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colegéo TRANS. Bruno Latour JAMAIS FOMOS MODERNOS Ensaio de Antropologia Simétrica Tradugdo Carlos lrnew da Costa editoralll34 uFRes BPilowece Setociat de Citacias Sociais « W EDITORA 34- ASSOCIADA A EDITORA NOVA FRONTEIRA Diseribuigio pela Editora Nova Frontera S.A R. Bembing, 25 CEP 22215-050 Tel. (021) 286-7822 Rio de Janciro - RJ Js para lingua portuguesa, no Bra ‘Nous n'avons modernes © 1991 Editions La Découverte, Pa Ah FOTOCGRIA DE QUALQUER FOLHA DESTE LIVRO ILEGAL, € CONFIGURA UM arnonmingad INDEVIDA DOS DIREFTOS INTHLECTUAS E PATRIMONIAS 00 AUFOR, ‘Titulo original: [Nous wavonsjamats été modernes Capa projet grifio ¢ editorasio eleteBnica: Bracher © Malta Producao Grafica Reviséo: Claudia Moraes I Edigio - 1994 a SIC Leda ico, 635 s. 603 CEP 22470-050 RJ Tel, (O21) 239-5346 Fax (021) 294-7707 cP Be Sindicato Nacional dos Edicores de Livros, RJ. JAMAIS FOMOS MODERNOS Ensaio de Antropologia Simétrica 19 2. Constmugao. 83 3, RevoLugto a 4, RELATIVISMO 129 5. REDISTRIBUIGAD 145 Bibliografia grades Sen Fei Ge xen ite ‘Gucsemes, qumentos sui condos Grant osdiverss semindion que gen ‘lente organicase para mi, ara lzabeth Lac 1 RISE A PROLIFERAGAO Dos HisRiD0s 1Na pégina quatro do jornal, leo que as campanhas de medidas so- bore a Antartida vao mal este ano: o buraco na camada de ozdnio aumen- tou perigosamente, Lendo um pouco mais adiante, passo dos quimicos que lidam com a alta atmosfera para os executivos da Atochem e Monsanto, {que estio modifiando suss linhas de produgio para substituir 0s inocen- tes clorofluorcarbonetos, acusados de crime contra a ecosfera. Alguns pa~ rigrafosa frente, 6a vez dos chefes de Estado dos grandes; Fizados se meterem com quimica, refrigeradores, aero Contudo, na parte de baixo da colena, vejo que os metcorologistas no concordam mais com os quimicos efalam de variages ciclicas.Subitamente 0s industrias nao saber o que fazer. Sera preciso esperar? Jé ¢ tarde de- Mais abaixo, os paises do Terceito Mundo e os ecolog ito das geragdes «2, océu mais longinguo ¢ uma certa usina no subiirbio de Lyon, mais global e as proximas eleigdes ou o préximo conselho administra ‘yo. As proporgdes, as questées, as duragies, os atores ves e, no entanto, esto todos envolvidos na mesma his ‘Na pagina seis do formal, recebo de Paris contaminow ‘que os senhores Chirac e Reagan questionar novamente o hist6rico desta descoberta, que as indistriasq micas estio demorandoa colocar no mercado remédios fortementer dicados por doentes organizados em associagies militantes, que a epide- mia se dissemina na Africa negra. Novamente, cabecas coroadas, qui 0s, bidlogos, pacientes desesperados ¢ industrais encontram-se envolvi- dos em uma mesma hist6ria duvidosa Na pagina oi ses, na pagina nove embrides congelados, na pagina dez uma floresta em chamas, levando em suas colunas de furaca algumas espécies raras que alguns naturalistas desejam prote gina onze, baleias munidas de colares 0s quais si acoplados radios sinalizadores; ainda na pagina onze, ‘computadorese chips controlados pelos japone JnmaisFomos Medernos 7 uum terreno a0 redor de uma mina do Nort, simbolo da exploragio industrial, ‘acaba de ser lassificado como reserva ecol6gica devido a flora rara que lé sedesenvolveu. Na pégina doze, o papa, os bispos, Roussel-Ucla, as trom fundamentalistas texanos rednem-se em rorno do mes- smando uma estranha legiio. Na pagina quatorze, 0 interconecta o st. Delors, “Thomson, a CEE, as comissées de padronizagio, os japoneses mais uma vez, terado por umas ido do partido radical), eo suplemento onde os romances relatam as aventuras apaixonantes do eu profu aime, moinon pl “pa ee ‘canst o8 artigos hibridos que delineiam tramas de cigncia, po! relpio, técnica, ego, Sea leitura dojornal ddr €a reza do hhomem modemo, quio estranho 0 homem que hoje rezalendo estes assuntos confusos. Toda a cultura e toda a natureza sio diariamente reviradas ai Contudo, ninguém parece estar preocupado. As paginas de Economia, Politica, Ciéncias, Livros, Cultura, Religiioe Generalidades dividem o layout como s¢ hada acontecesse, O menor virus da AIDS nos faz passar do sexo as, a0 DNA, a Sao Francisco; mason analisaso penstdores, 05 esd fina red deseuada peo virus em pequenoscompartinentos Scns ene corres pe in apa amin a . Ao tentar acabar com a exploragio do homem pelo homem, 10 multiplicou-a indefinidamente. Estranha dialtica esta que ta oexplorador eenterra o coveiro aps haver en ‘como fazer uma guerra civil em grande escala. O reeake 1a em dobro: 0 povo explorado, em nome do qual a vanguarda do prole- tariado reinava, volta a ser um