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LONDON LISBOA Esta foi a temporada artistica que coincidiu com a deciséo de limpar as paredes. Ao contrério do que chegou a ser dito, esta decisao terd desgostado muitos turistas. Uma grande actividade registava-se al, em letrismo, colagem e descolagem. Por vezes exageradamente, mas exageros compreensiveis apés os longos anos de opres- so. Os muros, que no tempo(?) salazarista eram o lugar da_mensagem autoritéria ov do silencio, torneram-se ruidosos, 6 certo, mas @ pressa desta limpeza n8o pode deixar de reflectir um certo horror & proliferacao dos sinais visuais ¢ da sua conquista dos espacos publicos. Como se 05 sinais visuais devessem manter-se_invisiveis. Uma mesma agorafobia, paradoxal numa jover demo cracia. fez recolher-se nos seus gabinetes muitos dos principals responséveis pela politica oficial da cultura @ da educacéo. campo por exceléncia do didlogo. Em momentos de honestidade. criam-se comissGes consul tivas, mas muitas das suas stgestdes s80 desaproveitadas, © governo lembra as dificuldades econdmicas. Encontra porém fundos especiais, quando se trata de improvisar alguma realizae40 que ajude 2 ctiar uma boa imagem do préprio governo. E isto que é preferido ao devido apoio de_um programa coerente, Por isso as comissées. séo mantidas num estatuto ambiguo, ou dispensadas arbitra- riamente. Um certo silenciamento surge-nos assim como indi- cio do que foi a «atmosfera» da ultima temporada, Que algumas vedetas das artes parecam silenciar-se também, & uma homologia confirmadora, uma fraqueza, Intrinseca e, por vezes, efectivos compromissos de bast: dores. Nao hd nesses artistas generosidade nem lucidez. Fogem dos seus colegas quando é necessério discutir a situagdo @ assumir uma atitude publica, para procurar junto dos incultos poderosos uma posicdo de favor. Constituindo porém uma minoria, o que de mais signifi. Cativo se esté a passar pouco ou nada Ihes deve, Também no & novidade o siléncio dos meios de comu- nicagao de massa, que dos acontecimentos culturais lhes interessa de preferéncia noticiar @ mundanidade, Quer ‘saber quem inaugura, no quem exp0e. O silenciamento especial desta temporada é porém mais alguma coisa, Corresponde a longinquos defeitos da vida cultural por- tuguesa, € também & verificagso do que temos denun- 36 LISBOA por RU] MARIO GONCALVES ciado jé depois do «25 de Abril»: a indefinicéo de poltica Cultural por parte dos sucessivos governos, o desinteresse ou incapacidade dos partidos politicos, a prdpria novidade das propostas dos artistas. Discretamente, 0 movimento editorial comeca a for necer informacdes de alguns e bem diversos sectores do ensamento marxista, desde 0 cléssico Pleckanov wA ane @ a vida social») a0 polémico Marcuse («Um enseio sobre a libertacdo»), passando por alguns dos mais ding micos vanguardistas dos anos vinte, o russo-polaco Boris Awatov (wArte: produgo e revolucao proletériay) € 0 desenhador alemao Georges Grosz (KO rosto da classe dirigente», «Ecce Homo»), no esquecendo o estudo de Michel Jean Palmier (cLenine, a arte e a literatura) De nao menor utilidade, € 0 conjunto de livros que difun dem novos métodos de ensino artistico, onde se encon- tram autores portugueses: «Para uma’ didéctica intto- dutéria as artes plésticasy, de Helder Batista e Rocha de Sousa; «A pintura das criancas e nds». de Eurico Gon alves: «Método natural», de Freinet; «© desenho © 2 Criancay, de Marie-Claire Debienne; e «Deixe-o pintar, de Klaus Kowalski, Registe-se também, com outra ordem de preocupacses, 0 ensaio de Lima de Freitas «Almada © 0 Numeror. eo livro de divulgacdo de Fereira de Almeida e outros «Tesouros attisticos de Portugal Portanto, 0 silenciamento € especial porque hé nele também uma reflexdo sobre as novas condicdes da arte uma tomada de consciéncia das situagdes concretas Alguns partidos de esquerda comecam a manifestar N° Seu seio um desejo de prestar maior atencdo @ acc50 cultural, Por exemplo, um significativo grupo de intelec- ‘tuais do Partido Socialista manifestou veementement® esse desejo por ocasiéo de um Congresso, denunciando também a marginalidade a que se sentiam votados. ‘Também surgiu por parte de dirigentes do Partido Comu- nista Portugués, um convite a reflexao sobre 2 20780 cultural, reflexéo que no exclui uma auto-criica. Este partido, se, por ocasiéo dos encontros de aftistas em Agosto, nas Caldas da Rainha, tormou uma pouco es! Fecida posicéo contra a arte de vanguarda, j& em Seter™. ‘b10, em Lisboa, por acasio da gigantesca festa organizade pelo seu jornal, o «Avante, apresentou obras de muitos artistas de diversas tendéncias, destacando 0 pintor 1 Hogan, 0 escultor Jorge Vieira Cid @ 0 ilustrador Rogério Ribeiro abe aqui reparar que. se nos anos anteriores as exp: sig6es vindas dos paises de Leste eram de uma medio fridade que prestava mau servico a0 socialism ea cultura atistica, 8 este ano, a expasicso de arte moderna polaca (F. Gulbenkian) e a retrospective Ge Ma (S.N.B.A) mostraram como o vanguardismo 6 necess a transformagio social Outra comparacdo deve ser feits entre as duas temp tadas. agora no dominio técnico, Dissemos que 0 ano ppassado fo! 0 ano da gravura, devido as inimeras expos) ‘98es neste sector, em especial a comemorativa dos vinte ‘anos. 1956-1976, da Cooperativa dos Gravadores Por tugueses. Dissemos entéo como era de bom auguno, bara um pals que se declara a camino do socialismo, ser 8 arte da gravure muito praticada, e que essa notavel exposi. {gio naturalmente passaria a servir de bitola para a Primeira Exposicéo Nacional que se seguiria. Ora esta exposicao realizada este ano na F. Gulbenkian, ultrapassou em qua lidade 0 que era previsivel, confirmando-se assim a vita lidade desta arte om Portugal. (Ver «Coléquio/Artes» de Abril de 1977), Esta exposicéo, juntamente com outras realizadas na F. Gulbenkian, como a retrospective de témperas de Vieira da Silva, desenhos e gravuras de David Hockney, ‘gravuras © multiplos de Robert Rauschenberg, gravuras de Fayga Ostrower, 0. na Sociedade Nacional de Bolas ‘Artes, 8 grande colectiva intitulada «O papel como suporte na expresséo plésticay. citando apenas as de maior pros. tigio, foram exposicdes que chamaram a atengao, todas ‘las, para o mais imediato © comum dos suportes, meio Intimo que tio adequadamente acompanha todas 2s inflexdes da sensibilidade, © que pola sua intimidade 8 Bartolomeu MARIA JOSE AGUIAR / PINTURA / 1974 se arrisca ao silenciamento. Também Otto Dix era predominantemente constituida por deserihos © gravuras. (Ver «Coldquio/Artes» de Junho de 1977) David Hockney é um artista inglés que se a exposicéo de otabilizo na tendéncia epop», assumindo um lirimo que se fundia com certas imagens xnaivess, que refinadamente fe, onjugando com uma profunda ironia. A sétira 20 conforte Goméstico, a alterabilidade entre ambiente natural “o teatral, a tradiedo inglesa de hum 4 a obra desta personalidade for