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Capitulo Elementos descombinados néo produzem significado. Elementos combinados passam a ter significado. INTRODUCAO Ao longo de varios capitulos anteriores, j4 operamos com conceitos e mecanis mos que pertencem ao dominio da sintaxe da lingua. Em todos eles, porém, essa mi téria foi tratada como tema complementar - e nao como 0 niicleo da nossa reflexao. Com este, iniciamos uma seqiiéncia de capitulos em que a sintaxe passa a ser abordada como questao central. Evidentemente, a primeira providéncia a tomar é compreender, com toda a clareza, em que consiste esse aspecto da lingua e que tipo de problemas vamos abordar. 1 © QUE E SINTAXE? Para conceituar o que se entende por sintaxe do Portugués ou de uma lingua qual- quer, podemos comecar pela observacio de que a linguagem humana pressupée a ca- pacidade de simbolizar, isto é, a competéncia de representar fatos ¢ eventos do mundo por meio de sinais convencionais, por meio de signos. Gracas a essa competéncia, somos capazes de criar imagens mentais das coisas, como um tipo de substituto apro- 48 sistema anglo de ensino ximado da realidade. Nem a lingua, nem qualquer outra forma de linguagem existiria sem a contribuigao dos signos. (Ver Livro-texto 1, 1? série, pag. 5, itens 2 e 3). Mas é preciso levar em conta um dado primordial: um repertorio de signos é ne- cessario para a constituicao de uma linguagem no formato da humana, mas nao é suficiente. Se dispuséssemos de apenas um estoque de palavras para representar as coisas e nao tivéssemos aprendido a combiné-las entre si, nossa linguagem seria infinitamente pobre, praticamente igual a dos demais animais dotados de certo tipo de linguagem. Cada signo representaria uma coisa distinta da outra e a lingua teria apenas a quantidade de significados correspondentes a cada signo. Sem a capacidade de combinar os signos entre si, o homem nao teria adquirido a capacidade de formar infinitas frases com infinitos significados. Em resumo: com signos, sem as regras para combiné-los, nao teriamos uma lingua tao eficiente e econédmica como a que temos: com um ntimero finito de pa- lavras, somos capazes de produzir infinitas frases diferentes umas das outras. Ora, as regras de combinacdo das palavras so exatamente aquilo que chama- mos de sintaxe. A propria palavra significa combinag¢ao. ¥ A sintaxe, pois, pode ser definida como: compartimento da gramatica que con- tém as regras de combinagao das palavras da lingua para a formagao de frases. Entendida como um t6pico dos estudos gramaticais, a sintaxe abrange tudo 0 que se refere A correlacao entre as palavras da frase e, também, entre as oracoes do periodo. 2 Sintaxe e economia Ja dissemos que um conjunto de palavras nao é suficiente para garantir o funcio- namento de um sistema de comunicgao tao versatil quanto a linguagem humana. Para compreender a utilidade da sintaxe e a fabulosa economia que as regras de combinagao produzem, vamos estabelecer algumas comparagoes. Muitos animais se comunicam entre si: as abelhas com certa danga, as formigas e outros insetos com o-atrito das antenas, as aves com piados ou cantos. Ja se conse- guiu com certos chimpanzés um tipo de comunicagao muito elabora- da, com cores e gestos. ensino médio ~ 28 série Certo tipo de golfinho produz 500 tipos de sons, diferentes entre si, por meio dos quais envia 500 mensagens distintas para os companheiros, indicando 0 local em que se encontram, fontes de alimento, auséncia ou presenga de perigo, convite para 0 acasala- mento etc. Com esses ruidos, passam informagGes até mais sofisticadas: se o alimento € abundante, se estéo comendo bem, se a comida € boa, se as aguas esto limpas. (Ver An- tonio Houaiss. O que é a lingua. Sao Paulo, Editora Brasiliense, 1990. pag. 79). Com um pouco de fantasia, poderiamos dizer que essa espécie de golfinho pos- sui um léxico (um vocabuldrio) de 500 palavras, o que é um ntimero consideravel de signos diferentes. Mas, com esse numero, eles nao sao capazes de enviar mais do que 500 mensagens - 0 que é muito, em se falando de animais, mas é ridicula- mente insignificante, comparado-se com a linguagem humana. Toda a linguagem desses animais caberia apenas em quatro colunas de dicionério. Por que isso? Porque a “lingua” dos golfinhos e dos animais em geral nao possui sintaxe, nao possui regras de combinacao de dois ou mais signos para criar significados mais amplos. Em uma palavra, eles nao aprenderam a articular (a combinar) os signos de seu “idioma”. A sua linguagem é inarticulada, o que reduz consideravelmente a possibilidade de expressao de sua “lingua”. Imaginemos os gritos dos golfinhos representados por espectros de ondas sonoras, como nas ilustragdes a seguir: Ae Seguranca = _ (auséncia de perigo) O que os golfinhos nao sabem é combinar um grito com outro para formar uni- dades maiores. Eles nao sabem, por exemplo, fazer combinagées deste tipo: Ha alimento por iss estamos autores e ‘sistema anglo de ensino % Mas com o homem nao é assim. Além de usar um sinal (som/cor/gesto) para re- presentar outra coisa, o homem aprendeu a articular, a combinar entre si esses si- nais. A linguagem humana é articulada, e isso lhe confere uma enorme economia. Com um pouco mais de mil palavras, um homem consegue produzir e compreen- der uma inifinitude de mensagens. Um falante médio de uma lingua qualquer conhe- ce em torno de 3 a 5 mil palavras e, com esse estoque, consegue produzir frases que nunca foram ditas antes e encher de novidades paginas e paginas de grossos volumes. O que se da com os golfinhos nao é que eles possuem um numero de signos muito baixo. O rendimento que conseguem obter com esse estoque é que é baixo, pouco econdmico. Sua lingua nao possui