3
ESTRUTURAS CRISTALINAS
INTRODUÇÃO
A estrutura dos materiais sólidos é resultado da natureza de suas ligações
químicas, a qual define a distribuição espacial de seus átomos, íons ou moléculas. A
grande maioria dos materiais comumente utilizados em engenharia, particularmente
os metálicos, exibe um arranjo geométrico de seus átomos bem definido,
constituindo uma estrutura cristalina. Um material cristalino, independente do tipo de
ligação encontrada no mesmo, apresenta um agrupamento ordenado de seus
átomos, íons ou moléculas, que se repete nas três dimensões. Nesses sólidos
cristalinos, essa distribuição é muito bem ordenada, exibindo simetria e posições
bem definidas no espaço. Em estruturas cristalinas, o arranjo de uma posição em
relação a uma outra posição qualquer deve ser igual ao arranjo observado em torno
de qualquer outra posição do sólido, ou seja, qualquer posição em uma estrutura
cristalina caracteriza-se por apresentar vizinhança semelhante.
59 Estruturas Cristalinas
Tabela 3.1. Parâmetros de rede e ângulos dos sete sistemas cristalinos de Bravais.
a a a
a a
a
a a a
CÚBICO
a a
β c β c c
c
a a
b b a a
MONOCLÍNICO TETRAGONAL
b b b b
b
c c c c
a a a a
ORTORRÔMBICO
a
γ
a
α
a c
α
c β α
α
a a a
b a
Exemplo 3.1
O chumbo exibe estrutura CFC. Qualquer quantidade de chumbo sólido é
constituída por pequenos cubos imaginários (células unitárias), com arestas
medindo 0,495x10-9 m, onde os átomos desse elemento ocupam vértices e centro
das faces. A partir dessas informações, calcule o número de cubos existentes em 1
cm3 (1x10-6 m3) de chumbo.
Solução
O número de células unitárias é obtido pela divisão do volume total pelo
volume de uma célula.
Volume da célula unitária do chumbo=(0,495x10-9 m)3=1,2x10-28 m3
Número de células unitárias=1x10-6 m3/1,2x10-28 m3=8,2x1021 células (cubos)
Estrutura
Número Massa Atômica Densidade Raio
Elemento Símbolo o 3
Cristalina à 20
Atômico (g/mol) à 20 C (g/m ) o
Atômico (nm)
C
N VA
F. E. =
VC
3.1
Exemplo 3.2
Calcule o fator de empacotamento de uma estrutura cúbica simples.
Estruturas Cristalinas 64
Solução
O número de átomos que estão efetivamente em uma célula cúbica simples
é resultado da soma dos átomos presentes em seus vértices.
Número de vértices = 8
Número de átomos por vértice = 1/8
Número total de átomos = 8 . 1/8 = 1
Volume ocupado por átomos (VA) = 1 . Volume de 1 átomo = 4/3.π .r3
Volume da célula unitária,
3 3 3
V C = a = (2r ) = 8r
3.2
Fator de Empacotamento,
4
1 πr 3
3 3.3
F.E. = = 0,52
8 r3
ou seja, apenas 52% desta célula unitária são preenchidos por átomos. Devido ao
baixo índice de ocupação desta célula, os metais não apresentam este tipo de
arranjo. Uma única exceção é o polônio (Po).
No arranjo cúbico de corpo centrado (CCC) existe um átomo em cada vértice
de um cubo e um outro átomo no centro do mesmo, como mostra a figura 3.3. Esta
estrutura pode ser encontrada no cromo, vanádio, zircônio, tungstênio, tântalo,
bário, nióbio, lítio, potássio, etc. O parâmetro de rede a dessa estrutura é função da
presença do átomo central, e é diferente do caso anterior. Ao se observar a diagonal
principal da célula unitária dessa estrutura constata-se que seu tamanho
corresponde a quatro raios atômicos. Assim, o parâmetro de rede é calculado a
partir do teorema de Pitágoras ou:
2
(
a + a 2 )2
= (4r )2
3.4
4r
a= 3.5
3
Exemplo 3.3
65 Estruturas Cristalinas
Solução
O número de átomos que estão efetivamente em uma célula cúbica de corpo
centrado é resultado da soma dos átomos presentes em seus vértices, mais aquele
localizado em seu centro.
