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capitulo 8 ConstrRuCcAO DE UM SISTEMA DE INTELIGENCIA COMPETITIVA Elisabeth Gomes e Fabiane inteligéncia competitva 6 uma area cada vez mais demandada dentro das orga- nizagbes, em razéo do aumento crescente da competitividade. As organizagées precisam estar alertas 20 que acontece em seu meio ambiente competitivo, de forma a nao ser surpreendidas pelas acbes dos diversos atores que hoje influ: ‘enciam os seus negécios. Para que esse monitoramento aconteca de forma sistemitica e ética, é necesséria 2 reformulacdo na forma atual de identificagdo das necessidades de informacées estratégicas das ‘exganizacbes, de seu modo e ritmo de coleta, dos métodos de andlise e principalmente da disseminaczo, ‘501s 05 produtos de informaco tém de chegar ao tomador de deciso de forma correta e na hora certa 5212 apoiar a tomada de deciséo. Tépicos centrais = Inteligéncia competitiva e estratégia = Contra-inteligéncia competitiva * Euisapera Gours é mestra em planejamento energético e doutora em engenharia de producao, na area de gestio do conhecimento e inteligéncia competitiva, pela Coordenacio dos Programas de P6s-Graduacio em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (COPPE/UFRJ). £ professora de pés-graduacao lato sensu em inteligéncia empresarial da COPPE/UFRJ, da Escola Superior de Propa- ganda e Marketing e colaboradora do Centro de Referéncia em Inteligéncia Empresarial - CRIE/UFRJ. Desenvolveu varios trabalhos na area de inteligéncia competitiva e gestio do conhecimento em empresas piiblicas e privadas, Durante 15 anos trabalhou como analista de informagao no CIN - Centro de Informagoes Nucleares - da Comisséo Nacional de Energia Nuclear. Em 2001, publicou como co-autora dos livros Inteligéncia competitiva: como transformar informacao em um negocio lucrative e Gestdo de empresas na sociedade do conhecimento, ambos pela Editora Campus. Em 2003, escreveu o capitulo 9 do livro Gestdo de empresas na era do conhecimento, editado em Portugal. Faniaxe Braca € mestra em ciéncia da informacao pelo Instituto Brasileiro de Informagio em Ciéncia e Tecnologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IBICTIUFRJ) com graduagio em informatica pela Pontificia Universidade Catdlica do Rio de Janeiro (PUCIRJ). Professora do MBA de Gestio Estratégica da Tecnologia da Informacdo da Fundagao Getilio Vargas e do MBA em Gestdo da Informacao ¢ Inteligéncia Competitiva da Estacio de S4. Participou de projetos de implantacao de areas de inteligencia competitiva em diversos setores. Co-autora do livro Inte- ligéncia competitiva: como transformar informacdo em um negécio lucrativo, 2001, da editora Campus. Em 2003 escreveu 0 capftulo 9 do livro Gestdéo de empresas na era do conhecimento, editado em Portugal. Durante 13 anos trabalhou no CIN — Centro de Informacoes Nucleares - da Comissdo Nacional de Energia Nuclear, como analista de sistemas, na érea dé desenvolvimento de sistemas de informagao, 1 CCONSTRUGAO DE UM SISTEMA DE INTEUIGENCIA COMPETITIVA 0 CGESTAO ESTRATEGICA DA INFORMA Seguranca de informacao Inteligéncia competitiva e ética Perfil dos profissionais de inteligéncia competitiva Etapas de um sistema de inteligéncia competitiva Introdugao Nos tltimos anos, tem havido um crescente reconhecimento de que 0 relacionamento sintonizado entre a organizacdo e o seu ambiente de negécios tem influéncia direta no crescimento e desenvolvimento da organizagao junto ao mercado. A identificacao clara das ameacas e oportunidades que o ambi- ente apresenta, no apenas para a propria organizacio, mas também para seus concorrentes diretos, e a obtencéo do conhecimento acerca das forgas ¢ fraquezas desses mesmos concorrentes contribuem de forma significativa para um planejamento estratégico adequado a essa nova perspectiva. Essa certeza se torna cada vez mais presente em um mundo em que as mudangas ocorrem em ritmo acentuado e as informagées trafegam em velo- cidade e volume crescentes. O século XI é caracterizado por mudancas de paradigmas, e nele a informacao, com qualidade e preciso, passa a ser um diferencial na