sintaxe. Para se ter idéia da economia que as regras sintdticas trazem para as linguas, basta apelar para um sistema muito simples, conhecido por todos, que é o da nu- meracao decimal. Com apenas dez algarismos (0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9) representamos qualquer quantidade que pretendemos. Por qué? Porque ha regras combinatdrias que nos permitem organizar esses algarismos das mais diversas maneiras. Os golfinhos sao capazes de produzir 500 sons diferentes e, com isso, nado con- seguem produzir mais que 500 significados diferentes. Para acrescentar mais um argumento a favor da utilidade da sintaxe, imagine-se numa terra estrangeira com um dicionario das palavras da lingua ali falada. Se nao co- nhecer a sintaxe dessa lingua, isto €, as regras que comandam a combinagao das pala- vras registradas no diciondrio, a comunicacao com os habitantes do lugar serd sofrivel. Para terminar este item dedicado a demonstrar a economia que nos traz a sin- taxe, vamos usar um Ultimo expediente. Tomemos 12 palavras da nossa lingua: Imagine quantos significados vocé pode produzir com essas palavras, combi- nando-as entre si. 1. O rio é limpo. . A agua é limpa. . A terra é limpa. .. Este rio é limpo. . Seu rio é limpo. Esta Agua é limpa. . Sua Agua é limpa. Esta terra é limpa. 9. Sua terra da Agua limpa. 10. A agua faz a terra. 11. Esta sua terra da Agua limpa. 12. Este rio grande é seu, 13. Boa agua faz boaa terra. 14. Sua grande terra da esta boa agua. 15. Este grande rio da boa 4gua. 16. Aguas limpas fazem 0 rio limpo. 17. Agua limpa é rio limpo. ONAAAWN ensino médio - 28 série Nao é preciso ir além para provar que 12 unidades, combinadas entre si de diferen- tes maneiras, podem produzir muito mais significados que o ntimero dessas unidades. A FRASE E A ORACAO Falando com outras palavras, sintaxe de uma lingua é 0 conjunto de regras combina- t6rias que nos permite a articulagao das palavras para a formagao de frases ou oragoes. Como os conceitos de frase e oracdo serao utilizados repetidamente a partir daqui, precisamos compreender com rigor 0 seu significado. 3 Frase Frase é um conceito utilizado para designar qualquer combinacao de palavras terminada por uma pausa indicadora de que a seqiiéncia chegou ao fim. Chegar ao fim significa que, naquela seqiiéncia, ja se disse tudo o que se queria dizer. Nao é preciso usar teorias complicadas para determinar os marcadores lingiiis- ticos que servem para indicar o encerramento de uma seqiiéncia de palavras e, com isso, marcar os limites da frase. Seja na fala, seja na escrita, ha marcas sufi- cientemente claras para indicar que uma dada seqiiéncia de palavras chegou ao fim. Tanto 6 verdade que, num didlogo, um interlocutor pode pedir desculpas por ter interrompido 0 outro no meio da frase, isto é, por té-lo cortado antes de ele ter concluido a sua seqiiéncia. Tanto na escrita quanto na fala os sinais indicadores dos limites da frase sao muito claros. Uma frase afirmativa termina por ponto final na escrita. Na fala, termina por um rebaixamento da voz seguido de pausa. Exemplo: Vocé sabe que eu 0 odeio. Uma frase interrogativa termina por ponto de interrogacao na escrita. Na fala, por uma elevagao da voz seguida de pausa. Exemplo: Vocé sabe que eu 0 odeio? Uma frase exclamativa, na escrita, termina por ponto de exclamagao. Na fala, nunca termina por um rebaixamento da voz, como uma frase afirmativa. O acento mais forte 6 varidvel: incide sobre a silaba mais forte da palavra que se pretende realcar. Exemplo: Vocé sabe que eu 0 odeio! 4 Oracao Oracio e frase, a rigor, sao conceitos distintos, embora em certas circunstan- cias ambos se confundam. Uma defini¢ao pratica pode ser assim formalizada: Uma oracao nem sempre termina por pausa indicadora de término de seqiiéncia. sistema angio de ensino Deixemos essa defini¢&o em suspenso e os comentarios a fazer para o item em que vamos tratar do sujeito e do predicado. 5 Enunciado O termo enunciado é mais cémodo por possuir um significado mais genérico. Na lingua geral, enunciado serve para designar aquilo que foi expresso por palavras. Em sentido mais estrito, esse termo costuma ser usado para designar seqiién- cias de palavras expostas oralmente e por escrito. E, pois, um nome mais genérico e, por isso mesmo, mais apropriado para designar uma unidade da cadeia falada ou escrita, quando nao interessa classificd-la como oracao ou frase, ou quando ainda nao foi analisada. Assim, um enunciado é uma seqiiéncia de extensao maior ou menor, sem levar em conta 0 fato de se tratar de uma oragao ou frase. 6 A ANALISE SINTATICA O estudo da sintaxe de uma lingua procura compreender as regras que permi- tem a geracao das frases. Evidentemente, para 0 usuario da lingua nao interessa co- nhecer apenas mecanicamente as regras combinatorias da lingua, mas também os significados que as diferentes combinacées produzem. Por isso é que, na verdade, se estuda a sintaxe sempre acompanhada de um ponto de vista semantico. Em ou- tros termos, 0 estudo da sintaxe procura descrever as regras que usamos para or- ganizar as palavras em frases e o significado daj resultante. Ja vimos, na 1? série — no Capitulo 7 do Livro-texto 4 (item 2 e itens de 14 a 20) -, os principais marcadores da correlacao entre as palavras da frase. A partir de agora, vamos dar inicio ao que nossas gramaticas costumam chamar de anilise sintatica. A palavra andlise tem varios significados no nosso idioma, mas vamos toma-la aqui no seu sentido original de processo de diviséo, de segmentacao de um todo nas suas partes constituintes. Provém de uma palavra grega que significa exata- mente decomposi¢ao, divisao. O método analitico, usado em todas as ciéncias, consiste, pois, em segmentar um todo nas suas partes constituintes, com a intencaéo de examinar detidamente cada uma delas e descobrir a sua funcao no conjunto. Num laboratério de anatomia, por exemplo, analisa-se o corpo de um animal dividin- do-o nos seus 6rgaos constituintes (pulmées, coragao, figado, rins etc.) para examind- los com cuidado e, assim, compreender suas caracteristicas e a sua fungao no organis- mo. Eis 0 exemplo de um animal analisado nas partes constituintes da sua anatomia. ensino médio ~ 2* série Na anilise sintatica, dividimos a oracdo em suas unidades constituintes, e pro- curamos descrever as caracteristicas de cada parte para avaliar a sua funcdo em relagao ao todo. Pertence também ao dominio da andlise sintatica a divisdo do pe- riodo nas orag6es constituintes. 