Número de vértices = 8
Número de átomos por vértice = 1/8
Número total de átomos = 8.1/8 + 1 = 2
Volume ocupado por átomos (VA) = 2 . Volume de 1 átomo = 8/3.π .r3
Volume da célula unitária,
3 4r 3 64 r 3
VC = a = ( ) = 3.6
3 3 3
Fator de Empacotamento,
8
πr3
F.E. = 3 = 0,68
64 r 3 3.7
3 3
ou seja, apenas 68% desta célula unitária são efetivamente preenchidos por
átomos.
Figura 3.3. Representação de uma célula unitária CCC: (a) posições dos átomos; (b)
arranjo atômico; (c) átomos no interior da célula unitária.
Exemplo 3.4
Solução
67 Estruturas Cristalinas
4
3 πr 3
F.E. = 3 = 0,60 3.13
12 r 3 3
Figura 3.5. Representação esquemática de uma célula unitária HS: (a) posições
atômicas; (b) arranjo atômico; (c) átomos dentro da célula unitária.
3.14
4 3
6πr
F.E. = 3 3 = 0,74 3.15
24r 2
SEQÜÊNCIA DE EMPILHAMENTO
A estrutura cúbica de face centrada tem o mesmo fator de empacotamento
da estrutura hexagonal compacta (0,74). Este fato não é apenas uma coincidência,
mas resultado da natureza dos planos cristalinos que constituem estas duas
estruturas. Observando a seqüência de empilhamento de planos cristalinos na
direção da diagonal do cubo da estrutura CFC e na direção perpendicular à base no
caso da hexagonal compacta, nota-se que os arranjos atômicos, em ambos os
casos, são de mesma natureza. A diferença entre as duas estruturas concentra-se
no posicionamento dos átomos destes planos em relação a um ponto de referência.
Enquanto os planos do cristal HC apresentam apenas duas variações de
Estruturas Cristalinas 70
4 5 6
(a)
1 2 3 4
5 6 7 8
(b)
Figura 3.7. Seqüência de empilhamento de planos compactos das estruturas (a) HC
e (b) CFC.
71 Estruturas Cristalinas
ALOTROPIA OU POLIMORFISMO
Diversos elementos, bem como compostos químicos apresentam mais de
uma forma cristalina, dependendo de condições como pressão e temperatura
envolvidas. Este fenômeno é denominado de alotropia ou polimorfismo. Metais de
grande importância industrial como o ferro, o titânio e o cobalto apresentam
transformações alotrópicas em temperaturas elevadas. A tabela 3.3 mostra alguns
metais que exibem variações alotrópicas e suas temperaturas de transformação.
A variação alotrópica encontrada em cristais de ferro pode ser considerada
como um clássico exemplo de polimorfismo, conforme ilustra a figura 3.8. Esta
variação alotrópica é muito importante em processos metalúrgicos, pois permite a
mudança de certas propriedades do aço (Fe + C), através de tratamentos térmicos.
α existe de -273 a 9120C e tem estrutura cristalina CCC. Entre 768 e 9120C, o ferro
α deixa de ser magnético e, algumas vezes, é chamado de ferro β . O ferro γ
existe de 912 a 1.3940C e tem estrutura CFC. O ferro δ existe de 1.394 a 1.5390C,
apresentando, novamente, estrutura CCC. A diferença entre as estruturas CCC do
ferro α e do ferro δ reside no valor do parâmetro de rede dos dois casos. Na faixa
de temperaturas mais baixa, o parâmetro de rede é menor.