povo; as elites com seus longos dences, que pareciam ser desnecessria, voltam com toda fog para recomar,nos bancos, Jumais Fomos Modernos 1B nos comércios e nas fabricas seu antigo trabalho de exploracio. O Ociden- te liberal ndo se contém de tanta alegria. Fle ganhou a guerra fria te triunfo dura pouco. Em Paris, Londres e Amsterda, neste lizadas as primeiras conferéncias sobre simboliza, para alguns observadores, 0 ada e de ‘na em dobro: as multidées que deveriam ser salvas da morte caem aos nna misériay as natureaas que deveriam ser dominadas de forma absoluta nos domiaam de forma igualmente global, ameagando 2 todos. Eswranha daltia esta que fa do escravo dominado 0 mestre e dono do hhomem, que subitamente nos informa que inventamos 0s ecocidios ea0 ‘mesmo tempo as fomes em larga escala. Asimetriaperfeita entre a queda do muro da vergonha e o desapare- cimento da narurezailimitada 66 ndo ¢ vista plas ricas democracias oc \dentais, De fato, os socialismos destriram a0 mesmo tempo seus povos€ seus ecosinemas, enquanto que os do Ocidentesententional pudecam salvar seus povos e algumas de suas paisagens destruindo o resto do mundo e jo- gando os outros povos na miséria. Dupla tragédia: os antigos socalismos pensam poder remediar seus dois problemas imitando 0 Oeste; este acted ta er escapado aos doise poder, na verdade, ensinarlgBes enquanto deixa morrer a Terta eos homens. Acredita ser 0 tnico a conhecer otruque que _ permite ganhar sempre, justamente quando talvez tenha perdido tudo. és esta dupla digressio cheia de boas intengies, nds, modernos, atentemente perdemos um pouco de confianga em nés mesmos. Te Jhor no tentar acabar com 2 exploragio do homem pelo home ido melhor nfo tentar tomar-se mestre e dono da natuceza? Ni eas vieudes foram colocadas aservigo portada, la mesma forma como 0s jovensalemies se voltam para seus pais srisalhos: “A que ordens criminosas escavamos obedecendo?” “Poderemos dizer que aio sabiamos?” Esta dvida sobze o bom furdamento das boas intengbes faz com que alguns de nés tenham se tornado reacionérios de duas formas di preciso no mais querer acabar com a dominago do homem pelo ho- 4 Bruno Latour zes de acreditar nas promessas duplas do socialismo e do “naturalismo”, (0s pos-modernos também evitam duvidar totalmente delas. Fcam suspensos entee a duivida ¢ a crenga, enquanto esperam o fim do milénio, Enfim, aqueles que rejeitam 0 obscurantismo ecol6gico ou o obscu- ‘p6s-modernos, decidem con! decididamente modernos. Continuam aereditando nas promessas das én’ cias, ou nas da emancipasio, ou nas duas. Contudo, sua crenga na mo dernizagio hoje no soa muito bem nem na ace, nem na economia, nem 1na politica, nem naciéncia, nem na técnica. Nas gaerias de are, assim como nas salas de concertos, a0 longo das fachadas dos iméves assim como nos institutos de desenvolvimento, épossvel sentir que o esptito-da coisa no ‘std mais presente. A vontade de ser moderno parece hesitant, algumas |\ vezes até mesmo fora de moda Quer sejamos anti-modernos, modernos ou pés-modernos, somos ‘todos mais uma vez questionados pela dupla faléncia do miraculoso ano de 1989. Mas iremos retomar nossa linha de pensamento se consierarmos este ano justamente como uma dupla faléncia, como dus igs cuja admi- rive simetria nos permite compreender de outa forma todo ness passado. E se jamais tivermos sido modernos? A antropologia comparada se \tornaria entao possivel, As redes encontrariam um lar. © Que eum MopeRNo? [A modernidade possui tantos sentidos quantos forem os pensadores ‘apontam, de uma forma raste, um passado arcaico ee ra encontra-se sempre colocada em meio a uma polémica, em uma briga onde ha ganhadores e perdedores, os Antigos ¢ ‘0s Modemnos. “Modeeno”, portanto, éduas vezesassimétrico:assinala uma ruptura na passagem regular do tempo; asinala um combate no qual ha vencedores e vencidos. Se hoje hé tantos contemporéneos que hesitam em cempregar este adjetivo, se 0 qualificamos através de preposicées, € porque nos sentimos menos seguros ao manter esta dupla assimetria: nfo pode- ‘mos mais assinalar a flechairreversivel do tempo nem atribuir um premio 40s vencedores, Nas inimeras discussGes entre os Antigos eos Modernos, ambos tém hoje igual nimero de vitérias, e nada mais nos permite dizer seas revolugdes dao cabo dos antigos regimes a os aperfeigoam. De onde Jamas Fomos Modecaos / 15 oceticismo interessantemente chamado de “pés”-moderno, ainda que ele no saiba se é capaz de suceder para sempre aos modern Volkando atras ao que dissemos, devemos retomar a definigio da modernidade,interpretar 0 sintoma da pos-modemidade, e compreender porque niio nos dedicamos