7 A funcao da parte no todo A descoberta da fun- gao de cada parte dentro do todo requer duas ope- rages basicas: * percepeao da relacao; * interpretacao da inter- feréncia da parte ana- lisada no conjunto das demais. Suponha que se queira descobrir a fungi (ou de- sempenho) de uma alavan- ca no interior de um auto- movel. Tenta-se verificar, primeiro, qual a relacao entre a alavanca e as ou- tras partes do automével. Se, ao levanté-la, percebe- se que o banco dianteiro se rebaixa, entao esta des- coberta a fungao da ala- bas vanca: rebaixar 0 banco um painel eletrénico, as fungées ja sao indicadas por escrito. dianteiro. Para descobrir a fungao sintatica de uma palavra (ou de um grupo de palavras) no interior de uma frase procede-se de maneira semelhante: © verifica-se antes qual a relacao entre a palavra em foco e as demais palavras da frase; * interpreta-se a interferéncia dessa palavra no conjunto todo da frase. Como a interpretagao da interferéncia da palavra no conjunto envolve andlise do seu significado, podemos dizer que a anilise sintdtica envolve sempre duas operacoes: = deteccao da relacao; — interpretagio de sentido. Tomemos uma frase como esta: Nuvens escuras escondem o Sol. Suponhamos que a proposta seja descrever a fungao sintatica da palavra escuras nessa frase. Descrever a fungao sintatica 6 o mesmo que traduzir o papel da palavra es- curas em relagao as demais palavras da frase, 0 que é o objetivo da andlise sintatica. O primeiro passo consiste em detectar com que outra palavra esta relacionada a palavra escuras. Como ja estudamos na 1° série, observando os critérios marcadores de correla- co entre as palavras da frase, percebe-se que escuras estd associada a nuvens. — Nuvens escuras escondem 0 Sol. 54 sistema anglo de ensino Se procurarmos compreender a interferéncia dessa palavra no sentido da frase, vamos perceber que: * escuras esta relacionada a nuvens; * para indicar uma qualidade, um estado das nuvens. Poderfamos descrever, entao, a funcao sintatica da palavra escuras nesses termos: * palavra que ocorre nessa frase, associada ao substantivo nuvens, para indicar- Ihe uma caracteristica; ou mais resumidamente, * palavra caracterizadora de um nome (de um substantivo). Mais adiante, vamos resumir tudo isso num nome técnico: adjunto adnominal. Esse trabalho realizado por nés é um procedimento tipico da anilise sintatica. Mais a frente, vamos utilizar esse mesmo método para analisar todos os termos da oracao. Ao descrever as funcdes, vamos usar uma nomenclatura que ja se tornou consagrada na tradi¢ao dos estudos gramaticais no Brasil: sujeito, predicado, ob- jeto direto, objeto indireto etc. @ SUJEITO E PREDICADO’ A arvore faz sombra. abriga phooaros em oua ramagem. enfeita qualquer paisagem. é fonte de energi sinal de terra fértil. reina soberana na paisager. protege-nos contra 0 vento, uma verdadeira catedral de folhas. ‘tem mais de 100 anos. foi plantada pelo meu pai foi ueada como mourdio de cerca, perde ouas folhas no inverno. etd veotida de folhas verdes. cresceu na diviea da fazenda. Antes de mais nada, é preciso dizer que estes dois termos basicos da oragao, do qual todo estudante ja ouviu falar milhares de vezes, sao muito faceis de localizar, mas nao tanto de definir. Vamos tentar conceitué-los, antes, sob o ponto de vista do seu significado. Esses dois nomes, sujeito e predicado, vém da tradigao grega, da ldgica de Arist6teles, Para ele, uma proposi¢ao consiste em afirmar (ou negar) alguma coisa sobre outra; portanto toda proposigao contém dois termos essenciais: * osujeito, isto é, 0 suporte, aquilo que serve de base para a afirmacao; * opredicado, que é precisamente o que se afirma ou se nega sobre o sujeito. Exemplo: * Proposigdo: Sécrates é sdbio. * Sujeito: Sécrates * Predicado: é sdbio ensino médio — 2 série Como se vé, ha muita semelhanga entre 0 que a légica classica chamava sujeito e o que chamamos hoje. O significado de origem da palavra traduz, de certa forma, 0 seu papel na ao. A palavra sujeito é formada do prefixo sub (embaixo, posigio inferior) verbo jacere (langar, colocar). Trata-se do mesmo radical que aparece em jato, jetar, ejetar (langar para fora). Traduzindo termo a termo, sujeito significa aquilo que esta colocado e aquilo que é tomado como base, o que serve de suporte. A palavra predicado também provém do latim, do verbo praedicare, que ser traduzido por afirmar, declarar, proclamar, dizer. Entao, os dois termos em que se reparte a oracdo podem ser assim conceit Essa definicao nao é incorreta (como vimos, é uma heranga da légica classica),n é insuficiente. E preciso fazer uma ressalva: nao é todo tipo de afirmagao que con tui um predicado; nao € todo tipo de suporte de afirmagao que constitui um Ee? Observemos o seguinte par: a eee Vidro transparente suporte atributo * nao 6 sujeito * nao 6 predicado Nesse par, a palavra transparente esta atribuindo uma qualidade a vidro; a pa~ lavra vidro, por sua vez, est4 funcionando como suporte dessa atribui¢ao. q