumprindo tarefas que um verdadeiro marinheiro
teria prazer em levar adiante.
O homem era realmente impressionante. Infelizmente, ela não se deixava impressionar
por rapazes sedutores, que esbanjavam charme. Nunca tinha achado fácil confiar em
homens tão atraentes quanto Martin e não iria começar com isso agora. Mas se
tivesse que se encontrar com Martin, outra vez, já saberia o quanto ele podia
perturbá-la e estaria preparada!
- Então está ai! - exclamou Luci, interrompendo os pensamentos de Kim. - Vamos, sua
preguiçosa, temos que nos arrumar para um encontro.
- Calma, menina - Kim respondeu, se levantando preguiçosamente, o ár quente agindo
nela como uma droga calmante.
- O que aconteceu, Kim? - perguntou a amiga, olhando atentamente para a outra.
- Nada - Kim disse. - Estou muito bem.
- Você parece um pouco tonta.
- Muito obrigada - ela reagiu, rindo. - Quem falou que os amigos não dizem sempre a
verdade?
- Sei lá - Luci riu -, mas está pessoa na certa não me conhecia. Eu digo mesmo o
que acho. Gil vai chegar daqui a quarenta e cinco minutos, com parte de sua
surpresa.
Ele disse que a segunda parte vira somente depois do jantar.
As duas tomaram uma ducha e se vestiram. Quando Kim estava calcando a fina sandália
de salto alto, Ricky apareceu, já de pijama pronto para dormir, e se acomodou na
imensa cama, examinando as duas moças.
- Vocês duas estão mesmo bonitas - ele anunciou, com uma pose de conhecedor. -
Aonde vão?
- Gil nos convidou para jantar no hotel em que trabalha, na praia de Kaanapali -
Luci explicou. - Que tal um beijo de boa-noite em tia Luci?
- Por que as moças gostam tanto de ganhar beijos? - ele comentou, fingindo
desgosto, mas se levantou e abraçou Luci, dando-lhe um sonoro beijo. - Puxa, como
está cheirando gostoso! Vai encontrar alguém? - ele perguntou, quando beijou Kim.
- O que você entende de encontros, seu espertinho? - ela respondeu alegremente. -
Vamos, está na hora de ir para a cama.
Ricky foi até a porta, mas virou-se ainda para ela.
- Um dia papai gritou com vovó por causa disto - comentou o garoto. - Disse para
ela tratar de sua própria vida, porque ele não queria que você saísse para ter
encontros.
Ele não devia gritar com a vovó.
Kim se aproximou do garoto e se ajoelhou perto dele, com os braços abertos. O
menino imediatamente se aninhou entre eles.
-- Não, Ricky, ele não deveria, mas você não precisa se preocupar. Eu conversarei
com seu pai.
- Está bem. Boa-noite. - Ricky deu um beijo no rosto da irmã, antes de ir embora.
Kim se levantou e deu com o olhar apreensivo de Luci.
- Como foi que eu não percebi? - comentou, com um sorriso triste.
- Não entendo - Luci respondeu. - Mas agora você sabe. E o que pretende fazer?
- Acho que a melhor coisa é me mudar para a sua casa, como você sempre quis. Ainda
me quer lá?
-- Lógico que sim! - Luci respondeu prontamente. - Mas agora é melhor irmos, antes
que Gil venha nos buscar aqui dentro. Ele tem uma surpresa para você.
A "surpresa" assobiou encantado quando Kim e Luci se aproximaram do carro contra o
qual ele estava encostado: era Martin Ste. Croix.
- Gil Kono, você é realmente um homem de sorte - ele disse, com o belo rosto fixo
em Kim. - E me permita aliviá-lo da metade desta encantadora carga, s'il te plait!?
- Ele puxou Kim para sentar-se a seu lado no assento de trás, antes que ela tivesse
tempo de protestar. Seu sorriso era brincalhão, como se a provocasse, e Kim reagiu,
ficando séria. Não fazia mal que o sangue corresse mais depressa em suas veias e
que um ligeiro arrepio percorresse todo o seu corpo; escondeu as emoções com um ar
despreocupado e incluiu Gil e Luci na conversa. Martin a observava curioso, a
expressão impenetrável. . . e assim ficou durante a noite toda.
Ele foi encantador durante o jantar. Se pretendia mais do que uma simples companhia
social, conseguiu disfarçar muito bem, com atitudes calmas e delicadas. E o
magnetismo dele era incrível! Pela primeira vez em sua vida, Kim sentia-se
envolvida em emoções conflitantes. Ela queria a atenção de Martin, porém cada vez
que ele olhava para ela, sentia o sangue subir a seu rosto. As reações
incontroláveis de seu corpo a enfureciam mais ainda porque Martin era um modelo de
cavalheirismo.
Ele dançou com ela com cuidado, como se fosse um professor ensinando sua aluna
preferida. A conversa girava sobre Gil e Luci e Martin se revelou uma agradável
companhia, contando historias divertidas que encantavam a todos.
Mas, apesar de tudo, Kim tinha certeza de que ele agia estranhamente, como se
desempenhasse um papel para ela. Kim era uma policial treinada cientificamente,
conhecia bastante psicologia e desconfiava que Martin estava se portando
falsamente. Percebia nele, às vezes, um olhar cínico e duro, quando pensava que
ninguém o estava observando. Não tinha duvidas de que aquela atitude descontraída
dele era uma maneira de disfarçar os verdadeiros sentimentos. Mas não conseguia
descobrir por que ele estava fazendo isso.
Mais tarde, eles assistiram a tocante cerimônia da tocha. O enorme e luxuoso salão,
situado no ultimo andar do hotel, tinha uma vista magnífica para o rochedo de
basalto vulcânico negro, que se projetava mar adentro. Assistiram então a dança de
um homem na beira do penhasco, girando uma tocha de fogo. Aos poucos, ele seguia o
seu caminho acendendo tochas que tremulavam alaranjadas. No ponto mais alto do
rochedo ele parou, uma silhueta espetacular contra o céu escuro. Erguendo os
braços, numa prece aos deuses, com a tocha na mão, ele ficou um instante imóvel,
como que invocando dramáticamente as glorias passadas. Depois girou a tocha com
tanta agilidade, que ela mais parecia uma roda de fogo.
Então ele mergulhou no mar. Homem e tocha tocaram a água ao mesmo tempo, e os
hóspedes romperam em aplausos entusiasmados.
- Contam os antigos havaianos que os guerreiros se atiravam dali para irem ao
encontro dos espíritos do mundo - Gil revelou.
- Como o mundo se transforma... - comentou Martin. - O que sabe dos antigos
havaianos?
Gil começou a contar o que sabia dos antigos reis e rainhas, seus deuses e deusas.
Falou sobre a mãe do semideus Maui que tinha feito uma roupa para ele. Ele tinha
muita pressa de usá-la, para exibi-la a uma bonita mulher, mas as fibras demoravam
a secar. Ele, então, foi laçar o sol para que a roupa secasse logo.
- E depois? O que aconteceu? - perguntou Luci, impaciente.
- Martin - Gil brincou, alegre -, não acha que e um erro a gente cair nas garras de
uma mulher?
- Mas acontece - respondeu o outro, com os olhos fixos em Kim, fazendo com que o
coração dela batesse mais depressa - que o homem foi, feito para investigar o
universo você bem sabe. A ligação íntima com uma mulher provavelmente é um jogo
perigoso, um risco incalculável. Só que vale a pena.
- Assim como um mergulho submarino - acrescentou Gil, que abraçou Luci e beijou-a,
carinhoso. - De qualquer modo, de acordo com a lenda, Maui subiu até a casa do sol
no monte Haleakala e ficou a espera do sol. Quando ele saiu, lançou-o e só o soltou
quando o sol prometeu ficar mais tempo nestas regiões, para que as roupas secassem
mais depressa e as colheitas maturassem mais rapidamente. Um dos programas que
vocês deviam fazer, é assistir ao nascer do sol, lá no cume do monte Haleakala.
Nenhum espetáculo da natureza se compara a este. E uma experiência fantástica.
- E permitido acampar lá em cima?
- Sim. É um parque estadual. Lá existem cabanas e um acampamento, tudo muito
primitivo mas vale a pena. Se quiser, eu posso arranjar tudo, Martin.
- Obrigado, Gil. Deve ser mesmo maravilhoso. - Ele olhou para Kim. - Não gostaria
de vir também?
- Ricky adoraria - ela respondeu, para que ele se lembrasse que tinha
responsabilidade sobre o meio-irmão. Martin sorriu, e ela teve curiosidade em saber
o que ele estaria pensando. Havia nele algum mistério, mas Kim sentia uma forte
atração por aquele homem viril e sedutor; sentia também que ele estava muito
atraído por ela.
Sua intuição, entretanto, lhe dizia que ele estava preocupado com seus sentimentos.
Por que? Seria casado? Era uma hipótese provável. Como seria ser casada com esse
homem? Ele parecia inteligente, esperto, um homem com pleno controle de sua vida.
Olhou a boca sensual, os lábios inferiores ligeiramente cheios, o nariz reto, o
queixo quadrado e voluntarioso.
- Um tostão por seus pensamentos... - ele gracejou e imediatamente o maldito rubor
tomou conta do rosto de Kim, enquanto os olhos cinzentos de Martin brilhavam,
divertidos.
- Como é, concorda ou não? - perguntava Luci.
Kim sentiu-se uma perfeita idiota. Não tinha escutado uma só palavra do que os
outros tinham dito.
- Concordar com o que?
- Martin sugeriu levar você de volta ao iate. Ele precisa ir até o aeroporto
esperar um amigo e Gil gostaria de ficar comigo mais um pouco.
- Eu... sim, ótimo. Eu tenho mesmo que voltar.
Na volta, Kim irritou-se com o olhar zombeteiro do francês; era evidente que Martin
tinha percebido a atração que ela sentia por ele. Mas Kim achava que, por alguma
razão desconhecida, ele a desprezava por isso.
Era muito tarde quando chegaram ao Beautiful Lady, banhado pelo luar, suas luzes
fracas cintilando na noite.
Kim esperou que Martin desse a volta no carro para abrir sua porta, sentindo-se
tímida como uma adolescente. Não tinham conversado durante o curto percurso e,
quando saltou e enfrentou aqueles olhos que a observavam atentos, sentiu uma
profunda irritação ao perceber que sua respiração estava agitada.
Na beira da rampa de subida, Martin a fez parar com uma ligeira pressão em seu
ombro. Kim voltou-se, a saia rodada e esvoagante do vestido branco dançando em
torno dela.
Martin inclinou a cabeça e examinou o rosto, confuso e lindo, levantado para ele.
Talvez fosse impressão sua, mas Kim sentiu que repentinamente ele ficou tenso, e um
vago desdém substituiu a expressão de enlevo com que ele a olhava.
Depois ele deslizou as mãos pelos braços bronzeados de Kim e levantou os dedos
dela, onde pousou um ligeiro beijo.
- Foi uma noite muito agradável, Kimberly Wells, muito obrigado. - E logo soltou a
mão dela com uma indefinível expressão em seus olhos. Sem dizer mais nada, deu
meia-volta e se afastou, muito alto e musculoso. Sem entender a razão, Kim teve a
impressão de que Martin estava com medo dela, ou do que sentia por ela.
O que recearia? Um beijo de boa-noite? Não sabia.
No camarote Kim se deitou, e lembrou que não havia entrado em contato com Jack. Não
ia mais deixar que ele a dominasse, já tinha decidido!
CAPITULO III
Na manhã seguinte, a voz aguda de Ricky agiu como um despertador, acordando Kim.
Ele parecia irritado e ela se levantou resmungando. Lembrou-se da promessa de levá-
lo a praia e apanhou o robe, enquanto Luci ainda dormia profundamente. Seis horas!
Kim fez uma careta.
Ricky estava no cais, em frente ao iate, com as mãos na cintura, as pernas
afastadas, numa posição de desafio.
Um bem-humorado Martin Ste. Croix estava diante dele enfrentando o olhar hostil de
Joe Hoffman.
- Martin vai subir comigo! - Ricky afirmava, autoritário, ao capitão. - Ele pode
entrar no iate, você não e o dono!
- Mas sou o capitão - o homem respondeu -, e as minhas ordens são para manter
estranhos fora.
- Tudo bem, capitão - Kim interrompeu, atrás dele. - Jack conhece o sr. Ste. Croix.
A testa vincada do capitão deu a distinta impressão que ele iria rebater as
palavras de Kim, mas depois de um instante, encolheu os ombros num gesto de
impotência e saiu do convés.
- Depois não venha dizer que eu não avisei -- disse, insolente, antes de
desaparecer.
Os olhos cinzentos de Martin estavam quase negros ao se fixarem em Joe e depois em
Kim.
Ricky então subiu pela rampa e parou em frente da irmã.
- Hoffy não queria deixar que Martin subisse a bordo - contou, zangado, - e Martin
me disse que ele conhece a melhor praia para se pegar jacaré.
- Joe tem que obedecer as ordens, Ricky, e você sabe disto. - Kim avisou com
doçura, enquanto observava Martin para ver se a dureza que sentira em seu olhar, na
noite anterior, ainda estava lá. Mas agora ele sorria, e nos olhos cinzentos havia
uma centelha de ironia.
- Desculpe ter acordado você, Kim. Encontrei Ricky e ele me convidou para ir com
vocês no passeio de hoje. Íamos justamente buscar o cesto de piquenique, quando
Hoffman nos impediu.
- Não esperava que você fosse - ela falou, irritada porque seu coração novamente
disparava com a proximidade daquele homem. - Eu tinha prometido passar o dia na
praia com ele.
- Mas eu quero que Martin também venha - Ricky pediu.
- Por que não vai se vestir, enquanto tratamos do lanche? - Martin perguntou,
inclinando-se e sorrindo, ignorando o olhar irritado de Kim. - Depois de vocês
tomarem café, podemos ir.
Ricky estava encantado com Martin e Kim não teve coragem de negar sua companhia ao
menino, que precisava tanto de atenção.
Enquanto punha um vestido branco e decotado, ela pensava que aceitava a presença de
Martin somente por causa do menino. Calcou sandálias sem salto e quando saiu da
cabine Luci ainda dormia, pois tinha voltado somente de madrugada. Devia ser
maravilhoso estar apaixonada assim!
Martin estava bebendo café, escutando a conversa de Ricky, e Kim uniu-se a eles
tomando sua refeição rapidamente. Depois foram com Martin até o jipe e saíram da
cidade.
Martin seguiu pela bela estrada litorânea, em direção a cidade de Wailea,
continuando até onde a estrada pavimentada terminava. A estradinha, no meio das
enormes árvores, era impressionante.
Subitamente entraram por uma alameda estreita, aberta no meio da mata. Samambaias
gigantes, coqueiros e palmeiras, flores e trepadeiras se entrelaçavam, enquanto o
perfume das flores e o cantar dos pássaros acrescentavam ao lugar um clima de sonho.
Repentinamente, a mata terminou e Kim soltou uma exclamação de alegria, que fez com
que Martin sorrisse, encantado.
- Lindo, não?
- E simplesmente perfeito - ela comentou.
Na frente deles, Via-se uma praia em forma de crescente, coberta de areia dourada,
banhada por águas cristalinas, com ondas fortes e espumantes, perfeitas para jacaré
e surf.
- Vamos! - gritou Ricky, enquanto saltava ansioso do carro, que Martin tinha
estacionado sob as árvores.
- Eu ajudo você com isto - disse Kim, enquanto Martin tirava o equipamento do jipe.
- Pensei que poderíamos fazer windsurf está tarde, quando o vento virar - ele
avisou, enquanto retirava a larga prancha e a encostava contra o jipe. - Você algum
dia andou nisto?
- Não, mas parece interessante.
- É muito divertido depois que se aprende a dominar a brisa e a barra de controle -
ele falou, enquanto retirava também a enorme vela que se encaixava na prancha.
- Eu prometo ensiná-la, se quiser.
- Eu sou uma policial, não se esqueça - ela disse gracejando. Imediatamente ele se
virou para ela, encarando-a com estranheza.
- Eu não sabia disto - comentou, enquanto desviava o olhar e retirava a cesta de
piquenique. - Não compreendo como um homem tendo uma filha excepcionalmente bonita
como você, permite que ela entre para a polícia. O que Wells estava pensando quando
deixou que se dedicasse a uma coisa tão... tão quixotesca?
Kim tirou as toalhas do veículo e virou-se para vigiar Ricky que estava correndo de
volta.
- Você é especialista em comentários desastrados, não?
Ele a olhou da mesma maneira estranha com que já a olhara outras vezes, mas não
teve tempo de responder pois Ricky, entusiasmado, já estava ao lado deles, Kim, a
água e tão transparente que eu posso ver os meus pés! Mas não é fundo!
- O que há, garoto? Então não sabe nadar? - ela perguntou.
- Lógico. Melhor que todos os meus colegas na escola. Mas gostaria que vocês
viessem comigo.
- Logo todos estavam de maiô.
Ricky adorou pegar ondas, mas lá pelo meio-dia estava tão exausto, que mal
conseguiu comer o delicioso lanche que o cozinheiro tinha preparado. Depois,
estendeu uma toalha numa sombra e se deitou, mergulhando num sono em menos de dois
minutos.
Enquanto Kim recolhia os restos do piquenique, Martin estendia as outras toalhas
sob a sombra de uma árvore próxima e esticava seu corpo atlético.
Kim olhou-o de relance. Ele era um homem inegavelmente bonito, o corpo perfeito,
vestido na sunga preta, e ela sentiu as mãos tremerem. Rapidamente ficou de pé e
acabou tropeçando num prato de batatas que tinha esquecido de embalar.
Sem equilíbrio, pulou com um pe só, no esforço de soltar o outro, e caiu sobre a
cesta, que tombou e derrubou seu conteúdo novamente no chão. Irritada, sentiu que
braços fortes a amparavam, enquanto enfiava o rosto naquele peito bronzeado e
viril. Novamente percebeu que Martin se esforçava para não se deixar levar pelo
magnetismo que os atraía, um para o outro. Mas acabou desistindo e começou a andar
com ela no colo, pela praia.
- Ponha-me no chão! Deixe-me! Como tem coragem de rir assim!
- Kim tinha conseguido soltar um braço e com o pulso fechado batia no peito
musculoso. - Me ponha no chão! Me largue!
Martin ria como um garoto e, levando-a até a beira do oceano, deixou-a cair. Kim
levantou-se ainda cuspindo água e foi atrás dele. Mas Martin segurou-lhe os pulsos
frágeis e a fez perder o equilíbrio. Afinal, uma onda derrubou os dois, Kim
assustou-se e acabou se agarrando freneticamente a Martin, toda a zanga esquecida,
enquanto ele a envolvia junto ao corpo grande e másculo.
Repentinamente, Kim sentiu que seu corpo inteiro vibrava com aquele contato íntimo.
Levantou os braços e tocou o homem que a olhava sorrindo.
- Martin...
- Ah, Kim, o que vou fazer com você?
Levantou-a nos braços e levou-a para fora do mar, até a toalha sob as árvores.
Inclinou-se sobre ela, que levantou as mãos para ele, envolvida pela magia daquele
lugar, pela brisa suave, pelo sussurrar das ondas morrendo na praia. Os dois então
se olharam profundamente, o calor do sol tropical dominando seus corpos jovens e
ávidos. Mas havia algo de duro no olhar de Martin, que Kim não compreendia!
Finalmente, sem conseguir resistir, Martin a envolveu com tal paixão que ela mal
conseguia respirar, mas Kim não tentou se libertar.
- Mon Dieu, "Olhos de Neblina", não me olhe assim - ele gemeu, indefeso. Mas ela
não o atendeu. Bem no fundo de sua mente, o alarme de perigo tocou, mas Kim não
tomou conhecimento e, impulsivamente, puxou-o para ela.
A pressão dos lábios dele sobre os seus a fizerem vibrar, enquanto Martin explorava
com experiência os lábios entreabertos. Mas repentinamente o encanto foi quebrado.
- Kim! - gritou Ricky, interrompendo o idílio. - Ei Kim, pare com estes beijos!
Você e Martin prometeram me levar para fazer windsurf logo que o vento mudasse.
Vamos agora!
Martin praguejou em francês e Kim, presa aos braços firmes dele, que hesitava em
soltá-la, sacudiu a cabeça e olhou para o irmão.
Ele estava ao lado deles, com as mãos na cintura, na pose típica em que costumava
expressar sua insatisfação.
- O que é? - ela perguntou, finalmente.
- O vento já está soprando, sua boba! - ele respondeu, impaciente. - Temos que ir
agora mesmo!
CAPITULO IV
Kim e Ricky foram praticar windsurf. Martin tentou ensiná-los, em terra firme, qual
o movimento que deveriam fazer, e depois levou Ricky para a água.
O garoto lutou contra o vento e a vela e afinal ficou exausto.
- Martin disse que estou indo muito bem - ele declarou, visivelmente orgulhoso,
quando se aproximou de Kim que o esperava na praia. - Agora ele quer que você vá
tentar.
- E o que você vai ficar fazendo, enquanto eu estiver na água?
- Não se preocupe comigo. Va lá. Você vai adorar - o garoto insistiu -, e não vai
se machucar porque é só cair na água e subir outra vez. Martin é legal!
- Émesmo? - ela perguntou, rindo.
- Se é! Eu vou procurar conchas, e depois Martin me contará o nome de cada uma. - E
vendo que Martin acenava de longe continuou: - É melhor ir agora. Ele está
esperando.
-Já percebi, estou indo. Tem um pouco de suco de goiaba, ainda, na garrafa, se você
sentir sede.
- Legal! Obrigado, Kim. - Ricky saiu correndo pela praia, seu corpinho moreno
brilhando ao sol.
Kim avançou até onde Martin a esperava, no meio da pequena enseada. Era evidente
que ele entendia e gostava de crianças. Quantos homens teriam está paciência com um
menino? Especialmente tendo outros interesses por perto?
Kim já conhecia suficientemente os homens para perceber a forte atração que Martin
estava sentindo por ela. Mas, ao mesmo tempo, uma estranha relutância o fazia
recuar. Quando a beijou, ele teve, visivelmente, uma sensação de triunfo mesclada
com um sentimento de derrota, que ela não conseguia entender.
Caindo e mergulhando na água, tossindo e cuspindo, sempre amparada pelos braços
musculosos e curtidos pelo sol, Kim estava feliz. Encostada naquele corpo forte, o
mar ondulante a sua volta, ela sentia uma traiçoeira atração. Numa das vezes,
percebeu o olhar preocupado de Martin sobre ela.
- Está se sentindo bem? - ele perguntou, e Kim afastou-se rapidamente, receosa por
causa da violenta atração que existia entre os dois.
- Tudo bem - disse, seca.
Novamente ela subiu na prancha, enquanto Martin a orientava de longe.
- As mãos estão muito juntas! Concentre-se em manter o mastro em pé! Fique com o
corpo reto! Está muito bom!
Mais uma vez Kim mergulhou nas águas mornas e quando emergiu Martin estava rindo.
Ela Ihe fez uma careta, enquanto subia novamente na prancha. Desta vez, conseguiu
ficar mais tempo equilibrada... um pouquinho mais.
- Muito bem. - Aplaudia Martin, e ela conseguiu ficar na superfície por uns bons
cinquenta metros. Finalmente se desequilibrou.
Quando voltou a tona, Martin estava a seu lado.
- Não é exatamente uma campeã, mas você está indo bem, Olhos de Neblina.
Por mais quarenta e cinco minutos ela, ainda tentou e finalmente desistiu, exausta.
Resolveram voltar para a praia.
- Se precisar de um instrutor, eu me candidato - gracejou ele, o corpo escorrendo
água do mar, e sorrindo bem-humorado. - Mesmo que você leve um ano para aprender.
- Não sabia que pretendia ficar por perto durante tanto tempo - Kim respondeu no
mesmo tom.
- Eu não pretendia - ele disse, tão serio que a surpreendeu -, mas quero que saiba
que estou pensando nesta possibilidade.
Kim levantou os olhos para ele, fascinada por aquele homem misterioso. Ele emanava
um magnetismo tão intenso, que ela se sentia completamente atraída.
- Ah, Olhos de Neblina, você me enfeitiça.
- Eu... você... - Kim começou a dizer, confusa. - Não diga isto! E não pense em
mudar seus planos por minha causa.
- Não... não ainda. Por enquanto estou satisfeito em ser o único interessado. No
entanto, mais tarde, sei que não vai querer que que a deixe. . .
Kim estava atônita com aquelas palavras, mas Ricky salvou-a do embaraço, chegando
com as mãos carregadas de conchas.
- Olhem só! - gritava excitado.
Aliviada, ela virou-se para o menino, inclinando-se para ver o que ele mostrava, e
escondendo o rubor que as palavras de Martin haviam provocado. Mas sentia o olhar
dele grudado nela, malicioso.
- Como é o nome desta, Martin? - perguntou Ricky, mostrando uma pequena concha,
colorida como um pôr-do-sol.
- E chamada Rubor de Donzela, eu acho.
Mais uma vez Kim corou violentamente e ele riu.
Que homem impossível, ela pensou exasperada, enquanto pegava uma das toalhas e
sacudia para tirar a areia, num gesto automático. Mas todos os seus sentidos
estavam no homem sentado com pernas cruzadas na prancha.
Sentia-se atraída por ele, Kim tinha que reconhecer. Já havia se interessado por
outros homens, mas nunca como por esse. Martin era tão bonito, tão perfeito! E
tinha charme de sobra!
Kim estendeu novamente a toalha e sentou-se, ajeitando o biquíni antes de se
deitar, com os braços sob os cabelos molhados.
Observou-o, um pouco afastado dela. Foi quando percebeu a cicatriz! Pegando todo o
lado, indo da frente às costas, formava uma linha nítida não queimada pelo sol.
Logo Martin mudou de posição e ela não viu mais a marca. Mas aquilo não prejudicava
a beleza perfeita de um deus pagão. Ele não parecia consciente de sua beleza, não
tinha nenhuma atitude pretensiosa e irritante. Seria divertido se apaixonar por um
homem assim, Kim pensou.
Ao mesmo tempo, sabia que ainda não estava preparada para se apaixonar. Quando
finalmente escolhesse o homem para se casar, queria se entregar totalmente, sem
reservas.
E esse homem ainda não tinha surgido, o que não a preocupava. Era sensata demais
para perder o coração num namoro sem futuro com um francês atraente. Kim se
conhecia bem; os homens sempre ocupavam um lugar secundário em sua vida. Sua
carreira era, para ela, a coisa mais importante do mundo. Sempre havia achado que
devia honrar a memória de seu pai, que fora chefe policial, fazendo uma carreira
brilhante.
Seus colegas de trabalho gostavam dela e a respeitavam, mas guardavam a distância
exigida por ela. Com a morte de sua mãe, e a necessidade de auxiliar a avó tomando
conta de Ricky, Kim preencheu o instinto natural que as mulheres têm de se dedicar
a uma criança.
Sem nenhum homem importante em sua vida, Jack Wells a requisitava constantemente, e
ela nunca se sentia sozinha. Agora ela entendia o que ele tinha planejado. Mas
também agora sentia uma atração especial por Martin Ste. Croix. Talvez fosse
porque, depois de muito tempo, estava livre do domínio sufocante de Jack.
Talvez fosse isso mesmo, mas Kim duvidava. Martin realmente a atraía como um imã
poderoso, que a arrastava sem remédio. Kim desconfiava de amor a primeira vista;
uma mulher para se apaixonar precisava conhecer bem um homem, suas qualidades e
suas fraquezas. Era a maneira mais segura de garantir um relacionamento durável,
sempre tinha acreditado nisso. No entanto, agora começava a ter dúvidas.
Esgotada pelos pensamentos conflitantes, ela acabou adormecendo, e sonhando com um
francês risonho. Acordou incomodada com algo roçando a pontinha de seu nariz.
Deu com os rostos divertidos do menino e do homem inclinados sobre ela. Martin
agarrou-lhe os pulsos e a fez ficar de pé.
- Vamos, sua dorminhoca. Está na hora de irmos embora. Kim tentou manter a
dignidade, mas Ricky a provocou:
- Estava sonhando com Martin, Kim?
- Lógico que não! - respondeu confusa, enquanto sacudia a areia de sua toalha.
- Você estava chamando o nome dele, eu ouvi - insistiu o garoto, acostumado a ter
respostas diretas. Martin ria.
- Talvez eu estivesse. Não me lembro - respondeu ela.
- Martin disse que vai nos levar para fazer pesca submarina amanhã, num lugar que
ele conhece - Ricky contou, entusiasmado, enquanto ajudava a carregar o cesto e os
equipamentos de windsurf de volta para o jipe.
Desde o acidente de mergulho, que havia custado a vida de sua mãe no Caribe, Kim
nunca mais mergulhou e não tinha certeza se desejava fazer isso novamente. Mas
ficou tentada pelo convite de Martin.