corrida para a obtengo de uma vantagem competitiva. A inteligéncia competitiva assume um papel estratégico importante dentro do processo de obtencao, pela organizacao, de um conhecimento continuo, e cada vez mais preciso, de seu ambiente de negécios, que é composto de variaveis de natureza politica, social, econdmica e tecnolégica, como podemos ver muito claramente na figura 1. A proposta deste trabalho é apresentar, de maneira objetiva e simples, a metodologia de construgo de um sistema de inteligéncia competitiva, seus beneficios e possfveis desafios. CTT uss Le. ON ¢ Celi = s S = "7 es 2 Z cd ee =. Z 5 aren = BS 7 yee aed ly, ~ @2 RS Ed (ra & o SS Shel) Ficura 8.1: Ambiente de negécios. © processo da inteligéncia competitiva A implantagao de um sistema de inteligéncia competitiva altera a cultura de uma organizacao, pois altera a hierarquia de poder. Por ser um sistema que trabalha diretamente com andlise de informagées, ele possui um enfoque diferente dos sistemas tradicionais da organizacao. E necessdrio preparar adequadamente a organizagao para as mudancas culturais e estruturais, em vista de que as atividades do sistema de inteligéncia competitiva nao sejam mal interpretadas, nem interrompidas. Partindo do objetivo do sistema, que € fornecer informagio estratégica de alto nivel, informagao analisada, para apoiar © processo de tomada de decisdo, devemos conhecer a organizagao e fazer com que ela conhega o sistema que vai receber. A seguir apresentaremos cada uma das etapas de um sistema de inte- ligéncia competitiva, suas atividades, objetivos e obstaculos. Sao cinco as etapas que compdem um sistema de inteligéncia competitiva: Identificagao das necessidades de informacao; Coleta e tratamento das informacées; Anilise final da informacao; Disseminagao da informacao; Avaliagao. ae eee Etapa 1 - Identificagdo das necessidades de informagdo Esta etapa é a mais importante para o desenvolvimento do sistema, pois identificara quais so as necessidades de informagio que o tomador ou os tomadores de decisdo, neste caso, clientes do sistema de inteligéncia com- petitiva, tém. Uma vez identificadas, essas necessidades de informagao gerarao as chamadas questées relevantes que seraéo constantemente monitoradas pelos integrantes do sistema de inteligéncia. Uma das formas mais faceis de identificar essas necessidades de infor- magao é fazer ao tomador de decisdo as seguintes perguntas: Quais decisées precisam ser tomadas? O que vocés precisam saber? © que vocés jé saber? Por que vocés precisam saber disso? Quando vocés precisarao saber disso? © que farao com a “inteligéncia” gerada, uma vez obtida? Quanto custara obté-la? Quanto poderia custar nao obté-la? Essas questées, embora paregam simples e ébvias, despertam no entre- yistado a importdncia do foco da resposta. Neste texto, nado vamos explicar sécnicas de entrevista, mas € importante para a efetividade de um sistema de inteligéncia competitiva que as entrevistas sejam focadas. A primeira 3 ‘CONSTRUGAO DE UM SISTEMA DE INTELIGENCIA COMPETITVA GGESTAO ESTRATEGICA DA INFORMACAO etapa dessa fase inicia-se por uma entrevista individual com os tomadores de decisao e quem mais for indicado como relevante ao processo. Na entre- vista identificam-se o risco de decisées pendentes, preocupagées mais impor tantes com os agentes externos, as vigilancias a serem monitoradas; e ob- tém-se opinides sobre possiveis surpresas. Em seguida, a entrevista é anali- sada, para certificar-se de que as necessidades de informacao solicitadas foram bem entendidas. Numa segunda entrevista, validam-se os enunciados junto aos usuarios do sistema, avaliando se 0 escopo do trabalho a ser reali- zado contempla a necessidade de informacéo para as decisées que serao tomadas. Nossa experiéncia prdtica aponta que devemos fazer no maximo trés entrevistas por usudrio. Principais dificuldades encontradas nessa etapa: « Falta de comprometimento dos entrevistados. Esta dificuldade é maior quando estamos lidando com altos executivos que nao conseguem tempo em suas agendas para as entrevistas iniciais, mesmo que estejam apoiando 0 projeto. « Falta