Partido entre alguns dos probi lemas vivenciais da sua Qeracdo através de uma incessar ante redescoberta do culto propor cenas de homossexualidade 0 © principalmente para faunciar todo um tipo de figuras jovens, onde a sensua 'idade se afirma,llustrador, de um modo adulto, dos de Grimm @ de poemas de Cavaty, retomando a st eA Pecadéncia de um estroinay talvez Hockney devesse ainda com os seus desenhos contribuir para uma compre2n so de André. Gide . © que ha de pessoalismo em Hockney. que o tome Treat getPateneles verses ede esteticiamo vvieo Suaglanamente, adquinndo grande importincia os seus ATO 2 Prépna reflex’o sobre os ambientes do seu trabalho, € completamente diferente do que propdem a Crpanhols Valdés @ Solbes, que actuslmente sho 05 sore ageonstituintes da Equipo Cronica, niialmente com Fara bamieipantes, Trabelham em conjunto, precisement Pata que 0 rigor das intengdes se sobreponha @ subi va. do dove anos, 1995-1976 ere conadia com 2 exposicso, de Hoke 73 consul a pate mas recente da obra dests artistas e dominava a exposicdo. E uma série que constitui i devaprofurdarento de pasquca 2 que Valués € ct ergecando, se nao ha como em Hockey, Solon rarrovarfeant Go formule © de, magens, he um verona a banaizagao quo 2 socedade actual Pott andor lecnlogla 2, comuricargo de masses eter soe os sina do nosso tempo. ESM Sonsedue arene crodon pos aises,deturpando-Ines sot don Ne oils auton o museu tmaginai, var a ened ara ado. @cubmetido a uma ionograie era an ds tempo em que se viv. O mur, por Sromples repesenad como reprodurso de pitas Se°Skan Gs Chico, Dalvaux, Magrite. Tapes. Recal e.etAtperutabiidade Gos elementos na composigSo farna mats agua 2 consclncia da banlizcdo dime tomes neceesade do abordar problomaica do ser Sarena do sou coterto coca Esta exposicéo veio a0 encontro das intencdes de siguns atstosrorugusses, peo que se tomou particule mento oporuns Come ve sondo habitual, 6 na Sociedade Nacional de oles Anos que melhor se pode seguir» achvdado dos artistas portugueses. Em cito exposicées colectivas. foi possivel observer aspectos muito variados da actual pro- Baran. Sea estes oo exposes, acrscantamos. 3 {Alerratva Zon que efenca nota artigo dentarevsta. feromos um cosjunto que olrece um panorama basan's significativo. Embora timidamente, ensaiam-se passagens de uma concepgdo de exposigao-manifesto a outra de ‘exposicSo-cientifica. Compreende-se que estas venham ‘sendo adiadas. quer pela dificuldade intrinseca, quer por no haver ainda um clima cultural propicio. Elas surgem mais como exposicSo-inquérite, ou como exposi¢ao- ‘Dnssi. et tividade. Uma retrospect ‘A «Altemativa Zero», por exemplo, era fundamental- mente prospective um vanguardismo marcado essen- ccialmente pelas cor “conceptuais, a partir de 1968, historicista, antes a apresentag’o iamento do que ja falei adquire, Seixas, Carlos Fernandes, Batarda, Eurico, Fat Jesmim, Joo Cutileiro, Pomar, “Maria Jost'™® Vaz Mario Botas, Paula Rego. Pedro Oom,, Raul gush Samouco, Isabel Meireles, Ciara Meneres © Rose rar ‘Ainda as obras ndo estavam montadas, jé se fame protestos que conduziram proibico da expose Estoril. A S.N.B.A. imediatamente cedeu as soe 2,70 gbes, assim como 0 Centro de Arte Contemmreal (Porto). Também o secretério de Estado da Cultura snort 8 exposi¢ao. Durante a inauguracto na SNBA. pecel que 0 escéndalo tinha acalmado. Alguns diss dec Aifgie no «Didrio de Noticias» um artigo de remrc oos de um poema-manifesto, de 