- Eu pensei que poderíamos ir a bordo do Sea Witch, seguindo pela costa até a baia
de Honolulu. O mar ali é espetacular para pesca submarina e Ricky me disse que sabe
mergulhar.
Kim olhou para Martin. Seu olhar direto parecia mostrar que realmente queria
proporcionar um divertimento ao garoto. Acabou concordando, e os três caminharam
para o jipe.
- O que é isto? - perguntou Ricky, ao perceber a enorme cicatriz no lado esquerdo
do corpo atlético de Martin. O homem virou-se para ele, os olhos brilhando.
- É o meu zíper. Eu perdi uma batalha contra a lei da gravidade quando era criança.
- O que aconteceu?
- Eu cai de uma arvore do pomar do meu tio, no sul da França. Um galho se quebrou e
eu me machuquei gravemente.
- Doeu muito?
- Doeu. E depois disto fiquei bem mais cuidadoso.
- Entendo. Eu também ficaria.
Martin riu e levantou o garoto pondo-o dentro do jipe, enquanto Kim pensava que ele
deveria ter sido uma criança encantadora e cheia de vida.
Finalmente Martin seguiu pela estrada acidentada, rumo a Lahaina. Para
desapontamento de Ricky, Kim recusou o convite para jantarem, dizendo que Ricky
precisava de uma boa-noite de sono para poder apreciar o passeio do dia seguinte.
Na realidade, ela não queria ficar mais exposta ao charme daquele homem
irresistível. Subiu correndo a rampa do Beautiful Lady, plenamente consciente que
estava fugindo, colocando uma distância segura entre eles.
- Kim - chamou Hoffman, seguindo-a até a cabine -, Jack falou pelo rádio novamente,
e mandou Ihe dizer que vai esperar seu chamado até depois da meia-noite. Quer falar
com você.
Kim pegou o pedaço de papel que ele Ihe estendia.
- Obrigada. Mais tarde falarei com ele. Agora tenho que por Ricky na cama.
- Mais tarde? Ele disse que era importante - protestou o capitão.
- Mais tarde - ela repetiu, autoritária. - Vamos, Ricky.
Controlou-se para não amassar o papel até chegar a cozinha. Lá, fez uma bola com
ele e atirou-a na cesta de lixo, esquecendo o fato enquanto preparava uma refeição
ligeira para ela e o irmão.
O calor tropical da noite estava muito agradável quando acabaram de comer. Ricky
bocejava, enquanto terminava de beber o copo de leite, e Kim sentia o corpo
dolorido por causa do exercício durante o dia. Deveria ter dormido bem, mas não
conseguiu. A imagem perturbadora de um homem de cabelos negros e olhos cinzentos
sorrindo para ela a perseguia nos sonhos.
CAPITULO V
Nos três dias seguintes, Kim ignorou os sinais de perigo que a ameaçavam e
continuou a brincar com fogo.
Com despreocupação, ela presenciava a crescente admiração de Ricky por Martin Ste.
Croix, aproveitando-se disso para passar seus dias na companhia dele. Cada manhã,
resolvia com o menino os planos do dia, que sempre incluíam Martin. De fato, ela
sentia-se maravilhosamente bem ao lado dele.
Kim percebeu que estava contando mais de sua vida do que costumava. Martin Ihe
fazia perguntas diretas, descobrindo seus gostos, suas preferências, suas
habilidades.
Conversavam sobre arte, música e balé. Kim chegou até a confidenciar seu desejo
secreto de fazer uma viagem pelos oceanos distantes. E ambos gostavam de ler.
As perguntas de Martin eram feitas com naturalidade e ela não tinha a impressão de
que ele estava especulando. Kim sentia-se completamente envolvida pelo ambiente
exótico e pelo fascínio poderoso do francês.
Ele nunca falava em Jack Wells, nem sobre a sua vida particular. Embora muitas
vezes Kim Ihe fizesse perguntas, estas invariavelmente ficavam sem resposta. Aquele
homem escondia algum mistério, mas a atração que Kim sentia por ele mascarava tudo.
Martin provocava Kim, mas não tentou beijá-la de novo. Algumas vezes ela
surpreendia aquele olhar estranho que a intrigara desde o principio, e que mudava
instantaneamente quando Martin percebia que ela o observava. A rapidez com que
Martin conseguia fazer um comentário jocoso a deixava muitas vezes confusa.
Será que ele estava realmente preocupado e angustiado com alguma coisa que
procurava esconder com maneiras arrogantes e firmes? Kim não sabia.
O instinto, que fizera dela uma das melhores policiais de sua corporação, estava
agora adormecido. Kim só desejava gozar aqueles momentos de companheirismo e
descontração.
Assim, eles fizeram passeios ao redor da ilha, com Ricky radiante pela atenção que
recebia dos dois. Ele era o pretexto para se encontrarem continuamente.
Luci e Gil faziam de tudo para reforçar os laços cada vez mais estreitos entre
eles. Os dois casais passavam noites agradáveis juntos, jantando em lugares
sofisticados em praias enluaradas, dançando ao som das músicas locais.
No sábado a noite, os quatro se acomodaram no salão do Beautiful Lady, depois de um
jantar saboroso.
- Estou satisfeita demais, comi muito - falou Luci, atirando-se num sofá. - Prepare
um drinque para mim Gil, por favor.
Ele riu e preparou-se para atender ao pedido da noiva.
- E vocês dois? - Kim recusou e Gil serviu-se de um Martini. - Kim - Gil continuou
-, será que você me emprestaria Ricky por três ou quatro dias? Somente durante o
dia a noite eu o trarei de volta.
- Para que? - Kim perguntou sem entender, os olhos em Gil, não se dando conta da
súbita tensão que dominou Martin.
- Meu tio Boki está aqui de visita. Ele mora e trabalha no Havaí, mas minha tia
está convalescendo e mandou os seus dois filhos menores para umas férias de duas
semanas. E se Ricky se juntasse a eles, com certeza eles se divertiriam mais. - Gil
olhou para Martin que o fitava com o rosto impassível, os olhos negros e duros.
- O velho planejou uma porção de atividades para manter os garotos ocupados, e acho
que apreciaria a companhia de Ricky.
- Bern... eu não sei. Tem certeza que tomarão conta dele?
- Tio Boki é muito dedicado aos filhos. Isto eu garanto.
- Posso conhecê-lo antes? E aos garotos?
- Lógico! Eu os trarei amanhã de manhã.
- É que sou responsável por Ricky. Preciso ter certeza que ele estará bem.
Martin soltou a respiração lentamente.
- Fez as reservas que combinamos, Gil? - perguntou.
- Está tudo certo - Gil respondeu.
- Lembra-se de que Gil comentou sobre o nascer do sol visto do alto do Haleakala? -
Martin perguntou a Kim. - Ele conseguiu organizar uma excursão para nós amanhã.
Depois de um certo trecho iremos a cavalo, e pernoitaremos lá em cima. Isto é uma
coisa difícil de arranjar, nesta época do ano.
- É verdade - Gil concordou. - Eu só consegui porque tenho um tio que. . .
- Chega de tanto tio! - exclamou Luci, rindo. - Parece que nada nesta ilha é feito
sem a ajuda de seus parentes!
- Minha família é famosa por sua fertilidade. Não se esqueça que colaboramos com a
povoação deste lugar, portanto, previna-se menina. . .
- Pode ficar descansado - foi a resposta descontraída de Luci, mas ela corou.
- O que seu tio quer que a gente faça? - perguntou Martin.
- Precisam se apresentar no escritório do superintendente. Tudo já Está resolvido.
Se se levantarem as três da manhã, ele colocará um guia a disposição para os levar
até a cratera. Lá vocês param para descansar, comem qualquer coisa e vão até a
borda da cratera ver o sol se por. Numa noite boa, a vista é espetacular...
realmente espetacular!
- Obrigado pelo esforço, Gil. Você vem comigo, Kim? Teremos que sair bem cedo para
chegarmos lá as três.
- Vamos acampar ao ár livre?
- Com colchões de ár, minha companhia e. . . um guia para nos acompanhar. O que
mais uma mulher sensata poderia querer?
- Vou ver antes se Ricky ficará bem, - respondeu ela, ignorando a malícia da
pergunta.
Gil pareceu ofendido. Kim confiava nele como confiaria em um irmão, mas não diria
isso ali. O francês estava confiante demais, seguro que sua resposta tinha que ser
afirmativa.
- Oh, Kim, você sabe que Ricky ficara em boas mãos! - Gil disse.
Kim o brindou com um daqueles seus sorrisos maravilhosos. E ouviu a exclamação
abafada de Martin. Ela conhecia muito bem o efeito de seus sorrisos luminosos sobre
os homens. Os olhos prateados, os dentes brancos, contrastando espetacularmente com
a pele cor de canela, deixavam qualquer um atônito. Gil e Martin estavam indefesos
e Kim, aproveitando a vulnerabilidade dos dois, anunciou que estava cansada e ia
para a cama.
Apesar de Gil não conhecer Martin há muito tempo, seria possível que tivesse se
dado ao trabalho de arranjar companhia para Ricky somente para deixar-nos sozinhos?
Seja lá como fosse, deveria ser excitante passar mais algum tempo na companhia
daquele belo francês. Se Ricky tivesse outros programas, seria maravilhoso acampar
a beira da imensa cratera ao lado de Martin, pensou Kim, enquanto lavava o rosto.
O encontro de Rick com os filhos do tio Boki foi urn grande sucesso, e ele recebeu,
alegre o convite para passar alguns dias em companhia dos garotos. Tio Boki, alto e
musculoso, exibiu os dentes brancos para Kim, orgulhoso quando apresentou seus
filhos, deixando-a tranqüila quanto aos cuidados que iria tomar com Ricky.
- Ricky pode ir, sr. Boki, sei que estará em boas mãos - ela disse afinal, e os
meninos imediatamente saíram correndo alegremente.
- Obrigado, srta. Matthews - o homem disse, satisfeito. - E eu tenho um recado de
Gil para a senhorita. Ele mandou lhe dizer que Martin virá buscá-la ao meio-dia.
Vista jeans e sapatos fortes e leve um agasalho quente.
Boki se despediu e levou os garotos. Já era meio-dia e cinco! Kim correu para a sua
cabine e apanhou uma jaqueta no armário. Depois, gozando a liberdade daquele
momento, sem a responsabilidade de cuidar de Ricky, correu para o convés. A idéia
de passar vinte e quatro horas em companhia de Martin Ste. Croix lhe agradava
imensamente...
- Telefone, Kim - avisou Carl Brown, um dos tripulantes.
- Quem é? - perguntou, aborrecida. Não tinha ainda procurado Jack, desde a sua
primeira chamada. Sabia que ele havia falado com Ricky, mas estava resolvida a não
permitir que se metesse em sua vida. Ela e Luci combinaram que logo que a corrida
terminasse voltariam para casa, de avião. Jack que voltasse sozinho.
- É Jack - disse Carl.
- Diga a ele que estou de saída, e que não tenho tempo de atender agora. - Kim
sentia-se protegida, recusando-se a falar com Jack. Talvez assim ele percebesse que
ela falara sério quando o levou ao aeroporto. Sabia que ele não podia deixar
Honolulu durante a regata, e planejava já estar no avião quando voltasse.
Carl franziu a testa, surpreso pela resposta dela, mas Kim correu pela prancha de
desembarque até o cais, ao encontro de Martin que acabava de surgir. Estava
contente de vê-lo por mais de um motivo. Agilmente, pulou para o assento ao lado do
rapaz, sem dar-lhe chance de ajudá-la.
- Parece que está com pressa - ele comentou. - Isto é sinal de que está contente em
ir comigo?
- Quem sabe - respondeu, olhando-o vestido de jeans, uma camiseta azul desbotada,
Ele era a própria imagem do homem com quem todas as mulheres sonham. - Vamos!
Kim não olhou para o iate, mas escutou os passos pesados de Joe Hoffman e o berro
que ele deu chamando por ela. Martin também escutou. Lançou-lhe um olhar intrigado,
fez a manobra e seguiu em frente.
- E de perder o fôlego!!!
Kim estava de pé, na beira da cratera do gigante adormecido chamado Haleakala.
Foram necessárias algumas horas de subida puxada para atingirem aquele ponto, a
quase dois mil e trezentos metros de altura. O cume do vulcão ficava a três mil e
trezentos metros do nível do mar, mas aparentemente não era aquele o destino deles.
Martin tinha estacionado o jipe na área destinada aos visitantes e fora conferir
suas reservas no escritório do responsável. Incapaz de ficar esperando sentada, Kim
subiu a escada cavada na montanha e estava agora fascinada, olhando aquela paisagem
sublime.
Um buraco a seus pés, parecendo ter sido escavado por um gigante antigo, no começo
dos tempos, cones de cinza colorida, batidos pelos ventos, que iam do vermelho,
ocre, lavanda, púrpura, negro, e até dourados! Era tudo maravilhoso!
O fundo da cratera, caia em paredes abruptas a uma profundidade assustadora de
aproximadamente novecentos metros. A esquerda, uma fumaça espessa saia por uma
grande fenda, e se derramava por um rio irregular de resíduos de lava negra. As
pesadas nuvens brancas gotejavam no chão seco e imediatamente desapareciam. Kim
olhava fascinada o fenômeno, mas havia tanta coisa interessante para ver que nada
prendia sua atenção por muito tempo.
- Extraordinário, não?
- Nunca vi nada tão desolado e mesmo assim tão lindo - ela respondeu, olhando para
Martin que acabava de se juntar a ela. - Obrigada por ter me trazido.
- Precisamos ir agora. Nosso guia está nos esperando com os cavalos.
- Cavalos?
- Sim. Se quisermos que a viagem valha a pena, teremos que andar um pouco na base
da cratera. E Gil me disse que o melhor é ir a cavalo. Você anda a cavalo?
- Sim.
Martin segurou-lhe o braço, enquanto desciam e não o soltou até chegarem ao jipe.
Começaram a subida íngreme e Kim teve uma sensação estranha. O horizonte ao longe,
onde o mar e o céu se encontravam, parecia subir, se deslocando mais rapidamente do
que eles. Tudo parecia estar afundando no mar. O horizonte subia mais alto, mais
alto, cada vez mais alto. Era irreal... era assustador, e ela não tinha explicação
para isso! Seus olhos prateados estavam agora escurecidos com a excitação, e ela se
virou para Martin, curiosa.
- É ilusão de ótica, chérie, - explicou ele. - Já tive está sensação quando fiz
alpinismo, mas nunca vi uma claridade como esta! Quanto mais alto você subir, mais
poderá ver a superfície da terra e isto faz com que tenha a impressão de que o
horizonte está subindo. Talvez aqui a sensação seja mais pronunciada porque
Haleakala está diretamente sobre o mar e não há barreiras para a nossa visão.
- É... é glorioso! - murmurou Kim. - Tenho a impressão de que estou no centro da
terra... e que estou afundando!
Continuaram a conversar animadamente, dominados pela paisagem imponente, até
chegarem aos acampamentos de turistas, onde encontraram seu guia, e se equiparam
com o material necessário para acampar.
Finalmente partiram, o guia puxando um cavalo carregado com os suprimentos a
frente, Kim e Martin seguindo atrás em fila, em direção a borda da cratera.
Quando chegaram, Kim perguntou ao guia o tamanho aproximado da boca da cratera.
- Maior do que muitas coisas que eu já vi. - Foi a resposta do guia, David Hanaike.
- Está vendo lá em baixo, aqueles morrinhos com as depressões no meio? - Kim olhou,
seguindo a direção apontada pelo homem. - Muitos tem perto de cem metros de altura,
e alguns chegam até a duzentos metros!
- Não parecem tão altos daqui - Martin comentou.
- Mas são. Eles parecem pequenos porque a cratera e muito funda. E existem uns
vinte daqueles cones visíveis deste ponto.
- É muito grande! - Kim murmurou, assustada com a magnificência da vista. - Você
tem alguma idéia de quanto mede?
David parecia encantado com a reação dela.
- Deixe-me ver - disse, pensativo, a mão no queixo. - já esteve na cidade de Nova
York?
- Uma vez. Ha três anos.
- Conhece um pouco de lá?
- Alguma coisa. Fiz os passeios que os turistas costumam fazer.
- É uma cidade impressionantemente grande, não?
- Bern grande.
- Põe grande nisto - gracejou Martin.
- Pois bem - disse David - Manhattan, desde o Bronx até o Battery, do lado leste ao
lado oeste com os metros, os arranha-céus, tudo caberia na base desta cratera.
- Isto é brincadeira sua! - exclamou Kim, afastando o olhar da paisagem e pousando-
o no rosto de David.
- Não é não! É a pura verdade. A ilha inteira de Manhattan cabe dentro da Casa do
Sol.
- Parece incrível!
- Parece mesmo. Vamos descer agora?
Eles desceram pela borda daquele gigante adormecido que era Haleakala, até ao fundo
da cratera. Então chegaram a um mundo diferente.
Kim estava maravilhada. Conforme desciam, os cones coloridos iam crescendo de
tamanho e os dominavam com sua altura. Espigões, cones, rochas, nas formas mais
variadas, os cercavam, em meio a profundas fendas e buracos.
Estas formações majestosas eram, na maior parte, formadas por fragmentos de rocha,
uma cinza fina que os ventos mudavam de lugar e que a luz do sol fazia refletir
diversas cores.
Os cavalos seguiam tranqüilamente, e Kim tinha a impressão que estava descendo para
o centro da terra. Era belo, desolado, impressionante.
- Isto deve ter sido uma brincadeira de um deus louco! - Kim comentou, quando
chegaram ao acampamento. - Maui era inteiramente são?
David pulou da sela, o couro rangendo no silêncio do lugar.
- Maui tinha a reputação de ser brincalhão. Está vendo aquela plataforma ali? Lá
ele se escondeu para jogar sua rede sobre o sol, conseguindo assim aumentar as
horas de nossos dias. É isto pelo menos que meus ancestrais diziam.
- Podemos comer agora, David? - pediu Martin. - Gostaria de subir novamente para
apreciar o pôr-do-sol.
- Sim. E talvez, se formos logo, poderemos ver o espectro de Brocken!
- Que espectro de Brocken? - Kim perguntou, enquanto retirava a sela de seu cavalo.
- É um fenômeno atmosférico. Existe uma montanha Brocken na cadeia de Harz, na
Alernanha, e foi lá que este fenômeno foi visto pela primeira vez, causando grande
emoção.
- Não compreendo - disse Kim, enquanto abria os sacos de dormir, e os homens
armavam a tenda.
- Se as condições forem favoráveis, e o observador estiver atento, ele poderá ver a
própria imagem projetada na tela de nuvens como uma figura gigantesca envolta num
arco-íris circular.
- Está brincando.
- Não. Nos tempos primitivos isto era considerado um presságio. Mas hoje em dia,
até aeroplanos projetam estas imagens. Não é comum, mas não tem nada de
sobrenatural.
Continuaram conversando descontraidamente durante a refeição, que David preparou
rapidamerite.
A subida foi extenuante. O guia ia na frente, as cinzas sob seus sapatos grossos
chiando e desmoronando. Kim seguia seus passos e Martin ia logo atrás. Antes de
chegarem ao topo, estavam transpirando, e Kim arrependidade de ter trazido a
jaqueta que Martin recomendara. Mas ao chegar ao cume, todo o desconforto foi
esquecido.
O sol estava atrás deles, já baixo no céu, e as nuvens rolavam. A sombra de Kim,
enorme e nítida, envolvida por um arco-íris aparecia esplendida na bruma. Martin
aproximou-se mais e as duas sombras se uniram. Kim, fascinada, ficou imóvel quando
ele a abraçou. Só se separaram quando o fenômeno cessou e então se viraram para
apreciar o pôr-do-sol.
Voltaram pelo caminho, ainda maravilhados com a beleza do mar, do céu, da montanha.
Um vento fraco soprava agora, enquanto os ruídos imprecisos de insetos: pássaros se
misturavam aos de seus passos. Lá no alto dos penhatxos, pássaros escuros abriam
suas enormes asas, voltando aos ninhos, depois de um dia no mar.
Kim andava no escuro agora, seguindo o facho de luz da lanterna de David, abalada
com a proximidade de Martin. Logo as estrelas iluminaram o céu e ela diminuiu o
passo para absorver a beleza majestosa da noite. Martin ficou a seu lado, enquanto
David entrava na barraca comunal. Depois ele acendeu uma lanterna.
Kim continuou admirando a noite.
- E tudo tão imenso - disse ela. - Mas não reconheço as constelações.
Martin estava tão perto, que ela sentia o calor de seu corpo.
Estamos realmente no alto - murmurou ele. - Por causa da atmosfera limpa, podemos
ver estrelas que normalmente não se vêem na cidade.
- É... e espetacular!
- Sim - disse ele, os olhos presos ao belo rosto de Kim.
Baixando o olhar, ela se viu face a face com Martin. O rosto dele, sombreado pela
luz das estrelas, fazia o coração dela disparar e ela ofereceu os lábios ardentes
para um beijo. Sentia o coração dele bater surdamente contra o seu e correspondeu,
trémula, quando ele forçou sua boca a se entreabrir. O tempo parecia ter parado.
Kim quase caiu quando repentinamente Martin levantou a cabeça e olhou para ela,
atormentado.
- Eu... você... - balbuciou ela. - É melhor irmos dormir agora.
- Ótimo! Na minha cama ou na sua?
- Não fale isto! - ela protestou, libertando-se dele, apesar de todo o seu ser
ansiar por aquele homem. - A experiência foi maravilhosa. Estou muito feliz e nunca
poderei lhe agradecer o bastante por ter me trazido. Não vamos estragar tudo.-
Dando meia-volta, seguiu para a tenda.
- Estava só querendo completar sua alegria, Kim... e também a minha. Por que está
tão relutante em deixar que eu a ame?
- Por que? ela pensou, dentro de seu saco de dormir, enquanto Martin se preparava
para deitar, no espaço restrito da tenda.
Logo Kim escutou o ressonar cadenciado do guia e logo depois ela adormecia. Assim,
não viu quando Martin inclinou-se sobre ela admirando seu rosto perfeito a luz
fraca da lanterna, com uma expressão atormentada. Ele ajoelhou-se com cuidado ao
lado dela e acariciou apaixonadamente os cabelos revoltos. Kim estremeceu mas não
acordou, enquanto ele dava um suspiro fundo, expressando claramente a dor em seus
olhos cinzentos. Finalmente saiu da tenda, só voltando algum tempo depois.
Levantaram-se quando ainda estava escuro, cuidando dos cavalos e comendo no frio da
madrugada.
Martin falava pouco, mas não tirava os olhos de Kim. Ela percebeu isso, enquanto
comia e ajudava nos preparativos, conversando com David e procurando ignorar o
silêncio soturno de Martin. Cada vez que seus olhares se encontravam, ela se
lembrava do apaixonado beijo que tinham trocado e da resposta intensa de seu corpo,
e cada vez se irritava mais: isso parecia divertir Martin, ela não entendia por
que. Estava tão irritada que acabou tropeçando num dos fios que prendiam a tenda,
mas Martin a amparou.
Finalmente estavam prontos para seguir. O céu já clareava, mas a aurora demoraria
ainda mais de uma hora.
Cavalgaram no silêncio da enorme cratera e, mais uma vez, ela sentiu-se envolvida
pelo fascínio daquele mundo estranho. Nunca tinha imaginado um lugar tão cru, tão
primitivo; desmontaram afinal e se acomodaram para assistirem ao nascer do sol.
O ár frio estava cheio de sons de pássaros. As estrelas começavam a sumir no céu da
manhã, e longos e vividos raios de sol, lançados cada vez mais altos, transformavam
a aurora num caos vibrante, onde todos os tons de rosa se misturavam. A cratera foi
iluminada por um brilho glorioso, colorindo magicamente o chão de cinzas,
delineando os cones com atordoante extravagância. O sol ia surgindo vagarosamente
no céu.
Não havia palavras para Kim descrever um espetáculo assim! E não tentou comentar o
que estava sentindo. Martin observava as rápidas mudanças na expressão de seu
rosto, fascinado.
Satisfeito com o espetáculo que os deuses matinais tinham oferecido, David guiou-os
de volta.
- Penso que os senhores poderiam ver ainda mais algumas paisagens do Haleakala
antes de partirem - disse ele. - Vamos dar mais uma olhada e mesmo assim chegaremos
a estação antes do meio-dia, concordam?
Os dois concordaram e partiram para uma viagem de exploração que Kim achou
incrível. Visitaram cavernas, poços, buracos, montes formados por rochas derretidas
durante uma erupção. David conhecia e explicava tudo, inclusive as lendas ligadas a
cada coisa.
- Pele, a antiga deusa dos vulcões que morava nos pontos mais quentes, tinha
abandonado há muito tempo o Haleakala e agora morava no Mauna Loa. Mas havia
deixado suas marcas, como o Cercado dos Porços de Pele, uma formação vulcânica que
se assemelhava a um curral para a criação de porcos - contou David.
A infinita lista de maravilhas geológicas não tinha nem chegado ao meio quando,
exausto, Martin finalmente pediu para volitarem.
- Quero ver alguma coisa da costa antes de escurecer - ele explicou a David, sem se
importar com o olhar surpreso de Kim. - E ainda temos que parar para o almoço.
- Eu preciso voltar por causa de Ricky - disse Kim.
- Tomei a liberdade de pedir a Luci e Gil para que ficassem com ele até nós
voltarmos. Não conhece a mata do outro lado da ilha, conhece?
- Não. Mas não acho que...
- Não seja má, chérie. Passe mais este tempinho comigo.
Kim não tinha certeza do que queria. Um pouco mais de tempo com Martin poderia ser
a sua ruína. Ao se lembrar de sua reação aquele beijo sob as estrelas, sentiu o
pulso acelerado. Ele era perigoso demais para sua paz de espírito. Sabia, sem
sombra de dúvidas, que deveria evitar momentos íntimos com ele.
Martin e David estavam agora conversando sobre o delicado equilibriu ecológico,
suportado pelo imenso vulcão. Kim escutava, interessada.
- A vegetação nativa da área tem pouca chance contra a que foi trazida pela mão do
homem - explicava o guia. - A espada de prata é um bom exemplo. - Antigamente ela
cobria as encostas do Haleakala. Mas os homens introduziram os porcos que comeram
todas elas.
- Entretanto, é uma planta extraordinária, parente do girassol.
Os dois homens continuaram a conversar sobre a fauna e a flora das ilhas havaianas.
Depois que os vulcões cessaram suas erupções - explicou o guia - as sementes foram
trazidas pelas correntes marinhas e pelos pássaros, e muitas se adaptaram ao
ambiente.
- Muito interessante! - exclamou Martin. - Nunca tinha pensado nisto.
- Poucas pessoas pensam, mas a original idade de nossa vida vegetal e animal
dependeu do isolamento de nossas ilhas, separadas dos continentes por mais de duas
mil milhas de água. Vamos olhar daqui - ele disse, parando.
Olharam, interessados, vendo lá embaixo os cones, agora novamente diminuídos pela
distância. Uma nevoa tênue começava a esconder as formas.
- Se o tempo estiver claro, pode-se,ver umas vinte crateras daqui - disse David.
- É mesmo incrível! - exclamou Kim, e David sorriu ao ver seu encantamento.
Finalmente eles seguiram por um atalho onde David lhes mostrou a espada de prata
florescendo. A planta tinha folfias muito finas, a copa em forma de domo, brilhando
como prata contra a lava negra. As hastes com flores eram lindas e chegavam a
altura de Martin.
- A espada de prata leva vinte anos para florescer - contou David. - Cada haste
suporta umas cem minúsculas flores parecidas com o girassol. Quando as sementes
amadurecem, a planta morre.
- E difícil imaginar as encostas cobertas com elas.
- Sim - concordou David. - Mas a lenda diz que antigamente elas eram assim.
Mais tarde, Kim estava sentada no parapeito da área de estacionamento, esperando
que Martin acertasse as contas com o superintendente, enquanto olhava encantada a
paisagem da ilha.
Estava tão distraída que não se interessou pelo helicóptero que descia no outro
extremo do estacionamento. Sua mente pesava os perigos que correria se permitisse
que o seu relacionamento com Martin se estreitasse mais, assim ela não ouviu os
passos que se aproximavam.
- Levante daí e venha para o helicóptero, Kim! Vamos embora.
Atônita, ela deu um salto e ficou de pé.
Jack Wells estava a sua frente, os olhos injetados de ódio, os punhos cerrados ao
lado do corpo.
CAPITULO VI
Kim recuou.
- O que foi que disse?
Jack avançou para ela, francamente descontrolado.
- Eu disse para que entrasse naquele maldito helicóptero, Kim.
- Agora mesmo! - As palavras saiam duras de seus lábios.
Kim olhou-o sem poder acreditar, sua calma sumindo, o rosto corado.