de preparo dos entrevistadores. E preciso ser bem objetivo e claro na condugao de uma entrevista para que ela atinja 0 seu objetivo. Etapa 2 - Coleta e tratamento das informagées Esta etapa identificara quais as fontes de informagdo mais relevantes e mais titeis para auxiliar a resposta das questées relevantes identificadas na etapa 1. Partindo das necessidades de informagao ¢ das vigilancias' identifi- cadas, deve-se planejar a agao identificando a estratégia de busca, as fontes que serao usadas (primérias ou secundérias; formais ou informais?) e definir se sera contratada uma empresa especializada em coleta ou se sera uma tarefa realizada pela equipe do sistema. Esta decisio depende basicamente dos recursos humanos e financeiros alocados para o projeto. Essas fontes e as informagGes coletadas devem ser classificadas quanto a sua confiabilidade. Diversas vezes, encontramos e usamos fontes de informagéo com pequena confiabilidade, mas que possuem dados e informagées publicados que foram coletados de fontes com grande confiabilidade. Todos os dados e informacées coletados sAo considerados inteligéncia bruta e necessitam ser trabalhados para poder crescer em valor. Antes de " Vigillincias sdo setores externos & organizagaio nos quais servio mapeadas e coletadas as informagées relevantes a0 negécio, ou seja, aquelas que irvio responder as cha- madas questdes relevantes, identificadas na fase 1 do sistema de ic. Para maiores detalhes procure o livro Inteligéncia competitiva — Como transformar informagoes. em uum negécio lucrativo, de Elisabeth Gomes ¢ Fabiane Braga, Rio de Janeiro: Campus. 2 Quanto ao conteddo: fontes primarias — dados inalterados vindos diretamente das fontes (ex: clientes, consultores, fornecedores etc.); fontes secundédrias: contém dados que j4 sofreram algum tipo de interpretagdo/andlise prévia. Quanto a estru- tura: fontes formais ou textuais — informagao estruturada; fontes informais — nao estruturadas e geralmente externas as organizacoes. sua andlise e utilizagdo, é importante sua organizagao, classificagao ¢ indexagao segundo terminologia pertinente. Desta forma, a recuperagao de informagées que j4 tenham sido tratadas se dar de forma mais eficiente. Por isso, é importante que, a partir dos elementos identificados na etapa 1 (identificagéo das necessidades de informagao), sejam definidos os ter- mos, linguagem e estratégias de pesquisa. Essa tarefa poder ser auxiliada pelo uso de tecnologias de informagao mediante um software especializado. Principais dificuldades encontradas nesta etapa « Falta de confiabilidade das fontes. Muitas vezes, a urgéncia nao per mite validar com confianga a informagao obtida ou a fonte utilizada. * Falta de recursos financeiros. Obter a informacao de que se necesita muitas vezes custa caro, pois € necessirio fazer assinaturas de bases de dados, de revistas, de jornais, comprar relatérios de consultoria, participar de feiras, exposigdes, congressos etc. Etapa 3 - Anilise final das informagdes Esta fase denomina-se “gerador de inteligéncia”. Nesse ponto, 0 analista transforma as informagées coletadas em uma avaliagdo significativa, com- pleta e confiavel. A andlise é um resumo ou sintese no qual sao apresen- tadas conclus6es sobre o assunto que esta sendo pesquisado. E a fase critica para a criagdo da inteligéncia, pois requer analistas com habilida- des especificas e que sejam especialistas no assunto pesquisado. Cabe enfatizar que por mais automatizado que seja 0 processo, apenas © raciocinio humano é capaz de avaliar a real relevancia e credibilidade das informacées e agregar valor & sua formatagao final. Os modelos de andlise de informagao sdo em sua esséncia apenas estru- suras que comportam dados e informagao. Nada substitui a capacidade huma- na de pensar ¢ juntar todos estes itens numa solugao completa para 0 pro- blema que esta sendo investigado. Miller (2000) diz: “Os modelos so étimas ferramentas para se fazer boa andlise. Mas eles ndo sao substitutos para pessoas com mente aberta, curiosidade e com habilidade de coleta de dados” Para que a andlise possa dar resultado, ela