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Capitulo | A EVOLUGAO DO TRABALHO HUMANO 1. Sociedade humana fundada no trabalho Da sociedade primitiva, passando pelo escravismo da antiguidade e o servilismo feudal, as relagdes de trabalho foram essencialmente calcadas na economia da terra. A cultura da agricultura organizada ao lado do pastoreio ultrapassou milénios. As relages de trabalho eram de extrema verticalidade, dada a submissao provocada pela dependéncia absoluta dos trabalhadores, em fungdo das estruturas econémicas e de poder. O contrato de prestagao de trabalho tinha na unilateralidade a negacao de um direito social, exceto nas relagdes de trabalho artesanais ou corporativas. O trabalhador moderno é produto da | Revolugao Industrial, que mudou o mundo. sob a lideranga da burguesia. O marco histérico foi a tomada do poder politico do Estado pela burguesia, em 1789, que desalojou a forga a monarquia do centro de decis6es, sendo implantada a Republica liberal. Nao sem conflitos sociais proftundos sao estabelecidas as bases modernas da relacao capital trabalho. A partir daquele momento, passam a polarizar as lutas sociais, de um lado o burgués capitalista industrial ou comercial e, de outro lado, o proletario, ou 0 operario, enfim o trabalhador. Este vende a sua forca de trabalho ao dono do capital, que a utiliza na produgao de bens e servigos. Desde entao podemos falar em relagao patrao ou empregador e trabalhador ou empregado. Numa primeira fase, as relagdes entre empregadores e empregados nao estavam reguladas e o mais forte economicamente fez prevalecer sua vontade no contrato de trabalho. Em seguida, as relagdes de trabalho passaram a ser balizadas pelo Codigo Civil Francés de 1804, que aos poucos foi sendo levado além-fronteiras, sobretudo, em fungao das guerras de conquistas de Napoledo. Como este diploma legal nao conseguia responder as demandas desse novo tipo de relagao, foi inevitavel o conflito e, por conseguinte, a emergéncia da questo social. Essa relago conflituosa colocava em risco o sistema capital e trabalho, Diante do impasse, comegou a ser articulada uma legislagao social para possibilitar a con- tinuidade da evolucao do sistema. As linhas que se seguem demonstram o inescusavel liame entre o desenvolvi- mento da sociedade humana e o trabalho dos homens. Veremos que o proceso de evolugdo em todos os campos sistemas sociais é dependente da atividade humana. Na sociedade do trabalho, a partir da introdugao da técnica que passa a garantir a sobrevivéncia da sociedade, posteriormente confere ao homem o poder de definir 0 seu futuro e ao mesmo tempo gerar os conflitos sociais, cabendo ao direito estabele- cer e regular as expectativas normativas estabilizando e equilibrando essas relagdes sociais. 28 * PEDRO PROSCURCIN 1.1. As relagdes de trabalho na sociedade primitiva Na sociedade primitiva o trabalho era dividido equitativamente entre os inte- grantes das gens, do grupo ou da tribo, Participavam do trabalho todos os membros do grupo segundo 0 costume, o qual considerava as possibilidades de éxito de cada um nas tarefas. A caga era geralmente tarefa dos homens adultos e a colheita era dividida entre os homens, mulheres e jovens. O produto da caga, da pesca e da colheita era dividido segundo o porte de cada unidade familiar. Ninguém ficava com qualquer excedente, tudo era dividido. Embora houvesse pequenas variagdes, tanto as mulheres quanto os homens se ocupavam dos afazeres domésticos, como cuidar dos pequenos, tecer e cozer. Quando o homem primitivo conseguiu, com base na experiéncia, lapidar o silex e dele formatar 0 machado, que fixado em um pedago de pau facilitou a sua ascendén- cia sobre as outras espécies, certamente nao tinha consciéncia das conseqiiéncias desse ato para a espécie humana. Este fato fundamental, que se seguiu da descober- ta do fogo, do arco e da flecha, permitiu dominar um raio de espago suficientemente importante e decisivo para a sua sobrevivéncia e evolugéo. Podemos dizer com seguranga que, nesse