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Um pouco da história da psicomotricidade *

               

                                                                                                 Dayse Campos de Sousa1

“A história do saber da psicomotricidade, representada já um século


de esforço de ação e de pensamento, a sua cientificidade na era da
cibernética e da informática, vai-nos permitir certamente, ir mais longe
da descrição das relações mútuas e recíprocas da convivência do
corpo com o psíquico. Esta intimidade filogenética e ontogenética
representam o triunfo evolutivo da espécie humana, um longo passado
de vários milhões de anos de conquistas psicomotoras”. (Fonseca
1988, p.99).

         O corpo humano sempre foi valorizado, desde a Antigüidade.  Na cultura


grega havia o culto excessivo do esplendor físico. Ao corpo, era conferido um
lugar de destaque, constatável nas esculturas de mármore, sempre presentes
nos estádios ou locais de cultos. Ainda que a tônica fosse o dualismo corpo-
alma, o movimento já era motivo de estudos e, relativamente, as emoções
passaram e não ser mais negadas, adquirindo cunho próprio; mas a força do
homem estava justamente em poder controlar suas emoções, ou seja, evitar
que essas emoções aflorassem.

         Os filósofos da época, como Platão, professavam uma concepção


clássica do corpo, “um lugar de transição da existência do mundo de uma alma
imortal”.  Platão apresenta a dicotomia entre psico - motricidade pela cisão
entre o corpo e a alma, como foi considerada na antigüidade, afirmando um
dualismo radical dentro do ser humano, existindo assim duas realidades.  O
homem é alma e corpo, mas é a alma que domina, que é a parte mestra, o
princípio e a finalidade. Para os gregos o corpo expressa a beleza da alma, a
saúde do corpo é uma virtude.

         Descartes afirma a dualidade corpo e alma, na organização de dois eixos


de reflexão e análise: uma fisiologia para o corpo e uma teoria de paixões para
a alma. “É a alma que dá ordens ao corpo e comanda seus movimentos”.  O
corpo passa a ter vida própria, mas influenciado pelas paixões. A teoria do
indivíduo livre e voluntário diz respeito a um ser que domina suas reações
corporais e cuja força reside no controle que exerce sobre as paixões.

         Apesar de todo o peso do pensamento romântico, foi sobre a sombra de


uns pensamentos racionais e dicotômicos, no que tange às noções de corpo e
mente, que a psicomotricidade surgiu no final da modernidade. No entanto, o
percurso desta ciência vai sendo marcado pelas diferentes concepções que o
homem vai construindo acerca do corpo, ao longo da história, sob a influência
de movimentos como o romantismo, movimento humanista e, como veremos
mais adiante, a psicanálise.

         No início do século XX, a psicomotricidade é caracterizada pelo


paralelismo psicomotor, vestígios de um imperialismo neurológico. A
paternidade fica para Dupré, psiquiatra francês que, em 1907, formulou a
noção de psicomotricidade, através de uma linha filosófica psiquiátrica,
evidenciando o paralelismo psicomotor, ou seja, a associação estreita entre o
desenvolvimento da motricidade, inteligência e afetividade.  A patologia cortical,
a neurofisiologia e a neuropsiquiatria são conhecidas como as três vias de
acesso do conceito de psicomotricidade.

         O paralelismo psicomotor define-se como uma tentativa de superação ao


dualismo cartesiano (mente e corpo).  Levin (1995) fala do primeiro corte
epistemológico. Nessa etapa, a influência da neuropsiquiatria é determinante
numa clínica centrada no aspecto motor e num corpo instrumental, uma
ferramenta de trabalho para o reeducador que se propõe a consertá-lo. Eram
propostos ao sujeito uns modelos de exercitações: exercícios para educar a
atividade tônica (exercícios de mímica, de atitudes e de equilíbrio), a atividade
de relação e o controle motor (exercícios rítmicos, de coordenação e habilidade
motora, e exercícios que tendem a diminuir sincinesias).