mais por intro a dupia tarefa da dominagio ¢ da emancipasio. Seré entio preciso mover 0 céu e a terra para aby 5? Sim, € exatamente iso: 0 céu ea terra, tesee também de um ensaio — € que a palavra *moderno” designa dois conjuntos de préticas totalmente diferentes que, para permanecerem eficazes, devem permane- cer distintas, mas que recencemente deixaram de é-o. O primeiro conjunto ‘de priticas cria, por “teadugao”, misturas entze géneros de seres comple- tamente novos, hibridos de naturezae cultura. O segundo cri, por “puri- ficagio", duss zonas oncol6gicas inceiramence distintas, a dos humanos, de um lado, ea dos no-humanos, de outro. Sem o primeiro conjunto, as iticas de purificagio seriam vazias ou supérfluas, Sem o segundo, o tra- ho da tradugio seria freado, limitado ou mesmo interditado, O primeiro conjunto corresponde aquilo que chamei de redes,o segundo ao que cha nei de critica. O primeiro, por exemplo, conectaris em uma cadeia con ‘nua 2 quimica da alta atmosfera, as estratégias cient preocupacdes dos chefes de Estado, as angistias dos ecologistas; o segun do estabeleceria uma partigfo entre um mundo natural que sempre esteve aqui uma sociedad com interessese questOes previsiveiseestéveis, ¢ um discurso independente tanto da referéacia quanto da sociedade, Enquanto considerarmos separadamente estas prticas,seremos real- mente modernos, ou se, estaremos aderindo sinceramente ao projeto da ppurificagdo critica, ainda que este se desenvolva somente através da p feragio dos hibridos. A partic do momento em que desviamos nossa aten~ fo simultaneamente para o trabalho de purificacio e o de hibridacio, deixamos inscantaneamente de ser modernos, nosso futuro comega a mu- dar. Ao mesmo tempo, deixamos de ter sido modernos, no pret tomamos consciéncia, retrospectivamente, de que os dois cor ram operando desde sempre no periodo passado comeca a mudar. Enfi ;nsformadas. O relativismo, a dominacio, o imperialismo, a ma fé, 0 sincretismo seriam todos explicados de outra forma, modificando entioa Qual o lage existente entre 0 trabalho de tradusio ou de mediacioe co de purificacio? Esta &a questéo que eu gostaria de esclarecer. A hipéte se, ainda muito grosseira,é que a segunda pos 16 Bruno Latour ‘mais nos proibimos de pensar os hibridos, mais seu eruzamento se tornal , . possivel; este & 0 paradox dos modemnos que esta situagao excepcional ‘em que nos encontramos nis permite enfim captar. A segunda questio diz, respeito aos pré-modernos, as outras naturezas bbém demasiado am, Fac20 € 0 trabalho de purificacio, o que iremos nos tornar? Como desejar as Luzes sem a modernidade? A hip6tese, também por de- ‘masiado enorme, é de que sera preciso reduzit a marcha, curvar e reg dda as coisas? Para responder a estas perguntas, deverei distinguir entre os pré-modernos, os modernos, e mesmo entre os pés-modernos aquilo que cles tém de durivel eo que tém de fatal. Perguntas demais, bem o sei, para lum ensaio que ndo tem outra desculpa que nao sua bre dizia, sobre os grandes problemas, que eram como os banhos trios: é pre- iso entrar répido e sair da mesma forma. 2 ConsTrTUI¢Ao. A Constrrurcko Mopenna A modernidade ¢ muitas vezes definida através do humanismo, seja ‘para saudar 0 nascimento do homem, seja para anunciar sua mor {© proprio habito é moderno, uma vez que este continua sendo assimétrico, Esquece © nascimento conjunto da “nio-humanidade” das coisas, dos ‘objetos ou das bestas,¢ 0 nascimento, ao estranho quanto o primeiro, de uum Deus suprimido, fora do jogo. A modernidade decorre da criagao con- junta dos trés, e depois da recuperagio deste nascimento conjunto e do tratamento separado das trés comunidades enquanto que, embaixo, os hi- bridos continuavam a multiplicar-se como uma conseqiiéncia tratamento em separado. E esta dupla separasdo que precisamo: tituir, entre o que estd acima e © que esté abaixo, de um lado, entre os fhumanos ¢ 0s ndo-humanos, de outro. ‘Ocorre com estas duas separagdes aproximadamente o mesmo que corre com aquela que dstingue 0 judicirio do executivo, Esta iltima no teria como deserever 0 mil 08, a8 infludncias cruzadas, as nego- ciagBes continuas entre os ui 10s. No entanto, aquele que nega a eficicia desta separasao estard enganado, A separa¢ao moderna entre ‘mundo natural ¢ 0 mundo social em o mesmo carter consttucional, com © detalhe que, até o momento, ninguém se colocou em posigio de estudar 10s poiticas eos cientistas simerricamente, ja que parecia nfo haver um lugar central. Em certo sentido, os artigos da lei fundamental que diz respeico 2 dupla separacio foram tao bem redigidos que nés a tomamos como uma dupla distings ica. Do