momento, tivemos a fundagao da técnica e da tecnologia pelo homem. Com tais apetrechos passou a ca¢a e mudou 0 seu cardapio, o que Ihe proporcionou uma mudanea biolégica que somente a ingestao de proteinas poderia implementar. O processo humano foi lento, mas continuo. A sociedade primitiva admitia apenas uma forma de hierarquia: 0 comando dos ancidos. Estes tinham como tarefas adicionais o culto, a cura e a aplicagdo da justiga. Os primeiros homens entendiam que os mais experientes estavam mais preparados para essas tarefas. Como a sociedade era ainda oral, as tradig6es tinham muito valor e os mais velhos eram os guardides dessa cultura. Uma sociedade oral e simples valorizava muito o territorio. Neste é que estavam 0s meios de manutengao do grupo numa economia de sobrevivéncia. Por isso, inva- so de territorio por parte de outro grupo era suficiente para a guerra. Como sabemos, na guerra temos vencidos e vencedores. Era natural que os vencedores abatessem seus inimigos derrotados. Esse costume vigeu por séculos. Em dado momento, alguém percebeu que poderia dar uma destinagao mais utilitéria aos vencidos. Estes poderiam trabalhar para os vencedores. Foi exatamente o que aconteceu. A inge- nuidade da sociedade primitiva de economia de subsisténcia transitou para uma sociedade de classes e interesses. A partir desse momento crucial da historia do homem foi criada a nefanda figura do escravo inferior e derrotado, transformado em “coisa” pelo seu algoz. Sendo “coisa” poderia — além de trabalhar forgado graciosa- mente para seu novo senhor — ser ou vendido ou emprestado, ou simplesmente destruido (morto). O trabalho passou a ser tarefa dos subalternos. Esse fato gerou a acumulagdo, a posse e a propriedade de poucos. As relagdes sociais mudaram. Os rela- tos histéricos nos d4o conta de que foi pela forga que nasceu a sociedade escravista"" (1) ENGELS, Friederich, A origem da familia, da propriedade privada e do Estado. Rio de Janeiro: Vitéria, 1963, pp. 21 e ss. COMPENDIO DE DIREITO DO TRABALHO * 29 O novo modelo estabeleceu divisdo de classes e relagdes sociais. Surgem os que mandam e os que obedecem. Passaram a existir as relacdes de troca e nasce um mercado incipiente. Na evolugao, até os devedores que nao saldassem suas dividas por nao terem bens suficientes para cobrir suas obrigacdes poderiam, inclusive, se verem a si préprios e a seus familiares como escravos dos respectivos credores, conforme constatamos nas sociedades grega e romana. 1.2. As relagdes de trabalho na sociedade escravista Na sociedade escravista a produgao dos bens era realizada basicamente pelo escravo. As elites passaram a devotar desprezo pelo trabalho. Afinal, para que tra- balhar se os escravos eram disponiveis. Homens de pensamento, como Aristételes @ Platao, chegaram a escrever que 0 trabalho escravo seria natural, revelando o quanto estava enraizada naquela sociedade essa modalidade de produgao de bens. Consta que na Atenas de Péricles viviam 500 mil pessoas. Perto de 100 mil eram estrangeiros, 40 mil homens, gregos livres, 20 mil metecos assalariados e 300 mil escravos", Dois séculos e meio apds, quando os romanos passaram a dominar 0 mundo de entao, a grandeza e a gléria de Roma foram possiveis por conta das guerras de rapina e do trabalho dos povos conquistados. A populagao escrava au- mentava incessantemente. Por tais motivos que o aparecimento de Jesus e uma nova mensagem, como a “de amar ao préximo como a si mesmo", era inaceitavel numa sociedade escravista. Algumas atividades eram realizadas por nao escravos, ou por libertos. A edu- cacao que os antigos tanto prestigiavam era atividade de homens livres e cultos. As artes e algumas tarefas técnicas também eram consideradas importantes. O comér- cio nem tanto, pois muitos o consideravam obra de especuladores. Em meio a es- sas relagées de trabalho da sociedade escravista surgiram as /ocatio, isto é, o instituto juridico da locagao de servigos. Houve dois tipos de locagao de servigos. Um deles era a locegao da prestagao de trabalho de