         Morizot (1984) nos fala que a partir da década de 30, começaram a ser
incorporadas outras noções, decorrentes de pesquisas no campo da psicologia
e da psicanálise e, que, apenas como citação, recorda as contribuições de
Charcot que se interessava pela função motora, para fazer dela a base da
patologia psiquiátrica. Das contribuições de Head na sua abordagem do
esquema corporal; de Schilder com sua visão psicanalítica da imagem do corpo
e, a importância de Gesell e as contribuições de Wallon sobre os aspectos
psicofisiológicos da vida afetiva, a consciência corporal, a relação intrínseca
tônus-emoção. O propósito deles foi definir a realidade do fenômeno da
“consciência de si”, que se manifesta como consciência de seu corpo e que
permite a auto-apreensão em face dos outros.

         Em 1935, impulsionado pelas obras de Wallon, Edouar Guilman inicia a


prática psicomotora que estabelece, por meio de diferentes técnicas
provenientes da neuropsiquiatria infantil, a reeducação psicomotora, que são
exercícios para reeducar a atividade tônica, a atividade de relação e o controle
motor. Esta primeira aproximação “prática” entre a conduta psicomotora e o
caráter da criança foi utilizado posteriormente, como modelo para diferentes
reeducações pedagógicas e psicomotoras, como, por exemplo, na Argentina,
por Dalila M. Costalat.  Era um trabalho dirigido a crianças que apresentavam
déficit em seu funcionamento motor e não governavam eficazmente seu corpo,
o que ocasionava uma serie de problemas em seu meio social.

         Na Alemanha, em 1942, Kofka, Kohler e os psicólogos da Gestalt


interessaram-se pelos mecanismos da percepção. Os trabalhos de Schultz ou
de Jacobson que definiram os primeiros métodos de relaxação e os
psicopedagogos que estudaram os desenvolvimentos sensório-motores da
criança, como Claparède, Montessori e Piaget na área da psicologia evolutiva,
propiciaram uma melhor compreensão no desenvolvimento da criança.

         Os trabalhos de Henri Wallon (1925), apud Fonseca (1988) forneceram


observações definitivas acerca do desenvolvimento neurológico do recém-
nascido e da evolução psicomotora da criança. Wallon diz que “o movimento é
a única expressão e o primeiro instrumento do psiquismo”. Wallon apud Camus
(1986), estuda a relação entre motricidade e caráter, diferentemente de Dupré,
que correlacionou a motricidade com a inteligência. Essa diferença permite a
Wallon relacionar o movimento ao afeto, a emoção ao meio ambiente e aos
hábitos da criança.  Para Wallon o conhecimento, a consciência e o
desenvolvimento geral da personalidade não podem ser isolados das emoções.
A partir de sua obra foi possível construir, pela síntese de muitas correntes e
teorias, uma técnica terapêutica nova, cujo objetivo era a reeducação das
funções motoras perturbadas. Sua obra continuou durante décadas a
influenciar a investigação sobre crianças instáveis, impulsivas, emotivas,
obsessivas, apáticas, delinqüentes, a diversos campos de formação como
psiquiatria, psicologia e pedagogia.  Wallon foi o principal responsável pelo
nascimento do movimento de reeducação psicomotora, que foi conduzido mais
tarde por J. de Ajuriaguerra e Gizele Soubiran.

         Wallon realizou um trabalho importante sobre os aspectos


psicofisiológicos da vida afetiva, a consciência corporal, a relação intrínseca
tônus-emoção, que chama de diálogo tônico, assinalando que a atividade de
relação e a atividade postural têm, em sua origem, uma raiz comum. Ainda
Wallon estudou, em 1945, os prelúdios psicomotores do pensamento e
descreveu os estágios do desenvolvimento.