deve ter seu foco muito bem definido. Nao se devem analisar informagdes que parecem importantes, mas que no fundo nao dizem respeito ao real objetivo. A anilise deve recair sobre a inteligéncia de que vocé ir precisar para somar as decisées estratégicas. O propésito da andlise competitiva Nso € aprender sobre os competidores ¢ sim OFERECER ALTERNATIVAS para a tomada de decisdes e de acées. E aqui nés voltamos a ressaltar a importancia da primeira etapa do nosso sistema, quando as necessidades de informagao sSo definidas, isto é, 0 tomador de decisao precisa passar para o analista, da forma mais completa que puder, quais questdes relevantes devem ser respondidas para apoiar a sua tomada de decisao. 5 DE UM SISTEMA DE INTEUIGENCIA COMPETITIVA onsTRUGAO GESTAO ESTRATEGICA DA INFORMACAO Metodologias de andlise A literatura aponta intimeras metodologias que podem auxiliar na ana- lise da informagao. E importante que as pessoas envolvidas nessa etapa sejam nao apenas conhecedoras, mas usuarias freqtientes das metodologias de andlise existentes, que devem ser usadas de acordo com o tipo de questdo a ser respondida. A seguir, apresentaremos os métodos mais usa- dos, com uma breve descrigéo, uma vez que nao é objetivo deste capitulo explorar a fundo esas metodologias. « Modelo das 5 forgas de Michael Porter O modelo das cinco forgas de Porter auxilia na andlise do ambiente com- petitivo. Auxilia na identificagao da vantagem potencial de um setor, verifi- cando as suas forgas e antecipando proativamente mudangas na sua estrutu- ra. Deve ser usado para analisar informagées relativas aos concorrentes’. = Fatores criticos de sucesso O método dos fatores criticos de sucesso é utilizado para avaliar dois tipos de atributos: a atratividade da industria e a forca do negécio. O analista plota os varios fatores que afetam a industria e o negécio, atribuin- do a cada um deles um valor crescente de 1 a 5. Calcula-se a média dos valores e 0 negécio é organizado em uma matriz. Esta matriz é projetada para avaliar as forcas de determinado negocio, mas também é uma ferra- menta eficaz para comparar concorrentes em uma industria, = Cendrios Sao um método utilizado para fazer previsdes (situagdo provavel, posi- tiva e negativa) de tendéncias para as variaveis do ambiente externo que exercem forte impacto sobre o desempenho da organizago, foram identi- ficados durante a andlise estratégica. = Perfil do concorrente Fornece um quadro das forcas e fraquezas dos potenciais ¢ atuais con- correntes. Tem quatro grandes objetivos: identificar os planos estratégicos dos concorrentes, predizer quais serao as reagdes dos concorrentes frente As iniciativas competitivas, determinar como melhor agrupar as estratégias atuais dos competidores e entender as fraquezas dos concorrentes. = Benchmarking E 0 método de avaliar quao bem as fungdes e habilidades de uma orga- nizagao estao sendo desempenhadas em comparacao com outra organizacao ou um conjunto de organizagées. Seu objetivo principal é entender comple- tamente as “melhores praticas” de outras organizagées e empreender agdes para atingir tanto o melhor desempenho quanto os menores custos. * © modelo das cinco forgas de Porter est descrito no livro Estratégia competitiva. Técnicas para andlise de indistrias e da concorréncia. Rio de Janeiro: Campus, 1986. « SWOT Essa técnica analisa a capacidade interna da organizagao (forgas e fra- quezas) e sua posicdo em relacdo aos concorrentes (ameacas e oportunid: des). A capacidade interna tem como finalidade apresentar as deficiéncias e as qualidades da organizacao que est sendo analisada, considerando sua atual posicdo produto-mercado. Essa andlise deve considerar as organiza- gdes do mesmo setor de atuacio, sejam elas consideradas concorrentes diretas ou apenas potenciais. A andlise externa tem como objetivo estudar a relacao que existe entre a organizagao e o ambiente no qual ela esta inserida, mostrando as oportunidades e as ameagas em termos de produto e de mercado atuais e futuros. Com essa ferramenta, podemos identificar na andlise quais fatores devem ser atacados para melhorar nosso