Nao se diz, porém, que vidro seja um sujeito e que transparente seja um predicado. Dai se conclui que nem toda palavra que faz uma atribuigao é predicado; nem toda palavra que suporta uma atribuicao é sujeito, O mesmo nao acontece com 0 exemplo a seguir: eS Vidro é transparente. ‘suporte atributo *éumsujeito | + épredicado Nesse caso, a expressdo em vermelho é um verdadeiro predicado. A expressao é transparente ndo contém um atributo qualquer do substantivo vidro, mas uma afirmacao capaz de formar uma frase com sentido acabado. E esse dado que faz dela um predicado. Entaéo vamos marcar com precisdo os diferentes passos dessas observagoes: * osujeito é suporte de uma afirmacdo feita pelo predicado; * entretanto, nem toda palavra que funciona como suporte é um sujeito, assim como nem toda afirmacao ou 0 atributo referido a um suporte funciona como predicado; * s6 funciona como predicado a afirmacao ou atributo que é capaz de fechar uma frase; s6 é sujeito o suporte de uma afirmagao que encerra frase; sistema angio de ensino * s6 é capaz de encerrar frase uma afirmagao feita por um verbo ou por uma ex- pressao que contenha um verbo. A condigao essencial para a constituigéo de um predicado é 0 verbo. Tanto é verdade, que o verbo é a Unica classe de palavras que pode, sozinho, consti- tuir um predicado. Exemplo: Y eae Acidentes | acontecem. sujeito predicado Nao ha nenhuma outra classe de palavras com essa propriedade. Mas é preciso nao tirar a conclusao apressada de que todo verbo tem essa propriedade. A maio- ria dos verbos, alias, reclama 0 acompanhamento de outros termos para a forma- cao de um predicado. Mas uma conclusao é absolutamente certa: nao existe predicado desprovido de verbo, que pode estar eliptico (apagado), mas sempre estara presente, como vem. ilustrado nos exemplos a seguir: Todos esses exemplos ilustram o dado de que o predicado pode ser formado de um verbo apenas ou de um verbo e outros acompanhantes, mas sempre e necessa- riamente contém um verbo. A propésito ainda do significado do sujeito, é preciso desfazer a idéia de que o sujeito é sempre o agente da agao verbal. Pode ser, mas nao necessariamente. Eis alguns exemplos: Em todos esses casos passaro esté funcionando como suporte das afirmagées contidas no predicado. Esta, pois, funcionando como sujeito. Mas apenas nas duas primeiras é 0 agente da agao verbal. Nas outras duas é 0 paciente, isto é, esta indicando quem sofreu a queda e quem sofreu a agao de ser espantado. ensino medio ~ 2# série aT. MARCAS TIPICAS DO SUJEITO Se de um lado é dificil dar uma definico simples e ao mesmo tempo satisfat- ria de sujeito, de outro é muito facil identificd-lo na oracéo por meio de suas pro- priedades tipicas. Vejamos cada uma delas. 9 Concordancia O verbo da oracao concorda com o respectivo sujeito. Isso quer dizer que a de- sinéncia do verbo fornece pistas para identificd-lo. Prova disso € 0 dado de que, no Portugués, muitas vezes, nem é preciso revelar explicitamente 0 sujeito. Exemplos: Eu sonhei que tu estavas to linda! () Sonhei que () estavas tao linda! O apagamento dos pronomes Eu e tu nao traz problema nenhum para a com- preensao da frase, j4 que, por imposigao da concordancia, 0 sujeito de um verbo em 1® pessoa do singular (sonhei) sé pode ser um termo de 1# pessoa do singular (eu); diga-se 0 mesmo sobre 0 sujeito de um verbo em 2 pessoa do singular (es- tavas): 86 pode ser um termo de 28 pessoa do singular (tu). Por imposi¢ao também da concordancia, nao é possivel que um verbo na 3* pes- soa do singular tenha como sujeito um substantivo na 3° pessoa do plural. Na frase: Ha flores no jardim, 0 sujeito nao pode ser flores, a menos que a frase esteja errada. Como se sabe que nao hé erro nessa frase, s6 se pode concluir que flores nao é o sujeito. Ja, nesta outra frase: Existem flores no jardim, 0 sujeito de fato é flores. 10Colocagao No Portugués, a colocacao mais usual do sujeito é antes do verbo (na escri- ta, A esquerda). Excetuados alguns poucos verbos, mesmo que 0 sujeito venha colocado depois, a oragao fica plenamente aceitavel com a transposi¢ao para antes. Exemplo: Ocorreram durante o verao deste ano, sobretudo no interior do Parana, perdas significativas da safra de feijao. O sujeito, posposto ao verbo na frase acima, fica mais perceptivel quando ante- posto, como na frase abaixo: Perdas significativas da safra de feijio ocorreram durante 0 verao deste ano, sobretudo no interior do Parana. 1Permutabilidade por um pronome do caso reto Os pronomes do caso reto (eu, tu, ele, ela, nés, vés, eles, elas) funcionam como sujeito. Quando o sujeito é constituido por substantivo, pode ser permutado pelos pro- nomesele, ela, eles, elas. Tomando um exemplo dado anteriormente, observemos esta frase: HA flores no jardim. 9 68 sistema anglo de ensino O sujeito nao é a palavra flores, como ja comentamos no item 9. Na verdade, nao é possivel deslocd-lo para a esquerda do verbo e permuté-lo pelo pronome do caso reto correspondente (elas): “*Elas hd no jardim.” é uma frase inaceitavel. JA nao se pode dizer o mesmo sobre esta frase: Existem flores no jardim. Nesse caso, flores é 0 sujeito, que pode ser colocado antes do verbo e trocado por elas: “Elas existem no jardim.” é uma frase perfeitamente aceitavel no Portugués. 