momento em que tragamos este espago ixamos de ser modern comm que define est a esta separagdo. Quem deve escrevé cas, a tarefa cabe aos juristas, mas Jamsis Fomos Modemno# 6 apenas metade de seu contrato, jf que nio explicaram o trabalho de puri- ficagdo que se realiza acima deles, 0 qual explica esta proliferacdo. Quanto 20s coletivos estrangeiros, € tareta da antropologia falar a0 ‘mesmo tempo sabre rodos os quadrantes. Na verdade, como quer exndiogo & capaz de escrever, na mesma mon« forges presentes, a reparticio dos poderes entre humai areligido , 08 ancestrais, a cosmologia, o direito a propriedade ¢ as etndiogo evitaré eserever 1r8s para os poderes, eum iltimo para as 10 aquele, magnifico, em que Descola tenta resumir a constituigio dos achuar da Amazonia (Descola, 1986): © 08 podes taxonomias de plantas e veget Os achuar, entretanto, nio se apropriaram comple mente da natureza nas ro, o.campo cultural aa ver que nele se encontram classificados anit 10s que dizem respeito ciedades amerindias. Ndo encontramos, portanto, nos achuar, «esta antinomia entre dois mundos fechados eisredutivelmente copestos: 0 mundo cultural da sociedade humana e o mundo natural da sociedade animal. H, ainda assim, um momento em que o continuum de sociabilidade & lugar a um universo selvagem ircedot homem. Incomparavelmente mais reduzido que o dominio da cultura, este pequeno segmento de nacureza compreende 0 con- junto das coisas com as quais nenhuma comunicagao pode ser estabelecida. Aos seres possuidores de lingwagem (aent uais 0s humanos sio a encarnacio mais completa, opok as coisas mudas, que povoam universos paraelos c inacessves. particularmente abrangente, uma lantas, ¢es- tada e prodigiosamente ‘e dos meteoros permanece surda aos discuzsos dos homens” (p-399). ‘A tarefa da antropologia do mundo moderno consis em descrever dda mesma maneira como se organiza todos os ramos de nosso governo, inclusive os da nacureza e das ciéncias exatas,e também em explicar como 20 Bruno Latour € Porque ests ramos eseparam, assim como os mille arranjos que os rene, Oemnlogo de nowso mundo deve colactrac oo ponte ores Jem os paps as ac ie ou incapar, Ele deve de definir ou nao a matétia, 0 direito, a sem partir da metafisca moderna, Da BovLe e seus Omietos “Nao concebemos a te, para impor este vocabulério da demarcacao, e nos estorga ‘mos para stuarhistoricamente esta linguagem e pars explcar ‘os avangos destas novas convengées do discurso. Se descjamos ‘que nossa pesquisa seja respeitada do ponto de vista € preciso que evitemos usar de forma superficial a lingua des 5 atores em nossas proprias explicagdes, E precisamente esta iguagem que permite conceber a politica como algo exter 4 ciencia que tentamos compreender e explicar. Chocamo-nos neste ponto, coma visio geral dos historiadores da ciéncia que ppensam ter ultrapassado ha muito as nodes de “interior” € “ ” daciéncia, Grave erro! Estamos apenas comecando a entever os problemas colocalos por estas convenes ede mais Foret Moderns 1 limitagio. Como, historicament, os exores cient 1s elementos de acordo com seu sistema de delimitagao (¢ m0 de acordo com 0 nosso), ¢ como podemos estudar empiricar mente as formas que eles possuiam de conformar-sea este siste- rma? Isto que chamamos de “ciéncia” ndo possui nenhuma de~ smarcagio que possamos tomar como fronteira navural” (p.3421. Esta longa citacio, extrafda do fim de um livro de Steven Shapin € Simon Schatfer (Shapin e Schaffer, 1985), marca 0 verdadeiro pri ‘de uma antropologia comparada que leva a sévio a cigncia (Latour, 1990c) Eles nZo mostram como 0 contexto social da Inglaterra podia justificar 0 desenvolvimento da fisica de Boyle e © fracasso das reorias matemticas fam com o proprio fundamento da filosofia politica. Lon- abalhos cienificos de Boyle em seu contexto social” ou politica “deixa vestigios” nos conteidos cientificos eles Hobbes brigaram para inventar uma ciénci 1sio entee os dois. Eles ndo estio em posigzo de ‘contexto, jd que nem um nem outro existiam desta Boyle e Hobbes tivessem atingido seus respectivos em desenterrado 08 politicos ignoravam, ssde seu herdi—e ti — que 0s historiado- ses da ciénei trabalho de organiza- go de seu hers com a ciéncia, Hobbs tum belo quadro: Boyle sobre quase tudo. Ambos desejam om unficada, e so adeptos fervorosos da fil {gue ambos sejam profundamente racionalistas, suas opinioes divert quan aque deve ser esperado da experimentagio, do raciocinio ‘Gentifico, das formas de argumentacao politica e, sobretudo, da bomba de ar, verdadeiro heroi desca histria. As diferencas entre estes d ‘mens, qué no entento concordam sobre todo © resto, 