acordo com um prego estabelecido pelas partes, numa forma aproximada do que hoje conhecemos por empreitada ou obra certa, denominada ocatio operis faciendi. O outro tipo ou outra modalidade de ‘oca- ¢0 era a contratacdo de mao-de-obra simplesmente, chamada de locatio operarum, uma espécie de prestagao remunerada de trabalho com uma duragaio maior que a anterior. Esta 6 a forma de relagdo de trabalho considerada pelos autores como precursora do contrato de trabalho moderno®. O antigo regime escravista durou séculos. Pelos idos dos 495 d.C., quando o Império Romano do Ocidente ruiu e a grande Roma caiu, a escravidao era um custo insuportavel para os derrotados patricios integrantes da velha aristocracia romana. Além disso, a religido crista, oficializada em Roma pelos idos de 330 d.C., reputava (2) DE MASI, Domenico. 0 futuro do trabalho. Rio de Janeiro: Editora UnB/.José Olympio editora, 1999. P76. (3) GOMES, Orlando e GOTTSCHALK, Elson. Curso de Direito do Trabalho. Rio de Janeiro: Forense. 2002, p. 101 ess. 30 + PEDRO Proscurcin ‘a escravidao como aética e moralmente reprovavel. Paralelamente aos acontecimentos Poliico-miitares, a economia escrava dava lugar a outro modelo, no qual preponderava @ cultura agricola. A queda de Roma simbolizou o fim da antiga sociedade escravista © @'nicio de um novo sistema econdmico com base na grande propriedade rural", 1.3. O trabalho na sociedade feudal Findo 0 Império Romano, as nobrezas das diferentes etnias européias vo assumindo o vacuo de poder por toda a Europa. Aos poucos foram sendo tormados Os novos sistemas de produgao com base na grande propriedade, conhecidos como feudos. As velhas elites escravistas locais dominadas ou aliadas dos romanos rece. biam por concessao as glebas e trabalhadores, antigos escravos, que nelas perma~ neceram. Em contrapartida estes senhores feudais tinham de Prestar servicos e pagar rendas pela concessao real, além da lealdade devida. Por essa raz4o, o antigo escravo que trabalhava 0 campo passou a pertencer a terra e, por conseguinte, ter de servir ao novo senhor. A divisdo do trabalho nessa nova economia passou a ter dois agentes fundamentais: o senhor feudal por concessao eo servo ligado A gleba, importa destacar que a forca da cultura romana era tdo significante que as artes, @ arquitetura, as técnicas e as instituigdes juridicas permaneceram e influenciaram a historia de todos os povos conquistados por Roma. As instituigdes romanas foram tao fortes marcantes que ao lado da cultura grega forjaram o que chamamos de civiliza. (40 ocidental, Nessa estrutura econémica feudal, cada feudo tinha de ser auto-suficiente. 0 Senhor cobrava o trabalho, cunhava a moeda e estabelecia as regras da economia local. O servo tinha o direito de lavrar um pedaco de terra para sua sobrevivéncia e de sua familia. O sistema durou séculos. Funcionou perfeitamente entre os séculos Vil e XIV d.C. As conquistas e a intensificagao do comércio com o Oriente, mais a descoberta das. Américas proporcionaram a chamada Revolugdo Mercantil e a propria decadéncia do sistema feudal. 1.4, O trabalho na sociedade mercantil Os interesses comerciais no Oriente alteraram as condig6es de trabalho da dade Média. O feudo foi util para a fase agricola, mas o comércio a partir do século XIV requisitava novos produtos. Por novos produtos tinhamos tecidos, armas e meios de transporte. Estes produtos necessitavam trabalho mais especializado, Nao eram Construides por servos camponeses, recém-saidos do arado e da enxada, salvo aP6s muito treinamento. Ao lado dos castelos e mosteiros, surgiram os burgos, que 0s poucos se transformaram em cidades. Arteséios em oficinas laboravam nesses burgos, fato que gerou uma grande corrida de servos para esses centros. O campo (4) WEBER, Max. Historia agréria romana. Sao Paulo: Martins Fontes, 1994, pp. 190, 191 ¢ 221 {5) Como se recorda, Constantino dividiu o Império em dois: Roma ¢ Constantinopla (Império Romano 90 Oriente), atual istambul. © Império Oriental permaneceu integro até 1495 4.C. COMPENDIO