negécio. Principais dificuldades encontradas nesta etapa: » Treinamento em metodologias de andlis téncia por parte dos analistas; = Falta de sensibilizacao quanto A importancia da tarefa por parte de colaboradores de outras area da organizagao, que pensam ser esta uma atividade menor. que exige tempo e persis- Etapa 4 - Disseminagdo do produto de inteligéncia Esta fase envolve a entrega da informagéo analisada, ou seja, a inteli- géncia, em um formato coerente e convincente, aos tomadores de decisio. Este formato é 0 que denominamos produto do sistema de inteligéncia competitiva. A palavra-chave aqui é “convencimento”. Na disseminagao da inteligéncia, alguns pontos importantes devem ser considerados: tema de = Defini¢do de mecanismos de distribuigao dos produtos do inteligéncia competitiva, cuja responsabilidade é dos analistas de informagao. Estes mecanismos sao definidos em conjunto com o usudrio e de acordo com suas necessidades. Podem ser relatérios customizados, apresentagdes, andlises setoriais, boletins etc. = Definicdo da linguagem, forma e facilidade de acesso do produto do sistema. Os formatos dos produtos sio definidos segundo as necessi- dades dos usuarios do sistema. Duas formas de dissemina¢g’o sdo consideradas: disseminagao focada, que acontece quando determinado usudrio ou grupo de usuarios solicita um tipo de informagao espect: fica; e a disseminacao geral, que acontece quando a inteligéncia é disseminada para toda a organizagao sem um usuario especifico. = Definigéo da freqiiéncia de envio dos produtos aos clientes; = Credibilidade da andlise, que depende da credibilidade das fontes de informagao coletadas. Principais dificuldades encontradas nesta etapa » Falta de periodicidade dos produtos, que fatalmente deixara o siste- ma de ic em descrédito. 7 ENCIA COMPETITIVA CCONSTRUCAO DE UM SISTEMA DE INTELIG EICA DA INFORMACAO GEsTAo EsTRATE Etapa 5 - Avaliagdo Esta etapa tem como objetivo avaliar se o sistema criado foi eficiente do ponto de vista da produgao do produto de inteligéncia e quanto a eficiéncia deste produto para o tomador de decisio. Logo, devem ser avaliados sob dois aspectos: o primeiro diz respeito ao desempenho de cada uma das fases que compéem o sistema, isto é, se o melhor método de andlise foi escolhido, se a escolha das fontes de informagao poderia ter sido mais bem direcionada, se 0 formato do produto foi o mais ade- quado etc. O outro aspecto € a avaliagdo junto aos usuarios do sistema dos resultados praticos obtidos com 0 uso dos produtos gerados pelo sistema. Estas duas avaliag6es so imprescindiveis tanto para o aprimo- ramento do sistema quanto para sua sobrevivéncia, pois 0 processo de inteligéncia competitiva s6 se consolida e transforma em inteligéncia se seus resultados sao utilizados para a tomada de decisdo. Caso 0 processo termine na disseminagao, a organizagao ter4 somente adquirido informa- do, uma vez que a inteligéncia sé ocorre quando os resultados do pro- cesso sdo utilizados na definigado das agdes organizacionais. E importante ressaltar que as avaliagdes do sistema estao interligadas, mas sao distin- tas em seus objetivos. Além disso, é essencial a verificagao freqiiente da adequagao do produ- to de inteligéncia competitiva disseminado com as necessidades reais de informagao da organizagao. Mas como fazer isso? Mediante: = pesquisas pontuais sobre a satisfagao dos usuarios com os produtos recebidos; = avaliagdes econdmicas (indicadores) dos resultados obtidos com de- cisdes tomadas com base na inteligéncia adquirida, tais como produ- tividade, redugao de custos, investimentos em inovagao e qualidade etc.; = discussdes internas no ambito da equipe de inteligéncia competitiva, com o objetivo de analisar e melhorar cada etapa do sistema. E importante que nessa etapa haja clareza no processo de avaliagao, ou seja, que os indicadores determinados sejam adequados, entendidos e dis- seminados juntos aos participantes do sistema de inteligéncia competitiva. Para completar nossa metodologia, criamos um instrumento simples de avaliacao dos resultados praticos obtides com o uso dos produtos gerados