- Não seja ridículo! Não tem o direito de me falar assim!
Ele se adiantou e ela recuou com agilidade. Uma centelha de medo surgiu dentro
dela, pois percebeu que Jack estava louco da vida e sem condições de raciocinar.
Então subiu numa rocha mas caiu, sentindo o chão áspero sob as mãos. Jack abaixou-
se e puxou-a pondo-a de pé, ignorando seu involuntário grito de dor.
- Vamos! Agora mesmo!
- Não!
Ela foi agarrada com brutalidade, e sua negativa aumentou o ódio dele. Por um
instante, Kim ficou chocada demais para reagir.
Estava vagamente consciente do protesto do piloto do helicóptero. Aquilo a fez
readquirir o sangue-frio e, levantando rapidamente os braços, num gesto inesperado,
conseguiu se livrar de Jack, afastando-se dele.
Ele a olhou, o rosto vermelho e contorcido, os olhos injetados. Um homem que
nenhuma mulher sensata enfrentaria.
- Não me toque, Jack! - ela ameaçou. - Não vou a lugar algum com você.
- Deixe-a em paz, Wells! - gritou o piloto do helicóptero, que, na pressa, não
conseguia desprender o cinto de segurança.
Agora Kim estava controlando suas reações, seu treino de policial vindo a tona.
Recuou, a adrenalina invadindo seu sangue, os músculos tensos, mas preparada para
entrar em ação.
- Vai fazer o que eu digo! - A prudência e o equilíbrio tinham abandonado Jack,
quando avançou feroz para cima dela.
A reação de Kim foi automática. Quando ele se inclinou para agarrá-la, usou o braço
estendido como alavanca, fazendo com que ele voasse por cima de seu ombro. Ele caiu
com um barulho surdo no chão. Kim se afastou e tomou fôlego, enquanto o medo, a
excitação e o arrependimento a invadiam em igual proporção. Ela agira intuitiva-
mente, sem tempo para pensar. Se Jack tivesse batido a cabeça...
- Bravo, chérie! - exclamou Martin se aproximando. Jack ficou de joelhos, apoiado
nas mãos e Martin o ajudou a se levantar, uma mão de ferro segurando a frente de
sua camisa. - O que está querendo fazer?
Jack levantou as duas mãos mas não conseguiu se livrar dos dedos de aço de Martin.
Kim observou que os possantes músculos das costas do francês estavam saltados sob a
camiseta fina. Finalmente, ele soltou Jack.
Tonto, Jack cambaleou e teria caído se Martin não estivesse atento. Amparou-o e
colocou o braço do outro sobre seu ombro. Depois, levou-o até o helicóptero, as
pernas bambas de Jack mal suportando o corpo.
- É melhor que você carregue este sujeito de volta de onde veio - disse para o
piloto. - Quer ajuda para levá-lo para bordo?
- Quero - pediu o piloto, os olhos pregados em Kim. - Aquela dona é um perigo!
- É, realmente - respondeu Martin, sorrindo levemente.
- E é também uma beleza! Quem imaginaria isto? - O piloto puxou Jack com a ajuda de
Martin e o acomodou no helicóptero.
- É, ninguém pensaria - concordou Martin, e se afastou. Seu rosto, curtido pelo sol
das ilhas, mostrava-se irônico, quando voltou para perto de Kim. Ela estava pregada
ao chão, o rosto lívido. Martin segurou suas mãos geladas e puxou-a para seus
braços.
- Preciso me lembrar de não aborrecer você - murmurou. - Onde aprendeu isto, meu
amor?
- Na Academia de Policia. Eu era boa em defesa pessoal. - A respiração de Kim era
irregular. - Eu... eu não queria fazer aquilo a Jack. Eu. . . poderia tê-lo matado!
O helicóptero que levava Jack levantou vôo, e Martin protegeu-a do vento fazendo um
escudo com o seu corpo.
- Ele vai ficar bom. Por que você fez isto?
- Ele estava tão transtornado! Insistia para que eu entrasse no helicóptero e fosse
com ele. Nem me deu tempo para pensar!
- Foi bom assim; se ele tivesse encostado um dedo em você eu o esganaria. Vamos
agora, chérie?
Kim seguiu-o até o jipe, as emoções em turbilhão, sem conseguir pensar com clareza.
Martin a ajudou a subir e desceram pelas encostas do Haleakala. O encontro com Jack
tinha abalado Kim e ela sentia-se mal. Viajou muda, o olhar vago, em estado de
choque. Martin a olhava, preocupado.
A tarde deveria chover, mas a manhã estava clara e a vista muito nítida. O centro
da ilha se estendia, diante deles, verde e dourado contra o oceano azul. Aquela
vista pacifica produziu um ótimo efeito sobre Kim e finalmente ela suspirou, mais
calma.
- Está infeliz, Kim?
- Estou. Não sei o que deu em Jack, ultimamente.
- Não é raro que um pai se preocupe com sua linda filha. - Martin não acrescentou
que era mais raro ainda uma filha derrubar o pai daquela maneira.
- Ele não é meu pai.
- O que? - Martin freou repentinamente, e Kim quase bateu com a cabeça no vidro.
- Não faça isto! Pode nos matar aos dois!
- Desculpe. - Ele se virou no banco e olhou para ela. - Que historia é está? Ele
não é seu pai?
- Lógico que não! - exclamou Kim com escárnio. - Meu pai era um cavalheiro. Nunca
faria as coisas que Jack faz. Tenho que reconhecer que nunca gostei especialmente
de meu padrasto. E também não confio nele.
Martin xingou em francês. Procurou em Kim algum sinal de dissimulação, de
falsidade, mas não encontrou nada em seu olhar límpido e claro. Pensou em tudo que
soubera sobre Kim até aquele momento e a esperança começou a brotar em seu coração.
Será que tinha se enganado sobre ela?
- Incrível, Kim! - disse, parecendo aliviado.
- Não pensei que isto tivesse importância. Que diferença faz, ele não ser meu pai?
- Não é por isto, mas... - Martin calou-se repentinamente e, fechando os punhos,
esmurrou o volante.
- Não vai me contar? - ela perguntou rindo, percebendo vagamente que ele estava
tornado pela emoção.
Martin olhou-a de relance e inclinou a cabeça. Kim olhava para ele, sentindo
intensamente a proximidade daquele homem. Sentia o cheiro daquela pele queimada de
sol, um cheiro irresistivelmente viril. Inesperadamente ele virou a cabeça, e se
surpreendeu com o olhar revelador e o rubor colorindo o rosto dela. Martin sorriu
tão docemente que ela quase perdeu o fôlego.
Os dois ficaram alguns minutos esquecidos do mundo, se encarando, até que ele
levantou um dedo e tocou suavemente o rosto de Kim.
- Eu acho, srta. Kimberly não-sei-de-que, que devemos procurar um lugar sossegado e
discutirmos alguns assuntos delicados.
Kim se esforçou para se libertar da magia em que estava envolvida e respondeu:
- Meu sobrenome e Matthews - disse ela. - Meu pai era Richard Matthews. Jack era
amigo dele e se casou com minha mãe, dando o nome do meu pai ao filho que nasceu.
- Bem... vamos esclarecer todos os mal-entendidos entre nós, está bem? - Martin
pediu, subitamente tão carinhoso que a assustava. Ele assobiava alegremente,
enquanto seguiam montanha abaixo, um sorriso nos lábios.
Ao chegarem a planície, ele parou no primeiro armazém que encontrou e saltou,
recomendando a Kim que o esperasse ali mesmo. Logo voltou com uma caixa de
provisões, que colocou na parte de trás do jipe.
- Vamos fazer um piquenique! Temos muito o que conversar. - Ele sentou-se ao lado
dela. - Iremos a um dos lugares mais bonitos e desertos do mundo, para conversar.
. e nadar. . . e conversar. . . e comer, e outras, coisas, se os deuses sorrirem
para mim. Pretendo descobrir tudo o que ainda não sei sobre você.
Viajaram mais de uma hora e meia pela floresta tropical, exuberante com suas
folhagens verdes, até chegarem a uma baia numa encosta profunda. Martin estacionou
o jipe na ladeira, entre as árvores, no ár pairava um aroma de goiaba e maracujá.
Finalmente desceram para a praia.
Era espetacular!
A áreia escura cercava uma baia de água cor de turquesa, com ondas suaves, que
manchavam de branco as margens. Um riozinho desaguava ali perto e enormes pássaros,
chamados fragatas, voavam sobre suas cabeças, contrastando com o céu de um azul
profundo.
Kim sentou-se ali, sem voz diante de uma beleza tão perfeita. Martin também estava
calado, mas ele apreciava outro tipo de beleza. Finalmente ela se virou para ele,
sem perceber seu olhar apaixonado, dominada pela encantadora vista.
- Obrigada, Martin. Não posso dizer o que estou sentindo.
- Venha - convidou ele. - Ainda há mais.
Caminharam em volta da baia, de mãos dadas, sem necessidade de falar. O suave
sussurrar das ondas era aos poucos abafado pelo ruído de uma cachoeira. Quando
chegaram ao lugar onde a água descia pela montanha em direção as areias escuras,
Martin a guiou para o meio da mata. Kim percebia que a água caia de uma plataforma,
mas só quando chegou lá viu que havia uma grande depressão na rocha, formando uma
piscina natural.
- Vamos nadar?
- Não posso, não trouxe maiô.
- Nem eu. Mas eu posso nadar com minha sunga, você não? Ela corou.
- Acho que não. Minhas roupas são muito transparentes.
- Ah, chérie, vamos nadar! Vamos ficar em baixo da cachoeira e mergulhar nesta
piscina cristalina. Vamos esquecer das convenções e sermos um para o outro o que
realmente queremos ser.
- Sobre o que está falando? - ela perguntou, desconfiada.
- N' importe! Primeiro vamos nadar e depois conversaremos.
Martin começou tirando os sapatos. Abalada, Kim o observava se despindo. A sunga
dele realçava o corpo cor de cobre. Mais uma vez Kim observou aquele físico
perfeito marcado pela cicatriz, que ia da frente as costas.
- O último é tio de macaco! - provocou ele, enquanto a encarava com ar felino. Kim
sentiu um arrepio percorrendo seu corpo. Depois, ele se virou e mergulhou num
estilo perfeito. Kim assistia a tudo imóvel.
- Venha! - convidou Martin. - Suas roupas de baixo devem cobrir você tanto quanto
um biquíni. Está com medo?
- De você? - Kim fez-lhe uma careta. - Ainda vai chegar o dia. - Puxou o zíper da
calca, tirou a camiseta pela cabeça e mergulhou suavemente, chegando perto de seu
desafiante.
- Melhorou muito! Vamos nadar até a cachoeira?
Nadaram mais de uma hora na água agradável. Lentamente Kim foi tomando consciência
de um estranho sentimento. Será que ela gostaria de amá-lo? Ela se perguntava.
Seria Martin o homem que tinha esperado todos esses anos, enquanto suas amigas iam
se casando?
Subitamente Martin a içou para fora da piscina e a envolveu em seus braços, a
brincadeira esquecida.
- Ah, chérie... - Logo sua boca estava sobre a dela. Ele a levantou nos braços e
foi para a praia, os olhos a devorando, enquanto murmurava palavras apaixonadas em
francês. Kim estava completamente dominada por aqueles olhos cinzentos como nuvens
escuras, brilhando apaixonados. Ela se aninhava nos braços fortes e no peito nú,
seu corpo palpitante, o coração obtendo ao compasso do dele.
Ajoelhando sob a sombra de uma árvore, Martin a deitou com cuidado sobre uma pedra
lisa. Depois, deslizou seus dedos longos sobre seu seio rijo, causando nela um
estremecimento de prazer.
- Ah, Kim, que filhos lindos nós vamos ter!
- Eu... o que foi que você disse?
- Disse que nossos filhos serão maravilhosos! Meu físico e sua inteligência... -
ele gracejou.
- E a sua maluquice. Que combinação ideal. Devo concluir que está me pedindo em
casamento, seu homem impossível?
- Mas claro que sim! Parece que não há nenhum amor entre você e Jack Wells e não
são nem parentes! Não imagina como isto me deixa leve, porque agora posso confessar
que eu a amo, que eu a desejo. Kimberly Matthews, diga que vai casar comigo e
colorir minha pobre vida!
- Não pode estar falando sério. E por que o meu relacionamento com Jack tem alguma
coisa a ver conosco?
O sorriso abandonou o rosto dele, que baixou os olhos, escondendo uma centelha de
ódio.
- Qual e o problema, Martin? O que há entre você e Jack?
- Não tem nada a ver com você, meu amor. - Levantou a mão dela e pousou um beijo em
sua palma. - Kim, diga que vai casar comigo?
Ela olhou para ele, fascinada por aquele corpo perfeito, brilhando ao sol,
totalmente entregue ao encanto daquele momento.
- Eu... - Kim não teve tempo de acabar a sentença. Martin tinha levantado a cabeça
a tempo de ver que a caixa com a comida estava sendo roubada do jipe por um
garotinho que mal agiuentava seu peso.
Logo ele ficou de pé e saiu em perseguição do pequeno ladrão. O garoto ouviu-o se
aproximar e deixou cair à caixa, mas seu esforço para escapar foi inútil. Martin
agarrou-o e o levou de volta até a pedra onde Kim estava sentada, completamente
atônita.
CAPITULO VII
Martin teve que usar toda a sua força para dominar a criança. O menino lutava como
um animal encurralado, seus braços e pernas parecendo garras. Dava pontapés,
arranhava e mordia. Mas Martin o segurou com firmeza, impressionado com a
resistência que encontrava.
Finalmente a criança parou, exausta, a respiração irregular, os olhos baixos.
Penalizado, mas precavido, Martin levantou o garoto pelos bracinhos finos.
- Não vamos machucar você, infante. Não tenha medo. Onde estão seus pais? Você é
filho de quem?
O menino continuava calado, olhando para ele com desconfiança e medo.
- Pauvre petit - murmurou Martin. - Você parece faminto. Foi por isto que estava
roubando a nossa comida? - A doçura do sorriso de Martin tocou o coração de Kim,
enquanto olhava o menino.
Era um garoto franzino de uns seis ou sete anos. Estava magro e parecia subnutrido,
mas era de boa constituição. Suas perninhas eram morenas e finas, arranhadas e
sujas, A blusa já tinha perdido os botões e algum dia fora branca, com um bordado
delicado em vermelho e dourado no pescoço, nos punhos e nas bordas. Mas agora
estava em tiras, cobrindo o corpinho frágil. Nas costas, o menino tinha um inchaço,
entre as costelas.
Ele ficou ali de pé, respirando alto, os olhos vivos em movimento, lutando contra o
medo que sentia.
- Parece que vou ter que alterar os meus planos - disse Martin, com um sorriso
desapontado. - Mas não se preocupe, Olhos de Neblina. Vamos conversar novamente
depois que cuidarmos desta criança.
- Quer, por favor, juntar as nossas roupas? Acho que ele deve ter passado um mau
pedaço, sem pais e sem família. Vamos levá-lo de volta a sua casa e então
continuaremos a nossa conversa.
- Sim... - Confusa, Kim ficou de pe, e foi até a piscina natural, envergonhada por
estar vestida somente de calcinha e sutiã. Sorte que o inesperado visitante
era apenas uma criança! Vestiu-se e levou as roupas de seu companheiro.
Repentinamente Martin deu um berro e Kim só teve tempo de vê-lo cair sobre a rocha,
enquanto o menino escapava com incrível rapidez, desaparecendo no emaranhado da
floresta. Martin correu atrás, o corpo ágil e elástico vestido somente com a sunga.
Kim colocou as roupas dele sobre a pedra e foi até o jipe recolher os mantimentos
que o menino tinha espalhado na areia, quando deixou a caixa cair. Depois arrumou a
mesa para o piquenique, sabendo que o menino precisaria comer quando Martin o
trouxesse de volta.
Finalmente deitou-se ao sol. Que dia extraordinário tinha sido aquele! Ver o nascer
do sol lá do alto; depois a absurda aparição de Jack! E, por último, a peculiar
reação de Martin ao saber que ela e Jack não estavam em bons termos e nem eram pai
e filha. Por que isso era tão importante para ele?
Ela nunca se esqueceria desse lugar maravilhoso onde viveu momentos tão
apaixonados. Será que alguém no mundo tinha recebido um pedido de casamento num
lugar tão romântico? Mas estaria mesmo apaixonada? Martin a perturbava como nenhum
homem. Sentia-se fortemente atraída por ele, admirava sua brilhante inteligência,
seu senso de humor, seu coração compassivo. E ele era muito viril! Kim sentia que
estava a ponto de se apaixonar. Mas isso era suficiente para se casar com ele? Este
sentimento tenderia a crescer, transformando-se num amor duradouro? Desconfiava que
sim, Martin quero tanto amar você! Ela pensou.
Finalmente Martin voltou, arranhado e sangrando, xingando violentamente em francês,
o garoto vencido em seus braços. Kim ficou de pé num salto, assustada com os
ferimentos.
- Estou uma droga - ele disse, taciturno. - Este menino é mais escorregadio que uma
enguia. Vou levá-lo até o mar para lavá-lo. Não vai fazer mal algum.
Levou o garoto no colo até as ondas suaves e tirou a blusa dele apesar dos
protestos, descobrindo então a razão do inchaço das costas. O menino tinha amarrado
entre as costelas uma bolsa de uns vinte centímetros, bem presa por tiras. Quando
Martin fez um gesto para tocar nela, a reação dele foi extremamente violenta.
Libertou-se e, mergulhando, nadou para o fundo do mar.
O menino nadava muito bem, mas não tinha chance contra um homem como Martin, que
acabou alcançando, enquanto ele reagia com surpreendente ferocidade. Quando saiu do
mar com o garoto no colo, a paciência de Martin estava no fim.
- Agora, mon petit chat-tigre, comporte-se. - Deu-lhe uma violenta sacudidela e o
pos de pe. - Vamos acabar com está histeria e ver que mistério e este.
O menino se empertigou todo, o corpo nú muito rígido. Havia tal desespero em seus
olhos que Kim soltou uma exclamação abafada e correu para ele, abracando-o. O
garoto não se entregou, o corpinho moreno duro sob os dedos dela.
- Oh, Martin, ele está tão assustado! Parece tão sozinho. Não insista em tirar isto
dele. Não podemos deixá-la?
- Podemos sim, por enquanto - concordou Martin. - Acho que o mais importante agora
e alimentá-lo. Pronto, deixe que eu o carrego. - Levantou o menino e segurou-o
contra o peito largo. A criança ainda fez menção de resistir, os olhos arregalados.
Mas Martin sorriu para ele e colocou-o ao lado da toalha com as comidas do
piquenique.
- Pronto rapazinho, vamos arranjar uma coisa para você. - E pegando sua camisa de
malha, meteu pela cabeça do garoto. Ele estremeceu e seus olhos revelavam puro
terror.
- As tu jaim? - perguntou Martin. O garoto continuou mudo. Martin tentou o
espanhol, depois o italiano, o alemão, mas nada funcionou. Fez então um belo
sanduíche e colocou diante dele, que ficou olhando, mas não se moveu, apesar de ser
evidente que estava faminto. - Está aqui, para você comer quando quiser. - Martin
preparou outro sanduíche que entregou a Kim. - Coma, meu amor. Encoraje nosso
convidado a imitá-la.
Fez um terceiro para si e começou a comer com tanto apetite que o garoto não
resistiu e agarrou o dele, mastigando com avidez.
- Foi o que pensei - comentou Martin, abrindo três garrafas de refrigerante,
entregando uma a Kim e colocando a outra em frente do garoto. - Ele estava vivendo
numa caverna ao lado dos penhascos. É uma mera fenda, mas se alarga para dentro. A
entrada e tão camuflada que eu quase não percebi. Parece que já está ali há algum
tempo.
- Sozinho?
- Tenho certeza que sim. Não havia sinal de mais ninguém. Nosso amigo está só no
mundo por alguma razão.
- O que vamos fazer com ele?
- Não sei. - Martin fez um segundo sanduíche para o menino. - Ele está com muita
fome e não podemos deixá-lo aqui, naturalmente. Temos que levá-lo para Lahaina e
ver se conseguimos localizar sua família. Sinto muito se o nosso idílio foi
interrompido, mas eu garanto que vamos recuperar nosso tempo perdido...
O menino estava mastigando com prazer, os olhos negros e grandes grudados em
Martin. Parecia estar julgando implacavelmente o homem que o havia capturado.
Martin e Kim limparam a área, sempre de olho no garoto, para que não tentasse nova
fuga, recarregaram o jipe, e Martin pos o menino no colo de Kim; ele tentou
resistir, mas ela envolveu o corpinho franzino com braços fortes, o coração
apertado por causa dele.
- Maman, maman - ele começou a chamar, desesperado. - Papa Depois, quando o jipe
começou a se afastar, o garoto se virou nos braços dela e ficou olhando para trás.
Deu um soluço sentido e ficou inerte no colo de Kim, os olhos fechados, o rosto
inexpressível.
CAPITULO VIII
CAPITULO IX
Depois de ver se Gil tinha os preparativos para o casamento sob controle, Luci
arrastou Kim para as compras.
- É tudo tão romântico, Kim - ela exclamava. - Imagine só, sair de férias e
encontrar com um homem com quem toda mulher sonha, e ele acabar se apaixonando por
você!
Martin está louco por você, qualquer um pode ver. E casar na fabulosa Fern Grotto,
todos que souberem vão morrer de inveja!
- Calma - disse Kim rindo. - Não vamos conseguir comprar nada se você continuar
assim agitada.
Kim comprou um belo vestido branco, com rendas incrustadas, a cintura bem justa e a
saia se abrindo levemente.
- Parece uma virgem preparada para o sacrifício - gracejou Luci, fazendo Kim corar.
- E ela não só é virgem, como ainda fica vermelha! -continuou a terrível Luci.
- Kim, você não pretende usar sapatos, pretende? Não deve usar, sabe muito bem!
- Pare com isto, Luci - protestou Kim. - Vou usar sapatos, sim, e não vou de véu.
- Não vai usar véu? Se arrisca a deixar Martin ver exatamente o que ele está
levando?
- Ele sabe muito bem. Vou usar flores nos cabelos.
Luci decidiu que entraria em contato com Martin para recomendar que ele usasse
calças brancas, uma camisa aberta no peito e, na cintura, uma faixa vermelha.
- Será sensacional! - ela exclamou, entusiasmada. - E vou dizer a ele para não usar
sapatos!
- Não se atreva, Lucinda Saavedra! Comporte-se. E já está na hora de voltarmos ao
hotel.
Depois de saírem para jantar com Gil, Kim pediu licença e subiu para o quarto, para
esperar o telefonema de Martin. Ele parecia não ter pressa, pois ela aguardou mais
de três horas no quarto escuro, admirando o céu estrelado. Era quase meia-noite
quando o telefone tocou. Ela correu para atender, ansiosa para escutar a voz do
noivo.
- Chérie - disse ele, com voz acariciante -, estou morto de saudades. Não vejo a
hora de abraçá-la novamente. Mas depois, nunca mais nos separaremos!
- Martin, como vai você? - ela perguntou, apreensiva.
- Muito bem, naturalmente - foi à resposta impaciente. - Como vão os nossos
preparativos? Falei com Luci e ela disse que tudo está caminhando bem e me deu
algumas instruções. Recomendou para eu me apresentar no casamento descalço.
- Não ouse - Kim disse, rindo. - Descobriu alguma coisa sobre Hoku?
- Não muito até agora, mas tenho boas pistas. Ele está aqui ao lado e vai falar com
você.
- Alô, Kim. Eu.. sou... Hoku - o garoto disse em inglês bem compassado.
- Estou tão contente em falar com você, Hoku!
- Eu... não... Comprends, Kim. Bye.
- Ele não consegue ainda conversar, mas está aprendendo depressa - disse Martin,
pegando o fone.
- Ótimo, Martin, mas onde ele aprendeu francês?
- Em seu pais, que foi protetorado da Franca.
- Por que Hoku ainda não foi se deitar? Crianças precisam dormir cedo.
- Eu sei, mas tivemos um dia cheio e só agora voltamos ao hotel. Infelizmente não
poderei ficar amanhã com ele, porque meus negócios são muito... delicados. Mas
encontrei uma malaia que fala inglês e que tomara conta dele, enquanto eu estiver
fora.
- Está interessado em que Hoku fale inglês, não está? Por que?
- Parece que ele é órfão e não têm parentes. Neste caso, com a sua aprovação, estou
pensando em adotá-lo.
- Surpresa, Kim não sabia o que dizer.
- Acha possível, Olhos de Neblina?
- Lógico. Gosto muito de crianças. Por que não concordaria?
- Está vendo por que eu decidi casar com você, Olhos de Neblina?
- Que homem complicado é você, Martin Ste. Croix.
- Outro homem qualquer não se importaria com o destino de um órfão num momento
desses, o que provava seu ótimo corarão.
Martin não poderia estar de volta antes da cerimônia, avisou, mas tudo estava
caminhando satisfatoriamente. Ele a encontraria em Kauai, a ilha Jardim do Havaí,
em tempo para a cerimônia. Gil levaria Kim e Luci para o Aeroporto de Lihue no dia
seguinte, antes do pôr-do-sol. Martin já tinha feito reservas no luxuoso Coco Palms
Resort. Kim ficaria instalada no chalé principal, que dividiria com ele, na noite
do casamento. E já estava programado um jantar de comemoração. Kim não precisava se
preocupar com nada. O próprio Gil pilotaria o avião que a levaria com Luci.
Conversaram mais algum tempo e ela foi se deitar, radiante. Ele ainda lhe deu o
número do telefone onde encontrá-lo, que Kim anotou num pedaço de papel.
Na manhã seguinte, Luci a acordou e passaram o dia ocupadas com os últimos
preparativos. Quando Gil veio buscá-las, tudo estava pronto.
Do Aeroporto de Kaanapali, seguiram viagem. Do ár, Kim viu o Beautiful Lady
ancorado em Lahaina e sentiu um aperto no corarão. Como Ricky gostaria de vir com
ela!
Ela havia telefonado para ele e explicado mais ou menos por que não estava mais no
iate, mas Ricky não tinha compreendido. Kim sentia-se culpada por tê-lo abandonado
com o tio de Gil, mas não podia mais deixar que Jack usasse a criança para dominá-
la.
O jatinho avançava pelo céu azul, e o mar lá embaixo apresentava todas as
tonalidades de verde.
- Isto é lindo, não é, Kim? - perguntou Luci.
- Sem dúvida. Não sei por que não voltei aqui desde criança. A última vez que vim
foi com meu pai. Eu devia ter uns quatro ou cinco anos.
- Lá está Kauai! - Luci disse, repentinamente.
A ilha jardim parecia um paraíso verde, incrustada no mar azul e brilhante. Kim
sentia seu coração bater com tanta intensidade, que mal conseguia respirar. Se ao
menos estivesse inteiramente segura do que ia fazer... Gil pousou o jatinho com
perícia e ela esqueceu o pânico que sentia.
O Coco Palms não é somente um hotel, pensou Kim. E algo fantástico!
Milhares de palmeiras espalhadas pelos jardins, agitavam suas folhas verdes,
douradas pelo sol do poente. O saguão do hotel era impressionante como uma
catedral.
Gigantescos lustres de cristal brilhavam com suas luzes que pareciam refletir o
arco-íris; janelas de vidro fume filtravam a luz de fora, e, por todos os lados, as
plantas tropicais davam vida e colorido ao ambiente. O aroma das flores perfumava o
lugar e tudo parecia dar-lhe das boas-vindas.
O chalé reservado para ela era espetacular, com uma enorme piscina ao ár livre,
escondida dos olhos curiosos por um muro cercado de arbustos floridos. Os moveis
eram confortáveis e sofisticados e os tapetes espessos e luxuosos. Um cenário ideal
para uma lua-de-mel!
Apesar das dúvidas sobre seus verdadeiros sentimentos pelo homem que oferecera esse
pedaço de paraíso a ela, Kim dormiu profundamente naquela noite.
O dia seguinte foi frenético, com os preparativos de última hora, mas quando Gil
veio buscá-la para levá-la ao barco que subiria o rio, ela estava pronta.
Luci ajeitou pela ultima vez a saia do belo vestido de Kim, a coroa de flores
brancas e miúdas e os colares de flores.
- Ela não e a noiva mais linda do mundo? - Luci tagarelava alegremente.
Os três seguiram. Kim sentia-se um pouco abalada, pensando na gravidade do passo
que ia dar.
- Recebi noticias de Martin - Gil lhe disse, enquanto entravam no barco. - Devemos
seguir para a gruta. Ele estará lá à espera. Um de meus primos vai pegá-lo, quando
chegar de helicóptero, e o levara de lancha.
- Tem certeza de que ele virá? - perguntou Luci.