12 Auséncia de preposicao Uma marca lingiifstica, itil para descartar a hipétese de sujeito, é que este nunca vem precedido de preposicao. J4 vimos, na 1? série, que a marca da prepo- sigdo serve para desfazer ambigiiidades. Uma frase como “Uma boa mae um bom filho deseja.” é ambigua, jd que, pela compatibilidade de sentido e pela concordancia, tanto mae como filho podem ser interpretados como sujeito do verbo desejar. Permutando o sujeito por um pronome reto, teriamos duas versGes possiveis. * Interpretando a mae como sujeito, teriamos: Ela um bom filho deseja. * Interpretando o filho como sujeito, teriamos: Uma boa mie ele deseja. Para desfazer a ambigiiidade, basta apelar para uma preposicao e marcar 0 termo que nao se quer colocar no papel de sujeito. Teremos entao: * Interpretando a mae como sujeito Uma boa mae a um bom filho deseja. * Interpretando o filho como sujeito A uma boa mae um bom filho deseja. Em resumo, como 0 sujeito é uma funcao que nao vem marcada por preposi- cao, um termo precedido de preposigao nao pode ser interpretado como sujeito. TIPOS DE SUJEITO 13 Sujeito determinado O sujeito de uma orac¢ao pode vir representado por uma palavra qualquer, si- tuacao em que ele é classificado como sujeito determinado. Exemplos: O petréleo nao é um bem renovavel. Algo aconteceu fora do esperado. Nada acontece por acaso. Todo mundo tem medo de alguma coisa. Em todas essas oragées, 0 sujeito é determinado, j4 que em todas elas 0 papel de sujeito est sendo ocupado por um termo determinado: 0 petréleo, algo, nada, todo mundo. ensino médio — série Os exemplos foram colocados de propésito para ressaltar que, nessa classifica- ¢ao,determinado nao quer dizer um sujeito de significado definido. Determinado deve ser entendido nos seguintes termos: dentre as palavras constituintes da oracao, existe uma (ou um grupo delas) determinada que esta no papel de sujeito . Evidentemente, essa determinada palavra que esté funcionando como sujeito pode ser totalmente indefinida sob o ponto de vista do contetido. Em resumo, pode-se dizer, com absoluta certeza, que osujeito explicito na ora- ¢ao por qualquer palavra se classifica comodeterminado. 14Sujeito determinado simples ou composto Exemplos: Crianga nao paga. Nenhuma crianga paga. Nenhuma crianga menor de sete anos paga. Nenhuma crianga menor de sete anos, acompanhada de um adulto, paga. Em todos os exemplos dados, o sujeito possui um niicleo apenas: crianga. Dependendo da intengao do enunciador, o niicleo do sujeito pode vir sozinho ou acompanhado de outros termos determinantes a fim de dar melhor preci- sao ao enunciado. Normalmente, agregam-se ao nticleo os determinantes neces- sdrios para 0 esclarecimento que se quer dar. Se, por exemplo, a primeira frase fosse colocada na porta de um circo, 0 espetdculo, com certeza daria prejuizo. Evidentemente, por meio de determinantes, 0 antncio vai restringindo o ntime- ro dos nao pagantes. Se quisesse tapear o ptiblico, para fazer piada, o cartaz poderia ser uma “pega- dinha’” do tipo: Nenhuma crianca menor de sete anos acompanhada de pais de oitenta paga. Piada a parte, esse é um recurso que se pode usar com intengdes nao muito ho- nestas. Um vendedor, por exemplo, para persuadir alguém a comprar 0 seu produ- to, pode, na conversa, omitir alguns acompanhantes do nticleo e, apenas no texto escrito do contrato, completar a lista. Quem tem habito de comprar, confiando s6 na palavra do vendedor, sem ler contrato, pode cair no conto. O niicleo do sujeito é sempre um substantivo (ou pronome substantivo) nao precedido de preposicao. Exemplo: A gasolina, 0 alcool e o gs serao reajustados no préximo més. sistema anglo de ensino 15 Sujeito determinado eliptico A termina¢ao do verbo e dados do contexto podem permitir 0 apagamento do su- jeitosem trazer ambigiiidade ou confusao de sentido. Nesses casos, 0 sujeita eviden- temente, é determinado. Apesar de a Nomenclatura Gramatical Brasileira nao prever essa classificacao, costuma-se classificar, por tradicao, esse tipo de sujeito como: * determinado oculto; * determinado eliptico; * determinado implicito na desinéncia verbal Exemplos: O ex-prefeito processou o jornal, exigiu direito de respostae encheu de fis- cais o departamento pessoal da empresa. O sujeito dos verbos exigiu e encheu nao precisa vir explicito. Subentende-se facilmente que é o mesmo do verbo anterior (processou). 16 Sujeito indeterminado Ha casos em que nem a terminagao do verbo, nem dados do contexto permi- tem identificar na oracao ou no texto algum elemento que possa ocupar a fun- cao de sujeito. Isso ocorre quando a intengao do enunciador é dar a conhecer apenas a exis- téncia de um sujeito, escondendo a sua identidade e até mesmo a quantidade. No Portugués, quando se deseja produzir esse resultado, usa-se 0 verbo na 3® pessoa do plural, sem referéncia a nenhum elemento do contexto. Com esse procedimento, o significado produzido é 0 de marcar apenas a exis- téncia de um sujeito e apagar qualquer outro tipo de definigao, tanto da identida- de quanto da quantidade. Para entender essa ocorréncia, imagine-se um diélogo como este, entre dois interlocutores: - La na festa falaram maravilhas de vocé. - Quem falou? ~ Falaram. Como se vé, 0 verbo na 38 pessoa do plural nao tem, nesse caso, um sujeito elipti- co, identificdvel no contexto. Nem mesmo se pode dizer que, por imposi¢ao da concor- dancia, 0 sujeito seja eles. Pode ser — e, ao que parece, é - uma pessoa apenas, que 0 interlocutor se recusa a identificar, repetindo o verbo na mesma 3? pessoa do plural. Nesse caso, a 3? pessoa do plural é um expediente, digamos assim, evasivo. Sua finalidade é: * =marcar apenas a existéncia de um sujeito; e * apagar qualquer outro traco identificador, até mesmo a quantidade. Em sintese, quando o sujeito é indeterminado, a terminacao do verbo e 0 con- texto permitem apenas reconhecer que: * existe um sujeito mas, * nao se sabe quem é nem quantos sao. Além da 3? pessoa do plural existe outro recurso para indeterminar 0 sujeito, que sera tratado na Capitulo 5, por questao de estratégia didatica. ensino médio ~ 2 série Observacao Evidentemente, quando 0 verbo esta na 38 pessoa do plural, nao se pode des- cartar a hipétese de sujeito determinado oculto ou eliptico. Nesse caso, 0 contexto fornece pistas para identificar que existe o sujeito, quem é e quantos sao. Sera sempre um elemento de 3? pessoa do plural, iden- tificavel no contexto. Vamos supor um di logo equivalente ao anterior: - Lana festa, estavam aqueles seus dois companheiros de viagem. Fala- ram maravilhas de vocé. Nesse caso, 0 Sujeito de falaram ja nao é mais indeterminado, tanto que 0 outro interlocutor nem precisou perguntar quem foi que falou. Osujeito nesse caso édeterminado eliptico e pode ser preenchido por eles (aqueles dois companheiros de viagem). 