         Julian de Ajuriaguerra e R. Datkine, 1947/48, na França apud Fonseca


(1988) provocaram uma mudança na história da psicomotricidade, com as
primeiras técnicas reeducativas vinculadas aos distúrbios psicomotores. Nessa
época, Ajuriaguerra atualiza o conceito de psicomotricidade, associando-o ao
movimento. Em seu manual de Psiquiatria Infantil, Ajuriaguerra delimita com
clareza os transtornos psicomotores, “que oscilam entre o neurológico e o
psiquiátrico”. Com essas contribuições, a psicomotricidade se diferencia de
outras ciências e adquire sua própria especificidade e autonomia. Ajuriaguerra
com suas novas concepções teóricas passa para a história da
psicomotricidade como o único que conseguiu romper efetivamente com o
imperialismo neurológico e com o conceito de paralelismo psicomotor de
Dupré.

         Em 1960, na França, a Universidade de Salpêtriere confere o certificado


da capacidade em reeducação da psicomotricidade sob a ação científica de
Wallon. Posteriormente, citando os neurologistas como: Rybot, Bonnier, Picq,
Head, Schilder e outros, Wallon, através do conceito do esquema corporal,
introduz dados neurológicos nas suas concepções psicológicas, diferenciando-
se de Piaget que também muito influenciou na teoria e prática da
psicomotricidade.
         Piaget foi um dos autores que mais estudou as
inter-relações entre a motricidade e a percepção, através
de ampla experimentação. Ele considera que a motricidade
interfere na inteligência, antes da aquisição da
linguagem. Para Piaget, o resultado de uma certa
experimentação motora integrada e interiorizada como
processo de adaptação é essencialmente movimento. Wallon
refere-se ao esquema corporal, não como uma unidade biológica ou psíquica,
mas como uma construção, elemento de base para o desenvolvimento da
personalidade da criança.

         As contribuições de Ajuriaguerra, por volta de 1960, somadas às de


Wallon e Piaget, influenciaram o curso de pensamento de outros autores
como: R. Diatkine, J.Bergés, Jolivet, S. Lebovici, permitindo-lhes redefinir os
objetivos da psicomotricidade, dando ênfase especial à relação, às emoções
e ao movimento. Essas redefinições também sofreram influência de conceitos
psicanalíticos relativos ao campo da afetividade, destacando-se psicanalistas
como: S. Freud, M.Klein, J.Lacan, W. Reich, P. Schilder, F. Dolto, Samí Alí, D.
Winnicott, .Manoni, entre outros.

         Já próximo à década de 70, com a influência direta e


indireta dos trabalhos de Wallon, surgem os trabalhos na
Educação Psicomotora, por Le Boulch, que desde 1966, em
seu livro “A Educação pelo Movimento”, tinha como objetivo
inicial sensibilizar os docentes do primeiro grau, quanto
ao problema da educação psicomotora na escola, muito
difícil, pois era um contexto desfavorável à pedagogia da
época, centrada essencialmente na aquisição das
“Habilidades Escolares de Base”. Participaram também
desses trabalhos  Picq e Vayer, André Lapierre, Bernard
Aucouturier, Defontaine, J.C.Coste e outros  que percebiam
nesse momento a educação psicomotora, enquanto maneira
original de ajudar a criança inadaptada a desenvolver suas
potencialidades e ter acesso ao mundo escolar. Opondo-se às
práticas da época, que eram uma adaptação das técnicas de educação física e
de fisioterapia, os autores trouxeram conhecimentos e soluções inspiradas na
psicologia genética, a qual evidencia que a criança desenvolve o conhecimento
de si mesma e do mundo que a cerca através de sua ação.