Gil sorriu e pegou a mão de Kim.
- Nem um batalhão de fuzileiros o impediria de vir. Nunca vi um homem tão
determinado! Luci, cuidado com o buquê. Mesmo aqui, onde estas flores crescem, ele
custou uma pequena fortuna.
Luci olhou a cascata de minúsculas orquídeas cor de púrpura, com admiração.
- Não são mesmo divinas? E combinam maravilhosamente com o vestido de Kim! Oh, eu
estou tão feliz! Mal posso esperar pelo meu próprio casamento!
- Por que esperar? - Gil respondeu imediatamente. - Poderemos casar nas próximas
semanas, se você quiser.
- Sabe que não podemos, Gil. Nossos pais nunca nos perdoariam se não convidássemos
todos os nossos parentes!
- É, eu sei! Eu devia ter levado você para Las Vegas no dia em que a conheci, antes
que eles soubessem de nada - lamentou ele.
- Agora não adianta mais - Luci o consolou. E mudando de assunto. - Kim, você é uma
garota de sorte! Está feliz?
Kim não tinha certeza. Estaria feliz? Intrigada, sim. Ansiosa, também. Mas
igualmente assustada e insegura. Talvez não devesse ter sido tão impulsiva. Por que
estava casando com um homem que não tinha certeza de amar?
A resposta era fácil. Nunca havia encontrado alguém como ele antes, e ficou
fascinada com sua autoconfiança serena, seu humor, sua ternura e a intensidade de
seu amor por ela. Ela o admirava, e talvez o amasse. Pelo menos nunca sentira uma
atração tão grande por nenhum outro homem. Mas isso seria amor?
Martin deve ser muito rico, Gil e eu achamos - continuou Luci. - Gil me disse que
ele tem um avião particular e que dirige uma importante corporação européia. Ele
contou a você?
- Não, não contou! E como sabe tudo isto?
Luci deu uma risada.
- Não fique assim tão chocada, Kim. Não pus nenhum detetive atrás dele. Gil teve a
oportunidade de conversar com o amigo dele, Ted Kalama, quando estavam fazendo os
preparativos do casamento.
- Quer que eu acredite que Ted Kalama falou por acaso sobre os negócios de Martin?
- Alguém tinha que investigar - defendeu-se Gil. - Ted compreendeu.
- Eu insisti - Luci confessou. - Martin é maravilhoso, mas este casamento foi muito
de repente. Eu sei que Martin a ama, qualquer um pode ver isto. Mas não faz mal
procurar saber alguma coisa sobre o homem com quem a sua melhor amiga vai casar.
Afinal, ele é um estranho... e um estrangeiro!
- Concluo que ficaram satisfeitos.
- Nota cem, com o que Gil conseguiu apurar.
- Obrigada, amiga. Ainda vai esfolar este narizinho se insistir em metê-lo em tudo
- Kim gracejou, mas intimamente sentia-se mal por não saber nada sobre seu futuro
marido.
Repentinamente Kim sentia-se muito só. O que estava fazendo ali naquele barco,
vestida de noiva, indo ao encontro de um homem estranho para casar, sem ao menos
ter certeza que o amava? Teria perdido o controle de sua existência?
Sentia-se incapaz de pensar. Estaria nervosa por causa do casamento? Esperava que
sim, mas duvidava. Assustava-se com sua ignorância a respeito daquele homem. Por
que então ia se casar? Estava fora de si... completamente insana?
Não sabia! E ainda não sabia quando o barco atracou. Ela então se moveu, sabendo
ser o centro das atenções.
Luci, muito ativa, arrumava os leis em volta de seu pescoço; a amiga estava
encantadora em sua roupa havaiana, a beleza morena casando com o colorido alegre.
Gil usava branco, como os outros homens, parecia bonito e a vontade no meio daquela
floresta luxuriante.
Os músicos e os outros passageiros do barco formaram um alegre cortejo e Gil
consultou seu relógio.
- Martin deve estar chegando, senhoritas. O ministro que ele escolheu já está aqui,
e, portanto, acho que podemos nos dirigir para a gruta. Temos que andar um bom
pedaço.
Seguiram pelo caminho cheio de arvores. A luz do sol filtrava suavemente, tornando
o atalho um mosaico verde e dourado. Kim, esquecida de suas preocupações, olhava
fascinada a sua volta.
Enquanto seguia pelo longo caminho, chegou uma conclusão: estava se casando com
Martin Ste. Croix por livre e espontânea vontade!
Quando Kim surgiu na clareira, ele a esperava, à entrada da enome caverna. Seguindo
por outro caminho, tinha chegado antes dos outros. Martin estava magnífico,
observando os outros se aproximarem. Contra a vegetação, ele se destacava
imponente, vestido de branco. O parapeito onde ele se apoiava era todo entrelaçado
de flores, o tradicional gengibre havaiano e opuhis.
Os músicos se acomodaram num palco improvisado e começaram a tocar e cantar as
doces melodias havaianas, acompanhadas por violões e bandolins. Envolvida pela
magia da musica, Kim avançava, atraída pelo magnetismo daquele homem. Ele estendeu
a mão, a pele morena contrastando intensamente com a fazenda branca da blusa e da
calça, muito justa. A faixa vermelha cingia a cintura... e os pés estavam descalços.
Resistindo a um impulso histérico de rir, Kim sentiu o calor dos dedos dele contra
sua mão gelada. Ele a fez virar-se para o ministro e tomou-lhe o buquê, entregando-
o a Luci.
Kim não conseguiu se concentrar nas palavras que foram ditas. Escutou a voz firme e
clara de Martin, cantando em seus ouvidos, e olhou quase surpresa quando ele enfiou
a aliança de brilhantes em seu dedo. Depois Luci Ihe deu uma aliança de ouro e Kim
ouviu sua própria voz repetindo as palavras que, pacientemente, o ministro dizia a
ela. Mas seu significado não era claro. De repente, ela estava enfiando a larga
aliança de ouro no dedo de Martin.
Ao som da Marcha Nupcial Havaiana ela foi beijada, a música ecoando pela bela
gruta, suave e pura.
Martin levantou a cabeça e olhou para Kim, os olhos cinzentos brilhando de
felicidade.
- Este é o dia mais feliz da minha vida - confessou em seus ouvidos.
Deus, em sua infinita sabedoria, escondeu deles a verdadeira importância daquelas
palavras apaixonadas!
CAPITUL0 X
CAPITULO VI
Naquela noite, Kim não conseguiu comer nada. Só a muito custo Luci convenceu-a a
voltar à suíte.
- Martin vai aparecer e não conseguirá encontrá-la - disse a Kim. - Se quiser, eu
ficarei com você. Gil vai virar está ilha de ponta-cabeça. Ele encontrara seu
marido.
Kim foi com ela, o rosto desfigurado pelo sofrimento, o coração pesado. Luci deu-
lhe a caixinha de cetim branco que ela não tinha aberto e pegou a bela orquídea
branca. As duas atravessaram silenciosamente o saguão, saindo para a suave noite
tropical. Kim apertava a caixa contra o peito.
Onde estaria seu marido, tão belo, tão cheio de vida?
- Quer que eu fique aqui? - Luci perguntou, já na suíte.
- Não, é melhor não. Martin poderá não gostar de ter uma testemunha em sua noite de
núpcias.
- Isto mesmo. Promete que vai para a cama e não se preocupará?
- Vou me deitar. Estou precisando de um bom banho quente.
- Se Gil descobrir alguma coisa, ele vira avisar imediatamente. Odeio deixar você
assim, mas...
- Vá, Luci. Eu preciso de um banho e depois irei para a cama.
- Tem certeza que ficara bem?
- Lógico que sim. Martin aparecera provavelmente com uma história incrível. Agora
vá!
Quando Luci saiu, Kim notou que o quarto estava repleto de flores. Ela foi até a
banheira ao ár livre, em formato de concha, e abriu a torneira. Depois voltou ao
quarto para pegar a camisola.
Reparou então na outra orquídea branca, junto com outra caixa, semelhante à
primeira, em cima do travesseiro da imensa cama. Kim deixou cair à camisola e foi
até lá, pegando a caixa com cuidado.
Havia outro cartão que dizia: "Para o meu amor". Abriu a caixa e lá estava urn
enorme diamante, brilhando em sua perfeição.
- Martin! - ela murmurou, comovida. - É tão lindo! - Colocou o anel no dedo anular,
reconhecendo imediatamente seu imenso valor. Realmente, Martin devia ser muito rico
para poder dar presentes tão valiosos assim.
Ainda deslumbrada, ela desfez a fita que embrulhava o pacote que Martin tinha
deixado sobre seu prato, e se viu diante de um soberbo colar de pérolas brilhantes
e perfeitas, do tamanho de uma unha.
Kim caiu sentada na borda da cama, os olhos muito abertos.
Como poderia não amar um homem que lhe dava tanto?
Finalmente teve forças para se levantar e mergulhar no banho repousante, enquanto
as lágrimas escorriam pelo seu rosto infeliz.
Ainda chorando, saiu da banheira e se enrolou numa toalha felpuda, voltando para o
quarto. Repentiriamente viu a valise de Martin.
Imediatamente pegou-a e a levou para a cama, onde abriu com facilidade. Estava
cheia de roupas e coisas masculinas, sedas e lãs de cores clássicas, objetos de
toalete.
Mas não havia nada de pessoal. Nada!
Querendo poupar a camisola que havia comprado para a noite de núpcias até que
Martin pudesse apreciá-la, ela pegou uma camiseta dele e a enfiou. Depois fechou a
maleta e recolocou-a onde a tinha encontrado. Finalmente entrou na cama, pondo a
caixa com o colar embaixo do travesseiro.
O sono de Kim foi agitado. O tempo todo ela esperava Martin inutilmente.
Bem antes de o dia clarear, Kim se levantou e tomou uma ducha fria. Depois de
pedir, na copa, suco e café, ela vestiu calca comprida e uma blusa leve, em tons de
azul. Quando o garçom chegou, já estava pronta.
Pela manhã, Gil, com cara de quem não pregara o olho, chegou.
- Ele não está na ilha - informou, enquanto aceitava uma xícara de café. - Kim,
estou quase louco! Não sei mais o que fazer! Por que um homem desapareceria na
noite de seu casamento?
- Não adianta ficarmos fazendo especulações, Gil. O fato e que ele estava aqui e
sumiu. Ou saiu voluntariamente, ou foi vitima de um plano muito bem engendrado.
Acho que precisamos localizar Ted e ver se ele sabe alguma coisa. Tem algum parente
que possa nos auxiliar?
Joe Smith é o chefe de policia daqui. Na verdade, não é parente, mas é meu amigo.
Sei que ele gostará de ajudar. Vamos.
O capitão Smith foi muito gentil e tratou Kim como uma colega policial em visita.
-O único vôo ontem a noite foi de um helicóptero que saiu de Oahu um pouco antes de
escurecer. Quatro homens e o piloto viajavam, mas todos são empresários muito
populares aqui em Kauai. E o dono do helicóptero é um conhecido fazendeiro em
Honolulu. Ele estava trazendo os amigos para casa depois de uma visita. Nos
checamos todos eles e são insuspeitos. Nenhum é nativo e todos tem negócios limpos.
Uma hora depois, o fazendeiro seguiu de volta para Honolulu. Chegou no horário e
alem dele só havia o piloto a bordo.
Kim olhou para ele, os instintos policiais aguçados.
- Alguém viu quantos homens subiram aqui no helicóptero?
- Ninguém, infelizmente. E o piloto informou que havia somente uma pessoa. Ele pode
ter mentido, mas não há meio de provar.
- O senhor tem possibilidade de localizar um endereço através de um número de
telefone?
- Sim. Qual e o número e a quem pertence?
- Não sei bem de quem é o endereço. Mas meu marido telefonou de lá há três dias, e
disse que se eu quisesse falar com ele deveria ligar para este número. Deve ser o
apartamento de algum amigo dele. O garoto que ele está tomando conta também estava
lá.
- Vamos tentar. Talvez demore algum tempo, mas conseguiremos - disse o capitão. -
Voltarei logo.
- Luci sabe onde nós dois estamos? - Kim perguntou a Gil.
- Eu disse a ela. Luci ficou de interrogar novamente o pessoal do hotel. O gerente
se prontificou a ajudar no que puder.
Joe Smith voltou, com ár satisfeito.
- Os rapazes em Honolulu já estão trabalhando no número e avisarão logo que
souberem de alguma novidade. Pensou em mais alguma coisa?
- Sim - Kim respondeu -, Martin tem um iate, o Sea Witch, ancorado no porto de
Lahaina. Como sua esposa, acredito que posso autorizar uma busca para ver se
existem algumas pistas.
- Por que não pensei nisto antes! - exclamou Gil. - Pode conseguir que o pessoal de
Maui colabore, Joe?
- Não tem problema. Fale-me do iate, Sra. Ste. Croix.
Duas horas depois, os relatórios chegavam. Um deles informava que Ted Kalama tinha
alugado um apartamento mobiliado com aquele telefone. A zeladora nada sabia sobre
ele, a não ser que era uma pessoa sossegada e amável. O outro avisava que o Sea
Witch não estava mais em Lahaina! Foi então que Kim entrou em pânico.
- Preciso ir a Honolulu, Gil. Tenho que encontrar Ted. Ele é a única pessoa que
sabe alguma coisa sobre Martin.
- Você tem razão, Martin falava muito pouco sobre si mesmo. Você sabe alguma coisa
sobre ele?
O que ela sabia? Que tinha tios que moravam no sul da Franca, e que tinham um pomar
onde ele se machucou quando menino. Que ele estudou numa Universidade. Que tinha
uma mãe americana e uma avó que dizia "na batata". Que dançava bem, mergulhava e
nadava como um peixe. Que fazia windsurf com perfeição. Que sabia guiar carros e
dirigir aeroplanos e que fazia amigos com facilidade. Que falava diversas línguas,
gostava de música, de ler e de arte. E que a amava. Mais nada!
- Acho que não sei muito, Gil.
- É uma pena, porque precisamos mais informações.
Finalmente o treino profissional de Kim veio em seu socorro.
Por que ela nada sabia sobre o marido? Agora percebia que ele tinha evitado lhe
contar qualquer coisa, a não ser seus gostos mais gerais, sonegando habilmente
informações sobre sua vida pessoal. Seria deliberado?
Logo que se conheceram, ela sentiu a relutância de Martin em permitir uma real
aproximação. Será que ele precisava esconder seu passado, que tinha se apaixonado
por ela contra a sua vontade e só tinha casado porque não conseguira resistir à
paixão?
E por que ficou tão feliz ao descobrir que ela nada tinha a ver com Jack? E que nem
ao menos gostava dele? Depois disso sua atitude havia mudado e ele a pressionou
para casar, sem deixar que ela pensasse com calma se queria ou não isso. Será que
Martin Ste. Croix era um criminoso?
Este pensamento a atingiu com a força de um soco, e seu rosto se contorceu de
horror. Os dois homens olharam espantados para ela.
- Acha que Martin possa ser criminoso, Gil? - ela conseguiu perguntar.
- Nunca, Kim! Martin era honesto, posso apostar nisto. Ele desapareceu, mas garanto
que não é marginal.
- Obrigada, Gil - disse ela, com um sorriso descolorido. - Eu concordo. Mas ele me
contou tão pouco sobre sua vida, que deve ter uma razão para isto. Eu estava tão
ocupada, falando sobre mim mesma, que não dei a menor importância a isto... Mas,
por outro lado, agora tenho a impressão que ele sempre evitava me responder, quando
eu fazia perguntas.
- Se eu a conhecesse e me apaixonasse por você, Kim, na certa não quereria falar
sobre mim. Faria mil perguntas. E provavelmente foi isto o que aconteceu a Martin.
- Talvez... - concordou ela. - Capitão Smith, pode verificar o que Martin declarou
na alfândega, quando entrou em Lahaina?
Certamente. Isto nós Dará o ponto de origem e o endereço onde o iate está
registrado.
- Não é muito, mas já é alguma coisa. Partirei imediatamente para Honolulu. Preciso
encontrar Ted, e como ele não apareceu para o casamento, ainda deve estar lá com
Hoku. E Ted saberá como devo fazer para entrar em contato com os pais de Martin.
- Se precisar da ajuda da policia de Honolulu eu posso conseguir - disse Gil. -
Minha prima é casada com um sargento de lá.
- Gil, você é demais! - exclamou Kim, rindo alegre pela primeira vez em horas.
- Parece mentira, Kim, mas eu tenho mesmo estas ligações. Enviarei um bilhete a
Donna e ela lhe apresentara seu marido.
- Obrigada, Gil. E quando parte o próximo vôo para Honolulu?
O capitão Smith consultou as companhias e reservou um lugar para ela, desejando-lhe
sucesso. Kim prometeu a Gil mandar noticia.
Os dois voltaram ao hotel para buscar Luci e as bagagens. Não havia nenhuma
novidade até aquele instante. Luci quis acompanhar Kim a Honolulu, mas a moça
recusou.
O desaparecimento de Martin havia se tornado um assunto policial, e a amiga não
tinha experiência nem treino para ser uma assistente valiosa. Assim, finalmente,
Gil convenceu Luci a voltar com ele para Maui.
Kim levou a mala de Martin e uma pequena valise sua, partindo imediatamente para
Honolulu. Lá chegando, pegou o primeiro táxi disponível e deu o endereço que o
capitão Smith conseguira. Era um respeitável conjunto residencial, não longe da
praia. Kim pediu que o motorista esperasse e foi a procura da encarregada.
- Sim, eu conheço o Sr. Kalama - disse a simpática senhora. - O que posso fazer
pela senhorita?
- Preciso falar com ele.
- É namorada dele?
- Não. Sou uma amiga.
- Já faz alguns dias que não o vejo. Ele esteve aqui com um amigo, um homem
extraordinariamente bonito! - Os olhos azuis da mulher brilharam de admiração. - O
amigo tinha um garotinho com ele. Tanto o sr. Kalama como o amigo viajaram a
negócios... não sei para onde. Mas o menino ainda está aqui.
- Hoku! - Kim exclamou - Onde ele está?
- O amigo do Sr. Kalama pediu a uma conhecida minha para tomar conta do menino,
somente um dia. Já faz dois dias. Ele disse a Berenice que voltaria para buscar a
criança ontem. Mas o Sr. Kalama não voltou, provavelmente se atrasou com os
negócios, e Berenice ficou mais um dia com ele.
- Eu sou a sra. Ste. Croix - disse Kim -, e Martin, meu marido, é o amigo do Sr.
Kalama. Eu preciso falar com Ted e vim buscar Hoku.
Preferiu não explicar demais os fatos. Mas precisava entrar no apartamento de Ted.
- Sua amiga, Berenice, poderia me trazer o garoto? - Kim continuou. - Então eu
pagaria a ela o que deve receber. Meu marido e eu não conseguimos voltar antes para
buscar o menino. E não pensavamos que Ted demoraria tanto. Espero não ter
incomodado sua amiga.
- Absolutamente. Ela gosta de crianças e disse que ele é um bom menino. A senhora
nunca quis ensinar inglês a ele?
- Não. Achamos melhor que ele aprendesse antes o francês. E depois, não pensamos em
morar nos Estados Unidos a não ser recentemente.
- Ele não se parece com a senhora.
- Certamente que não! A mãe dele era malaia.
- Compreendo. Vou telefonar a Berenice para que traga o menino. Gostaria de esperar
no apartamento?
- Agradeceria muito. - Kim pegou a chave que a mulher lhe oferecia, foi até o táxi
buscar suas coisas e se apressou para entrar no apartamento de Ted. Lá dentro, pôs
as malas no chão e entrou em ação.
Quarenta e cinco minutos depois tinha procurado em cada centímetro E não tinha
encontrado nada!
As roupas e os pertences de Ted estavam todos em perfeita ordem na mesinha de
cabeceira havia três jornais já lidos, e os objetos de toalete estavam todos lá,
assim como a escova de dente. Não havia nenhum pedaço de papel nem informação
alguma. Nem comida no refrigerador.
Estava no meio do quarto, quando alguém bateu na porta. Decepcionada, ela foi
abrir. Deu de cara com Hoku, o rosto subitamente iluminado ao vê-la, com uma mulher
a seu lado.
- Alô, Kim, estou contente em ver você!
- Oh, Hoku, - Kim ficou de joelhos, aliviada e feliz, enquanto abraçava o menino. -
Eu também estou contente em ver você!
- Onde está Martin? - perguntou ele.
- Antes quero conhecer está senhora que foi tão bondosa tomando conta de você.
Depois vamos conversar. Está bem?
- Sim - ele concordou com calma. - Está, Berenice. Ela cuidar de eu. Martin foi
embora. Ela boazinha.
Kim cumprimentou a pequenina malaia e recebeu a maleta de Hoku. A mulher recusou
mais dinheiro, dizendo que já tinha sido bem paga. Agradeceu a Kim, elogiou o
menino e foi embora.
Kim sentou-se com Hoku e conversou com ele. Era incrível como o inglês dele tinha
melhorado, mas ele não tinha condições de explicar as atividades de Martin.
Finalmente ela desistiu de perguntar a ele e voltou a conversar com a senhoria. A
mulher concordou que Kim ficasse no apartamento e esperasse pelo Sr. Kalama. Como
ela era esposa do amigo dele, provavelmente o Sr. Kalama não faria objeções.
Assim, Kim e Hoku ficaram mais três atormentados dias ali, enquanto Kim seguia a
menor pista no esforço de descobrir Ted ou Martin.
Procurou Jim Apaka, casado com a prima de Gil, da polícia de Honolulu, e pediu
ajuda.
O apartamento foi vasculhado, mas nada foi encontrado. Por causa do mistério sobre
a origem de Hoku e a recomendação de Martin de se manterem discretos, Kim não falou
sobre o menino na polícia. E ninguém se interessou por aquele garoto calado.
Ela calculava que Martin tivesse passaporte francês, mas naturalmente poderia
também ser americano. Tinha nascido em Nova York, o pai francês e a mãe americana,
isso constava de sua licença de casamento. Mas não havia nenhum endereço da França.
Não havia também nenhuma corporação internacional cujo proprietarario fosse Martin
Ste. Croix. O sargento Apaka entrou em contato com a Interpol, mas preveniu Kim que
levaria semanas, talvez meses, até receberem respostas.
Gil descobriu que o Sea Witch estava sob a bandeira do Taiti, e seu dono era
Martin. Mas o iate tinha desaparecido.
Kim estava exausta e frustrada quando falou com Luci em Maui, naquela noite. Elas
conversavam diariamente e cada vez tinham menos esperanças. Luci decidiu, com Gil,
que já era tempo de eles voltarem para San Diego, e de Kim descansar. Por isso
comunicou sua partida para Honolulu, onde apanharia Kim para voltarem para casa.
- Mas não posso - Kim protestou. - Tenho que encontrar Martin.
- E o que vou fazer com Hoku?
- Leve-o com você. Não tinha dito que você e Martin iam adotá-lo?
- Mas Luci...
- Nem, mas nem meio, mas... Vamos levá-lo conosco. E quando Martin resolver voltar
para você, Hoku estará lá, não em alguma instituição. Vamos embarcar de volta
amanhã mesmo, Kim. E você irá para a minha casa, antes de Jack chegar. Não
permitirei que passe nem mais uma noite sob o mesmo teto com aquele homem! Nem
gosto de pensar no que ele fará quando souber que você está casada com Martin.
Ficara mais louco do que já é!
Kim sabia que Luci tinha razão e sabia que essa era a única solução, se voltasse
para os Estados Unidos sem Martin.
- Acho que tem razão, Luci. Não consigo mais raciocinar aqui!
- Gil providenciou passagens para nos três. Ele vai me levar está noite, e
chegaremos por volta da meia-noite. Levarei suas roupas.
- Eu esperarei por você. - Kim desligou, seu pensamento em Jack. Não tinha pensado
nele ha dias, mas o ódio virulento que ele sentia por Martin estava evidente.
Haveria entre eles algo mais do que ciúme por causa de uma mulher?
Quando ela conheceu Martin, teve a impressão de que ele era cínico e indiferente,
reagindo, às vezes, como se a odiasse e se desprezando por causa da atração que
sentia por ela. Seria imaginação sua? Tinha certeza que não! Mas no dia em que
descobriu que ela e Jack não se davam bem e que não eram pai e filha, Martin mudou
completamente! Por que havia ficado tão feliz e tão aliviado? Jack saberia alguma
coisa que impediria que ele a amasse?
Enquanto saia para almoçar com Hoku, estes pensamentos não deixavam sua cabeça.
Finalmente tomou uma decisão: perguntaria a Jack se havia alguma coisa. Entrou num
táxi e depois de fazer com que Hoku prometesse ficar calado, foi à procura do
padrasto.
Jack estava na plataforma elevada, juntamente com outros juízes de regata. Quando a
viu, livrou-se dos outros e correu em sua direção.
- Kim, minha boneca! Não me dá um beijo?
Kim evitou-o, o desprezo evidente em sua expressão.
- Não diga que ainda não perdoou a loucura de seu paizinho! Quero que me perdoe.
Afinal, pensei que aquele francês cafajeste estava se aproveitando de você. Isto eu
não podia admitir!
- Esqueça, Jack. Preciso falar com você.
- Kim, eu perdi a cabeça. Sinto muito...
- Quero falar em particular com você - ela insistiu.
- Lógico, meu bem. Por aqui. - Suas palavras refletiam a raiva que sentia e Hoku
apertou mais a mão de Kim.
- Quem é o garoto?
- Estou tomando conta dele para uma amiga minha - respondeu Kim, evasiva. - Onde
está Martin Ste. Croix?
O rosto de Jack ficou lívido.
- Ste. Croix? Por que eu saberia onde ele está?
Kim apertou os olhos cinzentos, alerta a cada mudança de expressão dele. Seu treino
na polícia era útil agora. Jack parecia culpado.
- Onde ele está, Jack? O que fez com ele?
- Que pergunta cretina! - Jack exclamou, começando a recobrar o sangue-frio. - Não
sei nem quero saber onde ele se meteu. Mas o que importa isto? O imundo bastardo só
estava atrás de uma coisa, não e? Ele abusou de você, Kim? É por isto que ele
fugiu... por que tem medo da minha vingança? Eu vou matá-lo...
- Martin é meu marido, Jack. Não seja vulgar.
Ele agora não escondia mais o profundo ódio que dominava sua alma.
- Martin não podia ter casado com você! - exclamou sombriamente.
- Por que não, Jack? Achou que podia evitar algum modo? - Onde está Martin? O que
fez a ele? - A suspeita de que Jack sabia alguma coisa transformou-se em certeza ao
observar a expressão dele.
- Pode me dizer por que? Se queria evitar o nosso casamento, chegou tarde demais!
Jack ficou de costas para ela e deu um soco formidável na mesa a sua frente.
- Vai se arrepender disto, Kim. Ele nunca mais chegara perto de você, isto eu juro!
Hoku tremia de encontro ao corpo dela, mas Kim ainda ameaçou:
- Se você tem alguma coisa a ver com o desaparecimento dele, eu é que juro que vai
se arrepender, Jack! Não descansarei até encontrá-lo e quando isto acontecer...
- Vá em frente e encontre-o se for capaz - berrou ele. - Não lhe desejo sorte
alguma.
Kim afastou-se irritada ao perceber que tinha lidado erradamente com a situação.
Agora, Jack não Ihe contaria nada sobre Martin.
- Ele homem mau - disse Hoku.
- Acho que sim - concordou Kim, ainda abalada.
- Adiantou perguntar?
- Desconfio que está policial não soube fazer seu dever, Hoku. Não interrogou o
suspeito com esperteza.
- Ele viu Martin? Sabe onde Martin foi?
- Provavelmente nunca saberemos - disse Kim desanimada, e acenou para um táxi. Hoku
sentou-se a seu lado, em silêncio.
Quando chegaram, entraram correndo na esperança de encontrarem Ted e Martin a
espera deles. Mas, como sempre, o apartamento estava vazio.
Naquela noite, Gil e Luci chegaram de Maui.
CAPITULO XII
CAPITULO XIII
CAPITULO XIV
Hoku foi mandado para a escola na semana seguinte. Luci trabalhava durante o dia.
Kim tomava café com os dois todas as manhãs, depois de seu turno, e durante algumas
horas se revirava na cama, num sono agitado.
Sonhava frequentemente com Martin. Sempre que ela queria se aproximar dele,
correndo, sem fôlego, ele sumia antes dela conseguir. Muitas vezes acordava
gritando o nome dele, implorando para que a esperasse. Acabava se levantando e
procurando fazer alguma coisa no apartamento, para se distrair.
Kim passava os longos dias de setembro na praia, encontrando a avó para compras, e
depois Ihe fazendo companhia para o almoço. Não tinha apetite e estava emagrecendo
tanto que seus colegas começaram a se preocupar.