17 Sujeito inexistente Embora seja mais raro, ocorrem no Portugués oracées sem sujeito. Falando em outros termos, hd oracdes em que o predicado nao se refere a nenhum termo. Faz- se pura e simplesmente a afirmacao, sem atribui-la a nenhum termo. Sabe-se que o verbo concorda sempre com 0 respectivo sujeito. Nas oragdes sem sujeito, como ele nao tem com o que concordar, fica sempre na 3° pessoa do singular. Por nao terem varia¢ao de pessoa, os verbos que nao tém sujeito sao cha- mados de impessoais. Exemplos: a) Trovejou forte durante a madrugada. Note-se que nao hd nessa frase nenhum elemento ao qual se atribui 0 ato de tro- vejar. A oragao contém apenas predicado. b) Nao ha condigées para a realizagao da partida. Vamos tentar localizar o sujeito dessa frase, usando os principios tedricos ex- postos neste capitulo. Ha quem aconselhe a localizar o sujeito, usando este artificio: * pergunta-se ao verbo quem é que ou 0 que é que. Como resposta teriamos 0 sujeito da oracao. Vamos tentar essa hipstese: = O que é que nao ha para a realizacao da partida? A resposta seria: condigdes. Pelo processo sugerido, o sujeito de ha seria condigées. Para testar se essa hipdtese é verdadeira, vamos verificar se o termo condi¢ées tem, de fato, as trés marcas que caracterizam o sujeito de uma frase (ver itens 9 a 11): * Concordancia Condigées esté no plural e o verbo (ha), no singular. Como, em Portugués, 0 verbo concorda com 0 sujeito, de duas uma: — ou condicgées nao é 0 sujeito; — oua frase esta errada. sistema anglo de ensino o Ora, qualquer falante do Portugués sabe que nao ha erro algum nessa frase. O errado seria fazer a concordancia do verbo com 0 termo condicées. Eis a frase que viria: *Nao hao condigdes para a realizacao da partida. Entao, podemos descartar a hipdtese de que condic¢ées seja o sujeito. (Convém aqui registrar que nem sempre da resultado o artificio de fazer a pergunta quem é que/que é que antes do verbo). * Colocagao e permutagao pelo pronome Condigdes nao h para a realizacao da partida. Se de fato condigdes fosse 0 sujeito do verbo (ha) seria possivel transporta-lo para a esquerda do verbo, o que é até possivel. Mas, apesar de ter passado pelo teste da colocagao, sabe-se que condicées nao € o sujeito da ora¢ao, pois, além de nao obrigar a concordancia, nao pode ser substituido pelo pronome elas. Seria completamente inaceitavel uma frase como: *Elas no ha de realizacao da partida. Como se vé, condigdes nao tem todas as caracteristicas tipicas do sujeito. Resta tentar ainda uma hipéotese: 0 sujeito de ha pode estar apagado (eliptico ou oculto). Se essa hipétese for verdadeira, é possivel explicitar o que esté apa- gado. Como o verbo esta na 3? pessoa do singular, 0 sujeito sé poderia ser um pronome de 3# pessoa do singular, ou nao existir. A possibilidade de encaixar um pronome de 3° pessoa no lugar do sujeito fica também descartada pela impossibilidade de uma frase como esta: *Ela (ele ou vocé) nao ha condigées de realizagao da partida. Por curioso que possa aparecer, se trocarmos 0 verbo haver por existir, a and- lise sera outra. Vamos verificar: Nao existem condicdes para realizacao da partida. O que é que nao existe? - Condigoes. Teste das propriedades do sujeito * Concordancia O verbo esta concordando com condigées (ambos no plural). * Colocagao E possivel colocar condigdes a esquerda do verbo: Condig6es nao existem para a realizacao da partida. * Permutabilidade por um pronome reto Elas nao existem para a realizacao da partida. Nesse caso, fica demonstrado que condigées é 0 sujeito de existem. Como tiltima observa¢ao, pode-se concluir que 0 verbo existir nunca é impessoal, isto €, sempre tem sujeito. O verbo haver, para ganhar o sentido de existir, nao pode ter sujeito, Em ou- tros termos, haver s6 é impessoal quando é sinénimo de existir. ensino médio - 28 série Capitulo mt ‘ 1 INTRODUCAO No Portugués atual, certas frases em que 0 verbo vem acompanhado do pro- nome se costumam ter um uso na variante culta da lingua e outro na variante po- pular. As frases reproduzidas na abertura deste capitulo sao, em sua maioria, es- tranhas lingua culta escrita, sendo por isso consideradas como erradas pela nossa tradigéo gramatical. Para compreender com clareza essa diferenga de usos, é necessério ter nocao precisa de duas fungdes que o pronome se pode assumir no Portugués: * indice de indeterminagao do sujeito. Além dessas duas fung6es, vamos tratar neste capitulo desse mesmo pronome no papel de: * pronome reflexivo (objeto direto e ) ensino médio — 24 série 85 2 DUAS ESTRUTURAS DIFERENTES QUE PARECEM IGUAIS Tomemos as duas frases que seguem: 1) Anulou-se o contrato. 