         Lê Camus (1986) comenta a opinião de Ajuriaguerra, afirmando os


grandes eixos da psicomotricidade dos tempos modernos: coordenação
estático-dinâmica e óculo-manual; organização espacial e temporal da
gestualidade instrumental; estrutura do esquema corporal; afirmação da
lateralidade; e domínio tônico. Comenta, também, que Ajuriaguerra procurou
caracterizar distúrbio psicomotor de síndromes psicomotoras que não
correspondem a uma lesão focal, como as que provocam as síndromes
neurológicas clássicas, mas, sim, certas formas de debilidade motora,
denominando-as de instabilidades psicomotoras, inibições psicomotoras, certas
faltas de destreza de origem emocional ou devido à desordem de lateralização,
dispraxias de evolução, certas disgrafias, tiques, gagueiras e outras formas de
desorganizações.

         Continuando, Le Camus (1986) dá uma nova definição a


psicomotricidade: “uma motricidade em relação”, o que, no pensamento de
Levin (1995), é onde entra o segundo corte epistemológico, onde se opera uma
passagem no enfoque do olhar do psicomotricista, olhar este que não está
mais voltado ao plano motor, mas direcionado a um corpo em movimento.
Dessa forma não se trata mais de uma reeducação, mas de uma terapia
psicomotora, que se ocupa, observa e opera num corpo em movimento que se
desloca, que constrói a realidade, que conhece à medida que começa a se
movimentar, que sente, que se emociona e cuja emoção manifesta-se
tonicamente. 

         Portanto, essa abordagem, com esse enfoque “global” do corpo do sujeito,


estaria determinada por três dimensões nas quais o psicomotricista centrará o
seu olhar: uma dimensão instrumental, uma dimensão cognitiva e uma
dimensão tônico-emocional. Continuando Levin (1995, p.42) diz que:

“A terapia psicomotora centra seu olhar, a partir da comunicação e da


expressão do corpo, no intercâmbio e no vínculo corporal, na relação
corporal entre a pessoa do terapeuta e a pessoa do paciente em
diálogo de empatia tônica”. 

         Nesse sentido, o novo enfoque dado à relação, à afetividade e ao


movimento, possibilita uma reformulação na prática da psicomotricidade:
abandonam-se as técnicas reeducativas, abrindo-se espaço para a terapia
psicomotora. 

         As contribuições da psicanálise, a partir de 1974, passam cada vez mais,


a integrar-se aos interesses teóricos e metodológicos dos psicomotricistas, o
que vai abrir espaço para que, em 1977,  Samí Alí,  lance uma proposta para
uma articulação mais profunda entre as teorias psicanalíticas e a
psicomotricidade. Dessa forma, a psicomotricidade incorpora em suas
construções teóricas, vários conceitos psicanalíticos: inconsciente,
transferência, imagem corporal, sublimação e outros, ficando assim um esboço
de uma teoria psicanalítica da psicomotricidade.  Nesse período  André
Lapierre e Bernard Aucoutourier delimitam suas posturas.

         Neste momento do percurso histórico da psicomotricidade marcado


profundamente pela teoria da psicanálise, Levin (1995) demarca uma virada
fundamental na concepção teórica-prática do campo psicomotor, situando,
portanto, o terceiro corte epistemológico, em que o olhar do psicomotricista já
não está mais centrado num corpo em movimento, mas num sujeito desejante
com seu corpo em movimento. No vínculo com o cliente, o psicomotricista leva
em consideração não mais à relação de empatia, mas a relação transferencial,
dando ênfase não mais à manifestação expressiva, mas simbólica, delineando-
se, assim, o campo da clínica psicomotora. Ainda Levin (1995 p.42)

“A clínica psicomotora é aquela na qual o eixo é a transferência e,


nela, o corpo real, imaginário e simbólico é dado a ver ao olhar do
psicomotricista. O sujeito diz com seu corpo, com sua motricidade,
com seus gestos, e, portanto, espera ser olhado e escutado na
transferência desde um lugar simbólico”.