DE DIREITO DO TRABALHO + 31 estava empobrecido @ decadente e o antigo senhor partia para o comércio que, passou a Ser muito mais rentavel, Nas cidades medievais, intra e além-muros, novas relagoes de trabalho passaram a existir. Entrava em cena o artesao, que passaria a Se organizar produtivamente em corporagdes de oficio", Paralelamente, inicia-se 0 periodo das grandes descobertas de novas terras, Sobretudo, das Américas. Os ingleses, os italianos, os franceses, os espanhois 6 os Portugueses tiveram grande destaque nessas descobertas. Especialmente na Amért, ca Latina ocorreu uma pilhagem das riquezas locais inigualavel. Os descobridores, 0 mesmo tempo que levavam para a Europa a riqueza local, determinavam aw colonias que adquirissem bens das respectivas matrizes. Essa modalidade de ex. Ploracdo colonial foi ampliada & medida que o trabalho na colonia ¢ na propria ma- liz Passou a ser executado com a mao-de-obra escrava negra, obtida a baxissimo Prego na costa africana. 1.5. A Revolugao Industri: A historia no da saltos, mas existem fatores que podem acelerar determinados acontecimentos. As colénias permitiram a expansao dos mercados. Ao mesmo tem- Po aumentaram as populagées dos paises europeus, evidentemente, gracas as melhorias das condigdes das técnicas em geral. O tear mecanico datava de 1580. A demanda por produtos era grande. Para se ter idéia dessa demanda, os soldados alemaes recebiam ordens para a produgao de tecidos de algodao. A prépria Franca revolucionaria € © advento de Napoledo fizeram emergir outras necessidades de Produtos. Mas na Inglaterra 6 que havia as melhores condigées para o desenvoli. mento da indastria. Em 1767, James Hargreaves inventa uma fiandeira que trangava 0 mesmo tempo oito fios, que ficou conhecida como spinning, Jenny, homenagem a Espasa do inventor. Outras melhorias foram introduzidas na spinning jenny, especial- mente quanto a parte hidraulica, por Richard Arkwrigtht e Samuel Crompton, e 20 cabo de vinte anos foi possivel produzir simultaneamente quatrocentos fios da melhor qualidade pela referida maquina. Nao se esquega que em 1712 Thomas Neweomen inventara uma primitiva maquina a vapor para bombear Aqua das minas de carvao. Em 1773, essa maquina é aperteigoada por James Watt, cientista de maquinas da Universidade de Glasgow. O segredo do sucesso da nova maquina foi a introdugao de um sistema que conseguia marter as valvulas, os cilindros e o émbolo restiados, Por esse meio, estava garantido 0 funcionamento das maquinas produtivas por lar- gas jomadas. A produtividade cresceu de forma impressionante. A nova maquina a vapor passou a ser aplicada em todos 0S segmentos industriais e de transportes (terra e mar) possiveis. A produgao e a comercializagdo dos bens e mercadorias foram simplesmente espetaculares™, {6) Antes das comporagées tivemos outras formas de associagbes como a colegia opiicum eo grémiono final do império romanc. As corporagdes eram comuns pela Europa jd antes do século Xile lacarans og mais diferentes denominagdes: confrarias, guildas, hansas, jurandes, entre outtas, N3O 6 cortele does Sue 2s Corporagées so precursoras dos sindicatos. Estes Sia produtos tipicos de detesa dos interes Ses dos trabalhadores da era industrial () BURNS. Edward MeNall. Histéria de cwilizapo ocidental. Volume Il, Porto Alegre: Editora Globo, 1968, pp. 661 a 675. 32 + PEDRO PROSCURCIN Enquanto no plano econémico e politico o capitalismo burgués industrial se cristalizava, as condigdes sociais daqueles que trabalhavam pioravam progressiva- mente. A inexisténcia de normas de tutela colocava a parte mais fragil da relagao capital e trabalho em uma desvantagem gritante. As jornadas nao tinham limite. Os salarios eram baixissimos. As condigdes de trabalho eram péssimas, pois 0 novo maquinario era muito perigoso. Os acidentados no trabalho nao conseguiam provar a culpa do empregador ¢ nao percebiam qualquer indenizagao. Essa era uma das raz0es da reivindicagao relativa a protegdo social. As mulheres e criangas dividiam com os