Líquido 1.539 oC
1.500 -
Ferro δ
1.394 oC
1.400 -
1.300 -
Ferro γ
1.200 -
Temperatura oC
1.100 -
1.000 -
912 oC
900 -
Ferro β
800 - 768 oC
Líquido α
700 -
Tempo
Exemplo 3.5
Solução
(
VI = VCFC = a 3 = 2 2 R ) 3
= 16 2 R 3 = 22,62 R 3
Estruturas Cristalinas 74
Após a transformação:
3
4R 128 3
VF = 2VCCC = 2a 3 = 2 = R = 24,63 R 3
3 3 3
(0,0,1)
(0,1,1)
(1,0,1) (1,1,1)
(0,0,0) (0,1,0) y
(1,1,0)
(1,0,0)
c
b
y
a v xyz
Figura 3.11. Uma direção em uma célula unitária é determinada a partir de um vetor
que parte da origem e atinge a posição definida pelas coordenadas consideradas.
x y z
+ + =1 3.17
a b c
onde a, b e c referem-se às posições de interceptação do plano com os eixos x, y e
z, respectivamente. No caso de um plano ser paralelo a um ou mais eixos, os
valores de a, b ou c podem ser infinitos, o que leva à adoção dos inversos de a, b e
c, na identificação do plano. Assim, faz-se h=1/a, k=1/b e l=1/c. Dessa maneira, a
equação 3.18 pode ser reescrita como:
hx + ky + lz = 1 3.18
z
[0 1 1]
4
[111]
3
1
[100]
2 y
[110]
x
Figura 3.12. Direções em uma célula unitária cúbica.
( h k l) , (h k l ) , ( h k l ) e ( h k l ) .
Em uma estrutura cúbica, os planos atômicos são importantes no tocante ao
comportamento mecânico. A figura 3.13 exemplifica alguns planos desse tipo de
estrutura.
z
[111]
[110]
3 2
1 y
[010]
x
Figura 3.13. Planos cristalográficos em estruturas cúbicas.
Exemplo 3.6
Determine os I.M. na estrutura cúbica, dos planos que passam pelas
posições atômicas (1,1,3/4); (1,1/2,1/4) e (0,1,0).
Solução
Os pontos fornecidos permitem estabelecer o plano mostrado. Uma linha
unindo os pontos (1,1,3/4) e (1,1/2,1/4) possibilita encontrar o ponto (1,1/4,0).
Deslocando a origem, é possível notar que o plano intercepta o eixo x em x=–1, o
eixo y em y=-3/4 e o eixo z em z=3/4. Isso conduz aos I.M.= ( 3 4 4) .
79 Estruturas Cristalinas
(1,1,3/4)
(0,1,0)
y
x
(1,1/2,1/4)
(1,1/4,0)
3.21
ou
B.A
cos φ=
B. A
3.22
ou
x1x 2 + y1y 2 + z1z2
cosφ = 2 22 2 2 2 3.23
( x + y + z1 )1/ 2 ( x 2 + y 2 + z 2 )1/ 2
1 1
Estruturas Cristalinas 80
(x1,y1,z1)
B-A
A
φ
(x2,y2,z2)
(0,0,0) B
Exemplo 3.7
Determine o ângulo entre as direções [111] e [110].
Solução
O ângulo pode ser obtido através de trigonometria ou a partir da equação
3.23, ou seja:
x 1 x 2 + y 1 y 2 + z 1z 2 1. 1 + 1. 1 + 1. 0 2
cosφ = = =
2 2 2 2 2
( x 1 + y 1 + z1 )1/ 2 ( x 2 + y 2 + z 2 )1/ 2
2
(1 + 1 + 1)1/ 2 (1 + 1 + 0)1/ 2 6
Logo, o valor de φ é igual a 35,2o.
[111]
y
[110]
x
81 Estruturas Cristalinas
z
Plano A
C
A B
y
x
Plano B
Figura 3.15. Direção da intersecção do planos A e B dada pelo vetor C
a b c
A XB = hA kA l A = a(k A lB −k B l A ) + b(l A h B −lB h A ) + c(h A k B −h B k A )
hB kB lB
3.24
Exemplo 3.8
Determine a direção da intersecção dos planos (111) e (001).