Por volta das três da madrugada, havia sempre um deles que insistia para que ela
fosse com ele comer alguma coisa, mas Kim comia pouco, quase obrigada.
- Está apaixonada, Kim? - Dan White lhe perguntou um dia.
Kim levantou os olhos do prato, o rosto sofrido. Ainda agora não sabia responder se
tinha amado verdadeiramente o marido.
A mágoa insuportável que sentia seria prova de amor? Não sabia, e isso ainda
aumentava mais sua sensação de perda.
- Por que me pergunta, Dan?
- Por que você parece com uma adolescente terrivelmente apaixonada, tenente
Matthews.
Kim sabia que sua resistência aos encantos de vários colegas seus, fora sempre
motivo de conversa entre os membros de sua corporação.
- Eu não sei - respondeu, com franqueza.
Somente Luci e o capitão Rogers tinham alguma idéia do que estava acontecendo. O
capitão a informava diariamente sobre as investigações. Ela já havia conversado
muitas vezes com o capitão Apaka, em Honolulu. Mas até aquele momento não possuía
nenhuma pista.
- Mas você não é uma adolescente, Kim. Quem é ele? Se quiser, eu quebro a cara dele.
- Obrigada, Dan - Kim disse, sem poder deixar de rir. - Não é nada disto. Eu tenho
um problema pessoal.
- Tem certeza, mocinha? - perguntou Dan, um homem quarentão com uma família
numerosa e unida. Ele era uma das melhores pessoas que Kim já tinha conhecido,
prestativo sem ser bisbilhoteiro. - pois trate de resolver isto logo, antes que
suma de tão magra! Você mal tocou na comida!
- Estou sem fome. Acho melhor irmos agora.
- Não é da minha conta, hein? Não posso dizer que você não tenha razão de não
querer me contar. Tenho a mão pesada para aqueles que ferem os meus amigos.
- Não é nada disto, Dan. É que não tenho certeza do que sinto e prefiro não falar
sobre isto.
- Compreendo. Mas se precisar de um ombro para chorar, o meu está as ordens. De
graça...
- Obrigada, eu me lembrarei - Kim respondeu, entrando em seu carro e voltando ao
trabalho.
Kim acordou no dia vinte e quatro com o coração pesado. Escutou Luci e Hoku
conversando alegremente, mas não tinha vontade de se levantar. A noite anterior
fora mais agitada do que as sextas-feiras normais. Ali deitada, pensava que aquele
era o dia de seu vigésimo sexto aniversario, e que isto não fazia sentido para ela.
Finalmente Hoku entrou no quarto.
- Você está muito preguiçosa. Não vai se levantar o dia todo? - O inglês dele
estava cada vez melhor, e Kim sorriu. Tinha se afeiçoado muito a ele.
- Por que eu preciso me levantar? Inventaram alguma coisa para mim?
- Sim, e você também nunca dorme muito aos sábados quando não precisa trabalhar a
noite.
- É verdade, mas este e um sábado especial.
- Eu sei. E é por isto que precisa se levantar - Hoku debruçou na cama e pegou o
robe dela. - Quero que veja uma coisa.
Kim pegou o robe de veludo azul, com um suspiro exagerado.
- Não vai mesmo me deixar descansar, não é? Saia agora e deixe que eu ao menos lave
meu rosto.
- Você é bonita mesmo assim.
- Obrigada, amigo - respondeu Kim, indo lavar o rosto.
- Para sua surpresa, a avó a esperava na sala. Tinha pensado em sair à tarde com
ela, mas eram apenas onze e meia!
- Oi, vovó... e Ricky! - Beijou os dois. - Como vai o senhor, Sr. Getvai? -
Perguntou, cumprimentando o velho empregado. - Por que está concentração de tropas?
- gracejou. Luci também estava diferente nessa manhã. Havia algo no ár.
- Sabe muito bem que e seu aniversário, Kimberly - disse a avó -, e o Sr. Getvai
concordou em nos levar até Julian. Vamos fazer um belo passeio pelas montanhas, ver
as folhas do outono amarelando nas árvores, comprar um cesto de maças, e comer um
piquenique lá em cima. Não é um ótimo programa?
- Realmente! Os arredores de San Diego eram de uma beleza incomparável. Subiriam a
Sierra, admirando seus carvalhos e olmos, as encostas cobertas de verde, enquanto
as árvores já estariam com a bela tonalidade de outono.
- E uma ótima idéia - concordou Kim. - E vamos comprar também um pouco de mel.
Vamos levar estes dois?
- Não sei... - respondeu a avó. - Vamos comer frango no alto da serra. Mas
desconfio que eles gostariam mais de ficar por aqui e comerem hambúrgueres...
- Não, não! - responderam os dois em coro.
- Não o que? - perguntou Kim.
Ricky e Hoku gostavam muito um do outro, e estavam satisfeitos em passarem o dia
inteiro juntos.
- Não queremos hambúrgueres - Ricky afirmou, muito sério.
- Acho que preferimos frango - acrescentou Hoku.
Assim, o Sr. Getvai levou todos no espaçoso Cadillac da sra. Matthews. Luci não foi
porque tinha outro compromisso.
Já era noite quando voltaram a San Diego. O Sr. Getvai estacionou o carro atrás do
edifício de Luci e carregou para cima o cesto de maças. Os meninos levaram, cada
um, uma garrafa de cidra e Kim o pacote de mel.
Luci não estava em casa; o apartamento não tinha nenhuma luz acesa. Kim entregou o
mel à avó e enfiou a mão na bolsa para pegar a chave. Entrou na sala espaçosa e
acendeu a luz.
Logo um pandemônio estava formado, com pessoas surgindo de todos os lados, todos
rindo e gritando.
- Surpresa! Surpresa! Surpresa!
Mike Long agitava um sino enorme, e Ralph Marvin, com a pose de um regente de
orquestra, comandou o coro que cantou "Feliz Aniversario". A sala fora enfeitada
pelos policiais com bolas e fitas; os jarros estavam cheios de flores. Até um
requintado bufe tinha sido providenciado.
Kim ficou parada, emocionada, fazendo os olhos cinzentos, cheios de lagrimas,
parecerem mesmo "Olhos de Neblina".
- Nós não contamos a ela! - gritou Ricky. - Nós guardamos segredo! Bem que eu disse
que sabemos guardar segredo!
- E verdade - disse Luci, sorrindo. - Kim, a festa é toda sua!
A avó estava radiante com tudo e não havia razão para que ela não participasse
alegremente da reunião. Uma hora depois, ela estava sentada no chão, com um prato
no colo, e a campainha soou.
- Eu atendo - gritou Ricky, e correu para a porta, com Hoku atrás dele. - Papai! -
ele exclamou, entusiasmado. - Entre! Estamos fazendo uma festa para o aniversário
de Kim.
- Eu pensei isto mesmo - Jack disse, entrando, os olhos em Kim, a pose levemente
arrogante.
Kim não havia visto o homem desde o dia seguinte em que voltara do Havaí. Sempre
que ía a casa da avó, certificava-se antes que ele não estaria lá. Olhou para ele,
sentindo a raiva crescer dentro dela. Ficou de pé derrubando uma xícara de café no
tapete.
- Seu velho pai só queria Ihe desejar muitas felicidades neste dia, Kim. Eu lhe
trouxe um presente.
- Você não é meu pai, Jack, e eu disse muito claramente que não queria vê-lo
mais... nunca mais!
Ele sorriu para ela, o belo rosto imperturbável, expressando somente indulgência.
- Ah, Kim, sabe que eu sempre a considerei minha filha. - E virando-se para os
outros. - Perdoem a agressividade de Kim. Eu fiz uma grosseria com ela há algumas
semanas e ela ainda não me desculpou, parece. Garanto que a culpa foi toda minha. A
gente às vezes se zanga com os filhos e diz coisas que não devia dizer.
Kim sentia sua fúria aumentar.
- Saia já daqui, Jack! - Não podia haver duvida quanto a firmeza de seu pedido. -
Não quero você aqui dentro!
- Está bem, está bem - ele disse, começando a se enervar. - Eu irei... desta vez.
Mas aqui está o presente que trouxe. - E estendeu um belo pacotinho.
- Eu não quero! Saia daqui!
- Kim! - exclamou a avó, surpresa com a reação dela.
- Não faz mal, mamãe - Jack disse, procurando acalmar a senhora. - Kim tem o
direito de estar zangada. Eu a ofendi seriamente e ela não imagina como eu estou
arrependido.
- Virou-se para Kim. - Só quero que saiba que só desejo o melhor para você, minha
querida. - Ele colocou a caixinha entre os outros presentes que Kim havia ganho de
seus amigos. - Quero que fique com isto e então compreenderá o quanto eu sinto o
que aconteceu.
Deu meia-volta e saiu da sala, antes que Kim tivesse tempo de impedi-lo. Ela ainda
apanhou o presente e correu para a porta, mas já era tarde. Então aproximou-se da
avó e entregou-lhe a caixa.
- Por favor, vovó leve isto quando for para casa. Não quero nada de Jack Wells.
- Está bem, minha filha - ela respondeu, olhando atentamente para a neta. Mas não
comentou mais nada.
A festa não foi à mesma depois da invasão de Jack. As pessoas terminaram de comer e
foram saindo aos poucos, sem ao menos esperar que Kim abrisse os presentes reunidos
sobre a mesinha.
A avó também foi, levando Ricky e o sr. Getvai. Mas se esqueceu do presente de
Jack, muito perturbada com a discussão entre a neta e o padrasto para se lembrar do
pedido dela.
Só depois que todos tinham saído, Luci encontrou a caixa. Colocou-a num canto, sem
entregá-la a Kim. Ela não devia se aborrecer mais com isso. As duas terminaram de
limpar tudo a uma da madrugada.
- Vai abrir seus presentes agora? - perguntou Luci, com um bocejo.
- Vamos fazer isto amanhã de manhã. Você é uma ótima amiga, Luci, mas realmente
preferia que não tivesse preparado tudo isto para mim. Sinto que não é direito, com
Martin desaparecido, eu festejar alguma coisa. Até agora não descobriram nada!
- Mas a vida continua, Kim. E você tem muitos amigos que se preocupam com...
Neste instante a campainha soou.
- Está esperando alguém? - Luci perguntou.
- A está hora da madrugada? - Kim dirigiu-se furiosa para a porta. Se fosse Jack
Wells outra vez...
Abriu com um gesto impaciente.. . e viu-se diante do rosto belo e irônico de seu
marido.
CAPITULO XV
CAPITULO XVI
CAPITULO XVII
Kim estava jogada no chão do caminhão, duro e gelado. Tentou uma posição mais
confortável, o fedor do óleo substituindo o odor adocicado do clorofórmio. Suas
mãos estavam amarradas às costas. Seriam suas próprias algemas?
Abriu os olhos. Estava na parte de trás de um veículo que corria pela noite,
subindo por uma estrada sinuosa, passando pelas curvas fechadas sem diminuir a
velocidade.
O corpo indefeso de Kim rolava de um lado para o outro no chão sujo, e em dado
momento sentiu que seu nariz batia numa coisa que parecia uma roda. Forçando melhor
a vista, viu os contornos de uma moto, e mais outra, e mais outra. Motos. . . ? De
quem seriam? A princípio a resposta não lhe veio, a cabeça doía, parecendo que ia
estourar.
Nesse instante o caminhão entrou numa curva fechada, o motorista praguejou e meteu
o pe no freio, e Kim rolou novamente sentindo que o chão áspero arranhava seu rosto.
Finalmente o caminhão parou. Esperaram algum tempo, enquanto o motorista sumia. O
homem que viajava na parte de trás do caminhão começou a xingar e a dizer
obscenidades por causa da demora, e finalmente a porta foi aberta. Seu captor
abaixou-se e a agarrou, arrastando-a pelo chão áspero, e depois jogando-a nos
ombros. Kim foi carregada
até uma pequena cabana escondida atrás de enormes árvores, e posta de pé. Depois a
fizeram entrar.
O interior era primitivo e quase vazio. Uma lamparina de óleo, pendurada numa trave
de madeira, iluminava, com luz precária, os rostos de três homens e duas mulheres.
Era evidente que eles estavam no meio de uma festinha, pois havia latas de cerveja
espalhadas pelo chão e o lugar cheirava a um boteco de segunda.
Quando Kim e seus captores entraram, caiu um pesado silêncio na sala. Com as mãos
presas às costas, ela se esforçava para não se deixar dominar pelo medo, tentando
gravar cada um dos rostos.
Haggar estava lá, naturalmente, alto e assustador. Ele a olhava com rancor, os
dentes amarelos aparecendo no meio da barba que rodeava seus lábios.
Kim sabia que tinha muito pouca chance de escapar do que a esperava. Se
sobrevivesse, precisaria se manter equilibrada, pelo menos para identificar os
participantes do estupro que obviamente já estava planejado.
As mulheres reagiam nervosas sob seu olhar. Kim sabia que não adiantaria apelar
para elas. Encarou a companheira de Zip Haggar.
- Você não vai morrer, tira - disse Haggar, jogando a lata de cerveja que segurava
para um canto. - Mas vai aprender o que significa se meter com um "Santo" ou a
mulher dele.
Kim lutou contra o pânico, sentindo que era cada vez mais difícil aparentar calma.
- A sra. Haggar irá para a cadeia. Não pode fazer nada contra mim que modifique
isto.
Ele riu, gozando a reação inútil dela.
- Isto nós ainda veremos. Eu lhe digo uma coisa. Vamos lhe dar um pouco de ação e
depois conversaremos outra vez, está bem? Por que não vai se preparando? Deite
ai, como uma boa mulher, e nos começaremos a função.
Subitamente Kim se livrou dos dois homens que a seguravam e correu para a porta
aberta.
Mas uma bota grossa e suja se esticou e a fez tropeçar. Incapaz de usar as mãos
para se proteger da queda, Kim caiu, batendo a cabeça. O fogo rápido das armas nas
mãos de três homens, todos vestidos de negro, que pularam pela porta, não foi visto
por ela, que havia mergulhado na inconsciência.
Aninhada no ombro de um homem cujo rosto pálido testemunhava o medo que ele tinha
sentido por ela, não tomou conhecimento da viagem estrada afora. Nem acordou
completamente com a voz pausada do médico que a levava para a sala de raios X. Dali
ela foi colocada numa cama estreita e uma injeção a fez mergulhar num sono profundo.
Kim acordou só doze horas depois, para encontrar o rosto preocupado do marido, ao
lado de sua cama.
- Aí...
- É tudo o que tem a dizer? Aí... ?
- Não. Eu... o que aconteceu? - Neste instante, a memória lhe voltou. - Oh, Martin!
Aqueles homens!
- Oh Martin! Francamente, é nisto que de mulheres bonitas brincando de mocinho e
bandido. Mas você brincou pela última vez, chérie!
- Eu... eu...
- Não vamos mais falar sobre isto, Kimberly. Acabou. E agora precisa descansar,
Teve uma concussão muito seria.
Kim suspirou, querendo evitar uma discussão no momento. Sentiu então a bandagem que
envolvia sua cabeça.
- O que aconteceu? Como me encontraram? Eu estava certa que ninguém sabia que
aqueles homens tinham me seqiiestrado.
- Ted sabia. Sozinho, ele não tinha condições de impedi-los, mas ele me avisou e
não os perdeu de vista. Eu consegui reforços e subi a montanha menos de dez minutos
depois de seus amigos. Agora fique quieta.
- Mas que reforços? Como Ted sabia? E você não estava em San Francisco?
- Estava, mas voltei está tarde.
- Mas não voltou para casa.
- Não voltei. Falaremos depois sobre isto. O médico insistiu para que você
descansasse - Martin disse e foi embora.
Só dois dias depois ele voltou e, impacientemente, puxou uma cadeira para perto da
cama dela. Sentou-se e olhou-a severamente.
Kim já estava farta de ficar no hospital. As enfermeiras entravam e saiam, a comida
era péssima e não tinha recebido visitas. O quarto vivia cheio de flores e o
correio lhe trazia montanhas de cartões desejando pronto restabelecimento, mas ela
estava curiosa para saber como a tinham descoberto e salvo.
- Você estava em San Francisco - ela acusou. - Entendi bem quando me disse que
tinha voltado, mas não me avisou?
- Correto. Era necessário que não soubessem onde eu estava.
- Por que, Martin? No que você está metido? E você falou de reforços. Que história
é está?
- São os homens que me ajudaram a libertar você daqueles animais que a tinham
sequestrado. São meus homens. Trabalham para Ted.
- Mas como Ted sabia o que estava acontecendo? Ele não estava lá! Não esperei pelos
homens de minha equipe. Não havia ninguém lá.
- Ted estava, chérie. Ele a vigiava todas as noites, depois da ronda que fizemos
juntos.
- Ele estava me seguindo? Estava me espionando?
- Eu diria que ele estava mantendo você em segurança. Você recusou sair. Como minha
esposa, não podia se meter numa tarefa tão perigosa sem a necessária proteção.
- Mas como você ousou! É contra a lei interferir em assuntos policiais! Não tinha o
direito de mandar me seguir!
- Mas não e contra a lei tomar conta de sua. . . dos membros de sua própria
família. - A mudança da frase foi clara, mesmo para Kim, que ainda estava meio
zonza.
Ela olhou desconfiada para o rosto dele, impassível. Ela notara alguma emoção nas
ultimas palavras, mas não atinava porque.
- Por que não foi para casa? - insistiu.
- Não queria que soubessem que eu estava de volta a San Diego.
- Por que não, Martin? O que está acontecendo? Como Ted conseguiu me seguir todos
estes dias sem que eu percebesse?
- Minha querida, eu sou urn industrial que dirige a firma internacional de minha
família. Lidamos com formúlas e desenvolvemos produtos que valem milhões de
dólares.
Nós empregamos verdadeiras fortunas em cada pesquisa. Se uma firma rival conseguir
roubar os resultados de nosso trabalho antes dele ser patenteado, economizara
milhões de dólares. Para nossa proteção, de nossas pesquisas e de nossos produtos,
somos forçados a ter sob contrato os melhores homens de segurança do mundo. Ted
dirige estes homens. Não foi difícil para ele segui-la sem que você percebesse. Ele
foi contratado porque é mestre nisto.
- Ted viu os "Santos" me pegarem?
- Viu. Não perdeu você de vista e passou a informação para mim. Kim fechou os olhos
digerindo toda aquela informação, enquanto Martin a olhava com ternura.
- Então todo aquele equipamento que você pos lá em casa era para estar em contato
permanente com seus homens?
- Isto mesmo. Posso me comunicar com meus homens no mundo inteiro.
- Mas não precisa de um satélite para se comunicar com eficiência? - Martin riu,
enigmático, os olhos fechados. Kim sabia que ele não diria mais nada sobre sua
organização.
- O que fez com aqueles homens?
- Não fiz com eles o que tinha vontade de fazer. As leis não permitem. Entretanto,
nós agimos de maneira a convencê-los a deixarem a área sem demora.
- Mas o que foi que fizeram?
- Atiramos neles com tranquilizantes que os fizeram dormir imediatamente. Depois
pusemos todos no caminhão. É triste, mas eles são pesados e assim os deixamos cair
no chão inúmeras vezes. - Seu olhar teve agora um brilho de malícia. - Depois, as
motos foram para dentro do caminhão, e como elas são frágeis, tiveram que ser
postas lá dentro aos pedaços...
- Quer dizer que quebraram as motos? Kim riu e Martin acompanhou-a sem precisar dar
resposta.
- Quero agradecer a você, Martin. Eles iam... eles iam...
- Não pense mais nisto. Duvido que ousem atacar uma mulher indefesa outra vez.
Fomos bastante duros com eles.
- Eu estava apavorada. Sabe como foi que eu bati a cabeça?
- Um deles pos o pé na sua frente para que tropeçasse, e sem as mãos para se
defender, bateu no batente. Foi um milagre que não tivesse morrido.
- Não pode me tirar daqui? - Kim pediu, com um sorriso esperançoso.
- Vou ver, se você prometer ser obediente. Kim balançou a cabeça, concordando
Prometo ser um anjo! Mas me tire daqui!
- Espere então. Não vou demorar. Martin voltou logo, em companhia do médico que a
estava atendendo, trazendo a alta assinada, e uma maleta onde havia um vestido e
roupas de baixo, além de produtos de maquilagem. Havia ainda seu anel e a aliança
de diamantes. Kim pegou-os e colocou nos dedos, pensativa, enquanto se vestia.
Seria aquilo um sinal de que o relacionamento entre eles devia mudar? Mas a morte
voltou a seu coração quando viu os lábios de Martin se apertarem à vista dos anéis!
Abalada com está reação, Kim ficou muda e foram até a casa sem se falar.
Ted percebeu o semblante carregado de Martin e avisou que precisava buscar Hoku.
Saiu, deixando os dois sozinhos. Martin olhou furioso para ele e depois com
severidade para Kim.
Assustada, ela disse que precisava ir tomar uma ducha e correu para cima. Depois de
um longo banho, enrolou uma toalha ao redor jo corpo e outra na cabeça, como um
turbante, e voltou para o quarto para se vestir.
O ambiente estava em penumbra e a cama pronta para que ela se deitasse. Martin,
encostado a um dos móveis, os braços cruzados no peito, tinha o rosto inescrutável.
Kim parou no meio do quarto, a luz do banheiro a iluminando imprecisamente. O
coração batia descontrolado em seu peito e ela olhou para o homem moreno, tão
perto.
Sentia que podia desmaiar de tanta emoção.
- Não vou me deitar - ela tentou protestar.
- Vai-sim - ele garantiu.
- Ora, Martin, não sou uma invalida e não pode me tratar como se eu fosse uma! - ela
protestou, rebelde, enquanto tentava alcançar o interruptor ao lado da porta do
banheiro.
Ele já estava ao lado dela, antes que Kim pudesse fazer qualquer coisa.
- Já para a cama, Kimberly. O médico entregou você aos meus cuidados e eu prometi a
ele que a faria ficar deitada até amanhã de manhã.
- Não vou fazer isto! - disse ela, os belos olhos prateados brilhando
perigosamente, e tentando se libertar dele. Mas Martin foi mais rápido e segurou-a
pelos ombros, sua forca muito superior a dela. Kim então levantou o rosto para
encará-lo e seus olhares se cruzaram.
A chama daqueles olhos cinzentos e dominadores a devoraram com intensidade. Sem
reação, Kim ficou imóvel. Então Martin levantou a mão e tirou a toalha que prendia
os cabelos molhados. Com um gemido abafado, ele a abraçou, o rosto nos cabelos
perfumados e úmidos. Kim não resistiu, sentindo o corpo dele colado ao dela,
desejando-a intensamente. Cada centímetro de seu corpo parecia vibrar, com uma
violência que ela nunca desconfiara ser possível, exigindo ser saciado em seu
desejo.
A toalha que a envolvia caiu a seus pés, e Martin olhou-a com olhos apaixonados e
febris. Depois deslizou lentamente a mão pelas suas costas, até a curva suave da
cintura, e mais embaixo, pressionando seu corpo de encontro ao dele. Sentindo a
urgência do desejo dele, Kim levantou a cabeça para protestar, mas ele a silenciou
com um beijo. O tempo pareceu parar para ela, seu corpo todo latejava, a paixão
tornando-se insuportável.
Os dois corpos muito juntos, ansiavam por se transformar num único ser. O beijo foi
se tornando mais profundo, e com suavidade Martin explorava o calor úmido de sua
boca. Kim sentia-se derreter nos braços dele.
Lentamente, Martin a acariciava, a paixão mútua tornando o prazer compartilhado
ainda maior. As mãos grandes e fortes cobriram os seios firmes e palpitantes, e Kim
teve que se segurar a ele para não cair.
Martin sorriu ao sentir a entrega total que ela lhe oferecia.
- Ah, Olhos de Neblina. . . - sussurrou. - O que vou fazer com você...?
- Você não me chama assim desde Maui, Martin - ela disse, feliz.
Imediatamente ela sentiu que Martin ficava tenso.
- Eu a chamava assim em Maui? - perguntou estranhamente. -
- Oh, Kimberly!
Depois, ele tirou as mãos e se afastou dela, virando as costas e se encostando
desesperado a parede.
- O que aconteceu, Martin? -- perguntou Kim, completamente atônita e sem saber o
que pensar. - O que eu fiz de errado?
Ele endireitou-se e virou-se para ela.
- Vá para a cama, Kimberly, e não discuta comigo!
Percebendo pela expressão dele que não era hora de discutir, Kim afastou-se.
- Está bem, se você insiste. Mas vai ter que avisar o capitão Rogers para mim.
- Eu já falei com ele - Martin avisou, enfiando as mãos nos bolsos das calças. - Eu
lhe disse que você ia pedir demissão.
- Você o que?
- Ele me explicou que você deverá testemunhar amanhã, no caso das três mulheres dos
"Santos de Satã", e disse que é melhor que vá de uniforme. Eu concordei com isto.
Depois, você vai desistir da carreira de oficial de policia.
- Você concordou? Eu vou desistir?
- Não fique histérica, Kimberly. . . e pare de repetir as minhas palavras. Você
está fora do departamento. Não admito que se exponha a estes perigos nunca mais!
- Você não passa de um arrogante, egoísta, tirânico. . . Você é um ditador, Martin
Ste. Croix. Mas não vai mandar em mim, não é meu dono! Eu sou uma policial, e uma
boa policial! Eu me formei em criminologia, na faculdade. É meu trabalho e não vou
desistir!
- Encontraremos outros meios para que não perca todo este preparo. Você é minha
esposa e eu não permito está loucura!
- Você não permite! Quem você pensa que é? - Kim estava furiosa. Ela pegou os anéis
e atirou longe. - Não quero ficar casada com um homem como você. Vá procurar alguém
que possa dominar.
Passou por ele, odiando a atração perigosa que sentia por aquele homem. Como tinha
permitido que ele a tocasse tão intimamente, pensava, enquanto revirava o armário,
empurrando os cabides com irritação crescente. Demorou algum tempo para que
percebesse que havia se esquecido de acender a luz. Sem conseguir enxergar, ela
tateou para achar o interruptor e caiu exatamente nos braços de Martin. Ele puxou-a
contra seu corpo másculo, novamente atiçando o desejo latente em seu corpo sensível.
Mas ela lutou furiosamente, esmurrando o peito dele com os punhos fechados. Martin
ria, enquanto a carregava para a cama, onde a jogou, sem cerimônia, mantendo-a
prisioneira com facilidade.
- Eu dei minha palavra que você ficaria na cama, Kimberly. E pretendo manter minha
promessa.
- Tire as mãos de cima de mim. Deixe me levantar!
A resposta de Martin foi se deitar sobre ela. Prendeu as mãos dela acima da cabeça
com uma das suas, o outro braço lhe imobilizando o corpo. Depois começou a beijá-
la, devagar e insistente.
Kim tentou resistir. Sua boca e seu corpo, tensos, não responderam aos beijos.
Martin riu outra vez e com a língua tocou toda a extensão de seus lábios. A paixão
sufocada dentro dela libertou-se selvagem, enquanto o coração começava a bater com
força. Kim estava perdida.
Repentinamente Martin estava deitado a seu lado, o corpo sintonizado ao desejo de
Kim.
- Kimberly, Kimberly - murmurou ele. - Eu quero você, eu quero tanto você... Os
beijos dele, ardentes, exploravam a pele macia e Kim deixava-se acariciar,
completamente indefesa, ansiando para que ele a possuísse inteiramente. Ele beijava
com paixão seus olhos, seu rosto, seu pescoço, enquanto com a língua a excitava,
preparando-a para a posse final. Kim sentiu-se generosamente feliz ao sentir o
quanto ele também a queria.
Finalmente ela adormeceu, embalada pelo amor dado e recebido, finalmente saciada.
Acordou já quase noite, o rosto apoiado no ombro forte do marido, seu corpo esguio
grudado ao dele. Kim tentou chegar ainda mais perto e a resposta imediata dele a
fez corar de prazer. Com o dedo longo, ele obrigou-a a encará-lo.
- Eu não acredito que era isto o que o medico tinha em mente, quando me disse que
você precisava ficar na cama - Martin disse, sorrindo. - Ah, Olhos de Neblina, olhe
para mim.
Ela não podia negar isso a ele, e levantou os olhos cinzentos quase prateados,
cercados por longas pestanas escuras. Martin riu ao reconhecer a paixão estampada
neles.
Mais uma vez eles se amaram com paixão.
Quando acordou pela manhã, ela resolveu que a vida era a coisa mais maravilhosa
jamais inventada. Martin tinha se levantado e ela escutou o barulho do chuveiro,
pela porta entreaberta do banheiro. Uma rosa vermelha estava no travesseiro ao lado
dela, os anéis enfiados no caule. Kim os colocou nos dedos, feliz e realizada.