1951, distnibuido pelo aoe” nizador da exposicao: Eurico Goncalves. No Porte’; Imprensa publicou novos protestos. al nfo apenas sone Eurico, mas também contra Pedro Oom, Clara Meneets Rosa Fazenda. Por seu lado, a Televiséo no deixou ter mitir a reportagem crftica realizada pelo seu coleborense habitual Rocha de Sousa @A Fotografia na Art Modema Portuguesas foi outta exposicgo-ensai que partia dos sumealstas Fer pando de Azevedo e Fernando Lemos (1952) e se esten Gia até & actualidade, com obras de Alberto Carneiro, Alvaro Lapa, Ana Vieira, Angelo de Sousa, Costa Pinheiro, ‘Artur Varela, Eduardo Nery, Emilia Nadal, Calhau, Helena ‘Almeida, Jo80 Dixo, José de Guimardes, Julio Ser. ‘mento, ‘Manuel Casimiro, Maria Velez, Mario Botas, Gosariny, Noronha da Costa, Pedro Rocha, Victor Pomar © Ricardo Cruz Filipe. Este titimo & quem actualmente mais se dedica a uma pintura em telas foto-sensibilizadas, tendo realizado uma exposicéo individual na Galeria Quadrum, repetida no Porto, no Centro de Arte Contem- porénea, que foi o organizador da colectiva, de colabo- tagéo com a Secretaria de Estado da Cultura. Exposicgo de rara_qualidade, passou quase ignoreda, ©. mesmo aconteceu depois com a jé citada exposicéo «0 papel ‘como suporte na expressio plésticay, a que concorreram 396 obras de 122 autores, tendo o jar seleccionado 138 obras de 63 autores. Estes nimeros mostram bem a act vidade que vai havendo. Esté-se bem longe do tempo em que 0 Conselho Técnico da S.N.B.A. fazia exposicdes apresentando apenas 11 obras. Insergdes mais imediatas na vida politico-social veri- ficavam-se noutras exposicées colectivas: «Artistas Por- tuguesas © Americanas», acompanhada de inimeres 2 lizagSes, concertos, debates sobre a condicao da mulher. etc.; Apoio aos anti-fascistas brasileirosn; as propostas do «S.AA.L», Espera-se que «Mitologias Locais». @ rea- lizar em Novembro, também na S.N.B.A., venha contribuir pera avancar nesta problematica Relembrando todas as grandes exposigdes colecti- vas, néo se pode citar os nomes de todos os participantes. Houve algumas revelacdes: os desenhos de Miguel Brandao, os objectos provocatérios de Rosa Fazenda. nena Nobre, os filmes de Maria do Carmo Galvéo les. Ainda na S.N.B.A. tiveram interesse as exposioes individuais de Rogério Amaral, Mario Botas, Antonio Sere. Cortéa, Vietor Palla, Carlos Rocha Pinto. Parente, Teresa Cabrita, Man, Victor Belém © U ‘do palestres foi dedicade ® osé-Augusto Franca, “AU CENTRE DU LABYRINTHE” / 1977 Um artista de rara sensibilidade, José Escada, arre dado do convivio com o piblico, foi apresentado na ESBAL Também os museus no Porto, dando guarid: 9 «Machado de Museu do animam: 0 «Soares dos Reis a0 Centro de Arte Contemporans ro», em Coimbra. Inaugurou-se 0 em Lisboa, € consta que @ préxima temporada verd finalmente constituir-se um Museu Nacio Arte Moderna, Para este Museu, as criticos Salette Tavares @ Ribeiro Teles tém proposto o alto do Parque Eduardo Vil, em Lisboa, como zona de lazer e cultura, e principalmente como ponto charneira de defesa dos espacos verdes da idade “ ambiente e do patrimoi intensivo para pr 0 de novo do perigoso silenciamento actual. apresentagdes, reflexdes $F tas, desenvolvimento A teflexéo tedrica anda agora n ) divida, E sem urar_a met Foi uma temporada que se seguiu a Congreso da Al.C.A. e em q Pés-graduacdo, um curso de Historia d: sidade Nova de Lisboa jo da Cultura a promov

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