Estruturas Cristalinas 82
Solução
O produto vetorial entre os planos A e B produzem o vetor C (direção de
intersecção):
a b c
C= 1 1 1 =a(1 −0) +b(0 −1) +c(0 −0) =a −b
0 0 1
A direção de intersecção é [1 1 0] .
+c
c
+a3
-a1
-a2 +a2
-c
+a1
a -a3
a3
[0001] +c
[ 1 1 20] [ 1 2 1 0]
[0 1 10]
2 [2 1 1 0]
1 1 -1 -1 [ 1 2 1 0]
-1
-1 [ 1 2 1 0] c
1 a2
+a3
-1 -a1
[1 1 00]
-a2 +a2
-c
+a1
a1 a -a3
(a) (b)
Figura 3.17 (a) Eixos basais e ilustração do procedimento para estabelecer direções
no sistema hexagonal; (b) Principais direções em uma célula unitária hexagonal.
O plano basal nesta estrutura é considerado um plano muito importante.
Como o plano basal superior é paralelo aos eixos a 1, a2 e a3, então o plano
Estruturas Cristalinas 84
interceptará tais eixos no infinito. Por outro lado, pode-se afirmar que tal plano
intercepta o eixo c em 1. Assim, a representação dos planos basais é dada por
(0001), como mostra figura 3.18. Usando o mesmo método, os pontos onde o plano
frontal da figura 3.18 intercepta os eixos são a1=+2, a2=-1, a3=-1, e c=∞. Isto permite
afirmar que tal plano é representado por ( 2 1 1 0) . O terceiro plano da mesma figura
intercepta os eixos são a1=∞, a2=1, a3=-1, e c=∞, o que resulta no plano (01 1 0 ) .
(0001) +c
(01 1 0)
c
+a3
-a1
( 2 1 1 0)
-a2 +a2
-c
+a1
a -a3
Exemplo 3.9
Identifique os índices de Miller-Bravais dos planos A e B e das direções Ce D.
D c
C
a3
a2
a1
85 Estruturas Cristalinas
Solução
Plano A:
a1=1; a2=1; a3=-1/2 e c=1. Invertendo tais valores, é possível obter 1; 1; -2 e 1,
respectivamente. Logo, o plano A tem índices (1
1 2 1)
Plano B:
a1=1; a2=-1; a3=∞ e c=∞. Invertendo tais valores, é possível obter 1; -1; 0 e 0,
respectivamente. Logo, o plano A tem índices (1 1 00 ) .
Direção C
Tomando-se uma direção paralela (que passa pela origem), tem-se um vetor da
origem até o ponto de coordenadas (1,-1,0,0). Logo, a direção será [ 1 1 00 ]
Direção D
Tomando-se uma direção paralela (que passa pela origem), tem-se um vetor da
origem até o ponto de coordenadas (1,-2,1,1). Logo, a direção será [ 1 2 11 ]
1 1
o +
n d e a to m o s2 2 1
Dlin e a=r = =
c o m p r imoe n t a a
3.25
1 1 1 1
+ + +
no de atomos 1 3.26
Dplanar = = 4 4 24 4 = 2
área a a
(100)
[100]
x
Figura 3.19. Plano (100) e direção [100] no sistema CS.
Exemplo 3.10
A estrutura do cádmio à temperatura ambiente é HC. Considerando que
seus parâmetros de rede são a=0,2973nm e c=0,5618nm, determine as
densidades atômicas: (a) Na direção [ 2 1 1 0] ; (b) No plano (0001).