0s fornam a séfilas” da nova antropologia, Boyle abstém-se cuidadosamente de falar sobre a bomba de vacto. |A fim de cofocar ordem nos debates que se seguem & descoberta do espa Beano Latour idade do ee ae tle detenvolve a pari do modelo de Ono von Guerihe paca exp forma dura or de um recipient de vidrotanoparete £9 3a lente, para a pce, em termos de cist, de complica, de noi dade, de tum dos grands equipamentos da fica contempotinea, Jf Big Since. ‘grande vantaem dis aparclagea de Boye ade permit das paredes de vidro e de poder introduzir ou mesmo manipt fags ma rie de mecanimosengehoos de vlvles ede rdomen a —S—C feietemente bons Boyle deve, portant, ier com que peaguea eno Ica avance osfceme prs qo le pon ez a experiencia que lhe Etc doef oH iho a ho de Tom do tbo ive, Dei anno com que om de seus feces — por sia 1B9Tb) — aconase a bomb, atingir o nivel do merci ‘experiéncias no interior da redoma b das a detectar 0 vento de éter postulado por seus adversérios, ou a exp! car a corsio de cilindros de mérmore, ou ainda 2 sufocar pequencs ani mais © apagar velas, Hento dy» oid caren sin ora de um ferdreno produrdo artialente em wt agar fchadoe prot deo lboratoo, ronicamene aqua chave dos contatvisas-—e a LCD des ets ova nsalasio sue artificial da bomba de ar. O ni Jamais Foros N ‘matéria — jé que foram adequadamente exterminados —, mas sera preci so suportar esta nova claque de sabios que ira se meter a contestar a auto- ridade de todos em nome da natureza, invocando para isso acontecimen- tos de laboratério inteiramente fabricados! Se for permitido que as expe- ncias produzam suas ™. na bomba de ar, €2 pa 8 filosofia natural, entdo a autoridade es- tar dividida: 0s espi io navamente levar todos 4 rev a,a teologia, a politica cientifica, 2 ciéncia politica ea herme- junto descrevem como Deus deve reinar, como 0 COMO 05 espiitos ou os anjos devem ‘como se deve questionar a natureza, a, como manter a plebe portant eles: 1, tepartem as competéncias das coisa ima separacio entre a forea soc Este € todo 0 paradoxo modi hibridos, estamos apenas a separacio to ra. Ea celagio entre 0s dois processor que eu gostaria de compreender. Enquanto Boyle ¢ Hobbes metem-sc ambos em politica eligi eénicae morale ciénci e dieito cles eparsem as tareas Jamas Fomos Modernos 3s entre side forma que um se dos homens. Qual a relagio 4 ciéncia das coisas eo out 1a entre seus dois movimentos? Sera purificagao necessiria para permitir esta proliferaca0? Serao necessérias, centenas de hibridos para que haja uma politica simplesmente humana € coisas simplesmente naturais? Seré necessdria esta distingdo absoluta en ¢ 0s dois movimentos para que permanegam ambos eficazes? Como ex- cia deste arranjo? Qual éo segredo do mundo moderno? Para lo, & preciso generalizar os resultados de Shapin e Schaffer € definic a Consttuigio completa jé que Hobbes e Boyle escreveram ape- ras um de seus primeitos esbogos. ‘Como para qualquer Consttuiglo, é preciso medir as garantias que la oferece. O poder natural que os descendentes de Boyle dfiniram em ‘oposicio aos descendentes de Hobbes, e que pecmite que os objetos mu- dos falem com o auxilio de porta-vozes cientificos fikise disciplinados, oferece uma garantia capital: ndo slo 0s homens que fazem a naturezs, cla existe desde sempre e sempre esteve presente, tado que fazemos é des- tco que os descendentes de Hobbes es de Boye faz com que dversos anscendéncia nos esmaga jedade ¢ feta apenas pelos homens e para eles, o Levit da qual somos ao mesmo tempoa forma ea matécia, ‘capaz de se sustentar. Sua prépria ima- néncia ria dissipd-loimediatamence na guerra de cada um contra 080 Mas nao € separadamente que devemos considerar estas duas garantias cons tieucionais,a primeira assegurando a no-humanidade da nacureza ea segun- da, a humanidade do social. Flas foram criadas juntas. Sustentamn-se mu- twamente. A primeira ea segunda garantias servem de contrapeso mituo, de checks and balances. Elas si0 apenas dois ramos do mesmo governo, Othando-as em conjunto, e no em separado, isemos perceber que as garantias se inverter. Os descendentes de Boyle nao dizer apenas que as eis da natureza escapam a nosso dominio, eles também as fabricam no laboratério. Apesar de sua consteugdo artificial na bomba de vicuo —éa fase de mediacio ou traducio —, os fatos escapam totalmente 2 toda € qualquer fabricagio humana — é a fase de purificacio. Os descendentes de Fiobbes nao afirmam apenas que os homens criam sua propria socie- 36 Bruno Latour ddade 20s murros, mas também que o Leviatd é durdve e séido, imenso forte, que mobiliza 0 comércio, as invengGes, as artes, que o soberano