homens os postos de trabalho. O trabalho e a jornada nao tinham diferencia- 40, mas, obviamente, criangas e mulheres ganhavam um salario muito menor. As primeiras industrias foram planejadas com a légica de grandes lotes de producao. Adam Smith, no seu A riqueza das nagdes"), descreve com miniicias 0 funcionamento de uma fabrica de alfinetes. Com efeito, a organizagao produtiva segula uma seqliéncia logica 2 partir do ato de desenrolar o arame, passando pelas diferentes operagées de fabricagdo, até o encaixotar dos magos de alfinetes. A primeira norma a regular 0 contrato de trabalho somente apareceu no Cédigo Civil Francés de 1804, o famoso cédigo de Napoledo, Mesmo assim, o trabalho estava colocado no mesmo status da locagao de coisas e animais. O patronato impunha as Condig6es contratuais. Os obreiros apenas aderiam. A contratacéio era considerada individual, embora, no caso especifico dos menores, fassem contratados aos lotes”. O espirito da época era o do liberalismo individualista resultante da Revolugao Fran- cesa, que acabara com os privilégios patrimoniais da Monarquia e do Clero. Os revo- lucionarios burgueses, embora tivessem recebido o apoio dos trabalhadores, chamados proletarios, impediam que os mesmos negociassem coletivamente as condigses de trabalho. A Franga extinguiu as corporagées de oficio dos artesdios') e proibiu o funcionamento de qualquer associagao ou sindicato de trabalhadores'". (Os demais paises europeus foram se livrando de suas monarquias como principal fonte de poder politico. As monarquias que sobreviveram foram mais habeis, fize- ram imensas concessées e, antecipando a inevitavel, entregaram o poder politico a burguesia rica emergente. Os parlamentos foram fortalecidos @ os reinados que permaneceram foram aqueles bem armados e que detinham popularidade. Mesmo assim, 20S poucos, a monarquia passou a ser mais decorativa, enquanto o poder real era transferido & Republica burguesa, isto 6, para governos eleitos e legitima- dos pelas maiorias. 1.6. II Revolugao Industrial A descoberta da energia elétrica peimitiu que 0 processo industrial sofresse uma tremenda aceleragao. A introdugao dos motores elétricos industriais implicou lecnologias nunca pensadas. A alterago das maquinas favoreceu a mudanca dos (8) SMITH, Adam. A riqueza das nagées. Vol. |, S40 Paulo: Abril Cultural, 1989, p. 42. (9) NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho, 18° ed, revista e atualizada. S40 Paulo: Saraiva, 2003, p. 16. (10) Decret D’Alard de 789, (11) Lei Chapellier de 1791 COMPENDIO DE DiREITO DO TRABALHO * 33 processos produtivos. O auge dessa revolugao, iniciada com a introdugao das ma- quinas eletrificadas aconteceu com a emergéncia de novas técnicas de producao. Frederick Winslow Taylor, pelos idos de 1910, nos EUA, introduziu na industria a chamada organizagao cientitica do trabalho, Taylor fragmentou as tarefas, cronometrou os tempos para cada operagao e esiabeleceu os espagos da atividade movimento para 0 trabalhador médio, Outra caracteristica dessa organizagao foi a retirada da parte inteligente da produgdo direta. Foram organizadas as areas de engenharia e planejamento fora da oficina. A fabriea era para produzir muito e rapido, dai a valorizagao da disciplina e da chefia autoritéria que conseguia “tirar a produgao planejada", a cada dia, O clima ficou mais tenso e propicio para os conflitos. De um lado, fez a economia crescer de forma nunca vista e, de outro lado, consolidou o movimento sindical, a greve e as conquistas de direitos sociais. Essa organizagao do trabalho, que acabou levando a denominagao de seu criador: taylorismo. A linha de montagem nao era idéia nova, ja existia, mas a sua difusdo mais elaborada, por volta de 1916, organizada e casada com 0 taylorismo foi obra de Henry Ford. Essas duas formas de organizagao da produgdo combinadas ficaram conhecidas por fordismo e taylorismo, que sintetizam a grande industria do século passado. O Estado do Bem-Estar Social coincide com esta fase e 6 consolidado apés 0 fim da ll