Solução
A densidade na direção [ 2 1 1 0] é obtida determinando-se o número de
átomos dentro de uma distância conhecida. Tomando-se, na direção mecionada, a
distância eqüivalente a um parâmetro de rede a, tem-se
87 Estruturas Cristalinas
1 1
o +
n d e a to m o s2 2 1 1
=
Dlin e a r = = = −9
= 3,3 6
x 1 09
á to m o/ ms
c o m p r imo e n t a a 0,2 9 7x31 0 m
O plano (0001) é denominado de plano basal. A densidade de tal plano
pode ser obtida através da razão entre número de átomos presentes em uma
área determinada e o valor de tal área. Tomando-se como referência um dos
triângulos eqüiláteros do plano hexagonal, tem-se:
Número de átomos = 3 x 1/6 = 1/2 átomo
Área = 3,8x10-20 m2
1 1 1
o + +
n de atomos
Dplanar = = 6 6 -9 6 = 1,31x10 19 átomos/m 2
área 3,8x10 m
Exemplo 3.11
Sabendo-se que a massa atômica do ouro é igual a 196,97 g/mol, sua
estrutura é CFC e seu raio atômico é igual a 0,144 nm, determine sua densidade
em g/cm3.
Estruturas Cristalinas 88
Solução
A solução pode ser obtida tratando o problema a partir do volume de uma
célula unitária. Em uma célula unitária da estrutura cúbica de face centrada, o
número de átomos que efetivamente fazem parte da mesma e seu volume são
dados por:
196 ,97
o 4 x
(n de átomos) x (massa de 1 átomo) 6,02 x10 23
D= = = 19,3 g / cm 3
volume 3
16r 2
PROJEÇÃO ESTEREOGRÁFICA
Observar e obter informações sobre direções e planos em um sistema
cartesiano de três eixos necessariamente envolve visão espacial apurada. Além
disso, a natureza tridimensional da estrutura cristalina é uma barreira natural para
que características comuns da mesma sejam avaliadas e comparadas
conjuntamente através do sistema tradicional de três eixos. Tais observações
também são válidas no caso do sistema de eixos hexagonal. Com a finalidade de
contornar essas dificuldades, a estrutura cristalina pode ser estudada de maneira
alternativa utilizando-se de projeções estereográficas.
O conceito de estereografia está associado à representação de figuras
sólidas no plano, ou seja, no caso da cristalografia, à representação de planos e
direções em apenas duas dimensões. Pode-se resumir o conceito de projeções
estereográficas como um meio de representar características tridimensionais
utilizando-se de gráficos e figuras bidimensionais.
89 Estruturas Cristalinas
Plano (hkl)
z
Extensão do
Plano (hkl)
Interceptação
do plano (hkl)
com a
y superfície da
esfera
x
desse conjunto por um observado situado à frente de um dado plano. Nesse caso,
a esfera será vista como um círculo, o plano extendido como um círculo ou um
segmento de um círculo e o seu polo, como um ponto no círculo.
Nas estruturas cúbicas existem três famílias de planos principais, quais
sejam: famílias {100}, {110} e {111}. Planos dessas famílias são mostrados na
figura 3.21.
z Plano
Polo (100)
(100)
Polo
y (100)
Plano
x (100)
(a)
z Plano
(110)
Polo
(110)
Polo
y (110)
x Plano
(110)
(b)
91 Estruturas Cristalinas
Polo Polo
Plano (111)
(111)
(111)
y
Plano
x (111)
(c)
Figura 3.21. Representações estereográficas dos planos (a) (100); (b) (110) e (c)
(111).
O primeiro plano, (100), refere-se ao plano paralelo à face do cubo e é
visto na figura 3.21.a. Um observador situado à frente desse plano verá que a
extensão do mesmo plano corresponde a um círculo que coincide com o círculo
associado à projeção da esfera e definido como círculo principal. O mesmo
observador verá que o polo desse plano corresponde a um ponto localizado
exatamente no centro do círculo principal. A extensão do plano na parte posterior
da esfera também formará um círculo, ou parte desse. Nesse caso, é necessário
que a interceptação do plano com a superfície frontal da esfera seja indicada de
modo distinto da interceptação com a parte posterior da mesma esfera, por
exemplo, através de linhas contínua e tracejada. O mesmo procedimento deve ser
efetuado com relação a polos.