tem em suas maos a espada de aco temperado ¢ 0 cetro de ouro. Apesar de sua construcio humana, o Leviaca ultrapassa infinitamente o homem {ue 0 criou, pois mobiliza em seus poros, em seus vasos, em seus tecidos as coisas inumeréveis que Ihe dio sua consistencia e duragio. E no entan- sar desta duracio obtida pela mobilizagdo das coisas e revelada pelo trabalho da mediacd0, somos nds e somente nés que o constituimos wi ‘camente pela forca de nosso céleulo, nés, pobres cidadios nus e desasm ‘dos — conforme ¢ demonstrado pelo trabalho de purificagio. Mas estas das garantias sio contraditérias, nfo apenas uma em re mas cada uma por si uma vez que fazer apelo ao mesmo i. Boyle e seus inumerdveissucessores tanto, sustentado pelas coisas —,e,em segundo lugar, a separacio total entre ‘ trabalho dos hibridos e o rabalho da purificasao. As duas primeiras g2- antias $6 sero comtraditérias enquanto a terceira nfo afasté-as para sempre uma da outra,fazendo de uma simetria por demasiado dbvia duasassimetrias contraditorias que a pratica resolve sem nunca poder expressar. Figura 2 PrimeiroParadoxo A manureeando é soma consrugio nore: A socedade é uma consruo nossa Ld ranscendente enoe lnapassa lad imanente 3 nostaa30 infstamente, Segundo Paradoxo Nés constr mea Nao constrains «sociedad panureza no lsboratario: ela € imanente. _cendente¢ nos utraparsinfiicamente Constinigto 1° garanas ind que sjamos ns parantia: anda gue no seemos ue comtruimora natures, ea funciona née que constrdras a ociedade, ela (Gomo s0 is no a consracom Freziona cam semis a consruseros, 5 paranias a natureca ea cacedade devem permarecer ‘ahsolutamente distintas,o trabalho de parca deve Permanecerabiolutamente ditnto do trabalho de mediag3o Jomais Fomos Modernos ‘muitos outros regulamentos paca compl ado pela disputa exemplar de Hobbes ¢ Boyle. Mas a estrutura do conjunto pode ser, agora, facilmente captada: es de conjunto irdo ‘a mudanga de escala dos modemos. Estes poderio fazer com que 2a intervenha em todos os pontos na construsio de suas socieda- des sem deixar, com isso, de atribuir-the sua transcendéncia radical po- derio tornar-se os tinicos atores de seu proprio destino politico sem di ar, com isso, de sustentar sua sociedade através da mol do outro, a imanéncia do socal nao ira impedir 0 Levit de continuar asec ranscendente. E preciso confessar que ma bela cons. tragio, que permite fazer tudo sem estar limitado por nada. Nao é de se estranhar que esta Consinigao tenha permitdo, como se dzia outora, “tiberar algumas forgas produtivas” ‘A QUARTA GaRaNTIA: & DO Devs SUFRIMIDO Era preciso, entretanto, evitar o restabelecimento de uma simetria demasiado perfeta entre as duas garantias da Consttuigdo, o que tei impedido 0 duo de tabalhar a todo vapor. Era preciso que uma quart garantia resolvesse a questio de Deus, afastando-o para sempre da da- pla construgdo social e natural, delxando-o ao mesmo tempo apresentd- vel eintercambiavel. Os suce refa com sucesso, 0s primeiros esvaziando a natureza da presenga fa, of segundos esvaziando a sociedade de qualquer origem divina. O poder cientifico “nao mais precisava desta hipdtese”; quanto aos pe 0s, podiam fabricar 0 “deus mortal” do Leviatd sem levar em conta 0 Deus imorel cujaE berano de forma figuratva, tar afastar Deus tanto do jogo das leis da nacureza qua Deus tomnou-se o Deus suprimido da metafisi physis ou quanto a sociedade o é do velho coletvo an- ‘ropotégico todo povoado por ndo-humanes. ‘Mas um afastamento demasiado completo teria privado os moder- nos de um recurso critico que Ihes permitiacompletar seu dispositivo. Os sémcos natureza€ sociedade estariam suspensos sobre o vazio sem que ninguém padesse decidir, em caso de conilito, qual dos dois ramos do governo deveria predominar sobre o outro. Pio ainda, sua simetria teria aparecido claramente. Os modernosaplicaram ao Deus suprimido 0 mes 38 Brano Latour mo desdobramento que haviam aplicado & nat transcendéncia 0 afastava infinitamente, de io live da ns ir o mundo mat irsse um 6rfd0 demiurgo abandonado por todos. Ao rei temas teol6gicos dos cristios, foi possi- vel colocar em jogo 20 mesmo tempo a transcendéncia de Deus e sua ima- inéncia. Mas este longo trabalho da Reforma do século XVI teria chega- ados muito diferentes caso nio se misturasse ao trabalho do sobre a invencao conjunta dos fatos cientificos © dos cida- dios (Eisenstein, 1991). A espiritualidade foi ceinventada, ita é, a teans- ccendéncia do Deus todo-poderoso no foro intimo sem que Ele intervies- se em nada no foro exterior. Uma religido totalmente individual e esp iticar tanto a dominagio da ciéncia quanto a da socieda- ‘obrigar