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Cenário
Houve um tempo, sendo mais específico, na década de 1970, em que as únicas pessoas
que interagiam com um computador eram os profissionais de informática. A eles só
restava entender como a máquina deveria interpretar os comandos enviados através de
um teclado ligado a um terminal e como interpretar as suas respostas.
Da década de 1970 até os dias de hoje, muita coisa mudou em relação à interação entre
o homem e o computador (IHC). Não é mais necessário que o usuário tenha que ter o
conhecimento de inúmeros comandos complicados para interagir com a máquina – ou
com respostas mais complicadas ainda – já que, hoje, é possível contar com o auxílio do
mouse, interfaces gráficas amigáveis, telas sensíveis ao toque etc. [1].
Entre todas as inovações referentes a disciplina de IHC, há uma em especial que vem
evoluindo continuamente, tendo revolucionado a sua indústria e criando um novo conceito
sobre como jogar vídeo game, e que ninguém ainda havia idealizado: utilizando
tecnologias de detecção de movimentos. Esta revolução aconteceu, em 2005, no Japão,
em uma feira de entretenimento eletrônico chamada de Tokyo Game Show. Naquele
momento, o mundo tomaria conhecimento de um novo conceito de jogar vídeo game com
o console revolucionário da Nintendo: o Wii [2]. A premissa básica do novo console era
que qualquer pessoa, seja ela jovem ou idosa, homem ou mulher, pudesse interagir sem
dificuldades com os games do console e se divertir.
Para passar uma rica experiência de interação com o mundo virtual para o jogador, a
Nintendo optou por aplicar tecnologias de detecção de movimentos em seu novo console.
Utilizando um dispositivo (joystick) que fosse capaz de enviar para o software todas as
informações sobre posição e movimento do jogador, foi possível criar uma nova forma de
interação com um game. Aquelas pessoas que antes não tinham interesse em games, em
virtude da dificuldade de compreender comandos complexos, agora poderiam apenas
fazer movimentos naturais, como segurar um volante de um automóvel imaginário, para
comandar seus movimentos no mundo virtual [3].
A proposta da Nintendo com o Wii foi um grande sucesso e já nos primeiros meses de
lançamento (entre dezembro de 2006 e março de 2007) foram vendidos cerca de seis
milhões de unidades no mundo todo. Hoje faz frente aos seus concorrentes Sony, com o
Playstation 3, e Microsoft, com o Xbox 360. Segundo especialistas da indústria o novo
console já é o campeão da nova geração de consoles [4].
No entanto, não são apenas os videogames que fazem uso deste tipo de tecnologia. A
gigante de eletrônicos Samsung e a Reatrix, uma agência de publicidade, se juntaram
para criar um painel publicitário capaz de interagir com os consumidores e abordar uma
nova forma de fazer marketing de produtos ou serviços [6]. É possível que, em breve,
para enviar um comando para o computador bastará um leve movimento da mão do
operador para que ele entenda o que deve ser processado.
O que é?
O Nintendo Wii, por exemplo, possui um sensor responsável por captar as informações de
posição do joystick e enviá-las ao console. Estas informações são interpretadas pelo
software que as transformam em comandos para o game [8]. Com isso, o Wii pode
transformar qualquer movimento natural do usuário em uma raquete de tênis, uma luva de
boxe, uma espada etc.
Outra vertente são as telas multi-toque, empregadas atualmente com grande sucesso nos
smartphones, como o iPhone da Apple. Nesses aparelhos, o usuário deve mover seus
dedos intuitivamente pela tela para apertar botões, redimensionar janelas, digitar, girar
objetos etc, junto com uma interface agradável e intuitiva [9]. O iPhone foi o pioneiro em
utilizar essa tecnologia e, assim como o Wii nos games, revolucionou o mercado. Hoje,
grandes fabricantes de smartphones, como a LG, Samsung e Nokia também aderiram aos
aparelhos com telas multi-toque [10].
Devido ao grande sucesso alcançado pela Nintendo com o Wii, que foi o primeiro a
explorar com sucesso a interação através de movimentos, outros grandes players do
mercado de entretenimento estão investindo agressivamente nesta nova tecnologia. Além
de permitir a interação já proporcionada pelo Wii prometem fazer melhor, dispensando o
uso de acessórios e criando uma interação mais rica com o mundo virtual [7].
A Sony relançou recentemente o acessório EyeToy para o seu novo console PS3, agora
com o novo nome de Playstation Eye que, com maior capacidade, permite a interação
com jogos através de movimentos bi-dimensionais e comandos de voz. O acessório, que
se parece com uma webcam, agora possui maior qualidade de captação de movimentos e
sons, e junto com o novo controle anunciado na EGS09, também será capaz de detectar
movimentos em 3D, semelhante ao que já acontece no Wii com o Wiimote [3].