grande Guerra e do nazi-facismo. O sistema capitalista, que era libertario em relagao ao nazi-facismo, tinha de concorrer com o chamado socialismo real da antiga URSS. Capitalistas e comunistas se uniram contra 0 nazi-facismo e 0 derro- taram, Mas essa disputa posterior entre os referidos modelos sociais auxiliaram nas conquistas sociais do ocidente. A URSS pretendia ser 0 modelo ideal de sociedade, sob 0 comando do Partido Comunista e dos trabalhadores. Enquanto o Ocidente avan- ava tecnologicamente, agora com um novo ator, o Japao, a antiga URSS perdida no fechado partido Unico caminhava para a autodissolugao, fato que ocorreu em. 1989, simbolizada na queda do Muro de Berlim. As inovagdes tecnolégicas permiticam que o capitalismo se expancisse e ocupasse os espagos da antiga URSS. A compe- titividade capitalista aumentou e a economia se globalizou em um grande merc sob a lideranga do pais mais forte técnica, econdmica e militarmente: os EUA\ Atual- mente esse novo império comanda o planeta. 1.7. Il Revolus Indust: As principais caracteristicas da II Revolugao foram a intensificagao do aporte tecnolégico na produc&o e 2 conseqliente excluséo da mao-de-obra do mercado de trabalho, Na empresa, a medida que a inovacao tecnolégica era introduzida na pro- dugao, por meio de maquinas ou equipamentos, havia um descarte de pessoal des- proporcional. Os ganhos de produtividade foram impressionantes, Outra caracteristica marcante foi a descentralizagao da produgao. O padrao da grande empresa representativo da Il Revolucao Industrial 6 abandonado. O novo padrao é a concentragao no foco da empresa. As atividades-meio séo repassadas para terceiros, teoricamente mais especializados, portanto mais competentes no 34 * PEDRO PROSCURCIN que fazem. A descentralizagao, ainda que nao visasse a redugao de pessoal, também impactou nesse sentido. A precarizagao foi uma conseqiéncia através do que se convencionou chamar de prestag&o de servigos pela pessoa juridica, falo que nao bate com a dura realidade das relagées contratuais. Esse enxugamento empresarial teve como reflexo a redugao das estruturas, dos niveis hierarquicos e de decisao nas organizagées. Desse modo, muita gente capacitada fica sem trabalho, conges- tionando 0 mercado com profissionais, que dificilmente retomarao os cargos e os salarios anteriormente auteridos Um capitulo especial foi a introdugao do que se convencionou chamar de novas formas de organizagao de trabalho, O proceso de produgao anterior era marcado pela estabilidade dos produtos e modelos. Primeiro ocorria a produgdo e as areas de vendas tinham a missao de vender, fato que Ihes conteria grande prestigio.Esse formato acabou. Ficou muito caro. A guinada foi mudar o procedimento. Primeiro é feita a venda do produto que fe, em sequida, sua fabricacdo. Com isso, os estoques foram racionalizados, a matéra-prima passou a chegar na hora de aplica- la. A produgao passou a ser iniciada apés a venda de determinado produto de tal modelo. Nesta sintese, estao as duas faces fundamentais das formas de gerenciamento da produgdo. Sem estoques, lucra-se com menos gastos e imobili- zados. A empresa recebe 0 produto quando vai utiliza-Io (just in time) O local onde ficava 0 almoxarifado ¢ alugado ao fornecedor, que tera de remunerar a locagao do Prédio. Conforme o caso, a venda do prédio 6 outra alternativa, A empresa fica mais enxuta e com menos manutengac, em suma, 86 vantagens. Depois, iniciar a produ- ao pds-venda, faz com que se receba capital antecipadamente. Nao se financia 0 cliente, ele é quem financia, logo, a empresa comega a lucrar sem ter colocado um tostéo do seu bolso, pensa 0 capitalista. Essa técnica, como a anterior, 6 oriental, levou 0 nome de “produgao com venda garantida”, ou “producao puxada” (kanban). ‘Ambas as técnicas, verdadeiramente simples, representaram lucros incalculdveis comparativamente ao sistema anterior de produgo. A essas técnicas 0 ocidente denominou toyotismo, que segundo consta, e é verdadeiro, a Toyota foi uma das primeiras organizagées