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A Linha do Tempo da Imigração Japonesa

Por Mariana Vianna

Desde a chegada do navio Kasato Maru, em Santos, no dia 18 de junho de


1908, a cultura brasileira nunca mais foi a mesma. Hábitos e rituais
indígenas, africanos e europeus abriram espaço a uma nova cultura: a
cultura trazida pelas primeiras 162 famílias de imigrantes japoneses.

Após a vinda da embarcação, por meio do acordo imigratório feito entre


Brasil e Japão, o volume de imigrantes da Terra do sol nascente só fez
aumentar. Juntou-se o útil ao agradável. Uma vez que, no começo do século
XX, o Brasil precisava de mão-de-obra estrangeira para as lavouras de café.
E enquanto isso, o Japão passava por um período de grande crescimento
populacional e não conseguia gerar emprego necessário para toda
população.

O acordo deu tão certo que, nos primeiros dez anos da imigração,
aproximadamente 15 mil japoneses chegaram ao Brasil. E com o início da
Primeira Guerra Mundial (1914-1918), uma média de 160 mil japoneses veio
morar em terras brasileiras. Sendo que desse total, 90% dedicava-se à
agricultura.

O centenário

De acordo com a linha do tempo da Imigração Japonesa que, este ano


comemora seu centenário no Brasil, a relação nipônica com o governo e
com os costumes brasileiros teve os seus altos e baixos. Mas, a comunidade
acabou se adaptando às particularidades do país. E por esse motivo,
japoneses e seus descendentes celebram essa data com eventos,
exposições e homenagens que, a partir desse mês, acontecem em todos os
cantos do país.

Mas, como nem tudo são rosas, os imigrantes também se deparam com
inúmeras dificuldades. No início da imigração houve um choque cultural em
relação à língua, aos costumes, religião, clima e alimentação. E as famílias
que tentavam retornar ao Japão eram impedidas pelos fazendeiros, que as
obrigavam a cumprir o contrato de trabalho.

E embora a idéia inicial da maioria fosse retornar para a terra natal, muitos
decidiram por fazer a vida em solo brasileiro contribuindo com o
crescimento econômico e com desenvolvimento cultural do país. E hoje,
sabe-se que o Brasil é o país com o maior número de japoneses e seus
descendentes fora do Japão.

Taikô

Foi inspirado nesse contexto histórico que, o Grupo de Taikô Hanabi


Wadaiko, da Associação Cultural Nipo Brasileira de Várzea Grande e Cuiabá,
vai participar pela primeira vez do quinto campeonato de Taikô, que
acontece no dia sete de julho em São Paulo.
O Taikô ou ‘grande tambor em japonês’ é um instrumentos musical de
percussão semelhante a um tambor ou um surdo, cujo som é obtido através
do impacto. Feito com tábuas de madeira e pele de vaca estendida, o
instrumento é tocado com bastões (Bachi) feitos de Bambu, Pinho ou outras
madeiras que variam de medida conforme o tamanho do Taikô.

Também chamado de Wadaiko, o instrumento produz um ritmo compassado


e seco que exige vigor físico e treinamento intensivo do instrumentista. Pois,
esse tem de sincronizar a melodia que sai de seu Taikô com a dos demais
integrantes do grupo.

Existem três modelos de Taikô: o Paarankuu é o menor de todos e por isso


permite que o instrumentista o toque enquanto realiza complexos passos de
dança; o Shime-daiko é um pouco maior e mais pesado, porém ainda
versátil, e permite a realização de coreografias; E por fim, o O-daiko.
Lembrando o formato de um barril, ele é o maior dos instrumentos. E devido
ao seu tamanho e peso a coreografia que o acompanha é mais simples.

Tradição

Carregando quase dois mil anos de tradição, o Taikô é uma das primeiras
expressões musicais Japonesas a serem espalhadas pelo mundo. Entretanto,
para os seus praticantes a arte representa muito mais que uma expressão
musical, representa uma filosofia de vida.

O estudante Solano Mussashi Otomura,19, é descendente de japoneses e


membro mais velho do grupo Hanabi Wadaiko. Segundo o garoto, o além de
ser uma grande diversão para ele, o que mais o impressiona na arte é o
ponto de vista de respeito e cuidado com a natureza que os mestres passam
aos alunos.

“A relação que nós aprendemos a ter com o instrumento e com a arte não é
puramente superficial de pessoa-objeto. Nós temos uma relação de
profundo respeito com a natureza e com a arte. Não tratamos os
instrumentos como objetos, mas como presentes vindos da natureza e os
quais nós temos o dever de tratá-los com zelo. Mais do que ouvir, nós
sentimos a vibração dos Taikôs”, ressalta Solano.

Um exemplo desse respeito ao Taikô é a forma como os bastões (Bachi) são


dispensados. Quando ficam velhos ou se quebram, ao invés de serem
jogados no lixo, o Bachi deve ser queimado e enterrado para ser devolvido à
natureza.

No Japão feudal, os Taikôs eram usados para motivar as tropas do exército a


marcar o passo na marcha, para anunciar comandos e técnicas marciais,
para demarcar territórios, para estimular a bravura dos guerreiros e, nas
festividades, para acalmar os espíritos mortos.

O estudante ainda revela que já conhecia o Taikô mesmo antes de entrar no


grupo. “Morei no Japão até os 13 anos e ela essa prática é muito comum.
Nas escolas japonesas, o Taikô é ensinado como outra matéria artística
qualquer. Existem muitas escolas e competições só direcionadas à arte lá”,
explica.

O Campeonato

O mistério é grande em torno da coreografia e da música que o grupo vai


apresentar no campeonato. Isso porque uma das regras da competição é o
ineditismo da apresentação, além da postura e da fisionomia dos
integrantes, da coerência entre a melodia e a coreografia, a técnica, o
tempo limite de cinco minutos de apresentação e do alinhamento do ‘Hapi’ –
vestimenta estilo Kimono usado nas apresentações.

Entre as categorias do campeonato, configuram os níveis Livre até (18


anos), Júnior (todas as idades) e Máster (profissional). O Hanabi Wadaiko vai
representar o estado na categoria Livre. E a premiação desse nível é um
valor em dinheiro e entrega de medalhas. Atualmente, existem quase oito
mil grupos de Taikô no Japão.

Segundo o vice-presidente da Associação Cultural Nipo Brasileira de Várzea


Grande e Cuiabá Ioshiu Nouchi, o Taikô é uma tradição japonesa que associa
percussão, coreografia e ritmo.

'Já temos 30 coreografias ensaiadas para o campeonato e o grupo está em


grande sintonia. Mas, precisamos de nove mil reais para que nossos dez
tocadores mais a equipe participem do evento. Estamos fazendo festas e
arrecadando dinheiro para que o estado de Mato Grosso seja representado
no campeonato, porém ainda falta muito e pedimos por doações'.

E alerta: “A Associação e o grupo estão abertos aos homens e mulheres da


comunidade de Cuiabá e Várzea Grande, sejam eles japoneses,
descendentes ou não. Não é necessário saber tocar nenhum instrumento,
nem ter algum porte físico específico. Basta querer aprender e ensaiar
bastante! Para nós, o importante é conseguir manter as nossas tradições!”.

Integrados à cultura brasileira, os japoneses acresceram muito aos


costumes e à economia nacional. Afinal, a culinária, a moda, a literatura e a
tecnologia japonesa já adicionaram o seu tempero ao Brasil. País abundante
em espaço, cultura e diversidade. País que reúne todos os rostos do planeta
em um só lugar.

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