Já a Microsoft anunciou uma grande iniciativa em junho deste ano: o Projeto Natal, que
traz mobilidade ao console Xbox 360 através de um novo acessório que capta
movimentos e sons do jogador, sendo que os movimentos captados podem ser
tridimensionais, o que sugere que a tecnologia vai muito além da já utilizada em produtos
como o PlayStation Eye [3].
Outros players também estão investindo, com foco em outros mercados, como a gigante
do ramo de eletrônicos Samsung e a empresa de anúncios interativos Reactrix. As duas
empresas lançaram, em parceria, um painel interativo de 57 polegadas que consegue
"enxergar" os movimentos de pessoas a uma distância de até cerca de 5 metros.
Utilizando sensores que captam movimentos de forma tridimensional, o produto permite a
interação com anúncios, navegação por menus, e (até mesmo) que o cliente possa jogar
através de gestos [6].
Já com relação aos dispositivos móveis, em 2007, a Apple lançou a primeira versão do
iPhone para entrar no mercado dos smartphones, oferecendo uma alternativa rica em
usabilidade para os usuários destes aparelhos [11]. Desde então, o aparelho já está em
sua terceira versão, agora com mais capacidade de armazenamento, processamento
mais rápido, comando de voz, bússola digital, entre outras funcionalidades.
Com esta iniciativa, a Apple logo ganhou mercado, motivando outros grandes
concorrentes do mercado de celulares como HTC, Nokia, LG e Samsung a seguirem seus
passos e também disponibilizarem no seu catálogo de aparelhos, smartphones com telas
sensíveis a toque, similares às do iPhone.
Mas de todas as iniciativas, a que aparentemente possui mais força é a da SKO, uma
recente joint-venture firmada entre a empresa start-up belga Softkinetic e a Optrima,
detentora da patente sobre a tecnologia de sensoriamento tridimensional, junto com a
gigante produtora de semi-condutores Texas Instruments [12] [13].
Como funciona?
O Wii possui um joystick conhecido por WiiMote, contendo um acelerômetro para medir os
movimentos do jogador em três dimensões e enviar estas informações e o estado dos
botões através de bluetooth para o console. Para adicionar à interatividade, há outra parte
do joystick que se encaixa na base do WiiMote, o Nunchuck. Ele possui uma alavanca
analógica, dois botões e também um acelerômetro interno para calcular o movimento do
jogador no espaço, semelhante ao WiiMote. Com isso, o game pode proporcionar
experiências de interação mais interessantes, com as duas partes do joystick (WiiMote e
Nuncuck) em cada mão, como sugere um game de simulação de boxe, por exemplo.
O acessório conta ainda com microfones para melhor determinar a posição do usuário no
espaço (“ouvindo” seus movimentos), contando também com algoritmos de
reconhecimento de voz para que comandos de voz sejam enviados para o game.
Além disso, o Projeto Natal poderá reconhecer movimentos faciais, características físicas
como comprimento do cabelo ou formato do corpo para determinar o sexo do jogador e,
também, o nível de força aplicada por ele para que o game possa reproduzir os seus
movimentos mais assertivamente [3]. A tecnologia utilizada pelo projeto Natal é bem
parecida com outras iniciativas, como a da Reatrix.
Porque é importante?
O lançamento do Wii trouxe uma revolução para a indústria dos games, criando uma nova
classe de consumidores, que se adaptou ao WiiMote. Na cerimônia de lançamento do
Projeto Natal, uma das grandes personalidades do mundo do entretenimento, o diretor
Steven Spielberg, questionou como seria possível fazer com que a indústria de games
se tornasse tão acessível como as outras formas de entretenimento. Ele mesmo
respondeu: fazer com que ele se torne "invisível". A idéia é simples: sem a necessidade
do controle, a barreira que separa pessoas que nunca experimentaram esse tipo de
entretenimento interativo diminuirá, e elas estarão mais a vontade para começar.
Se, conforme dito por Spielberg, cerca de 60% dos lares nos EUA não possuem nenhum
tipo de video game, então há um grande número de consumidores potenciais para esse
novo mercado.
Essa nova forma de interação permite que outros mercados também possam ser
beneficiados. O mercado de propaganda é um exemplo claro. Hoje os anúncios
publicitários disponibilizados através de cartazes e painéis não permitem interação com
os consumidores alvo, e com isso devem ser muito sucintos e diretos. A chegada de
painéis interativos definitivamente pode revolucionar. O anúncio publicitário pode
demonstrar mais funcionalidades do produto apresentado e permitir que o consumidor
explore isso de forma interativa, sem a necessidade de apertar nenhum botão. É possível
também disponibilizar simples games interativos, com fundo no produto que se deseja
anunciar [6].