         Os norte-americanos insistem sobre a concepção perceptivo-motora e o


papel do desenvolvimento motor no desenvolvimento perceptivo. Destacados
autores norte-americanos, apud Lorenzon (1995), como Kephart, Cratty, Frostig
e Barsch, aprofundam os aspectos complementares dessa visão dominante em
seu País.  

         Kephart apud Lorenzon (1995) considerou as experiências de espaço e


tempo como fase da aquisição, bem como da generalização motora, e sugere
um programa de exercícios de desenvolvimento perceptivo motor, de controle
ocular de percepção da forma. Por outro lado, Cratty estuda o comportamento
perceptivo-motor numa visão global do movimento ligada ao desenvolvimento
intelectual e esquematiza sua teoria na pirâmide do comportamento perceptivo
motor.

         Getman, apud Lorenzon (1995) investiga o complexo viso-motor e Frostig,


autora conhecida no campo das dificuldades escolares pelo seu teste de
percepção visual e seu Centro de Terapia Educacional, pesquisa a educação
pelo movimento, através de investigações multidisciplinares.

         Em alguns países, a profissão do psicomotricista é reconhecida de direito


e, em outros, vem buscando este reconhecimento a exemplo do Brasil. Na
década de 50, alguns profissionais ligados às áreas da deficiência começaram
a valorizar o corpo e o movimento. Nessa época, em Porto Alegre/RS, foi
criado o serviço de Educação Especial, dentro da Secretaria de Educação do
Estado, dirigido pela psicóloga Rosat, inserindo no atendimento a Ortopedia
Mental e a Educação Física para excepcionais.  

         Em São Paulo/SP, Hain Grunspum, psiquiatra da infância e A. Lefevre


neurologista, enfatizavam o movimento para os processos terapêuticos da
criança excepcional. E no final da década, Grunspum já indicava exercícios
psicomotores nos distúrbios de aprendizagem por Lesão Cerebral Mínima,
caracterizando os distúrbios de psiconeurológicos.

         Em 1951, no Rio de Janeiro/RJ, foi criado o primeiro curso de formação


de professores para deficientes auditivos, onde eram incentivadas as
atividades de Educação Física com jogos, dramatizações, mímica, ritmo e
dança. Glorinha Benttannuller (1951) tentava inovar a educação do deficiente
visual, associando o movimento e a expressão corporal à voz, e na deficiência
mental exercícios de motricidade no esquema de reeducação psicomotora.
Lucia Bentes (1960) introduziu exercícios de motricidade aos logopedistas
visando à orientação espacial, o ritmo e a coordenação motora. 
Posteriormente foi introduzida a cadeira de psicomotricidade na Faculdade de
Logopedia da Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ, por Maria Amélia
Machado. Esses profissionais recebiam a formação em psicomotricidade pelas
escolas francesas e, posteriormente, argentinas.
         Maria Silvia Machado (1962) chegou a Belo Horizonte/MG, após um
estágio em Psicomotricidade no Hospital Henri Rouselle em Paris/França,
procurando iniciar seu trabalho nessa capital. Em 1965, criaram o trabalho de
reeducação psicomotora no Instituto Brasileiro E. Claparede, Instituto
Pedagógico e, em 1968, na clínica Psiquê Psicologia Aplicada.

         A partir de 1968, foi que se difundiu a psicomotricidade no Brasil, através


de cursos e cadeiras de psicomotricidade em universidades de diversos
estados brasileiros. Aqui, aconteceu à mesma evolução ocorrida na França. No
início, a psicomotricidade foi introduzida nas escolas especializadas como um
recurso psicopedagógico que visava corrigir distúrbios e preencher lacunas de
desenvolvimento das crianças excepcionais. Nessa abordagem
instrumentalista, começaram a se aplicar exercícios conhecidos da maioria dos
professores como: exercícios de coordenação viso-motora, ritmo, orientação e
estruturação espacial, organização do esquema corporal, lateralidade dentre
outros.