pelo sistema, denominado formulario de avaliacéo das informagées compe- titivas. Este formulario possui questées abertas e é periodicamente envia- do aos usudrios do sistema. As informagoes registradas neste documento sao analisadas pela equipe de inteligéncia competitiva e transformadas em mtimeros que permitem avaliar e aperfeigoar o sistema. Cabe ressaltar que a avaliagao do produto de inteligéncia em relagdo a tomada de decisao ou agdio é qualitativa, ou seja, subjetiva, uma vez que esta atrelada a resposta do usuario final. Esta tiltima fase detém a questao mais discutida nas organizacoes, quando se avalia a implantacdo, ou nao, de um sistema de inteligéncia competitiva, que é saber exatamente o quanto financeiramente retornou ou retornaré 0 investimento feito na construgdo do sistema. Nao ha ainda formula pronta que nos ajude a avaliar quantitativamente o retorno de uma informagao gerada pelo sistema de inteligéncia competitiva. Muitas vezes, o bom senso é a melhor safda. Mas pensando melhor, pergunte a vocé mesmo, quanto vocé perderia por nao ter esse produto de inteligéncia? A inteligéncia competitiva, hoje, nas organizacdes Hoje em dia, é essencial para as organizagdes que desejam sustentar suas vantagens competitivas estarem alertas para as mudangas que ocor- rem no seu mercado. Por isso a atividade de inteligéncia competitiva se mostra tio importante dentro do processo decisério. Mais especificamen- te, os profissionais da area de inteligéncia, por meio de suas andlises, devem ser capazes de apoiar o planejamento estratégico da organizacaio na identificagdo de mercados potenciais, no desenvolvimento de novos produ- tos, no planejamento de fusdes e aquisicées, nas antecipagdes de mudan- ¢as no setor e nas estratégias dos concorrentes, na identificagio de novos e potenciais concorrentes, em descobrir parceiros potenciais e na identi: ficagdo das forcas e fraquezas do concorrente. Algumas organizagées pioneiras, demonstrando visio de futuro, implementaram as suas dreas de inteligéncia competitiva, independente- mente de opinides nado muito favordveis e tiveram como recompensa pro- dutos de inteligéncia extremamente valiosos que as auxiliaram em suas decisdes e conseguiram evitar gastos desnecessarios. Por exemplo: todos sabem que o mercado de telecomunicagées é extre- mamente competitivo e dinamico. Um caso pratico que ajuda a compreen- der como as organizagées estao colhendo frutos a partir de seus sistemas de inteligéncia competitiva é 0 da CTBC, empresa de telefonia do Grupo Algar que opera na regiao do Triangulo Mineiro e no interior de Sao Paulo - Brasil. ‘A CTBC é uma das raras operadoras do pais que, em uma tinica regiao, disputa um lugar ao sol em trés dreas distintas de telefonia — fixa, mével e de transmissao corporativa de dados. Em seu depoimento a revista Ama- nha (Muller, 2002), os profissionais da CTBC dizem como funciona essa area: femos uma metodologia de pesquisa que permite mapear novas opor- tunidades de negécios”, conta Monteiro. Certa vez, lembra, 0 grupo con- seguiu apontar as redes de supermercados mais inclinadas a adotar alguns dos servicos corporativos que a empresa oferece. Em outra ocasiao, o departamento aconselhou os executives da companhia a retirarem do 119 sENCIA COMPETITIVA CCONSTRUGAO DE UM SISTEMA DE INTELIG 120 GGESTAO ESTRATEGICA DA INFORMAGAO mercado um dos planos de assinatura de telefonia celular mais populares. A medida poupou a CTBC de gastar dinheiro em um produto que estava prestes a ser ultrapassado pela concorréncia. “Detectamos que uma ope- radora iria langar um plano semelhante, mas de menor custo que 0 nosso. E foi o que aconteceu”, lembra Monteiro. A Renault tem o foco de seu trabalho de inteligéncia competitiva direcionado a analisar os diversos mercados em que ela est4 presente. Aqui no Brasil esse trabalho foi coordenado pelo CRIE - Centro de Referéncia de Inteligéncia Empresarial da COPPE/UFRJ, que coletou e analisou infor- magées sobre as vigilancias comerciais, tecnolégicas, legais e sociais que impactam 0 negécio da organizagao. Como produto final, essas anélises foram