Outro campo que pode se beneficiar é o campo da saúde. O game SilverFit, aplicativo
voltado para tratamento de idosos através de exercícios físicos, ganhou o primeiro prêmio
na categoria "Inovação em Métodos de aplicação e Ambientes" pelo European Innovative
Games Award 2009, realizada em Frankfurt, em novembro último. No próprio site da
empresa (http://www.silverfit.nl/en/index.htm), é explicado que o exercício físico é feito de
forma mais intensa e eficaz quando é divertido, ao invés de chato e repetitivo. O Silverfit é
o elemento de diversão: através de games de interação o paciente faz os exercícios ao
mesmo tempo em que se diverte.
Um problema potencial dessa nova forma de interface, que inclusive já foi verificada em
alguns casos com o WII [19], é que os novos jogos desses consoles exigem que o jogador
utilize todo o corpo para jogar,.Com isso, adquirem desde pequenas dores localizadas nas
costas, braços e pernas, fruto de posições ou movimentos com os quais não estão
acostumados, e, até mesmo, lesões por movimentos repetitivos (LER), como por
exemplo, tendinites.
Com a utilização dos controles anteriores, o problema também existia. Porém,os novos
jogos que utilizam essa nova interface trazem consigo a promessa de serem mais
saudáveis e, até mesmo, trazer benefícios físicos aos jogadores. A descoberta de que
podem ocorrer efeitos colaterais indesejados, principalmente para as crianças, é o que
traz a maior decepção. O Wii, através do WiiMote, se utiliza do mesmo princípio de
jogabilidade, através da movimentação do corpo todo, e, por isso, seus jogadores também
estão sujeitos aos mesmos efeitos.
A Apple e seu iPhone também foi alvo de seus concorrentes mas mantem firme a primeira
posição no mercado de smartphones. Um exemplo de concorrente é o Nokia 5800 que,
além de ser operado com tela multi-toque semelhante, até o seu design lembra o do
iPhone. Os dois gigantes do mercado de celulares ainda brigam nos tribunais sobre a
questão de patentes quebradas de ambos os lados, discussões estas que ainda não
possuem um desfecho definido [10].
Com os custos cada vez mais baixos e componentes ainda mais avançados, a tendência
é que, no futuro, mais empresas de diversos segmentos deverão adotar estas
tecnologias, confirmando a previsão dos especialistas e analistas do mercado. No
entanto, esta tecnologia deverá apresentar mais desafios no futuro. Algo que pode trazer
preocupações para os especialistas da área seriam os fatores regionais como variações
na língua, dialetos e cultura. Por exemplo, é comum apontar a algo utilizando o dedo,
enquanto que tal costume é rude em algumas partes da Ásia [15]. E, também, assim
como as pessoas tiveram de se acostumar com o mouse no início da década de 90,
deverão acostumar-se a interagir de um novo modo, mas muito mais intuitivo.
O mercado de entretenimento foi renovado após o lançamento do Wii, fazendo com que
os concorrentes da Nintendo buscassem alternativas semelhantes a nova mecânica de
entretenimento proposta pela empresa japonesa, para também buscar uma fatia no
disputado (e milionário) mercado de games [3].
[1] GRAHAM-ROWE, Duncan. The Best Computer Interfaces: Past, Present, and
Future. Technology Review. April 6, 2009.
[2] 7 Things you should know about... Wii. Educause, July 2008.
[4] Annual video game conference sees big changes in 2007. Technology Review. July
5, 2007.
[5] EDWARDS, Cliff. Microsoft Moves onto Nintendo's Motion Turf. Business Week.
June 1, 2009.
[6] GREENE, Kate. A Display That Tracks Your Movements. Technology Review. June
20, 2008.
[7] GREENE, Kate. Throwing Out the Xbox Control. Technology Review. June 2, 2009.
[8] TURNER, Daniel. Hack: The Nintendo Wii. Technology Review. July/August 2007.
[9] 7 Things you should know about... Multi-Touch Interfaces. Educause, May 2008.
[10] EWING, Jack. Nokia's Touch Screen 5800 Nods to iPhone. Business Week.
October 2, 2008.
[11] Touching the future. The Economist print edition. September 4, 2008.
[14] GREENE, Kate. Touch Screens with Pop-up Buttons. Technology Review. April 28,
2009.
[15] EDWARDS, Cliff. Soon TVs and PCs May Work Like the Wii. Business Week. April
16, 2009.
[16] HESSELDAHL, Arik. Apple: Soon to Be a Mobile Gaming Force. Business Week.
November 4, 2008.
[17] HESSELDAHL, Arik. Will the iPhone Grab the Lead in Games? Business Week.
May 17, 2009.
[18] ALBRECHT, Chris. Coming Quickly to Your TV: Gesture Control. Business Week.
June 16, 2009.
[19] A Wii Workout: When Videogames Hurts. The Wall Street Journal, November 25,
2006