         A primeira formação sistematizada aconteceu no Rio de Janeiro com a


vinda, da França, de Mademoiselle Ramain e Germain Farjado, em 1970. 
Posteriormente, iniciaram os cursos de formação pelos franceses André
Lapierre e Francoise Deobeau.  Lapierre trabalha o auto conhecimento, em
vista de uma abordagem psicomotora relacional, que valoriza o movimento
espontâneo e a parte fantasmática do mundo interno de cada indivíduo.
Desobeau, dentro de uma abordagem relativamente nova e revolucionária, a
partir de uma atividade espontânea, acompanha o cliente em suas
explorações, que vão lhe permitir perceber o mundo e colocar-se nele,
vivenciando diferentemente os vários níveis de desenvolvimento: sensório-
motor, psicomotor e tônico-emocional. Essas vivências vão possibilitar refazer
as ligações que estavam perturbadas, e finalmente, tornar possível engajar-se
neste mundo de uma forma harmoniosa e saudável.

         Em 1980, foi fundada a Sociedade Brasileira de Terapia Psicomotora, sob


a presidência de Beatriz Saboya, fruto de muito trabalho, e com a participação
de Françoise Desobeau, tendo conseguido, então, ser integrada à Sociedade
Internacional de Psicomotricidade, que era sediada em Paris/França.

         Os objetivos da época visavam a não deixar se perder a diversidade e a


grande riqueza humana dos diversos profissionais interessados pela
psicomotricidade, pois ela constitui um campo profissional específico por si
mesmo, sendo uma especificidade que atende a diversas áreas.

         Em 1982, a Sociedade Brasileira de Terapia Psicomotora/SBTP, começou


a organizar, no Rio de Janeiro, os seus trabalhos, acontecendo o primeiro
congresso, presidido por Beatriz Saboya.  A partir dessa época começaram a
surgir aqui às primeiras publicações na área da psicomotricidade. Inicialmente,
os Anais do referido Congresso, a revista Continuidade do CESIR, as
monografias apresentadas à Sociedade, o primeiro exemplar do IPERA e a
revista Corpo e Linguagem, da Editora Jacobé, dirigida por Sônia Pereira
Nunes.
         Seguindo a evolução da psicomotricidade, surgiu no Brasil, em 1983, o
curso de Pós Graduação em Psicomotricidade, na Universidade Estácio de Sá
e no Instituto Brasileiro de Medicina de Reabilitação IBMR, ambos na cidade do
Rio de Janeiro. Em 1985, Beatriz Saboya criou um curso de formação, em 4
anos, no Centro de Estudos da sua Clínica, e Regina Morizot iniciou um curso
de Especialização em terapia psicomotora, em sua própria clínica, Centro de
Estudos de Terapia Associadas, com duração de três semestres.

         Nos anos de 1986/7, foi ministrado, na Universidade do Estado do Rio de


Janeiro, um curso de Educação e Reeducação Psicomotora como
Especialização em Psicomotricidade, em nível de pós-graduação Lato-Sensu.
E, em julho de 1989, no mesmo instituto IBMR, foi aberto o curso de formação
de psicomotricista com duração de quatro anos, em nível de graduação, hoje,
já aprovado pelo MEC. Nossa evolução aqui aconteceu como na França.
Iniciou-se com a reeducação psicomotora, e posteriormente a educação,
terapia e clinica psicomotora.

         Profissionais que já trabalhavam com a psicomotricidade começaram a se


preocupar, procurando fazer vivências psicomotoras, através de grupos de
estudos, então existentes.  O contato com o trabalho psicomotor mostrava
como era difícil atuar com pessoas portadoras de necessidades especiais, com
dificuldades ou perturbações psicomotoras, sem alcançar em primeiro lugar um
bom conhecimento de si mesmo. É muito importante para um profissional que
atua com seres humanos conhecer bem a si próprio e trabalhar as suas
dificuldades para que possa ter uma boa compreensão e saber lidar com as
dificuldades do outro. A Educação Especial foi o elo de surgimento e de ligação
da psicomotricidade na Europa e no Brasil.