inseridas em uma base de dados para consulta pelos técnicos ¢ tomadores de decisao da organizacao. Vale lembrar que um sistema de inteligéncia competitiva pode ser implementado em organizagées de pequeno, médio ou grande porte. O SEBRAE iniciou um trabalho inovador nessa drea, criando nicleos de in- teligéncia competitiva para apoiar micro e pequenas empresas de diferen- tes setores. O primeiro setor a ser atendido nessa linha é 0 das farmacias de homeopatia e manipulacao, com cerca de 160 integrantes. Este nticleo esta estruturado para atender as necessidades de informagao das farmé- cias no que tange as seguintes areas de interesse: mercado (fornecedores, concorrentes etc.), legislagéo, padronizagao, informagées técnicas, mao- de-obra. O que importa é estar alerta. Etica e legalidade em sistemas de inteligéncia competitiva E fundamental que as pessoas envolvidas na drea de inteligéncia com- petitiva estejam conscientes de que a obtengdo de dados deve ser feita da forma mais ética e transparente possivel: dados ou informagées confiden- ciais ou classificados pelo governo ndo devem ser usados; no se deve obter informagées confidenciais sob falsa alegacdo, usar informacao que possa interferir na privacidade das pessoas ou violar leis antitruste etc. A maioria da informacao de que voeé precisara é de dominio publico e sua obtengao pode ser feita de forma ética e legal. Mas como muitos advogados irao Ihe dizer, o que é legal nem sempre ¢ ético. As leis variam de estado para estado e de pafs para pais, mas elas existem e seus limites sao claros. Contudo, os limites éticos podem tornar-se perigosamente confusos. E. facil discutir e definir limites legais sobre 0 tipo e o modo de coleta da informagdo que deve ser conseguida. A ética pessoal varia enormemente e freqiientemente envolve muito mais a decisdo do individuo do que a do grupo. Todas essas medidas so imprescindiveis para que a atividade de inteligéncia competitiva nao seja vista como uma espionagem formalizada. Devemos nos preocupar com a ética, pois a reputacao da organizagao pode ser afetada caso sejam comprovadas falhas éticas. Ao definirmos previa- mente padrées éticos de comportamento, estaremos preparados para res- ponder a criticas futuras. Fuld (1995) diz, e nés concordamos, que cédigos formais de ética s6 sao liteis se forem lidos e, para que isso ocorra, a organizagao precisa estabelecer um cédigo de facil entendimento e estar sempre preocupada em divulgé-lo. A preocupagao com os meios de coleta de informagées nos leva a um outro ponto sobre o qual gostarfamos de refletir. Nao se engane em achar que apenas vocé esté monitorando os concorrentes. Eles também estao de olho em vocé. Quando uma organizacao, seja ela de que natureza fo resolve investir esforgos na construgao de um sistema de inteligéncia competitiva, ela se dé conta de que, da mesma forma que os seus concor- rentes deixam pistas para serem seguidas, ela também pode estar deixan- do tragos visiveis de sua atuacao. Assim sendo, quando se estabelece um sistema desta natureza também se faz um trabalho paralelo para controlar a evasdo de informagées estratégicas de dentro para fora da organizacao. Citemos 0 exemplo da Petréleo Ipiranga S/A, que em 1993 negociou a compra da Atlantic sem que o mercado tomasse conhecimento ou descon- fiasse do fato. Isso foi conseguido gragas & circulacao restrita de informa- goes. Apenas 15 pessoas, entre acionistas e executivos de alto escalao, sabiam © que significava o misterioso projeto Med, cédigo utilizado para resguardar a compra da Atlantic. Essa estratégia é freqiientemente usada na companhia. Na preparagao de um projeto, cada grupo envolvido sé tem acesso a dados sobre sua area especifica, Se algo vazar, é possivel fazer um rastreamento e localizar a origem da indiscrigao* Algumas companhias j4 adotam medidas para impedir 0 vazamento de informagoes. Elas vao desde cliusulas de confidencialidade nos contratos com os funcionarios e fornecedores, passando pela restric&o de acesso a determinados locais dentro da organizagao, até a restrigo de acesso a infor- macoes sigilosas. Funciondrios