11) Desistiu-se do contrato. Se permutassemos contrato (no singular) por contratos (no plural) e pedisse- mos que se reescrevessem os dois enunciados, a grande maioria dos falantes do Portugués atual nao teria diivida e escreveria: 1) Anulou-se os contratos. Il) Desistiu-se dos contratos. Isso 6 uma demonstragao clara de que, para a maioria dos falantes, nao ha dife- renga entre as duas estruturas apresentadas. Para a intuicdo da grande maioria, o sujeito esta indeterminado tanto na primei- ra quanto na segunda frase. Caso contrario, deveria haver diferenga de usos. Na variante culta escrita, porém, ha diferengas nitidas entre os dois enunciados acima transcritos: 1) Anularam-se os contratos. ID Desistiu-se dos contratos. Em I, 0 verbo foi para o plural, concordando com o substantivo contratos. Em II, 0 verbo ficou no singular, mesmo com 0 substantivo contratos no plural. Essa diferenca se explica pela seguinte razdo: na variante culta escrita, 0 subs- tantivo contratos é interpretado como sujeito do verbo, 0 que obriga a haver con- cordancia; na variante popular, nao. 3 UMA INTUICAO EM DESAPARECIMENTO O que ocorre de fato é que a maioria dos falantes do Portugués contempo- raneo perdeu a intuigdo de que o pronome se pode funcionar como um instru- mento para apassivar 0 verbo ou, para usar a nomenclatura consagrada, como particula apassivadora. Mas nao é dificil recuperar essa intuicdo, sobretudo se considerarmos esse pro- nome em certas frases em que 0 papel de particula apassivadora se mantém evi- dente até hoje. Tomemos uma frase como esta: Este clube se formou de poucos sécios. Qualquer falante do Portugués atual nao hesitaria em dizer que a frase acima tem o mesmo sentido e a mesma estrutura que esta outra: Este clube foi formado por poucos soécios. Essa percepcao é correta, pois: a) em ambas 0 sujeito é este clube. Prova disso é que, em ambas, 0 verbo concor- da com o mesmo termo (este clube): Estes clubes se formaram de poucos sécios. Estes clubes foram formados por poucos sécios. b) ambas admitem a seguinte transforma¢ao: Poucos sécios formaram este clube. sistema anglo de ensino 2 On0 Nessa transformacao: * 0 que era sujeito (este clube) passou a ser objeto direto; * 0 que era agente da voz passiva (por poucos sécios) passou a ser sujeito. Ora, essa é a prépria transformagao da voz passiva em voz ativa, sinal de que ambas as frases inicialmente confrontadas esto na voz passiva, com uma diferenga: * num caso, a voz passiva é formada pelo pronome se apassivador mais a terceira pessoa do verbo: ___ Este clube se formou de poucos sécios. ‘Trata-se da VOZ PASSIVA SINTETICA. * noutro caso, a voz passiva é formada pelo verbo ser mais 0 particfpio do verbo principal (terminacaodo, da, dos, das), Trata-se da VOZ PASSIVA ANALITICA. Esquematicamente teremos: ae Este clube | se formou de poucos sécios. | voz passiva sintética Este clube | foi formado_| por poucos sécios. | voz passiva analitica sujeito verbo agente da paciente passivo voz passiva Transformadas na voz ativa, as duas frases equivalem a: sujeito agente verbo ativo | objeto direto 4 VOZ PASSIVA NO PORTUGUES CLASSICO No Portugués classico a voz passiva sintética coexistia com a voz passiva analitica mais freqiientemente. Em Camées encontram-se frases como estas, que vem parafraseadas para facilitar a compreensao: Esta terra se habita dessa gente sem lei. = Esta terra é habitada por essa gente sem lei. Este mar se navega de cruéis marinheiros. = Este mar é navegado por cruéis marinheiros. Em Vieira encontramos: A virtude ama-se dos bons. = A virtude é amada pelos bons. No Portugués contemporaneo, porém, quando se usa a voz passiva sintética, na grande maioria dos casos omite-se oagente da voz passiva e inverte-se a posicao do sujeito, que passa a vir posposto ao verbo. Exemplificando essas transformacoes, temos: 1. Frase inteira: Essa terra sujeito paciente dessa gente sem lei. agente da voz passiva verbo navoz passiva sintética eee cece cece ee eenes ensino médio — 2 série 2. Frase com apagamento do agente: Essa terra verbo na voz passiva sintética agente da passiva apagado paciente 3. Frase com inversao da posi¢ao do sujeito: Habita-se verbo passivo na voz passiva sintética ‘sujeito paciente (posposto) Esta transformacao, com a inversao da posi¢ao do sujeito, afetou a intui¢ao do falante, induzindo-o a pressupor que, em frases desse tipo: * o sujeito é indeterminado; * ose é indice de indetermina¢ao do sujeito; * esta terra é objeto indireto. Tanto é verdade que, na fala popular, nao se faz mais a concordancia do verbo com 0 sujeito, dando origem a dois usos nitidamente distintos no Portugués atual. Exemplos: 5 MARCAS DA PASSIVA COM O “SE” APASSIVADOR Como dissemos, no Portugués contemporaneo nao é mais intuitivo 0 reco- nhecimento do pronome se como apassivador. E preciso, pois, reconhecé-lo por meio da observacao planejada das marcas tipicas da frase em que se aloja esse pronome. O pronome se apassivador s6 ocorre em frases que apresentam as seguintes caracteristicas: * verbo na 3° pessoa (singular ou plural); * pronome se; + um substantivo nao precedido de preposi¢ao. Presentes essas trés condicdes, e sendo possivel passar a mesma frase para a voz. passiva analitica (verbo ser + participio), temos entdo a seguinte andlise: * o seé particula apassivadora; * o substantivo sem preposi¢ao é 0 sujeito; * a frase est na voz passiva sintética. Nesse caso, 0 verbo estaré sempre em concordancia com 0 sujeito. Exemplo: Nao se apanham moscas com vinagre. 58 sistema anglo de ensino Nessa frase ha: * um verbo na 3 pessoa (apanham); * 0 pronome (se); * um substantivo nao precedido de preposigao (moscad. A mesma frase pode ser parafraseada assim: Moscas nao sao apanhadas com vinagre. Entao: * o seé particula apassivadora * moscasé 0 sujeita A frase esta na voz passiva sintética. 