multinacionais a delas fazer uso com absoluto sucesso. Evidentemente, tais mudangas representam uma nova organizacdo, uma nova cul- tura empreendedora. Mas faltava saber utilizar com mais intensidade e racionalidade a mao-de-obra. Foio que aconteceu. Qs profissionais que sobraram, jA que os cortes de pessoal em algumas atividades chegaram a noventa por cento, tiveram de se adaptar ao sistema do trabalho em grupo. A multifungao e polivaléncia sao intensificadas. Os niveis de responsabilidades foram revolucionados. Tinha de ser tudo produzide com qualidade perfeita pela primeira vez, retrabalho 6 perda e isso nao se admite. Os grupos definem tarefas, programam qualificagao, férias e rodizios, enfim, sao semi-auténomos, com orientagao sociotécnica. Inauguramos 0 “trabalho imaterial”, como veremos adiante. As fungdes foram enriquecidas, a utilizagao das ferramentas da chamada soci- edade da informagao com a telematica foi difundida e o trabalhador, além de ver aportar no seu posto de trabalho a sofisticagao, teve de se adaptar a uma nova COMPENDIO DE DIREITO D0 TRABALHO * 35 linguagem, a trabalhar em conjunto com colegas em outra parte do mundo no de- Senvolvimento dos produtos e mercados locais, o que foi possivel gragas ao compu- ‘ador, a microeletrénica e aos satélites para comunicagao em tempo real. Nada garante que os acontecimentos no mundo-do trabalho dos ultimos 20 anos tiveram o seu ciclo encerrado. Nao, pelo contrario, esse proceso e a sua dina- mica de inovagdes tecnolégicas avangam. Na linguagem dessa revolugao industrial u, como dizem alguns, pés-industrial e pos-moderna, tem uma marca indelevelmente profunda denominada PMC — Processo de Melhoria Continua 1.8. Era pés-industrial, do conhecimento, da pés-modernidade na sociedade da informagao Tornou-se lugar-comum a expresso pés-industrial nas ultimas décadas. Afir- ma-se que quando nos anos 60 do século passado o setor de servigos passou a empre- gar mais mo-de-obra que a industria haviamos adentrado na era pés-industrial. Porém, com o advento da Ill Revolugao Industrial fundada na inovagao tecnolégica, que fornece o ferramental para o enxugamento das empresas, introduzindo novas formas de organizacao do trabalho e de seu gerenciamento, a empresa industrial convencio- nal passou a ser coisa do passado. Logo, estariamos em outra era da produgao, a era pos-industrial. Por outra parte, a tecnologia teve a magia de alterar os parametros da compe- titividade, permitindo a expansao dos mercados, dai a globalizacao e a prevaléncia da lex mercatoria dos mercados mundiais. Tudo isso em fungao das inovages tecnolégicas que ditam o processo de melhoria continua e requisitam uma qualificagaio profissional esmerada, razao pela qual estariamos em plena era do conhecimento. A figura da subordinagao do empregado nao ¢ mais a mesma. Ele comanda processos, oma decisbes e suas responsabilidades séo incomparaveis com a organizacao taylorista de produgao do século passado. As mudangas pelas quais a sociedade passou atingiram todos os setores da vida Social. Uma verdadeira revolugao tecnolégica invadiu todos os segmentos da socieda- de moderna inaugurada com a Republica da Revolucao Francesa de 1789. Atualmente, estamos diante da nova empresa, de outro Estado, de uma nova familia, de novas telagdes de trabalho e de um mercado de trabalho cujo peril combina a precarizacao, ainformalidade e a exclusao social. Essa divisdo é o ponto central da chamada pés- modernidade. Em suma, a nova sociedade emergente das inovagdes tecnoldgicas promoveu mudangas globais das relagdes sociais e das ciéncias em geral que condicionam o mundo da vida. Procedendo a um corte epistemolégico, percebemos que as atividades humanas estao dependentes dos conhecimentos gerados em velocidade e tempo teal e da capacidade do homem de apreender e desvelar 0 mundo da vida sob um ‘Novo ritmo que apenas numa sociedade da informagao 6 possivel gracas aos meios de comunicagao simbolicamente generalizados.

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