Deus a intervir em uma ou na outra, Tornava- se possivel, para os modernos, serem a0 mesmo tempo laicos e piedosos. pays era dada por um Deus supremo, mas sim sma vez que era colocado duas veaes en 1a metafisica, uma segunda na parénteses. Uma fade. Nao mais atrapall a que fecha lidades. Nos ndo 08 a sociedade; n6s criamos a nat 165 ndo criamos nem uma nem outra, Deus criou tudos Deus no nada, nés criamos tudo, Quem nao percebe que as quatro garan: s servem umas as outras de checks and balances nada entende sobre ‘0s modernos. As duas primeitas permitem alternar as fontes de 40 passar sem dificldades da pura forca natural pura forca politica, ¢ inversamente, A terceira garantia impede qualquer cont tre aguilo que pertence a natureza e aquilo que pertence & pol ‘mesmo tempo em que as duas primeiras garantias permitem a alternan- cia entre uma e outra. A contradigio seria por demais visivel entre ater , que separa, ¢ as duas primeiras, que alterna belece com quarta garantia constitucional tamente distante que é 20 mesmo tempo completamente impotente ¢ juiz, saberano, Jamais Fomos Modornos » A modemidade no tem nada a ver com 2 invengio do humat com a icrupcio das ciéncias, com a laicizagéo da sociedade, mecanizagio do mundo, Ela é a produgdo conjunta dé transcendéncia ¢ imanénci moderno pararia imediacamente de funcionar, uma ver que ele vive da 0 tod A beleza do dispostivo surge ‘aqui em toda sa is oderna permite, pelo con- raga0 dos hibridos cuja existéncia — e mesmo a possibi idade — ela nega. Usando trés vezes seguidas a mesma alterndncia entre transcendéncia e imanéncia, é pe cbilizar a natureza, cosificar 0 social, sentir a presenca espiritual de Deus defendendo ferrenhamente, 20 ‘mesmo tempo, que a natureza nos escapa, que a sociedade é nossa obra e que Deus nao interfere mais. Quem teria res constru- ‘40? Foi realmente preciso que acontecimentos inusitados viessem enfra- quecer este possante mecanismo para que, hoje, eu possa descrevé-lo com esta distincia e esta simpatia de ernélogo para com um mundo em vias de desaparecimento, A Portnaia pa Critica cdamentadas dos preconceitos humanos. Ao aplicar seu padrio de sm nos antigos hibridos apenas indevidas que era preciso 2, separando os mecanismos nat ‘ou da ignorancia dos humanos. Todas as formas de pensar de outrora tor -ptas ou aproximativas. Ou, antes, a simples aplicagio da Constituigio moderna define um “outrora” absoluramente diferente do (wer abaixo). Oo tituido por uma aurora luminosa que separava claramente os encadeamen- tos naturais ea fantasia dos homens. As ciéncias naturais definiam a na- 0 rune Latour tureza cada disciplina foi vivenciada como uma revolugio total através fa qual ela se separava enfim do Antigo Regime. Ninguém € modemno se 4 beleza desta aurora e ndo vibrou com suas, ‘Mas a critica nao se dirigiu somente da ais. Solidamente apoiado pela ciéncia da sociedade, tornava-se pos- iveldistinguir nas outras ciéncias uma p: vel que era preciso purificar, separando cuidadosamente a parte que per- ' coisas em sie parte devida & economia, ao inconsciente, _guagem ou aos simbolos. Todos as formas de pensar de out cluidas certas ciéncias — tomaram-se ineptas ow aproxim: tes uma sucessio de revolugbes radi Por contraste, um “outro- oscuro que em breve seria dissipado pela aurora luminosa das cién- cias sociais. As armadilhas da naturalizacio e da ideologia cientifica se dissipavam, finalmente. Ninguém € moderno se nfo ansiou por esta auro- 1 e ndo vibrou com suas promessas. Tornou-se mesmo possivel aos invenciveis modernos combinar duas, tomando as c c is do poder e ‘car as falsas pretensées das ciéncias eda dom «stava, enfim, ao aleance da mao, Se o marxismo pareceu, durante um long foi porque na verdade cruzava os dois recursos mais 1 as esperancas das primeiras lu. ingo nevesséria entre os mecanis- 1, assim como a segunda dis- ‘ontes da indignacio moderna, ainda que nao possam 2 discussio como os marxistas fazia ncia, ou quem nunca foi rracional, entre falsos sabe- rese verdadeiras 7 ‘modeeno. Iamais Fomor Modermos 4a Ficura 3 Ponibidade Ponto derefeéasia Tranccondinca de natureca Nada podems contra a lets matrais Imanincia da natureza Possibiadesimitadar Imanincia da rociedade ‘Transcendence da socidade Solidamente apoiado sobre a certeza transcendental das eis da natu reza, 0 moderno pode criticar e desvendar, denunciar ese indignar frente Ascrengasieracionaise ts dominaséesnéo jstficadss. 