         A Sociedade Brasileira de Psicomotricidade, desde os anos de 80, pela


necessidade de ampliar seus objetivos, está presente, em vários estados,
promovendo cursos, seminários e pesquisas, com bons trabalhos científicos,
acontecendo vários congressos nacionais, com repercussões internacionais: 
 
 
 
 

Quadro I - Congressos Nacionais da Sociedade Brasileira de


Psicomotricidade

    CONGRESSO      PRESIDENTE       LUGAR ANO


I O Corpo em Movimento      Beatriz Saboya   Rio de 1982
Janeiro/RJ
II O Corpo Integrado Maria Terezinha Belo 1984
Araújo Horizonte/MG
III Psicomotricidade: seu objeto, seu Maria Aparecida Porto Alegre/RS 1986
espaço, seu tempo. Babst
IV A Imagem do Corpo Regina Morizot Rio de 1989
Janeiro/RJ
V O Sujeito na Prática Psicomotora Katia Godinho
Salvador/BA 1992
VI Especificidade da Psicomotricidade Vera Lúcia Matos
Rio de 1995
Janeiro/RJ
VII Psicomotricidade de Fato e de Dayse Campos de Fortaleza/Ceará 1998
Direito, Formação e Ética. Sousa
VIII Psicomotricidade: da prevenção ao Leila Manso Leon Rio de 2001
tratamento Janeiro/RJ
IX Psicomotricidade uma realidade Ibrahim Danyalgil Recife/PE 2004
transdisciplinar Junior
X  Interfaces da Psicomotricidade. Maria do Carmo Fortaleza/CE 2007
Façanha
 

         Um grande marco do VII Congresso foi à fundação da Red Fortaleza


Latino-americana de Universidades com formação em Psicomotricidade, aberta
e a ser integrada por todas as instituições de caráter universitário da
Latinoamérica com formação em psicomotricidade. Seus principais objetivos
são conseguir o pleno reconhecimento da profissão de psicomotricista na
região, procurando atuar em forma conjunta e colaborando com as diferentes
Instituições Científicas e Gremiais que atuam no âmbito da psicomotricidade. A
Red foi formada com a presença de profissionais do Uruguai, Argentina, Chile e
Brasil e conta com uma lista de discussão em um site na internet –
www.chasque.apc.org/psicomot.

         Em Janeiro de 2000, teve início a Especialização em Psicomotricidade na


Universidade Estadual do Ceará – UECE, Brasil. Este projeto foi elaborado
pela autora da presente investigação e até o presente momento acontece sob
sua coordenação na capital, terminando este ano a segunda turma e está
sendo estendido para o interior do estado. Em 2001 iniciou-se no município de
Tauá. Atualmente, através de muito esforço e divulgação, começa a produzir
frutos com a defesa de mais de 60 monografias e o outorgamento de títulos de
Especialista em Psicomotricidade.

         Atualmente, lutamos pela regulamentação da profissão do psicomotricista


no Brasil. Hoje, temos cursos de graduação, cursos de especializações por
vários estados brasileiros, inúmeros trabalhos científicos publicados, mas ainda
não temos o reconhecimento da profissão de direito; apenas de fato.

“Muitas dificuldades de teorização nascerão, muitos conflitos da prática


se equacionarão, mas a evolução da Psicomotricidade não pode deixar
de ter como orientação básica que o ser humano é único, total
evolutivo, e que ela na sua essência interventiva, lhe deve facilitar o
acesso a um funcionamento psíquico normal otimizado”. (Fonseca
1988, p. 98 )

1. Psicóloga, Psicomotricista, Mestre em Educação Especial.

o Texto do Livro: Psicomotricidade: Integração Pais, Criança e Escola – Ed. Livro

     Técnico/2004.

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