Observou Martin, quando ele saiu do banheiro, seu torso brilhante a meia-luz. Ele
foi até o armário, abriu uma gaveta, pegou uma cueca e a enfiou, assobiando
baixinho.
- O senhor parece muito alegre, Martin Ste. Croix - ela brincou. - Alguma razão
particular?
- Todas as razões do mundo! - ele respondeu, a cabeça surgindo no suéter de gola
alta que ele enfiava, enquanto chegava perto da cama. - Meu amor, você é
sensacional!
Kim ergueu o braço e tocou o rosto que se inclinava para ela.
- E você também não e nada mau. . .
- A sua não é a voz da experiência, fico muito feliz em constatar - disse ele,
sorrindo. - Ah, Kimberly, você não imagina o que significa para mim encontrar
minha.. minha. . . esposa ainda intocada, e assim apaixonada! - Ele a fez se sentar
na cama, abraçando-a com paixão. - Ah meu amor, meu amor!
- Ei, você acaba me amassando se continuar a me apertar assim!
- É verdade. - Martin a beijou ainda uma vez. - Agora se levante, sua preguiçosa.
Vai ter que ir a corte de justiça hoje.
- Tinha me esquecido! - ela exclamou, pulando da cama, e procurando se enrolar no
lençol para proteger sua nudez.
- Não, cubra seu corpo em outros lugares. Aqui em nosso quarto, quero apreciar sua
beleza - disse ele, impedindo-a.
Kim correu para o banheiro e entrou no Box, ainda envergonhada com as últimas
palavras do marido. Quando voltou para o quarto ele não estava mais lá. Vestiu-se
rapidamente, secretamente feliz por ser a última vez que usava o uniforme, e desceu
as escadas descalça, os sapatos nas mãos.
Hoku estava na porta, saindo para a escola. Ted ia levá-lo. Satisfeita por ter
Martin só para ela, Kim foi até a cozinha onde ele a recebeu com um beijo. Depois
se sentaram para o café.
As dez da manhã ela deveria estar na corte. Kim, transtornada de felicidade pela
súbita mudança de atitude de Martin, foi com ele, e deu seu testemunho em termos
concisos, os olhos fixos na mulher que assistira impassível o marido se preparar
para estuprá-la algumas noites antes. A sra. Haggar recusou-se a encará-la. O
marido dela estava sentado, assistindo ao julgamento. Ele sim, olhava com firmeza o
rosto corajoso de Kim.
Ela declarou seu nome e profissão, respondeu as perguntas feitas pelo promotor, e
depois relatou os fatos, não se confundindo com as tentativas do advogado de
defesa.
Ele não conseguiu abalá-la nem quando a acusou de interferir nos direitos
constitucionais da acusada. Finalmente a mulher do "Santo" foi considerada culpada,
recusando a apelação. O promotor veio cumprimentar Kim.
- Você foi maravilhosa. Vamos nos ver outra vez quando as outras duas forem
julgadas. Infelizmente será só daqui a duas semanas.
Kim foi ao encontro de Martin que estava na audiência, e quando se virou viu Zip
Haggar conversando com um homem loiro. Kim não conseguiu ver o rosto do homem, mas
sua figura era vagamente familiar.
Neste instante seus olhos encontraram os de Martin e ela se esqueceu de tudo mais.
Abraçados, eles foram embora.
Mais tarde fizeram um passeio pela cidade velha, onde havia as casas dos antigos
governadores espanhóis, com paredes grossas e telhas de cerâmica vermelha. Kim
amava aquela parte da cidade que tinha, alem da beleza de suas construções, os
melhores restaurantes mexicanos dos Estados Unidos.
Almoçaram carme asada, um prato tipicamente mexicano, onde a came se derretia na
boca de tão macia, feijão com queijo derretido e outras delícias típicas, mas não
prestavam atenção ao que comiam. Martin estava mais interessado em conhecer melhor
a mulher que ele amava, e Kim totalmente ocupada em ajudá-lo.
Falaram muito. Riram bastante, mas o mais importante era estarem juntos,
embevecidos pelo amor subitamente descoberto.
Finalmente a paixão ficou forte demais e eles resolveram voltar para casa. Se Ted
estava lá, eles não o viram.
Já era tarde quando desceram e encontraram Ted na cozinha, fazendo comidas muito
cheirosas. A lareira estava acesa porque a noite estava um pouco fria e Hoku tinha
se espichado diante dela, lendo.
- Estão mais descansados, agora? - perguntou Hoku, e Kim corou. Martin riu e passou
um dedo pelo belo rosto de sua mulher.
- Sim, Hoku, estamos descansados e... com fome!
- Ótimo - disse o garoto -, vamos comer logo.
Kim foi ver se podia ajudar na cozinha. Não havia nada a fazer, mas Ted pediu que
ela arrumasse a mesa.
Era a primeira vez que eles comiam na sala de jantar e a mesa estava cheia de prata
e cristais. Uma garrafa de champanhe descansava num balde de gelo, e no centro
havia um buquê de rosas vermelhas, ladeado por dois candelabros de prata.
Kim olhou aquilo tudo, maravilhada, e Martin aproximou-se rindo.
- Achei que devíamos comemorar - disse Ted atrás deles. - Parabéns aos dois.
- Oh, Ted - Kim exclamou, virando-se e abraçando o amigo -, eu adoro você! - E
plantou um beijo em seu rosto.
- Ei, vamos repetir isto - gracejou ele. - Gostei! - Ela repetiu a dose e se virou
para Martin, os olhos cinzentos brilhando como estrelas.
Ele a tomou nos braços e baixou a cabeça para ela, o rosto sério, os olhos
angustiados apesar de tudo.
- Está feliz, meu amor? Está contente por eu tê-la feito minha?
Kim estranhou uma leve nota de angustia na voz do marido, que ela não entendia.
- O que está preocupando você, Martin? - perguntou sobressaltada.
- Nada - respondeu, seco. Depois apertou-a nos braços, enterrando o rosto em seus
cabelos. - Nada está errado. Você é minha, só minha. O que poderia estar errado?
- Não estou muito certa desta historia de pertencer a alguém - Kim protestou, a voz
abafada no peito dele. - Eu pertenço a mim mesma, mas amo você.
Ele riu e beijou levemente sua orelha, continuando pela nuca. A reação de Kim foi
imediata.
- Diga o que quiser, mas você é uma parte de mim, chérie...
Depois todos se sentaram para jantar, alegremente. Estavam no meio da refeitjao
quando a terrina de molho precisou ser novamente cheia.
- Deixe que eu faço isto, Ted. Você já trabalhou demais - disse Kim. - Onde
aprendeu a cozinhar? - Ela se levantou da cadeira para ir a cozinha, mas a
campainha tocou e ela mudou de direção, para abrir a porta.
Jack Wells esperava do outro lado. Ele a olhou rapidamente e entrou antes que ela
pudesse esboçar uma reação. Tinha o rosto furioso e parecia totalmente sem controle.
- Quem é ele, Kim? Com quem resolveu viver agora? - perguntou, a voz carregada de
ódio. - Fui paciente com você, deixei que fosse viver com Luci. Mas você não ficou
satisfeita! Não, tinha que desaparecer, se juntar a algum cafajeste e convencer sua
avó a ficar de seu lado, a ponto dela nem querer conversar sobre você comigo.
Se Chris Hand não a tivesse visto na corte hoje e seguido você até aqui, eu ainda
não saberia onde estava.
Chris Hand... o tripulante do Beautiful Lady. Mas lógico! Ela não tivera tempo de
vê-lo bem, mas ele estava conversando com Haggar naquela manhã.
- Que direito tinha Chris Hand de me seguir? - ela perguntou, sua fúria se
igualando a dele. - Por favor, vá embora. Eu não quero você por aqui!
Mas ele a segurou pelos braços e a sacudiu. Kim, tomada de surpresa, deixou cair à
terrina de molho, que fez um estrondo batendo no chão do hall.
- Solte minha mulher, Wells.
O tom de Martin não admitia dúvidas. Tomado pela surpresa, imediatamente ele soltou
Kim e cambaleou até a porta, onde se apoiou.
Então ela viu Jack hesitar e depois olhar papa Martin, com a boca aberta, o queixo
caído, o rosto cor de cera, quase cinzento de susto.
- Ste. Croix! -- ele pronunciou com dificuldade, como se as palavras viessem do
fundo de sua garganta. Recuou, o olhar horrorizado dando com Ted, que com sua
altura parecia encher todo o espaço da porta. - Meu Deus! O que é isto?
Para completa surpresa de Kim, Jack deu meia-volta e saiu correndo da casa. Logo um
motor foi ligado, faróis acesos e ele partiu como um louco.
Kim virou-se para o marido, que parecia extraordinariamente calmo.
- Meu Deus do céu, que história é está? Ele saiu correndo como se estivesse
procurando salvar a própria vida!
- Quem sabe? - disse Martin, indo fechar a porta e colocando o ferrolho. - Ele
poderia estar fazendo exatamente isto, não é, Ted?
-Se é - concordou o amigo. - Exatamente isto.
Kim seguiu os dois de volta a cozinha. Ted começou a lavar os pratos. Depois pegou
um saco de lixo e foi limpar a sujeira do hall. Kim não perdeu o olhar preocupado
que ele deu a Martin.
Então virou-se para o marido, que encostado a um armário a olhava friamente.
- Não quero este homem por aqui, Kimberly - Martin disse.
- Mas pelo amor de Deus! Eu quero menos ainda que você!
- Pois eu acho isto estranho.
- Não me importa o que você acha! Por que ele ficou tão amedrontado quando o viu?
- Acha que ele ficou mesmo com medo?
- Ficou sim e você sabe disto. Não teria ficado mais assustado se vocês dois fossem
dois fantasmas! Por que?
Martin olhou para ela, aquela frieza em seus olhos que ela detestava tanto, de
volta. Ted apareceu com o saco de lixo e jogou no cesto.
Kim teve a impressão que o homem que ela amava se tornara novamente um estranho.
- Por que Jack agiu como se você e Ted fossem as últimas pessoas que ele esperava
encontrar neste mundo, Martin? Por favor, me diga!
Martin virou-se para Ted, que lentamente concordou com um movimento de cabeça.
- Sente-se, Kimberly. Ted, peça a Hoku para ir estudar em seu quarto. Depois volte
aqui.
Kim se sentou na mesa, Martin a sua frente. O rosto dele, sombrio, nada revelava. O
que estava errado? Por que ver Jack o tinha afetado tanto? Ted voltou, as mãos
cheias de pratos sujos. Colocou tudo na pia e se sentou ao lado de Kim.
- Conte a ela o que aconteceu a você na noite do.. . nosso casamento, Ted.
- Terminei meus negócios naquela noite a tempo de chegar ao hotel em Kauai e tomar
parte no jantar de casamento - começou Ted. - Quando fui buscar Hoku, fui vitima de
uma emboscada e raptado.
- Raptado?!
- Sim. Os homens que me pegaram, me puseram num helicóptero e me atiraram no meio
do oceano. Kim olhou para ele, pasmada.
- Mas por que alguém no mundo faria uma coisa assim terrível?
- Estavam planejando matar você?
- Exatamente. - Kim voltou o olhar para o marido. A expressão dele era dura e
sombria. Ela se virou imediatamente para Ted. - O que aconteceu, Ted? Como você
escapou?
- Não escapei. Eles me deixaram inconsciente, me encheram de narcóticos, me levaram
para cima e me atiraram de lá. Felizmente eu só fiquei sonado. Cai perto de um
barco de Pescadores que estavam pescando a noite. Os homens me tiraram da água. E
me levaram para o hospital.
- Mas nos procuramos em todos os hospitais em Kauai e também em outras ilhas,
quando eu estava ajudando a policia de Honolulu a procurar vocês - disse Kim. - E
você
não estava em nenhum deles!
- Eu estava no hospital em Kauai. Eu estava todo quebrado: as duas pernas um braço
e algumas costelas. Mas como tinha sofrido uma batida violenta, fiquei com amnésia
por algum tempo.
- Mas quando eles o levaram para o hospital, deveriam ter avisado a policia, se
você não sabia quem era.
- Geralmente é assim. Mas graças a Deus os Pescadores foram espertos. O helicóptero
estava voando mais baixo do que o permitido.
- Isto provocou curiosidade neles e por isso viram quando eu fui jogado. Não sabiam
que era uma pessoa, até que eu voltei à superfície e eles me pegaram. Mas
desconfiaram
que o helicóptero voava baixo para fugir ao controle do radar do aeroporto de
Lihue. Somente marginais agem assim, e eles imediatamente acharam que eram
marginais.
- Eu tenho o tipo físico de nativo e eles me trataram como um deles.
- Resolveram me proteger e disseram no hospital que eu era um membro da tripulação,
que tinha caído de um rochedo quando tentava escalá-lo. Está história não
suportaria uma investigação mais completa, mas ninguém se interessou. Os homens me
visitaram e se interessaram para que eu fosse bem tratado até que eu lhes disse
quem era.
Então entraram em contato com a corporação e Martin veio me ajudar. - Ted então
olhou estranhamente para Martin, que devolveu o olhar significativamente.
- Por que estes homens queriam se ver livres de você, Ted?
- Com a ajuda de Martin, eu tinha acabado de recuperar uma fórmula que valia
milhões e que fora roubada da corporação.
- Eles o seqtiestraram porque você tinha a fórmula?
- Mas eu não tinha - explicou ele. - Já a tinha passado para Martin. Quando não a
encontraram comigo, foram atrás de Martin.
- Eles seqiiestraram você também? - Kim perguntou ao marido. - Na noite de nosso
casamento?
- É uma longa historia, Kim... e por enquanto não quero comentar com você. - Não
havia dúvida quanto a dureza de sua voz.
- Acham que Jack tem alguma coisa a ver com os sequestros?
- Ele é um homem sagaz, Kim - respondeu Ted. - Não temos nenhuma prova que o ligue
com tudo isto, diretamente.
- E indiretamente?
- Não, realmente, mas ele ficou muito surpreso ao nos ver está noite. Você não
supõe que ele pensava que estivéssemos vivos, supõe?
- E você também deveria estar morto, Martin? - perguntou Kim, ao perceber que Ted
havia falado nós. Martin olhou-a longamente.
- Não quero mais falar sobre isto, Kimberly. Deixe como está.
- Quero que me prometa que não abrira mais aquela porta, a menos que tenha plena
certeza de quem está do outro lado.
CAPITULO XV
- Não vou prometer nada. Não sou criança para você ficar me dando ordens.
Ele a olhou de tal modo que parecia mesmo que a achava uma irresponsável.
- Não há razão para me olhar como se eu fosse uma perfeita idiota! Um simples
pedido teria a minha inteira colaboração, e eu já abri milhões de portas sem que...
- Chega Kimberly! Faça o que eu disse sem muita conversa. - Ele se levantou -e
caminhou para a porta, muito irritado.
- Ótimo! Acabou-se a lua-de-mel! - Kim disse para Ted.
- Compreende que meu patrão não pode engolir Jack, não compreende? - perguntou Ted,
com cuidado. - Martin está numa posição muito difícil. Ele quer agradá-la, mas tem
que pensar em outras pessoas, e tem outras obrigações. Não é fácil para ele!
- Que outras pessoas, Ted? Que outras obrigações? Sei tão pouco sobre Martin! Não
pode me dizer o que o está atormentando tanto? Sei que existe alguma coisa. Sinto o
tempo todo, mas ele não diz uma palavra! Como posso ajudá-lo se não sei o que há de
errado?
Ele ficou olhando para ela, como se duvidasse de sua sinceridade.
- Você realmente o ama, não ama? Mas eu não sou a pessoa que deve discutir o caso
com você, naturalmente. Terá que esperar até que o seu... seu marido esteja pronto
para lhe falar.
Kim percebeu que havia alguma coisa que Ted resolvera não revelar. O telefone então
tocou e Kim atendeu, enquanto Ted desaparecia na cozinha. Era Luci, que tinha
acabado de chegar, cheia de novidades. Meia hora depois, quando Martin voltou, Kim
ainda estava falando.
Martin pendurou o casaco no armário e veio para perto dela, os olhos embaçados,
enquanto a envolvia em seus braços. Ela se despediu de Luci rapidamente.
Ele beijou provocantemente seu pescoço, enquanto falava:
- Não vamos brigar, chérie. Vamos somente nos amar.
Imediatamente o corpo de Kim reagiu aos carinhos irresistíveis e ao calor daquele
corpo másculo, clamando pelo dela. A velha chama novamente se reavivou e ela
levantou a boca úmida e sensual para ele.
- Ah, chérie...! - ele murmurou, levantando-a nos braços e subindo as escadas
enquanto a beijava, dominado pelo desejo que aquela mulher provocava nele.
Os dois se amaram mais uma vez, envolvidos na imensidão daquela paixão, sem nunca
se saciarem um do outro. Finalmente exaustos dormiram nos braços um do outro.
Quando ela acordou pela manhã, Martin tinha saído.
Mais tarde, uma enorme cesta de rosas chegou com um cartão: "Meu amor, minha vida".
Kim levou as rosas para o quarto e espichou-se na cama, bebendo aquela beleza e
perfume, enquanto se recordava das ardentes caricias e dos beijos apaixonados da
noite anterior. Como aquele homem sabia fazê-la vibrar! Kim nunca havia imaginado
que fosse possível ser tão feliz!
Martin não apareceu o dia inteiro, mas telefonou para ela de Seattle. Avisou-a que
não tinha certeza do dia em que voltaria para casa, mas que no fim de semana
estaria de volta, sem falta. Falaram algum tempo, e ele reafirmou sua paixão e seu
desejo ainda maior por ela. Kim foi dormir com o coração transbordando de amor.
Pela manhã, seu corpo palpitava de desejo pelo homem a quem amava.
Desobrigou Ted da tarefa de levar Hoku a escola, porque queria visitar Luci. Como
estava adiantada, Hoku insistiu para ficar brincando com os amiguinhos antes de
entrar em aula.
Luci olhou para o rosto luminoso da amiga e riu. Kim corou.
- Soube que você pediu demissão da policia - comentou Luci.
- Martin não gostava de seu trabalho, não é? Como ele a convenceu?
Kim contou o que tinha acontecido com os "Santos", e a vingança da qual tinha
escapado por pouco.
- Mama mia! Não admira que ele a tenha feito desistir! Ah, Kim, estou tão feliz por
você! Ele é um bocado homem, não?
- Luci, não seja bisbilhoteira! Como foi sua viagem?
- Ótima, como já lhe disse no telefone.
Luci tinha que sair para trabalhar e Kim telefonou a avó para se encontrarem no
late Clube as quatro da tarde. Depois ligou a Ted para buscar Hoku na escola, e
passou o resto da manhã fazendo compras. As quatro estacionou o carro e foi andando
até o late Clube, com o pensamento em Martin.
Sua pele estava luminosa, os belos olhos claros e cinzentos tinham reflexos
prateados quando se aproximou da avó que a esperava no bar do clube. A senhora a
recebeu carinhosamente e as duas pediram refrescos. Kim estava tão evidentemente
apaixonada, que a avó sorriu, feliz.
Os pianos para o baile de Halloween estavam caminhando, informou ela. Mas ao
contrario do habitual, tinham pedido gravata preta para os homens.
- Já me indicaram um ótimo conjunto para dançar - ela disse a Kim. - Quero que a
festa seja um sucesso, afinal de contas, vai ser a apresentação de seu marido a
nossos amigos.
Kim imaginou o que os amigos pensariam da exigência de um traje formal para uma
festa dessas, mas isso não a interessava muito.
Quando estavam se despedindo, a avó perguntou se ela não podia arranjar algum
programa para Ricky, no domingo. Jack tinha viajado para o Havaí e o garoto sentia-
se muito só.
Kim concordou e, beijando a avó, voltou para casa.
Em cima da cama, encontrou uma caixa enorme, luxuosamente embrulhada. Abriu e
encontrou um bilhete: "Vista isto quando eu voltar, apenas para que eu tenha o
trabalho de tirá-la".
Não estava assinado, mas não havia dúvida de quem era. Kim levantou o tecido
diáfano. Era a mais bela camisola que já tinha visto, de um azul acinzentado, com
penhoar combinando, com incrustações de rendas no mesmo torn. Um verdadeiro sonho!
Só em pensar no toque das mãos de Martin em sua pele, seu corpo todo vibrava.
Mas será que ele nunca mais voltaria para casa?
Ele telefonou mais tarde, a voz sedutora revelando o quanto gostava de saber da
impaciência da esposa com sua volta.
- Está com saudades, chérie? Quer me buscar no aeroporto? Eu também não vejo a hora
de ter você novamente em meus braços.
Ele lhe deu o número do vôo e a hora aproximada da chegada.
- Só amanhã as nove da noite? Oh, Martin!
- Ah, meu amor, vamos recuperar todas estas horas perdidas.
O sábado foi um longo dia. Ela foi fazer compras e visitar Luci, mas a amiga não
estava em casa. Levou então Hoku para passear no Museu do Espaço.
Os olhos cheios de amor e desejo, ela encontrou Martin no aeroporto. Ele abraçou
sua bela mulher, vestida num terninho turquesa, e levantou-a do chão, sua boca
faminta beijando-a com paixão.
Transbordante de felicidade, ela o levou até onde estava seu carro esporte amarelo
e entregou as chaves a ele, incapaz de desviar o olhar daquele homem sedutor, que
ela amava tão completamente.
Durante a viagem até a casa, ele provocou-a com os olhos de veludo, a voz pausada e
grave. Quando chegaram, Kim sentia-se tão louca de desejo por ele, que seria capaz
de gritar. Mas a casa estava toda acesa e havia uma festa formada lá.
Luci tinha tido a idéia de promover uma festa de boas-vindas a Martin e Kim podia
tê-la esganado pela idéia desastrada.
- Eu esperarei... Chérie - ele sussurrou em seu ouvido -, e cheio de impaciência...
Logo eles estavam envolvidos na festa, Luci comandando tudo com sua usual energia.
Tanto os homens quanto as mulheres gostaram imensamente de Martin, ele representou
o papel do noivo com perfeição. Mas cada vez que o olhava de longe, Kim sentia seu
olhar sobre ela, esperando... À vontade dela era que todas aquelas pessoas
estivessem em qualquer outro lugar, menos ali!
Depois de algum tempo, Luci empurrou para um lado a pilha de presentes em cima da
mesa, atirou os sapatos longe e subiu.
- Agora todos encham seus copos - ordenou ela -, e vamos fazer alguns brindes.
Martin, pegue sua dama e venha para cá! Lá é um ótimo lugar - disse, apontando a
lareira de mármore.
Mike Long e Dan Whith estavam ocupados enchendo os copos vazios, enquanto o grupo
alegre voltava sua atenção para Luci. Martin veio ficar atrás de Kim e abraçou-a
num gesto possessivo, sua cabeça se inclinando para roçar o rosto dela.
- Vamos chérie, vamos tomar o nosso remédio...
Então forara feitos brindes a mais bela policial de San Diego, desejando-lhe toda a
felicidade do mundo, agora que não fazia mais parte da corporação, e a sorte de
Martin, por ter conseguido agarrá-la. Quem escutasse as brincadeiras perceberia
logo que Kim, durante os últimos anos, tinha sido a mulher mais desejada e cobiçada
da cidade.
- Da a impressão que você teve problemas com perseguição sexual, Kim. Conte, como e
que foi? - Martin pediu.
- Nada disto - Kim respondeu rindo. - Nunca ninguém me pediu para limpar sua arma,
ou para lavar seu carro, e muito menos... este lixo aí. - Ela riu para os homens.
Eles tinham trabalhado muito bem juntos. - Nunca houve uma equipe tão boa!
- Escutem, escutem! - gritou Luci, balançando uma garrafa de champanhe e, depois de
se servir, levantando sua taca. - Quero que saibam que Kim Matthews é a minha
melhor amiga desde o primário e ela sempre foi uma pessoa maravilhosa. E você,
Martin Ste. Croix, tome muito bem conta dela ou terá que se entender comigo!
- Você foi avisado - disse Kim, se virando para o homem atrás dela, sua taça
levantada. Ele a olhava, intrigado.
- Matthews? - disse ele. - Que historia é está de Matthews?
- Pensei que seu nome de solteira fosse Wells!
- Mas você sabe que não é. - Kim protestou, atônita. - Eu lhe disse quando voltamos
daquele nosso passeio ao Haleakala.
- Passeio ao Haleakala?
- Martin, então não se lembra? O dia em que fomos fazer aquele piquenique e
encontramos Hoku? Você se esqueceu daquele dia? Nós nadamos na piscina sob a
cascata...
- Os olhos dela brilhavam tão docemente, que Martin acabou rindo.
- Como eu poderia ter me esquecido, chérie? Lógico que me lembro. - E a beijou
docemente. - Eu a amo, minha Kimberly. E agora você é minha.
Kim concordou, os olhos baixos, se recordando da beleza daquela enseada, a frescura
da água contra seu corpo quase nú. E quando ele a carregara para fora da água,
começara a desconfiar que o amava. Agora sabia que não tinha se enganado!
- Sim, eu sou sua! - murmurou, aceitando plenamente a posse daquele homem. Ele a
abraçou, emocionado.
Como ela o amava! Tudo nela transpirava amor. Continuaram próximos um do outro o
resto da noite, aquela proximidade provocando cada vez mais o louco desejo que
sentia por ele. A idéia de que ele não se lembrava do dia em que a tinha pedido em
casamento a deixara intrigada, mas foi afastada prontamente pela emoção da presença
dele a seu lado. Só no dia seguinte ela voltaria a se lembrar deste fato
perturbador.
A festa continuava animada, naquela noite, e embora ansiasse por estar sozinha em
seu quarto com Martin, Kim estava se divertindo. Ele sempre arranjava uma maneira
de estar por perto, tocando-a, rindo de sua pronta resposta as suas provocações.
Algumas mulheres e homens expulsaram Ted da cozinha, não permitindo nem a entrada
de Luci e Kim. Depois de algum tempo, um aroma delicioso escapava de lá e Ginny
Long, a esposa de Mike, apareceu na porta.
- A comida está pronta! Cada um por si! - anunciou ela.
A refeição improvisada foi devorada em meio a risadas e conversas animadas.
Já eram onze horas quando finalmente Kim e Martin se puseram diante da mesa repleta
de presentes. Todos queriam que eles abrissem e vissem o que tinham recebido.
Nós tínhamos planejado está festa de despedida, e levamos as coisas para a casa de
Luci, mas ela insistiu em esperar que você voltasse, Martin - explicou Mike. -
Estamos sentindo a sua falta, Kim.
- Obrigada, Mike. - Ela sorriu, emocionada - Eu também sinto a falta de vocês,
mas...
- Nos sabemos. E não posso culpar Martin. Também não gostaria de ver a minha mulher
por lá.
Logo, Kim e Martin começaram a abrir os pacotes, ajudados por Hoku, que estava
adorando a festa de adultos.
Kim segurava uma bruxa de cozinha, particularmente feia, que deveria ser colocada a
um canto para evitar que a comida se queimasse, quando Hoku deu um grito tão agudo,
que ela deixou cair a boneca. Ainda teve tempo de ver Mike levantar o garoto e
apertá-lo contra o peito.
O menino soluçava violentamente, e dizia palavras incoerentes. Estava claramente
histérico. Kim olhou para Martin, que fez um sinal de cabeça, avisando-a para
subir.
Ela seguiu Martin e Hoku, com Ted em seus calcanhares.
- Ted, arranje um copo d'agua. Kim, volte lá embaixo e veja se descobre o que causou
está reação ao menino.
Kim desceu correndo as escadas, e encontrou Luci lá embaixo, claramente aborrecida.
- Sinto muito, Kim. A caixinha que Jack tinha dado a você em seu aniversário, ficou
misturada as outras quando eu pus tudo no carro para trazer para cá. E Hoku a abriu!
Jack? - Kim tinha se esquecido inteiramente daquele presente que ela havia
recusado. - Mas por que Hoku teria uma reação assim violenta ao abrir a caixinha?
- Não sei. É melhor que você venha ver.
Mike Long estava olhando a caixinha. De couro machetado, era forrada de veludo
negro por dentro. E lá estava o par de brincos mais lindos que Kim jamais havia
visto!
Eram de rubi, de um vermelho profundo, em forma de gota, cercados de diamantes
muito puros. E brilhavam como gotas de fogo. - Rubis cor de sangue! - exclamou
Luci.
- E as duas pedras são idênticas. Não são lindas?
- Lindas!
- Hoku deu um grito quando olhou para elas - disse Luci, pensativa. - Por que Kim?
- Não tenho a menor idéia. Elas devem valer um pequeno tesouro.
- Como Jack conseguiu uma coisa destas?
- Talvez um parente tenha lhe deixado como herança. - Foi o comentário caustico da
outra. - Você não acredita que ele tenha comprado isto, acredita?
- Não. Ele não teria bastante dinheiro para dar um presente destes.
- Nem mesmo a sua escolhida?