5 sobre a certeza de que o homem consie6i seu pr sre desvendar, denunciar ese indigna de uma nacueza que nao obra nossa, bem como a inicaimanén sociadade que coasteuimos por completo, iiam no entanto pa modemnos, por demais impotents diant das coisas ¢ por des frente &sociedade. Que enorme vantagem poder inverter os prin destinos dos geupos socais. Inversamente, apesat jemos a sociedade por intiro, ela dura, ela nos ultra la tem suas les, é tio transcendente quanto a natureca, {que 08 laborat6rios, as colesGes, os centros de célculo e de | tos de pesquisa e os esritérios de desenvolvimento tragam diariamente oslimites da iberdade dos grupos socaisetransformam as relagdeshuma- nasemoisasduraveis que ninguém crow. Enesta duplainguagem que reside dos modernos: podem mobilzar a natorezano io da , percebemos agora o trabalho de densincia como urna “modalida- verdade, em nossas aividades, mas que no as ‘como a modalidade revolucionétia nao explicava o proces: so dos acontecimentos de 1789. Tanto a denna quanto arevolugdo en- contram-se hoje esgotadas. ski e Thévenot conclu este movimento peevisto segundo o qual es modemnos néo podem mais acusar com snceridade mas, contrarlamente a Girard les nao desdenham 10s. Para que o mecanismo sacificatorio funcione, era preciso que, do, sacrficado coleivamente por toda a multidio, fos fr possarn acca ans das enol de ess ! detodoe qualquer nndo o de reconci bode expiats ado, sem qualquer mosivo que ‘A passagem do sacrificio ao ‘odenunca poder acusar sincera Mas Girard nao percebe que uma vez que acusa os obj imaginarmos que nossos: Thévenor, esgotam para sempre nossa capacidade de acusaz, Mas prolon- {gam ainda mais esta tendéncia dos modernos de desprezar os objetos —e Giraed profere esta acusacao com toda sinceridade, acreditando de fatonela « enxergando neste desprezo adquirido a duras penas a m: ‘20 mesmo tempo em que fazem do objeto envolvide nas provas do julgamento o centro de suas andlises. Jamsis Fomas Medernos ° Sob ojulgamento moral por deniincia, hé outro julgamento que sem pre funcionou por triageme ‘mas também de negociagio ou consenso. Péguy dizia ral ficial despreza os consensos préticos eos objetos que a sustentam. Sob 1 oposigao dos objetos e dos sujeitos, hé o turbilho dos mediadores. Sob 1 grandeza moral, hé a triagem meticulosa das circunstdncias © dos casos. Jantats Fomos MopeRnos Posso agora escolher: ou acredito na Constituigio moderna, ou en- to estudo tanto o que ela permite quanto 0 que proibe, o que ela revela e 0 que esconde. Ou defendo o trabalho de purificagio — e me torno tam= bém um purificador ¢ um vigilante da Constieuicdo —, ou entao estado tanto 0 teabatho de mediagio quanto o de purificagdo, mas entao deixo de ser realmente moderno. ‘Ao acreditar que a Constituigao moderna nao permite sua prépria compreensio, a0 me dispor a revelar as priticas que permitem sua exis: tEncia, ao assegurar que 0 mecanismo crtico se encontra agora esgotado, ajo como se entréssemos em uma época nova, sucessora da era moderna. Eu seria enti imente, pés-moderno? O pés-modernismo é um sin- toma e no uma nova solugdo, Vive sob a Constituigio modema mas no acredita mais nas garantias que esta oferece. Sente que ha algo de erzado ‘com a critica, mas nlo sabe fazer nada além de prolongar a critica sem no entanto acreditar em seus fundamentos (Lyotard, 1979). Ao invés de pass sat para o estudo empirico das redes, que dé sentido ao trabalho de pari= fieagdo que denuncia, o ps-modernismo rejeita qualquer trabalho empirico como sendo ilus6rio e enganador. Racionalistas decepcionados, seus adep- 10s sentem claramente que © modernismo terminou, mas continuam a ‘© tempo ¢ nio podem, portanto, recortar as as outras, so Brune Latour réncias e denincias sem fundamento, uma vez que 0s pés-modernos nao ue Ihes petmitiriam denun« tio que jamais foros modernos no sentido da Const nidade jamais comecou. Jamais houve um mundo moderno. O pretérito & importante aqui, uma vez que se trata de um sentimento retro sno continuamos a fuga t Wo nos agarramos mais a vanguarda da vanguarda; nd tentamos ser ainda mais espertos, ainda mais crticos, aprofundar mais um pouco aera da desconfiansa, Nao, pereebemos que nunca entramos na era mode! Esta atitude retrospectiva, que desdobra a0 invés de desvelar, que acres centa a0 invés de amputar, que confraterniza ao invés de denunciar, eu a caracterizo através da expressio no moderno (ou amoderno). F um no. aguele que levar em c ituigao explicava tudo mas esquecia tudo que estava no mei ““Nio € nada, nada mesmo”, dizia sobre as redes, “um simples residuo” ‘Mas os hibridos, 0s monstros, os mistos cuja explicacdo ela abandona s30 ‘quase tudo, compdem niio apenas nossos coletivos mas também os abusivamente chamados de pré-modernos. No exa

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