O segundo plano, (110), é mostrado na figura 3.21.b. Sua interceptação
com a superfície da esfera gera um arco, enquanto que um vetor perpendicular ao
plano gera o polo situado ao longo de uma linha divisória entre a parte superior e
a inferior do círculo, denominado de equador da esfera. Finalmente, o terceiro
plano, (111), é apresentado na figura 3.21.c. A extensão do plano (111) conduz a
um arco, enquanto que um vetor perpendicular ao mesmo, resulta em um polo
localizado no meio do primeiro quadrante do círculo.
Estruturas Cristalinas 92
θ
φ Linhas de
Latitude
Linhas de
Polo Longitude
Sul
Figura 3.22. Globo estereográfico.
93 Estruturas Cristalinas
Plano
(1 1 1)
z
Polo Polo
[110] [110]
y
x Plano
(1 1 1)
Plano
(1 1 0)
z
Polo Polo
[110] [110]
y
Plano
x
(1 1 0)
Polo Polo
[110] [110]
Plano
(001)
y
x Plano
(001)
(1 1 3)
Plano
(1 1 1) (110 )
(2 2 1)
Polo
[110]
(1 1 0)
(2 2 1)
(1 1 1)
(00 1)
001
01 1 011
101
11 1 111
110 110
010 010
100
11 1 11 1
10 1
01 1 01 1
00 1
(a)
011 1 01
111 001
1 11
101 011
110 1 10
111
100 010
110
11 1
10 1 01 1
(b)
Figura 3.28. Representação estereográfica padrão (a) (100) e (b) (111).
Nas projeções (100) e (111), os planos da família {100} são representados
por quadrados, os da família {110}, por elipses e finalmente, os planos da família
{111}, representados por triângulos. Tais figuras geométricas derivam do tipo de
corte que o plano faz junto à superfície do globo estereográfico.
Na figura 3.28, um outro fato interessante e que deve ser salientado
relaciona-se aos triângulos estereográficos. Analisando as projeções (100) e
(111), observa-se a existência de 24 triângulos. Esses triângulos têm em seus
97 Estruturas Cristalinas
vértices os pólos das famílias {100}, {110} e {111}. Essa constatação mostra que
um cristal cúbico é constituído por regiões cristalográficas semelhantes. Assim,
quando é necessário representar qualquer característica ou propriedade de um
cristal, basta utilizar apenas um triângulo estereográfico, com vértices exibindo
pólos na forma de um quadrado, uma elipse e um triângulo, como indica a figura
3.29.
111
100 110
Polo
(001)
z
Polo
(111)
Polo
(100) Polo
Plano (010)
y (111)
x Plano
(111)
(a)
Estruturas Cristalinas 98
Plano
(111)
Polo Polo
(100) (001)
z Polo
(111)
x
y Plano Polo
(111) (010)
(b)
Figura 3.30. Identificação do plano (111) no sistema cartesiano e através de
projeção estereográfica, antes (a) e após (b) uma rotação de 90 o em torno da
direção [100].
Polo
(001)
z
Polo
(111)
Polo
Polo
(100)
(010)
Plano
y (111)
x Plano
(111)
(a)
Polo
(001)
z
Polo
(111)
Polo
(100)
Polo
Plano
x (111)
(010)
Plano
y (111)
(b)
Figura 3.31. Identificação do plano (111) no sistema cartesiano e através de
projeção estereográfica, antes (a) e após (b) uma rotação de 90 o em torno da
direção [001].
99 Estruturas Cristalinas
Solução
Partindo-se da projeção padrão (100), pode-se obter a projeção desejada
pela rotação do globo de 90o em torno do eixo z [001], seguida da rotação de 180o
em torno do eixo y [010]:
Padrão (100)/polo norte:[001] Padrão (010)/polo norte:[001]
001 001
01 1 011 101 1 01
101 011
11 1 111 111 1 11
11 1 11 1 11 1 111
10 1 01 1
01 1 01 1 10 1 101
00 1 00 1
101 10 1
01 1
111 11 1
1 10 110
1 00 100
010
1 11 111
011
101
1 01
001
Estruturas Cristalinas 100
OBTENÇÃO DE RAIOS-X
A obtenção de raios-X para difração envolve a aplicação de tensões da
ordem de 35 kV entre um catodo (filamento de tungstênio) e um anodo (alvo
metálico), dentro de um sistema com alto vácuo. A figura 3.32 mostra um
diagrama esquemático de um tubo de raio-X.