e executivos podem se transformar, mesmo que involunta- riamente, em informantes dos concorrentes. E importante que as organi- zag6es treinem seus funcionarios na pratica de determinados habitos de seguranga (destruir papéis importantes, nao falar ao telefone sobre assun- tos sigilosos etc.) e no estabelecimento de vinculos estreitos entre si. Quando © funcionario se sente comprometido com a organizagao e vice-versa, nado se sentira tentado a quebrar a relago de confianga. Longe do ambiente de trabalho, em viagens ou congressos, as pessoas tendem a relaxar. E podem deixar vazar alguma informagao importante para agentes da concorréncia, que ‘costumam usar esse tipo de eventos para se aproximar dos funciondrios de uma empresa-alvo. Muitas vezes, a *Informagao retirada da revista Exame, de julho de 1997. CCONSTRUGAO DE UM SISTEMA DE INTELIGENCIA COMPETITVA sTEGICA DA INFORMAGAO GESTAO ESTRAT organizagdo interessada em conhecer melhor © seu concorrente contrata um instituto de pesquisas para buscar os dados necessarios. Ou seja: vocé pensa que esta sendo entrevistado para uma pesquisa sobre 0 panorama econémico latino-americano, mas pode estar deixando vazar dados precio- sos para seus competidores no mercado interno. Existem, porém, situagées sobre as quais nao se tem controle. Ex-exe- cutivos, em particular os insatisfeitos, podem se transformar em fonte de informagoes preciosas para os concorrentes. O desenvolvimento tecnolégico também permite bisbilhotices que ndo sao ilegais. Hé organizagdes que vendem fotos de satélites com alta definigao. Com elas, é possivel, por exemplo, verificar 0 movimento de caminhdes no patio de uma organiza- cdo ¢ ter indicios de como anda a atividade de uma fabrica. Nao se esqueca de que a maior parte das informagdes com as quais os analistas de inteligéncia competitiva trabalham sao publicas, néo necessaria- mente estao publicadas ¢ se encontram em balangos, relatérios de bancos, publicag6es internas, jornais, revistas, rumores, internet, fornecedores etc. 0 trabalho da equipe de inteligéncia competitiva consiste em reuni-las, ela- borar suposigées com comprovagao e dissemind-las as pessoas certas. Conclusao Todas as organizagdes tém de estar sempre alertas ao que acontece a sua volta, no importando a qual setor pertengam. Monitorar o proprio ambiente de negécios é fundamental para o sucesso da estratégia adotada. Por meio do seu desempenho em descrever 0 ambiente competitivo, deve-se prospectar 0 ambiente competitivo futuro, desafiar as suposigdes vigentes, identificar as fraquezas e buscar formas de compensacao, ajustar a estratégia as mudangas do ambiente e determinar quando a estratégia nao sera sustentavel em longo prazo. A inteligéncia assume seu papel de insumo critico para a estratégia, tornando-se um diferencial na competicdo entre as organizacées. A fun de um sistema de inteligéncia sera de modo continuo, legal e sistematico coletar, tratar, analisar e disseminar, em tempo habil, essas informages analisadas sobre 0 ambiente competitivo para apoiar uma tomada de decisao. Ao identificar os sinais que 0 mercado envia (pode ser qualquer acéo que um concorrente ou outro player importante tomem, fornecendo uma indicagao direta ou indireta de suas intengdes, motivos ou metas), o sistema se torna um instrumento estratégico de apoio a gestao que alteraré a maneira como as organizagées lidam com o mundo. Questdes para aprendizagem e reflexao 1. A ética deve ser um fator relevante para dar credibilidade a um sistema de inteligéncia competitiva. Qual a sua opiniao sobre isso? 2. Sua empresa se preocupa em nao deixar que informagées sigilosas sejam divulgadas, evitando assim que agées de inteligéncia compe- titiva por parte da concorréncia déem resultado? 3. Até que ponto a 4rea de inteligéncia competitiva deve participar na formulacao das estratégias de uma empresa? 4. Para que os tomadores de decisao identifiquem corretamente as suas necessidades de informagao, eles devem ser orientados sobre os objetivos de uma 4rea de inteligéncia. Sera esta uma tarefa facil? 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