- Pare com isto, Luci! Hoku está realmente abalado. Temos que descobrir por que.
Não desvie o assunto.
- Bern, pessoal - disse Dan -, acho melhor irmos embora. A festa esteve ótima.
Todos saíram, desejando felicidades e oferecendo sua ajuda. Luci também foi, sem
querer ser metida apesar de estar curiosa.
Kim voltou ao quarto de Hoku, depois dela e Ted terem arrumado tudo. O menino
estava conversando com Martin em francês. Parou imediatamente quando Kim abriu a
porta.
Ela viu o aviso nos olhos de Martin.
- Boa noite, Hoku - disse e saiu do quarto, colocando a caixinha na mão de Martin.
Parecia que tinham se passado horas quando Martin entrou no quarto, se despiu no
escuro e se enfiou na cama. Ela se entregou em seus braços sem hesitação, seus
lábios respondendo ao beijo dele com paixão. Kim se desmanchava de amor e de desejo
cada vez que Martin a tocava, e cada dia mais ela se sentia loucamente apaixonada.
Ele lhe falava em francês, e o som das palavras a embalava e excitava... deixando-a
indefesa diante daquele homem belo e viril que a reclamava com uma intensidade que
ela nunca imaginou existir.
- Seus cabelos cheiram a flores - murmurou ele. - Você precisa deixar de me
provocar, meu amor, porque eu tenho de dormir um pouco. Amanhã Hoku e eu vamos a
Honolulu.
- Honolulu? - Kim ficou tensa, sentindo um estranho medo. - Oh! Martin, você
precisa mesmo ir? Por favor, não vá! A última vêz que você foi eu... eu...
- Prometo que não vou desaparecer outra vez. Está bem? - disse, beijando-a.
- Eu não suportaria. Você precisa mesmo ir?
- Preciso, meu amor. Estamos a ponto de resolver toda está embrulhada, tenho
certeza disto. A terrível aventura de Hoku parece ser a chave da história toda.
- Tem alguma coisa a ver com aqueles brincos, não tem, Martin? Hoku os reconheceu.
Eram da mãe dele?
- Eram sim, Kimberly. Disto não há duvida. Hoku é inteligente demais para cometer
um erro destes.
- Mas por que ele ficou tão abalado ao vê-los?
- Hoku disse que a mãe dele estava com eles a última vez que ele a viu.
- Mas como Jack poderia ter conseguido os brincos? Oh Martin, o que está
acontecendo? O que Jack andou fazendo?
- Falaremos sobre isto quando eu voltar.
- Ele deve saber alguma coisa sobre os pais de Hoku...
- É justamente isto o que quero descobrir, chérie. Agora vamos deixar de lado estes
pensamentos tristes e nos preocuparmos com as coisas que fazem a minha miserável
existência mais bonita...
Ele começou a acariciar aquele belo corpo, provocando-a, excitando-a. Ela
protestou, rindo.
- Está tentando me distrair, Martin Ste. Croix. Você é terrível!
- Naturalmente, Kimberly Matthews - respondeu ele, beijando a ponta de seu nariz. -
Kimberly Matthews. Belo nome.
- Pare com isto, Martin. Você é incrível quando não quer contar alguma coisa. E
para seu governo, o meu nome e Kimberly Ste. Croix!
- Certamente. Pode acreditar em mim, chérie, espero esclarecer muitas coisas nesta
viagem. E espero também saber se Hoku tem parentes vivos ou se vamos afinal adotá-
lo.
- Adotá-lo? Desde o nosso casamento você não tinha mais falado sobre isto, só
quando me telefonou. Pensei que tinha mudado de idéia.
Ele a olhou de um modo estranho.
- Lógico que não! Ele foi a causa de nossa união. E acho que nós da sorte.
- Eu adoraria, Martin. Acha mesmo que poderá descobrir alguma coisa se for a
Honolulu?
- Espero que sim. Agora tenho uma outra idéia do que aconteceu ele, mas preciso
confirmar em Honolulu.
- Jack está envolvido nesta história, não está, Martin? - perguntou ela, se
chegando mais a ele. - Está?
- Não tenho certeza ainda, chérie. Não podemos conversar quando eu voltar? Quero
esclarecer um mistério cuja solução e vital para mim. Terá que confiar em mim.
- E não pode me contar mais nada?
- Ainda não, meu amor. Quer me fazer um favor de ir dormir com Luci? Ted terá que
vir comigo e não gostaria que ficasse sozinha nesta casa.
- Tem medo que um "Santo" venha me agarrar?
- Não me fale naqueles canalhas - exclamou ele, abracando-a com força -, ou não
terei coragem de deixá-la. Fique com Luci, está bem?
- Você estará de volta para a festa de vovó? Será na segunda a noite, não esqueceu?
- Tenho algumas coisas para investigar por lá. Na segunda irei ao banco logo que
ele abra, e depois tomarei o avião de volta. Deveremos chegar no começo da noite.
Pela manhã, eles tomaram apressadamente o café. Ted parecia preocupado e Hoku
estava triste e calado.
Kim tomou Hoku nos braços, a piedade e o amor vibrando dentro dela. Ele não tinha
comido nada, seu copo de leite ficara intacto. Conseguiu que Hoku experimentasse
uma torrada e alguns pedaços de laranja. Foi então arrumar sua maleta para passar a
noite em casa de Luci. Martin seguiu-a até o quarto, com a caixinha dos brincos na
mão.
- Pode guardar isto com você, Kimberly? Não acho bom deixar aqui na casa, e não
podemos guardar no cofre do banco no domingo.
- Eu os guardarei. São mesmo valiosos demais para ficarem em qualquer lugar por
aqui.
- Já vamos então. Telefonou para Luci?
- Telefonei e ouvi uma porção de desaforos... Ela perguntou desde quando eu preciso
pedir para ficar na casa dela.
- Espero resolver esta história de vez, agora - disse ele. - Depois poderemos morar
em nossas casas, minha mulherzinha.
- Nos temos casas?
- Certamente, meu amor. Uma no sul da França, outra em Zurich, outra em Paris, um
apartamento em Nova York. E este também, se você quiser. - Ele sorria, mas havia
uma sombra em seus olhos que a esposa não viu. - Vamos agora.
-Posso ir em meu carro para a casa de Luci.
- E no caminho, chérie, eu a levo. Quero que fique com Luci o tempo todo em que eu
estiver fora. Assim me sentirei mais tranquilo. - Não havia razão para que ela
negasse o seu pedido. Se precisasse de carro, poderia pedir o de Luci emprestado.
Ele a beijou apaixonado, quando a deixou na porta do apartamento de Luci. Kim
sentiu o medo apertar seu coração.
- Volte logo para mim, meu amor. Tome cuidado.
Ele então partiu, o som do motor do carro sumindo na distância .
CAPÍTULO XIX
Durante todo o dia, Kim foi perseguida por urn sentimento de premonição que a
deixou inquieta e infeliz. A tarde vestiu um short, uma camiseta e dirigiu-se para
a porta.
- Onde pensa que vai? - perguntou Luci, que estava lendo no sofá.
- Quero dar um passeio pela praia. Preciso pensar um pouco.
- Espere um instante que eu vou com você - ofereceu a amiga, jogando o livro para o
lado, e ficando de pé.
- Quero ficar um pouco sozinha. Há alguma coisa que está me incomodando e não
consigo descobrir o que é.
- Acontece que eu prometi a Martin não perder você de vista.
- Prometeu? - perguntou Kim, surpresa. - Por que? O que ele pensa que pode
acontecer comigo?
- Não sei bem, mas ele parecia muito preocupado quando ligou para mim.. . - Luci
calou-se e Kim olhou desconfiada para a amiga.
Martin estava preocupado em deixá-la por alguma razão, isso ela sabia. Mas o que
não sabia e que ele tinha telefonado a Luci e conversado sobre isso.
- Quando você falou com ele?
-Está manhã. Logo depois de você ter telefonado.
- Pois eu realmente acho que não precisaria ter vindo. Mas a verdade que ele está
muito preocupado, embora eu não saiba por que. Prometo não falar com desconhecidos,
está bem?
Luci não gostou, mas Kim saiu assim mesmo. Ela achava-se perfeitamente segura
andando pela imensa praia, que ia até Lá Jolla. Embora não fosse época de
temporada, havia muita gente, a maioria moradores das redondezas. Havia também
velhos passeando, crianças nas areias e os sempre presentes surfistas.
Mesmo com tudo isso Kim conseguiu o isolamento que procurava caminhando em
silêncio, entregue a seus pensamentos, o som das ondas abafando todos os outros
sons.
Caminhou quilômetros ao longo da praia, bela como sempre, as pernas ainda
conservando o bronzeado que adquirira no Havaí.
Pensou em tudo o que tinha lhe acontecido desde quando conheceu Martin. Se a
principio ficou indecisa, relutando em retribuir o amor que ele pedia dela, tinha
vencido sua relutância com muita facilidade.
Agora sabia que o amava! Era mais do que paixão, mais do que desejo. Seu amor por
ele era parte integral de seu ser, parte de seu corpo, de sua mente, de sua alma.
Para ela, a vida só fazia sentido com Martin.
Sempre havia procurado um homem que a completasse, mas de todos os que conheceu,
nenhum conseguiu fasciná-la. Nunca tinha tido paixonites de adolescente, nem tinha
se abalado com ídolos de televisão ou cinema.
Sempre soube que em algum lugar do mundo, havia o homem para ela. Sempre teve
certeza de que afinal o encontraria.
Mas o que a surpreendia naquela tarde em que passeava na praia, é que não o havia
reconhecido imediatamente. Realmente, depois que ele voltou, e que ela o viu diante
da porta aberta da casa de Luci, não tinha demorado muito a perceber que o amava.
Sentiu quase imediatamente que o amava perdidamente. Mas por que não teve a mesma
sensação em Maui?
Tinha se sentido atraída por ele, tinha apreciado seu bom humor e seu charme. Mas
sua declaração que se casaria com ele, quando Jack o expulsou do iate em Lahaina, a
surpreendeu tanto quanto a Martin. Não tinha absoluta certeza se era isso mesmo que
queria. Foi somente a agressão de seu padrasto que precipitou aquela decisão.
Os dias seguintes haviam sido frenéticos. Nem tinha tido tempo de pensar quais eram
seus verdadeiros sentimentos antes de encontrá-lo em Kauai, para se casarem.
E depois, os terríveis acontecimentos a deixaram completamente envolvida e
preocupada para pensar em ter dúvidas. A reaparição dele acabou com todas as
inseguranças e agora se sentia ligada a Martin com tal intensidade, que só a morte
poderia separá-los. Sabia que estava definitivamente apaixonada.
Mas havia algo em tudo aquilo que a incomodava. Alguma coisa estava errada! Tinha
certeza que Martin escondia dela informações essenciais. Disso, tinha certeza.
Durante o longo passeio, ela concentrou sua considerável inteligência tentando
reunir todas as impressões que conseguiu, as poucas informações que teve e que
poderiam ajudá-la a chegar ao âmago de sua inquietação e mal-estar.
Mas foi inútil. Ela não sabia o que estava errado.
Voltou à casa de Luci, descalça, mal percebendo a maré que subia e que cobria seus
pés e tornozelos, a água fria e límpida.
O sol já tinha sumido no horizonte, colorindo de rosa e dourado o céu, emocionando
Kim com a beleza e majestade do espetáculo.
Abriu a porta exatamente no instante em que o telefone tocou. Era Martin. Falou com
ele mais de meia hora, vibrando com o som de sua voz grave e carinhosa, que lhe
chegava através de milhas e milhas de oceano.
Tudo agora parecia estar sob controle. Ela não precisava se preocupar e deveria
esperar por ele. Estaria de volta a tempo de participar da festa dada em honra
deles.
Já tinha providenciado alguém para tomar conta de Hoku, durante a noite. O sr.
Getvai os esperaria no aeroporto e levaria o menino para a casa da avó de Kim, onde
uma pessoa olharia pelos dois meninos. Martin parecia ansioso em comparecer a
festa. Ele fez comentários íntimos, depois, o que muito divertiu Kim.
- E também convenci Gil a voltar comigo - disse ele, um pouco antes de desligar. -
Ele quer fazer uma surpresa a Luci, portanto, guarde segredo, chérie.
-Pode ficar descansado.
- Não vejo a hora de voltar às delícias da vida de casado - gracejou ele. - Acho
que depois disto, nunca mais vou me separar de você, sei que não vou conseguir.
Depois desligou, deixando-a com estrelas brilhando nos olhos claros e expressivos.
Mas durante a noite, seu sono foi agitado. Alguma coisa em seu subconsciente a
atormentava, e não conseguia descobrir o que era.
Quando o dia amanheceu, ela não estava descansada. A noite, não conseguia mais
aguentar a espera. Apesar dos protestos de Luci, decidiu voltar para casa.
- Martin virá diretamente para cá, do aeroporto - ela argumentou com lógica
irrefutável. - E daqui você irá com ele para nossa casa. Mas eu vou antes, Luci.
Martin só podia estar brincando quando lhe pediu para tomar conta de mim. Eu fui
treinada para tomar conta de mim e de outros. Até logo, e obrigada pelo carro. -
Tirou as chaves do carro das mãos relutantes da amiga e saiu sem olhar para trás.
- Por favor, tome cuidado! - gritou Luci, enquanto a amiga descia as escadas.
Depois, preocupada, ficou sentada, no mesmo lugar.
Kim guiou para a casa que começava a considerar seu lar. Dirigiu o carro para a
entrada lateral e olhou-a, pensativa. Martin tinha dito que se ela quisesse ele a
compraria para ela. Seria mesmo tão rico que nem pensaria no preço, se uma coisa
lhe agradasse?
Não era justo que ela conhecesse tão pouco sobre o próprio marido! Não queria
continuar casada com um estranho, e isso e o que ele era, na verdade. Iria exigir
dele algumas respostas, naquela noite mesmo!
Tirou a maleta do carro e trancou-o. Quando subia as escadas que levavam a porta de
entrada, um grupo de anoezinhos a cercaram.
- A bolsa ou a vida, dona - os garotinhos mascarados gritavam em coro. - A bolsa ou
a vida!
Kim fingiu medo, e as crianças fantasiadas de bruxas, segundo o costume do
Halloween, riam e gritavam a sua volta.
- Esperem - pediu ela, fingindo um terror exagerado, tirando da bolsa alguns
trocados. As crianças saíram correndo alegremente, enquanto um homem que estava
discretamente tomando conta deles, os guiou para a próxima porta. Quando ela era
criança não havia necessidade que seus pais os protegessem, mas agora os tempos
eram mais perigosos.
Abalada com o pensamento, Kim pos a mala no chão e procurou a chave da porta.
Depois entrou na casa escura e tentou acender o interruptor. Mas uma mão se pôs
sobre a dela, impedindo o move-mento.
Kim sentiu seu corpo inteiro gelar, o terror tomando conta dela. Abriu a boca para
gritar, mas uma outra mão grosseira abafou o grito. Foi puxada para trás, se
desequilibrando, e uma voz falou em seu ouvido:
- Não faça barulho!
Deitaram-na no assoalho frio, do hall, o rosto para o chão e colocaram uma mordaça
em sua boca. Alguém acendeu uma lanterna em seu rosto.
- Vamos levá-la para cima antes que estes malditos garotos toquem a campainha -
disse o que segurava a lanterna. O homem a carregou com facilidade e depois jogou-a
sobre sua própria cama. A mordaça estava começando a ferir sua boca e a machucar os
dentes.
- Acenda a luz - um deles falou baixinho, e a luz crua a cegou, momentaneamente.
Ela virou a cabeça e ficou imóvel.
O quarto estava numa bagunça incrível! Todas as gavetas e armários tinham sido
remexidos, o que havia dentro fora rasgado em tiras. As garrafas de perfume
esvaziadas, os potes de creme jogados no luxuoso banheiro, as malas dela e de
Martin todas cortadas, até o belo vaso de cristal com rosas vermelhas estava em
cacos. As duas poltronas tinham sido abertas a canivete e o estofamento revistado.
Nada estava intacto.
As cortinas estavam bem fechadas. Mas quando ela chegou, não havia luz lá em cima.
Portanto, eles já a esperavam!
Martin estaria temendo uma coisa dessas? Fora por isso que insistiu tanto para que
ela dormisse na casa de Luci? E lógico! Kim se censurou, então, por não ter
obedecido o marido. Mas agora era tarde demais para pensar nisso, o que ela poderia
fazer?
Rapidamente, ficou de pé e tentou fugir, mas um dos homens correu atrás dela. Ele
estava todo de negro, com uma meia enfiada no rosto, deformando suas feições.
- Deixe-a - ordenou seu companheiro, a voz também distorcida pela meia que usava.
Todos se vestiam da mesma maneira, quase como se estivessem de uniforme. - Procure
na bolsa.
Kim se lembrou, então, de sua bolsa de couro preto. Um dos homens jogou o que tinha
dentro em cima da cama, enquanto o que dava ordens não tirava os olhos de Kim.
O outro remexeu tudo, revistando sua carteira, e depois rasgou o forro tanto da
maleta quanto da bolsa. Quebrou o espelho do compacto, espremeu todo o rimel,
depois o tubo de pomada contra o solo.
- Nada aqui! - declarou.
- Ela foi passar a noite fora. Veja se não está na mala, lá embaixo. - Ele ainda
não tirara os olhos de Kim, e ela os via brilhar através da máscara de meia. Ficou
imóvel, sem poder fazer nada para se livrar dos assaltantes.
De repente, um grito de vitória veio lá de baixo. No mesmo instante, Kim soube o
que eles estavam procurando. Os brincos de rubi! Os mesmos brincos que tinham
causado tanta dor a Hoku. E agora, Porque tinha teimado em ignorar as recomendações
de Martin, eles o roubariam. Que tola havia sido!
Mais uma vez tentou fugir, mas o homem a derrubou e se sentou em suas costas. A
falta de oxigênio quase fazia com que perdesse a consciência, pois o peso em cima
dela era muito grande, mas repentinamente ele se levantou.
- Não podemos deixar que morra sufocada, dona - um deles disse, com bom humor,
enquanto apagava a luz do quarto. Depois eles se foram.
Foi só depois de alguns instantes que Kim concluiu que eles haviam conseguido o que
queriam. Deitada de bruços, as mãos atadas às costas, os tornozelos presos a uma
cômoda, ela usou toda sua energia para conseguir se libertar.
Depois de alguns minutos, ouviu a porta lá embaixo se abrindo. Sentiu um suor
gelado escorrer pelo corpo. O que eles queriam agora? Mas o alivio chegou
imediatamente quando as luzes se acenderam e ela escutou a voz irritada do marido.
- Kimberly? Você está ai? Por que as luzes estão apagadas?
- Aqui em cima, Martin - gritou ela. - Socorro!
Ele subiu correndo as escadas, o rosto furioso. Começou a xingar em francês,
enquanto procurava libertá-la.
Os pulsos presos firmemente tinham feito a circulação parar e foi doloroso o
retorno. Martin também cuidou dos tornozelos, enquanto Kim tentava mexer os braços.
O esforço a fez dar um grito de dor e ela deixou a cabeça cair no tapete imundo.
Martin levantou-a do chão, sem um carinho especial, e Kim abafou uma exclamação ao
ver o rosto zangado do marido.
- Sua boba! - ele exclamou, os dentes cerrados. - Há quanto tempo eles safram?
- Cinco minutos. . . talvez menos.
- Eram homens de Wells e estavam atrás dos brincos.
- Sim. . . estavam mesmo. Não sei se eram homens de Jack!
- Você não sabe nada, ma petite! Agora vá se arrumar. Tem quinze minutos.
A festa da avó! Mas como ela poderia ir? Kim esfregava os braços e olhava o quarto
em total pandemônio, sem saber o que fazer.
O francês de Martin podia ser ouvido no microfone, enquanto se comunicava com seus
homens. Ficou escutando um instante. A voz de Ted respondeu e tiveram uma rápida
conversa. Sabia que discutiam algo urgente.
O vestido que Kim havia comprado para a festa era agora um monte de tiras. Estava
impossível de ser usado. Por sorte os ladrões não tinham descoberto o poderoso
rádio transmissor. Martin achava que eram homens de Jack. Por que? E onde estavam?
Jack comandava a tripulação do barco, mas certamente não mandaria ninguém roubar
uma coisa que ele mesmo deu a ela.
Acabou encontrando uma saia de crepe negro, antiga mas muito elegante, e uma blusa
de mousseline toda entremeada de rendas. Não era o que a avó esperaria que usasse
naquela festa, mas servia. Achou uma sandália de camurça preta, catou alguma
pintura espalhada pelo banheiro e arrumou-se como pode, depois de um banho
reconfortante no banheiro de Hoku, onde os homens não tinham entrado.
Quando acabou de se arrumar Martin entrou e ela quase perdeu a respiração, ele
estava mesmo impressionantemente belo!
Nos últimos dez minutos, tinha conseguido vestir um smoking, elegantemente talhado,
e uma camisa engomada. Os sapatos de verniz brilhavam. Martin Ste. Croix era
realmente a imagem do homem com quem toda a mulher sonha!
Ele ainda estava zangado, mas agora tinha conseguido se controlar.
- Use isto, Kimberly! - disse friamente, e depois virou as costas para ela. - Você
só tem mais cinco minutos.
Kim abriu a caixa e seu coração deu um salto ao ver o vestido que estava dentro, de
um veludo vermelho, elegantíssimo em sua simplicidade. Será que serviria nela?
Rapidamente experimentou, os dedos trêmulos quando puxou o zíper. Entrava
perfeitamente em seu corpo! O corte no busto acentuava os seios cheios e os quadris
sensuais.
Os sapatos pretos de veludo, também cabiam como uma luva.
- Venha - disse Martin, aparecendo repentinamente. Ele ainda estava furioso.
Enquanto descia as escadas atrás dele, Kim ficou aliviada ao ver que os ladrões não
tinham tocado em nada lá embaixo.
Provavelmente pensaram que o lugar mais certo para se guardar uma jóia era mesmo o
quarto.
Martin não lhe deu chance de contar o que tinha acontecido. Atravessou a sala e
agarrou um casaco de peles jogado numa cadeira.
- Vista - disse, sem se importar com o olhar de surpresa da esposa.
- Quer que eu vista isto? - ela perguntou, olhando o casaco de"marta" com olhos
arregalados.
- Sim, e não tenho tempo para discutir. Depressa, Kimberly.
Kim virou-se de costas para ele e meteu os braços no casaco forrado de cetim.
Depois, sem uma palavra, ele abriu a porta. Kim seguiu-o em silêncio.
- Você guia - Martin disse, abrindo a porta de seu carro.
Mais uma vez não havia condições de discutir. Kim a principio ficou atrapalhada com
o controle do carro, novo para ela. Martin não tomou conhecimento de sua hesitação
e ativou um microfone adaptado no painel. Logo estava conversando com Ted em
francês.
Kim conseguiu guiar com certa habilidade e enquanto atravessavam a ponte sobre a
bela baia de San Diego, olhou Martin de relance. Seu rosto estava rígido e com uma
expressão cruel.
- O que está acontecendo, Martin?
- Não fale comigo, Kimberly. Estou me controlando ao máximo para não dizer a você
tudo o que penso de sua irresponsabilidade.
- Muito obrigada - ela respondeu, altiva. Afinal de contas, o que teria feito para
deixá-lo assim tão furioso? - Imagino que esteja zangado porque eu voltei para casa
em vez de esperá-lo na casa de Luci.
- Não quero conversar sobre isto. Cale a boca, Kimberly. Já tenho preocupações
demais agora, para discutir com você. Mais tarde nos conversaremos.
Kim calou-se, completamente atônita. Não gostava que mandassem nela. Quando
chegaram ao Hotel del Corona, onde a recepção aconteceria, ela estava de fato
furiosa!
Subiu os degraus que Ievavam ao saguão, sem tomar conhecimento de seu acompanhante.
Ele então segurou rudemente em seu cotovelo e a fez parar.
Kimberly, acho que sua avó não ficara nada alegre se você estiver com está cara na
noite em que ela dá uma recepção para anunciar seu casamento. - Abraçou-a,
encostando seu corpo másculo ao dela. - E além disto, você nem me deu um beijo de
boas-vindas. . .
- Precisa ter mesmo nervos. . . - Kim não conseguiu terminar a frase. Ele beijou-a
com tal paixão, que a deixou completamente dominada.
- Assim é melhor - murmurou Martin, cinicamente. - Vamos procurar vovó, está bem. .
. ?
Ela não teve outra escolha. Surpreendentemente dócil seguiu-o, os olhos brilhando
de desejo, que ele tão bem sabia provocar nela. Martin escoltou-a para o imenso
salão de baile que a avó tinha escolhido para o grande acontecimento.
Ted Kalama, também espetacular em roupa de gala, estava ao lado do vestiário.
Enquanto ela tirava o casaco, ele falou em voz baixa com seu marido, em francês.
Finalmente Kim entrou com Martin de um lado e Ted do outro. A avó estava na larga
entrada do salão de baile, vestida de longo, malva, os braços enfeitados de
braceletes de brilhantes. Parecia radiante!
A seu lado estava Jack Wells, como anfitrião, sua bela cabeça loira sobressaindo
entre as demais.
Quando Kim o viu, estremeceu, seu primeiro impulso foi de evitá-lo, mas Martin
apertou-lhe o brago e fez com que continuasse, seus olhos cinzentos, frios e duros.
- Ele está aqui porque eu mesmo pedi a sua avó. Controle-se, Kimberly, já fez
bastante hoje para arruinar os meus planos. Porte-se como se nada tivesse
acontecido - murmurou no ouvido dela. Ela então percebeu que Martin usava aquela
festa para seus propósitos.
Este pensamento acompanhou-a durante toda à noite.
CAPITULO XX
CAPITULO XXI
A festa terminou de madrugada, mas nem Jack nem Ted voltaram ao salão. Kim, cercada
pelos amigos, não teve tempo de pensar na ausência dos dois. Quando o ultimo
convidado saiu, ela estava exausta. A avó há muito tinha voltado para casa, levada
pelo sr. Getvai, a alegria e o orgulho pelo novo neto evidente em seu rosto.
Martin, agora calmo, foi o anfitrião perfeito.
Kim sabia que todos estavam fascinados por ele, e foi sentindo o coração leve, que
ela novamente vestiu seu casaco de "marta", enquanto o marido lhe beijava
suavemente
a nuca. Imediatamente ela esqueceu o cansaço, e Martin sorriu ao perceber a que
ponto ele a perturbava.
- Ah, Olhos de Neblina, como posso resistir quando me olha deste jeito? - murmurou
ele, mas uma expressão de angústia passou pelos seus olhos, o que surpreendeu Kim.
- O que há, Martin? Eu fiz novamente alguma coisa errada?
- Não, meu amor - ele disse, terno. - Você não fez nada. Mas precisamos ter uma
conversa séria. Vamos agora?
- Onde está Ted? Nem ele nem Jack voltaram à festa.
- Jack foi entregue aos cuidados da Policia. No momento está sendo interrogado pela
Policia Federal e as duas policias estão brigando pela honra de enjaulá-lo nos
próximos anos. Ted se encontra a caminho do sul da Ásia.
- Jack está preso?
- Exatamente, meu amor. O capitão Rogers está a nossa espera, e vamos agora falar
com ele.
- Ted foi procurar os pais de Hoku?
- Foi procurar outros parentes. Os pais certamente estão mortos. Eles faziam parte
de uma família real. Tiveram que abandonar seu país de origem com homens
contratados para ajudá-los a fugir e levá-los para os Estados Unidos ou Havaí. Mas
o iate nunca chegou. Deve ter sido afundado perto da costa havaiana.
- Com os pais de Hoku a bordo?
- É o que achamos, mas nunca teremos certeza.
- Mas por que a tripulação iria afundar o barco? E como chegaram a terra?
- Infelizmente, a família real estava no mesmo barco dos homens que roubaram a
nossa fórmula. Este bando costuma roubar iates em todo o mundo para usá-los no
transporte de contrabando. Se o barco em que eles se encontram se torna suspeito,
eles simplesmente o explodem ou afundam, depois de remover o que interessa para
outro. O príncipe teve o azar de escolher um destes barcos para sua fuga.
- Mas por que foi necessário matá-los? Certamente concordariam em trocar de barco.
- Só podemos especular, mas desconfiamos que o príncipe levava muitos bens para
poder viver confortavelmente em outro país. Aparentemente os bandidos descobriram e
roubaram dele.
- Menos as jóias que Hoku carregava com ele.
- Sim, estas eles não encontraram. Mas encontraram os brincos.
- E Jack deu para mim!
- Foi um grave erro dele. Suponho que ele não conseguiu resistir à idéia de dar a
você algo tão valioso. Nunca imaginou que Hoku tivesse sobrevivido e guardasse o
colar combinando.