O funcionamento do mesmo é bastante simples:
- Ao ser aquecido, o filamento de tungstênio (catodo) libera elétrons por
emissão termo-iônica. Devido a elevada diferença de potencial (35 kV), os
elétrons liberados são acelerados, ganham energia cinética e movimentam-se em
direção ao alvo metálico (anodo). Ao colidirem com o anodo, tais elétrons
provocam a emissão de raio-X. Em torno de 98% da energia cinética dos elétrons
é transformada em calor, o que torna necessário o emprego de um sistema de
refrigeração do anodo.
101 Estruturas Cristalinas
Raios-X
Alvo
Metálico
Vácuo
Fluxo de
Elétrons
Filamento de
Tungstênio
Sistema de
Refrigeração
DIFRAÇÃO DE RAIOS-X
No início do século 20, o conceito de onda foi incorporado definitivamente à
luz. Isso permitiu, juntamente com o desenvolvimento das teorias de Maxwell,
permitiu prever a difração de raios-X por fendas muito pequenas, como as que
são encontradas nas estruturas cristalinas de alguns materiais.
Se um feixe de raio-X monocromático (freqüência única) incide sobre um
átomo isolado, elétrons do mesmo são excitados e vibram com a mesma
freqüência do feixe incidente. Tais elétrons em vibração emitirão raio-X em todas
direções com a mesma freqüência do feixe incidente. Assim, o átomo isolado
espalha o feixe incidente em todas as direções. Entretanto, quando o mesmo
feixe incide sobre um conjunto de átomos ordenados, como é o caso da estrutura
cristalina e se este feixe monocromático tiver comprimento de onda com valor
semelhante aos espaçamentos entre tais átomos, então ocorrerá interferência
construtiva em algumas direções e destrutiva em outras. A figura 3.33 ilustra um
caso onde ondas em fase provocam interferência construtiva.
Nessa ilustração nota-se que a interferência construtiva de dois raios
monocromáticos ocorrerá quando os mesmos permanecerem em fase. Isto
acontecerá quando o segundo raio percorrer uma distância extra representada
Estruturas Cristalinas 102
Raio-X Raio-X
Incidente Difratado
θ θ
A
B θ θ
dhkl
D
SISTEMA RELAÇÃO
CRISTALINO
CÚBICO 1 2 +
k 2 + l2
= h
d2 a2
TETRAGONAL 1 2 + 2 2
= h 2 k + l2
d2 a c
HEXAGONAL 1 4 h 2 + hk + k 2 l2
= +
d2 3 a2 c2
ORTORRÔMBICO 1 2 2 2
= h2 + k 2 + l 2
d2 a b c
MONOCLÍNICO 1 1 h2 k 2 sen 2 β + l2
= +
d2 sen 2 β a 2 b2 c2
TRICLÍNICO 1
d 2
=
1
V2
( S11 h 2 + S 22 k 2 + S 33 l 2 + 2 S12 hk + 2 S 23 kl + 2 S13 hl )
V=Volume da célula;
S11=b2c2sen2α
S22=a2c2sen2β
S33=b2c2sen2γ
S12=abc2(cosα cosβ - seng)
S23=a2bc(cosβ cosγ - senα )
S13=ab2c(cosγ cosα – senβ )
Tubo de Raios-X
Porta-Amostras
Detetor
Detetor
Refrigeração
Escala de
Medida
12000
(110)
10000
8000
Intensidade
(211)
6000
4000
(200)
(220)
2000
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110
2θ
Exemplo 3.13
O difratograma do molibdênio mostrado na figura 3.35 foi obtido em um
equipamento com raios-X com λ =0,1542x10-9 m. Sabendo-se que tal elemento
exibe estrutura cúbica CCC ou CFC, determine:
(a) o tipo de estrutura cúbica;
(b) o primeiro plano a apresentar difração;
(c) a distância interplanar relativa a esse primeiro plano;
(d) o parâmetro de rede dessa estrutura;
(e) o raio atômico do molibdênio.