6 INDICE DE INDETERMINACAO DO SUJEITO Observe o trecho que segue: Um famoso jogador do Santos Futebol Clube disse que, no momento, recu- saria qualquer proposta para ir jogar na Europa, alegando que nAo se sai de um clube no meio do campeonato. Note que 0 sujeito dos verbos recusaria, ir jogar e alegando é determinado: nos trés casos esta eliptico (ou apagado); nos trés casos poderia vir explicitado por ele(um famoso jogador do Santos Futebol Clube). O mesmo nao se dd com o su- jeito de sai, que nao pode ser explicitado pelo mesmo pronome (ele) dos casos an- teriores. Se, entretanto, retirarmos o se de junto do verbo, 0 sujeito passa a ser de- terminado eliptico (ele), como os outros. Como se nota, 0 pronome se nesse trecho cumpre a fun¢ao de indicar que 0 sujeito do verbo ao qual se liga est indeterminada nao pode ser preenchido por nenhuma palavra do contexto. Por isso, em casos como esse, 0 pronome se é ana- lisado como indice de indeterminag¢ao do sujeito. Analisando as frases apenas sob 0 ponto de vista do significado, o pronome se apassivadore o indice de indeterminacao do sujeito produzem o mesmo efeito: indeterminam 0 agente responsdvel pela acao verbal. Mas, do ponto de vista da es- trutura sintatica, as frases sao diferentes. Quando o se funciona como indice de indeterminagao do sujeito, nao ocorrem na frase as trés condigdes que se dao quando se trata de particula apassivadora e, portanto, nao é possivel converter a frase para a voz passiva com 0 verbo ser. Exempl Desistiu-se do contrat. Nessa frase hd um verbo na terceira pessoa (desistiu), ha o pronome se, mas nao hd um substantivo desacompanhado de preposicao. Além disso, nao é posst- vel converter a frase para a voz passiva analitica O sujeito do verbo nao pode vir explicitado pelo pronome ele. Entao: * ose é indice de indeterminacao do sujeito; * 0 sujeito é indeterminada ¢ a frase esta na voz ativa; * do contratoé objeto indireta ile Note-se ainda que, quando o se funciona como indice de indeterminagao do su- jeito, o verbo a que se liga fica sempre na 3* pessoa do singular. ensino médio - 2* série 7 PRONOW (OBJETC T Observe a frase que segue: Cri: jogase Nesse caso 0 pronome se é um ana- férico, isto é, uma palavra que retoma outra ja citada anteriormente no nas enunciado ( a) eee Crianga joga-se tem o mesmo sen- ae oa tido que: & Td * peueieale cs . a jogaa ela mesma. = pay ¢ crianga jogaa si mesma... Bes “ m Note que o se, na frase inicial, esté retomando 0 , projetando-o como objeto do mesmo verbo. E por isso que se classifica como pronome reflexivo, numa alusao ao fato de que a acao verbal afeta um objeto que é igual ao sujeito, como se a ago partisse do sujeito e voltasse sobre ele mesmo (refletida). 3 5 8 g Ose reflexivo § é como se q fosse a : imagem do 3 sujeito refletida. 90 sistema anglo de ensino O pronome se reflexivo nao se confunde com a por- que esta nunca é um anaférico e aquele sempre é. Nao se confunde também com o indice de indeterminagao do sujeito porque 0 pronome reflexivo supde sempre um sujeito determinado. O pronome se reflexivo pode funcionar como: Objeto direto - quando vem no lugar de um complemento nao prece- dido de preposicao obrigatéria. Exemplo: O homem se olhava no espelho. Note que o complemento do verbo olhar nao deve vir precedido de pre- posicao, 0 que se percebe por frases do tipo. O homem olhava 0 amigo. O homem olhava © movimento. O homem olhava 0 relégio. O homem olhava-se. — quando vem no lugar de um complemento precedido de preposicaio obrigatoria. Exemplo: A jovem deu-se um presente. No caso, 0 se esté ocupando o lugar de um objeto obrigatoriamente prece- dido de preposigao, o que se nota por permutagoes do tipo: Ajovem deu um presente. A jovem deu um presente. A jovem deu-se um presente. ensino médio ~ 24 série 91 8 PRONOME “SE” RECIPROCO Quando 0 pronome se é um anaférico que remete a um sujeito composto ou plural, costuma ser classificado como recfproco se for indicador de que, ao praticar a acao ver- bal, um componente do sujeito afeta o outro e, ao mesmo tempo, é afetado por ele. Exemplo: Durante a luta, os dois boxeadores esmurraram-se No caso, 0 se indica que um boxeador esmurrou 0 outro e foi por ele esmurrado. HA situacdes em que uma frase fica ambigua, admitindo para o se duas versoes: pronome reflexivo ou reciproco. E 0 caso de uma expressao como esta: Eles se feriram. Posta, assim, fora de contexto, nao se sabe se nesta frase 0 se é um indicador de que um feriu 0 outro (reciproco) ou se ambos se feriram independentemente do outro. 92 sistema anglo de ensino Posta em contexto, a frase perde a ambigitidade, ficando clara uma das duas vers6es possiveis. Exemplo: Dirigindo em alta velocidade, eles se feriram. Nesse caso, 0 se é reflexivo, indicando que os componentes do sujeito sofreram ferimentos independentemente - e nao que um feriu ao outro Num choque violento durante a partida de futebol, eles se feriram. Gilberto Marques / Gazeta Esportiva O se, no caso, é reciproco e indica que um feriu ao outro. ensino médig ~ 2* série 9 “SE” APASSIVADOR x REFLEXIVO Hé também situacdes em que o pronome se pode funcionar como ou como reflexivo, associado a um mesmo verbo. Nesses casos, a posicao do su- jeito funciona como o divisor das aguas Observe as duas frases que seguem: a) Sempre se critica o jogador. Wander Roberto / Gazeta Esportiva b) O jogador sempre se critica. Ema, com o sujeito (0 juiz) pos- posto ao verbo, interpreta-se o como, » A frase equivale A seguinte paréfrase O jogador é sempre Em b, com 0 sujeito (0 jogador) anteposto, interpreta-se 0 se como reflexivo. A frase pode ser assim parafraseada: O jogador sempre critica a si mesmo. Nos casos em que 0 sujeito é um ser inanimado, a incompatibi- lidade semantica (de sentido) dis- solve a ambigiiidade, mesmo que 0 sujeito venha antes do verbo. Numa frase como esta: “A 4r- vore pelos frutos’, por incompatibilidade semantica nao se interpreta 0 se como reflexivo, mas como Nao se quer dizer que a arvore conhece a si propria pelos frutos, mas que a arvore é conhecida pelos frutos. 94 sistema anglo de ensino

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