- Então, está foi a ligação! - exclamou Kim, tocando no colar. Oh Martin, é tão
difícil acreditar! Conheci Jack a vida toda!
- E achava que ele era honesto. Seu padrasto ainda estaria solto se não fosse por
Hoku. A identificação que o garoto fez dos homens da tripulação foi muito
convincente.
O capitão Apaka os agarrou e os pôs em fila. Hoku reconheceu todos eles. Não há
mais dúvidas.
- E Jack só poderia ter os brincos se fizesse parte da quadrilha.
- Não seria a única maneira, chérie. Mas assim foi mais fácil.
- Jack era um dos membros mais importantes do bando, e as jóias o ligam com o grupo
e com os assassinatos.
- E o que acontecera a Hoku?
- Se for possível, nós o adotaremos. Mas de qualquer modo sempre olharemos por ele.
Kim estava emocionada com o bom coração do marido. Tinha se casado com um homem
maravilhoso! Ela levantou os olhos para ele, e a olhava com paixão. Repentinamente
um ruído os trouxe de volta a terra. Clement Rogers os olhava, afundado numa das
poltronas do saguão.
- Querem saber as novidades?
Martin sorriu e puxou uma cadeira para Kim.
- Negócios antes do prazer, Rogers. Minha mulher está morrendo de curiosidade.
-Parece que ela está mais interessada em outras coisas. . . --gracejou o capitão,
enquanto Kim corava e sorria maliciosa.
- Tome cuidado, capitão, agora sou uma civil e não posso ser embaraçada pela
policia... Mas conte o que está acontecendo, pelo amor de Deus!
- Com a ajuda de seu marido, nos conseguimos desbaratar uma das quadrilhas mais
perigosas do mundo.
- Eu acho que devia ter desconfiado de Jack - murmurou Kim. - Mas eu o conhecia há
tanto tempo que o considerava da família. E difícil pensar nele como o chefe de uma
quadrilha. Sempre foi tão convencional, tão conservador...
- Parte de seu disfarce - explicou Rogers. - Ele se aproveitava de seu posto como
diretor do porto para encobrir a entrada de contrabando. Tinha acesso a todas as
medidas de segurança cobrindo a área. E trabalhou bem, mantendo a aparência de um
cidadão honesto. Por isto ele era tão importante para a organização.
- Com o que a quadrilha trabalhava?
- Qualquer coisa. Drogas, jóias, armas, gente, tudo que desse lucro.
- E Jack usava o porto de San Diego? Como conseguia?
Ele se esforçava para manter uma posição respeitável, Kim. Ficou amigo de seu pai,
depois se casou com sua mãe. Nós desconfiamos que ele teve alguma coisa a ver com o
acidente de seu pai. Jack tirou vantagens disto. Casou-se com sua mãe e se mudou
para a casa de sua avó. Quem poderia achar que a respeitável sra. Matthews iria
encobrir um criminoso?
- E como ele fazia para tirar de San Diego as coisas que contrabandeava para cá?
- Seu marido foi quem descobriu.
Kim olhou para Martin.
- Eu estava em San Francisco, seguindo uma pista que os meus homens tinham
descoberto no Havaí, e descobri que os Haggar e os "Santos" eram seus correios,
distribuindo as mercadorias contrabandeadas.
-Eu e Martin começamos a pensar nisto, depois que aqueles canalhas a seqiiestraram
- disse Rogers. - Eu mencionei o telefonema que Luci tinha recebido, prevenindo
você para que não testemunhasse contra a mulher de Haggar. E Martin disse que
somente Jack Wells sabia qual era o telefone de Luci. Wells pensava que você ainda
morava com ela, na praia. Não tinha idéia que Martin estava na cidade e que você
estava com ele.
- Perguntei a sua avó, e ela garantiu que ele sabia o número de Luci.
- Mas como Jack podia dar o número a Haggar? Ele conhecia a reputação do homem. E
afinal, era o meu padrasto!
- Ele nunca ousaria se opor a Haggar. As regras de uma gang são duras. Uma vez que
um homem faz parte dela, perde o direito de se negar a fazer qualquer coisa que
ajude o bando todo. Ele seria assassinado, se negasse.
- Nós trouxemos o promotor geral, os rapazes da Policia Federal que lidam com
narcóticos e o Serviço de Renda Interna para discutir o caso. Não faz idéia de
quanta coisa descobrimos! Drogas, ouro, jóias, entrada ilegal de estrangeiros. Tudo
valendo milhões!
- E agarraram os homens que mataram os pais de Hoku?
- São os mesmos que atiraram Ted e Martin de helicóptero, pensando que estavam
mortos. Sim, nós os pegamos.
- Você não me disse que também foi atirado - reclamou Kim. - Oh, Martin, que horror!
Ele ficou lívido.
- Foi mesmo horrível, Kimberly - murmurou, as mãos crispadas.
- Por que não me contou? Também ficou com amnésia, como Ted?
O rosto dele revelava uma angústia profunda e Kim reparou que ele tremia. Estendeu
a mão para ele, que a segurou com força.
- Deixe isto por enquanto, Kimberly. Mais tarde conversaremos.
Novamente aquele olhar duro como o aço havia voltado, assustando-a. Sabendo que
alguma coisa estava profundamente errada, Kim, magoada, retirou sua mão. Martin
jurava que a amava, entretanto, tinha segredos que não compartilhava com ela. Isto
parecia falta de confiança nela.
Era a mesma falta de confiança, desde o começo de seu relacionamento. Ela já tinha
notado isso em Maui e por esse motivo hesitou em aceitar um compromisso com ele.
Aparentemente, depois que soube que ela não era tão ligada a Jack, Martin venceu a
desconfiança, mas tudo voltou quando se reencontraram em San Diego. Será que o
acidente fez com que ele esquecesse algumas das coisas que haviam dito um ao outro?
Talvez a explicação fosse essa. Kim procurou algum sinal disso no rosto do marido,
mas ele estava impenetrável.
- Então os pais de Hoku foram roubados e depois assassinados? - ela perguntou ao
capitão. - E os assassinos afundaram o barco porque os homens de Martin estavam na
pista deles!?
- Achamos que foi isto. Honolulu era a base para as operações da Costa Oeste. Nós
descobrimos alguns fazendeiros e respeitáveis homens de negócios envolvidos em
contrabando, assim como a tripulação do barco afundado. Nenhum deles confessou, mas
logo vamos conseguir que falem e todos passarão alguns anos na geladeira...
- Não entendo porque a quadrilha escolheu um meio tão difícil para levar a formula
roubada até o Havaí - disse Kim. - Por que não pegar um avião? É mais rápido e mais
eficiente.
- Meus homens são os melhores do mundo, Kimberly - disse Martin. - A fórmula
precisaria ser muito bem transportada, senão nos a acharemos. Qualquer correio,
desembarcando de um avião, seria detido imediatamente. Era bem mais seguro levar
por terra até a Europa e depois colocar num navio não identificado, saindo de um
porto de pouco movimento.
- Compreendo. Isto não me ocorreu.
- Além disto, eles já tinham diversos compradores que estavam praticamente fazendo
um leilão. O vencedor deveria receber a fórmula em Honolulu, durante a Regata
Transpacifica.
- Lá haveria iates em grande quantidade. Um a mais não seria notado.
- Sabíamos que o comprador seria um entre três homens - continuou Martin. - Ted
descobriu que a fórmula já estava em Honolulu, no cofre de um dos joalheiros da
cidade, membro da quadrilha. Abrimos o cofre na véspera do casamento e deixamos uma
fórmula falsa no lugar. Mas nossos planos falharam, porque o químico que o
comprador levou com ele, percebeu a fraude. O comprador recusou fazer o pagamento e
o bando foi atrás de Ted... e de mim. O resto, você sabe.
- Eles pegaram a fórmula novamente, Martin? - perguntou Kim, ao perceber a tensão
evidente no rosto do marido.
- Estava muito bem escondida. Eles não tinham meios de descobrir.
- Seu marido os enganou - ajuntou o capitão Rogers. - Quando não conseguiram que
ele falasse, o atiraram no oceano, nunca pensando que poderia sobreviver. É mesmo
incrível que tanto ele como Ted tenham saído com vida. Martin foi esperto,
colocando a fórmula junto com as coisas de Hoku num cofre forte e dando a chave
para o garoto guardar.
Kim olhou atônita para Martin.
- O tempo todo você sabia onde estava a fórmula! - ela o acusou. - Eu pensei que
você não sabia o que significava a chave até a festa em que Hoku reconheceu os
brincos e ficou histérico. Por que esperou tanto tempo? Se a quadrilha pensava que
você e Ted estavam mortos, eles não tentariam impedi-los de ir ao banco e resgatar
as jóias e a fórmula.
O rosto de Martin ficou ainda mais tenso.
- Eu...
- Martin estava colaborando na operação que prenderia gente muito influente, e foi
por causa disto que não nós arriscamos a dizer qualquer coisa a você - explicou o
capitão. - Os homens que agarramos está noite eram todos como Wells, com folha
limpa, respeitados na sociedade, com todas as credenciais atestando sua inocência.
E teríamos dificuldade em provar a culpa deles se Ted Kalama não convencesse Chris
Hand a colaborar. Os resultados foram ótimos!
- Por que, Clement? O que foi que eles fizeram? - perguntou Kim. - Algo muito
grave, que a policia não podia fazer?
- Sim. Eles pegaram os dois e os convenceram. Hand acabou se oferecendo para
entregar os brincos a Jack Wells. Martin queria observar a reação dele e deixar que
se incriminasse.
- Martin planejou tudo?
- Sim - respondeu o capitão, sem perceber a tensão entre os dois. - Hand está agora
trabalhando para o governo. Vai receber nova identidade para poder continuar vivo.
- Mas eu pensei que homens como ele sempre iam para a cadeia.
- Neste caso, Hand realmente queria sair da quadrilha mas não podia. Só
desaparecendo completamente ele conseguiria. Ele fez a única coisa possível. Depois
do julgamento, começar uma nova vida em outro lugar. Bem, eu tenho que ir.
Martin tirou os brincos do bolso e entregou ao capitão.
- Isto deve ficar com você.
- É mesmo. E também o colar, Kim. Mas só temporariamente.
Relutante Kim devolveu a jóia.
- Mas se você estava com os brincos no bolso, a caixa que Chris entregou a Jack
estava vazia.
- Mesmo Chris tendo concordado com nosso plano, eu não podia confiar este tesouro a
ele.
- Eles são mesmo sensacionais, não é mesmo, Ste. Croix? Posso entender que um homem
seja tentado a roubá-los. Quanto valem?
- Por volta de um milhão e meio de dólares - disse Martin sorrindo. - Vou mandar
avaliar logo que você me devolver.
- Aquele menino não precisará se preocupar com dinheiro, não é?
- Seu futuro está assegurado. E ele tem outras jóias de muito valor. Vamos colocar
tudo em um fundo para ele, e providenciar para que seja protegido até ter idade
suficiente para dispor dos bens que seus pais lhe deixaram.
- Ele tem sorte de ter vocês dois. Até logo. Manteremos contato - O capitão puxou
Kim e fez com que se levantasse. Depois deu-lhe um beijo, e cumprimentou Martin.
- Vamos nos encontrar nova-mente durante o julgamento.
- Martin, o que acontecerá com Ricky depois do julgamento? - Kim quis saber.
- Conversei com sua avó e ela ficara com ele até o destino de Jack ser decidido. -
Depois nós cinco resolveremos: você, Hoku, Ricky, sua avó e eu. Mas agora é melhor
irmos para a cama. Reservei um quarto aqui no hotel porque o nosso está inabitável.
CAPITULO XXII
A suíte ficava no último andar do hotel. A sala de estar era enorme, toda dourada e
branca, com vasos de cristal cheios de flores. O dormitório tinha uma cama
espaçosa, forrada com cetim dourado, dobrada de modo a revelar os lençóis também de
cetim. As cortinas estavam abertas e a vista de San Diego surgia imponente, o arco
da ponte claramente visível. Do outro lado, ficava a longa curva da praia de
Coronado.
- Gosta, Kim? - Martin quis saber.
- E... e maravilhoso. Parece que estou vivendo um sonho! E que agora sou uma
princesa. Você é o príncipe que me trouxe para a torre encantada?
- Oui, chérie... para todas as perguntas. Não sabe que sim?
Ele abraçou-a e Kim se perdeu no beijo apaixonado. Martin levantou a cabeça e olhou
o rosto iluminado pelo amor. Beijou as pálpebras fechadas, e ela não viu a profunda
tristeza que passou pelo rosto dele.
- Oh, Martin, sou tão feliz! Eu te amo tanto! É um alívio tão grande ter
esclarecido todo o mistério em que vivemos nos últimos meses!
- Kimberly, meu amor, minha vida! - ele falou, abraçando-a com sofreguidão.
Estranhamente, ela o sentia tremer. E seu coração também batia loucamente, como se
estivesse muito emocionado.
Martin apagou as luzes e carregou-a para a cama. Deixando-a de pe, ele a despiu com
uma tal pressa que surpreendeu Kim.
- Por favor, Martin, tome cuidado com o vestido. É caro demais para ser estragado!
- Não, Kimberly - ele murmurou. - Comprarei mil iguais a este para você. Nunca
conseguiremos recuperar o tempo que perdemos!
- Mas o "marta"! - o casaco, assim como o vestido, estava jogado pelo chão,
enquanto as mãos apaixonadas procuravam a carne macia, famintas, dando prazer. . .
Kim gemia, envolvida por todo aquele amor, e Martin sorriu ao sentir que ela também
vibrava de desejo.
Kim tinha a impressão de se desmanchar entre os braços dele, seu corpo todo
latejando, esperando o momento da posse total.
Mal sentiu. quando ele a deitou na cama. Abraçada a Martin, ela repetia o nome
dele, se entregando, recebendo.
Martin a olhava intensamente, o corpo brilhando a palida luz da lua que entrava
pelas vidraças, enquanto com as mãos quase a enlouquecia de paixão, os lábios
colados aos dela, inflamando seu desejo. Quando ela estava pronta, ele a possuiu
com todo o vigor de sua masculinidade. Kim estava tão feliz que perdeu a noção do
tempo, até que, finalmente saciados, os dois permaneceram unidos por alguns
instantes, uma paz suave se derramando sobre eles.
Quando Kim acordou ainda não era dia. Martin dormia a seu lado e ela via o rosto
dele, tranquilo a meia-luz. Ele estava com uma perna sobre seu corpo, e uma mão
envolvia possessivamente seu seio.
Ele era tão belo, tão amado! E estava tão exausto! Que sorte Martin e Ted tiveram
de escapar da queda do helicóptero!
Estranho que se apaixonasse por ela, mesmo sabendo que Jack estava envolvido no
roubo da fórmula. Se Martin não tivesse esquecido que Jack não era o verdadeiro pai
dela, a vida teria sido maravilhosa desde que ele reapareceu. Amnésia é uma coisa
estranha, Kim pensava. Ele também havia esquecido de ter entregue a Hoku aquela
chave do cofre.
Kim olhava fascinada o belo corpo de seu marido. Ele tinha atirado longe os
lençóis. Kim sorriu e se inclinou para apanhá-los. Foi então que ela gelou!
Martin estava deitado de lado, virado para ela. Seu lado esquerdo nu, musculoso,
aparecia iluminado pela lua, perfeito! Perfeito!
Kim soltou um grito abafado que acordou Martin. Imediatamente ela se afastou dele,
horrorizada. Ele a soltou, respirou fundo e acendeu a luz. O silêncio entre eles
era imenso, insuportável!
- A... cicatriz. . . - ela balbuciou. - Martin tem uma cicatriz.
Ela sabia que devia estar ficando louca. Como podia ter esquecido? - Onde está
Martin?. . . Quem é você?
- Não se aproxime! - ela continuou gritando, quando ele tentou chegar perto. - Quem
é você? - Kim não era capaz de pensar nem de se mover. E ele abraçou-a, com amor.
- Sou seu marido - foi a resposta angustiada. - Sou o homem que a ama mais do que
qualquer outra pessoa no mundo. Você é meu amor, minha razão de viver, nunca se
esqueça disto! Sem você estarei tão morto quanto meu irmão.
- Seu irmão?
- Martin era meu irmão. Meu amor, escute! Estou tão apavorado que as coisas que
preciso lhe contar a afastem de mim, que mal agüento pensar nisto!
Kim não conseguia raciocinar com clareza. Mas de uma coisa tinha certeza. Amava
aquele homem, fosse ele quem fosse. Instintivamente, ofereceu a ele o conforto que
pedia, colocando aquele rosto agoniado contra seus seios, os dedos suaves
deslizando pelos cabelos negros. Ele afundou o rosto no corpo macio, se acalmando
no refúgio de que precisava.
Kim ficou imóvel, sentindo toda a angústia que emanava dele. Permaneceram assim por
algum tempo, até que ele se recompôs para lhe dizer o que precisava.
O irmão de Martin... o irmão de Martin, pensava Kim, a cabeça num turbilhão. Martin
foi seu irmão. . . Martin não existe mais...
- Martin está morto? - as palavras terríveis caíram no silêncio daquele quarto
luxuoso. Ele ergueu os olhos que revelavam um incrível sofrimento. Seu olhar dizia
tudo.
- Martin está morto. Foi assassinado... no dia do casamento.
Kim ficou lívida, imóvel, petrificada, E o homem diante dela ergueu o olhar,
sofrendo junto.
- Ele. . . nós éramos gêmeos idênticos. É difícil explicar.
- Tente - pediu Kim. - Quem é você? Qual o seu nome?
- Sou Jean-Paul Ste. Croix de Revoire. Temos muito que conversar.
- Concordo, temos muito o que conversar. Mas eu não sou seu amor, eu me casei com
seu irmão. Como ousou fingir que era ele? Você se aproveitou da semelhança para...
para...
- Eu sei. Não tenho desculpas para o que fiz, mas não consegui me controlar. Eu a
desejava tanto e a amava tanto! Martin compreenderia. Kimberly, você é o meu amor!
E tem que me dar uma chance de explicar. Depois, se quiser, pode me odiar. Não
importa, eu a amo e lutarei contra o seu ódio. Você é a minha verdadeira e única
esposa.
Kim sentou-se na ponta da cama, pronta a fugir se aquele estranho tentasse se
aproximar.
- Teria sido mais fácil se você não se lembrasse da cicatriz - se lastimou ele.
- Quanto tempo você pretendia ainda me enganar? Fez uma coisa desprezível fingir
ser meu marido, fazer amor comigo...
- Eu sou seu marido, Kimberly. Não tenha dúvidas. Fiz amor com você como qualquer
marido que adora a esposa. E continuarei agindo assim, se me compreender.
Kim olhou o belo rosto, tão aflito, e não conseguiu negar a oportunidade de uma
explicação. Não importava o que ele tinha feito, ela o amava. E mesmo que tivesse
que abandoná-lo, continuaria a amá-lo.
- Está bem, eu vou procurar compreender. Mesmo sem a cicatriz, acho difícil
acreditar que não é Martin.
- Sempre invejei Martin por causa da cicatriz. Ele dizia que era seu zíper.
- Ele falou isto mesmo a Ricky, um dia em que estavam praticando windsurf.
- Ele contou onde estava quando caiu e se feriu? Talvez isto ajude você a
compreender.
- Não, ele não disse mais nada, a não ser que estava no pomar do tio, no sul da
Franca, e que tinha uma avó americana.
- Eu também estava lá, naquele dia. Minha tia me segurou em casa e eu conversava
com ela quando Martin caiu. A dor dele passou para mim e eu sai correndo e gritando
direto até onde ele se encontrava. O galho quebrado havia perfurado a carne e
Martin sangrava abundantemente. Teria morrido se não fosse encontrado
imediatamente.
Nos sempre conseguimos sentir a dor do outro, e também as alegrias. Eu senti quando
ele se apaixonou por você. E também quando morreu. Uma luz em minha alma se apagou
e desde então eu fiquei só.
- Está querendo me dizer que realmente não há... não há diferença entre você e
Martin?
- Mesmo separados, escolhíamos as mesmas cores de roupas, até os mesmos carros.
Gostávamos dos mesmos esportes e do mesmo tipo de mulher. Até nossa mãe achava
difícil reconhecer quem era quem. Não sei o que acontece com outros gêmeos, mas não
acredito que a ligação entre eles seja tão completa quanto a que havia entre eu e
Martin.
- Não posso compreender uma coisa destas. Parece impossível existir uma identidade
assim!
- Isto também preocupou minha família. Nós não éramos somente o espelho um do outro
fisicamente, mas tínhamos exatamente a mesma voz, os mesmos gestos. Nem
precisávamos perguntar um ao outro o que estava sentindo, porque sabíamos. Martin
me telefonou logo que a conheceu. Eu estava em Paris, mas já sabia!
- Como é possível? - exclamou Kim, impressionada.
- Nenhum de nós tinha se apaixonado seriamente antes. A onda amor que ele me
transmitiu foi fortíssima. Ele a amou desde o primeiro instante e eu sabia disto.
- Ele não foi muito amável nos primeiros dias.
- Eu sei, ele me disse. Mas não conseguiu lutar contra este sentimento, assim como
eu, quando a porta do apartamento de Luci se abriu e você apareceu na minha frente.
- Pensei que me odiasse, e mais tarde tive certeza!
- Eu odiava a mim mesmo. Ted entrou em contato comigo logo que foi possível. Fui
para o Havaí sabendo que Martin estava morto, e sabendo que o homem responsável por
sua morte era o seu pai. Você disse que Martin sabia de seus problemas com Jack e
de quem era seu pai verdadeiro, mas nem eu nem Ted sabíamos disto. E muito menos
que você nem desconfiava dos negócios ilícitos de - Jack. Acho que Martin deixou
para mais tarde todas as explicações porque estava muito envolvido com o casamento
e as investigações.
Respirou fundo antes de continuar.
- Desconfiei que você tivesse usado o casamento para atrair Martin para uma
armadilha. Ele estava tão apaixonado, que eu achei isto possível. Martin era o
chefe da segurança da corporação e eu não conseguia entender como violou suas
próprias regras de segurança, se expondo como obviamente fez. Ele mandou Ted
proteger Hoku e veio a seu encontro, desprotegido.
- É foi por isto que aqueles homens conseguiram capturá-lo?
- Eram homens preparados para operações deste tipo e fizeram com que ele caísse
numa armadilha. Eu achei que você tinha sido responsável e que o tinha atraído para
aquele lugar. Fiquei louco de dor quando Ted me contou tudo. Então fiz a mim mesmo
a promessa de não descansar até Jack pagar por seu crime.
Ele passou os dedos trêmulos pelos cabelos negros e revoltos.
- Como não conseguimos encontrar o corpo de Martin, não podemos acusá-lo de
assassinato. Mas o testemunho de Ted vai levá-los todos a cadeia. E Hoku, com as
jóias, será responsável pelos vários anos que Jack passara atrás das grades. Não
era o que eu desejava, mas acho que mantive minha promessa.
- E como assumiu a identidade de Martin? Nem mesmo Rogers suspeita de nada?
- Foi fácil assumir a identidade de meu irmão, mas mesmo assim eu dei algumas
escorregadelas que confundiram você. Achei surpreendente como consegui. A ajuda de
Ted foi vital.
- Você então pensou que eu estava envolvida nisto tudo, com Jack?
- Exatamente. Mas não contava em ser traído pela paixão que não consegui evitar.
Vim para cá odiando você. Pretendia castigá-la junto com Wells. Mas a minha
identidade com Martin era tamanha, que no instante em que a vi me apaixonei. Eu me
odiava e odiava você ao mesmo tempo. Apesar disto, eu a queria. Tinha tanto medo
que acontecesse alguma coisa naquele seu trabalho, que mobilizei vários homens para
a protegerem. Quase fiquei fora de mim quando a seqüestraram. E quando a trouxeram
de volta, eu a chamei de Olhos de Neblina, lembra-se? Então você me disse que eu
não a chamava assim desde o Havaí, e tive a impressão de estar traindo Martin, o
que me fez
sofrer horrivelmente.
Jean-Paul apoiou a cabeça nas mãos.
- Foi naquela noite que eu tirei de você o que achava que era meu e me desgracei
para sempre fazendo isto em nome de meu irmão.
- Oh, amor, será que consegue me entender e me perdoar? Você era a esposa de meu
irmão, e pela primeira vez na vida eu tirei dele uma coisa que lhe pertencia! E o
que é pior, eu me senti feliz. - Levantou para ela o olhar cheio de paixão. - Você
se casou com Martin, mas é e será sempre minha! O que vai fazer de mim, Kimberly?
Sei que Martin a amou, mas não mais do que eu.
Kim olhou para o homem que a tinha despertado para o amor e para a paixão. Podia
não ser casada com ele, mas ele era o seu companheiro verdadeiro.
- Acha mesmo que não posso rejeitar você, Jean-Paul Ste. Croix?
- Não pode, Kimberly - ele afirmou com paixão. - Não é comum duas pessoas chegarem
ao êxtase que nós dois chegamos. Mesmo que quisesse acabar com tudo, eu não
permitiria!
- Oh! E como pretende evitar isto? - ela perguntou, séria, querendo castigá-lo
pelos sofrimentos que a tinha feito passar.
Ele se ergueu e Kim também ficou de pé, correndo para a porta.
Mas Jean-Paul a alcançou e levantou-a nos braços, até perto da cama. Lá, ele a pôs
de pé, os braços musculosos a envolvendo bem junto do corpo viril, enquanto suas
bocas se uniam num beijo interminável. Kim estava perdida! Seu corpo todo pedia
pelo corpo daquele que era seu marido verdadeiro.
- Não posso viver sem você - ele murmurou. - Diga que me ama, chérie!
- Você é arrogante e mandão - ela começou a dizer -, e provavelmente eu sou tão
imprudente quanto você. Mas eu o amo, Jean Paul. Eu o adoro! Com cada fibra de meu
ser.
Ele encarou-a, a alegria brilhando em seus olhos.
- Eu não estava apaixonada por Martin - Kim afinal revelou. - Gostava muito dele,
mas era só. Martin era amável, bonito, alegre, e se o que me disse sobre vocês dois
é verdade, você também deve ser assim. Ele era extremamente carinhoso, mas
desconfio que você também seja. Eu aceito você...
Ele sorriu, sentindo um grande alívio.
- Por que acha que eu sou carinhoso, Kimberly?
- Só um homem muito carinhoso faria o que você fez por mim desde que chegou aqui.
- E só uma mulher insensível deixaria o marido aos pés da cama, perdendo tempo com
uma conversa tola em vez de gozar as delícias pelas quais anseia - ele falou, muito
sério.
- Mas você não é o meu marido - ela provocou, livrando-se dele e fugindo para o
outro lado da cama.
- Não sou mesmo - ele lamentou. - Venha cá, Olhos de Neblina! As coisas mais
importantes antes. O sol está para surgir e eu quero você em minha cama outra vez.
Quando nos levantarmos, apanharemos um avião para a França. E nos casaremos na casa
de meus pais. Venha cá!
Kim tentou fugir, mas tropeçou no vestido de veludo e caiu aos pés dele. Ele a
colocou de pé e a agarrou, enquanto ela esperneava, fingindo querer escapar
daquelas mãos fortes, enterradas na sua carne macia e dourada.
- Fique boazinha, chérie, se eu não a possuir agora, acho que enlouquecerei!
Kim sentia seu corpo todo vibrando de desejo e não resistiu mais à paixão que
existia dentro dela. Ergueu os olhos prateados para ele, se oferecendo enfim, sem
barreiras.
Seus dedos deslizaram por aquele corpo de homem tão perfeito, que a fascinava e
dominava. Ele ficou imóvel enquanto conseguiu, bebendo aquelas caricias
apaixonadas, e por fim a levou nos braços até a cama aconchegante. As esperanças e
os temores estavam agora esquecidos, enquanto finalmente possuía aquela mulher pela
primeira vez, de corpo e alma.
Kim foi envolvida na turbulência daquela paixão imensa em que os dois se entregavam
e exigiam do outro, ao mesmo tempo. Sua vida agora estava completa!
Quando acordou, algumas horas depois, encontrou Jean-Paul olhando para ela,
sorridente.
- Feliz, chérie?
- Muito feliz, meu quase marido - ela respondeu, rindo.
- Isto será resolvido dentro de vinte e quatro horas - ele garantiu. - Agora
levante, sua dorminhoca, e se apronte. Temos que ir buscar um garoto e apanhar um
avião.
- Não tenho nada para usar - ela protestou, e o riso dele encheu o quarto.
- Por mim, até que prefiro o que está usando. Mas vamos até a butique aqui do hotel
comprar alguma coisa. Depois você escolhera o que quiser com mais calma.
Kim sorriu, radiante. Era maravilhoso começar uma nova vida como a esposa adorada
de um homem desconhecido!
FIM
Digitalizado por
Rai Lira
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