Considere difração de 1a ordem.
Solução
O difratograma da figura 3.35 mostra picos de difração em 2θ =42,2; 59,0;
73,6 e 87,4o. Tais dados levam à construção da seguinte tabela:
Pico 2θ θ senθ sen2θ
1 41,0 20,5 0,3502 0,1226
2 59,0 29,5 0,4924 0,2424
107 Estruturas Cristalinas
EXERCÍCIOS
3.1. Quais são as 14 células unitárias de Bravais ?
3.2. Quais são as estruturas cristalinas metálicas mais comuns ? Liste alguns
metais que apresentam estas estruturas.
3.3. Qual é o número de coordenação dos átomos de uma estrutura CCC ?
3.4. Qual é a relação entre tamanho da aresta "a" da célula CCC e raio atômico ?
3.5. O Nb, na temperatura ambiente tem estrutura CCC e apresenta raio atômico
de 0,147 nm. Calcule o valor do parâmetro de rede "a" em nanometros.
3.6. Calcule o fator de empacotamento da estrutura CFC.
3.7. Quantos átomos por célula existem na estrutura HC ?
3.8. O Ni é CFC com uma densidade de 8,9 Mg/m3 e tem sua M.A. é igual a
58,71.
a. Qual é o volume por célula unitária baseado no valor da densidade ? b. Calcule
o raio atômico do Ni a partir de sua resposta na parte (a).
Estruturas Cristalinas 108
3.9. O Titânio é CCC em alta temperatura. Seu raio aumenta em 2% durante sua
transformação de CCC para HC no resfriamento. Qual a variação percentual de
volume que ocorre nesta transformação ?
3.10. Liste as coordenadas das posições atômicas dos 8 átomos nos vértices e as
dos 6 nas faces de uma estrutura CFC.
3.11. Desenhe as seguintes direções cristalográficas em uma célula CCC e em
outra tetragonal com a/c=3:
a. [001] b. [110] c. [111] d. [113] e. [223]
3.12. Qual é a família de planos {100} no sistema cúbico ?
3.13. Um plano no sistema cúbico intercepta os eixos em x=2/3, y=-1/2 e z=1/2.
Qual são os índices de Miller para este plano ?
3.14. Desenhe os seguintes planos cristalográficos na estrutura CCC e liste as
coordenadas dos átomos com centros nestes planos:
a. (100) b. (110) c. (111)
3.15. O Al é CFC e tem parâmetro de rede "a" igual a 0,3158 nm. Calcule a
densidade planar de átomos nos planos (100) e (111).
3.16. Considerando novamente o Al, calcule a densidade linear de átomos nas
direções [100] e [111].
3.17. A estrutura do titânio à temperatura ambiente é HC. Considerando que seus
parâmetros de rede são a=0,295nm e c=0,468nm, determine as densidades
atômicas: a. No plano (0001); b. Na direção [2110];
3.18. Considerando que o círculo principal corresponde ao plano (001) e que o
polo norte está associado à direção [100], identifique os polos dos planos de
simetria da estrutura cúbica.
3.19. Derive a lei de Bragg a partir de um caso onde um raio incidente sofre
difração pelos planos paralelos de um cristal.
3.20. Uma amostra de um metal CCC foi colocada em um difratômetro de raios-X
com λ =0,1541nm. A difração obtida pela família de planos {220} apresentou
2θ =82,5500. Calcule o valor do parâmetro de rede deste elemento. Assuma
difração de 1ª ordem.
3.21. Um difratograma de raios-X revelou os seguintes picos de difração:
2θ =39,76o; 46,24o; 67,45o e 81,28o. De acordo com as informações existentes, tal
109 Estruturas Cristalinas