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A fertilização azotada da beterraba

Angel Sanz Saez


Engenheiro Agrónomo

Devido à minha origem rural e actividades profissionais, a minha experiência em


a beterraba desenvolveu-se em Espanha, com frequentes relações com institutos
de beterraba na Europa. Por isso, ao escrever para uma revista portguesa não
pretendo transferir os resultados numéricos de ensaios. Procurarei expôr tendências
e explicar o meu ponto de vista sobre a evolução da fertilização e do rendimento do
cultivo nestes ultimos 50 anos, em que ocorreram impressionantes aumentos dos
níveis de produtividade. Sómente uma informaçao: os rendimentos de 30t/ha dos
anos 50 em Espanha, passaram actualmente para níveis da ordem das 75t/ha,
continuando ainda a aumentar. Esta evoluçao produtiva foi semelhante nos países
da Uniao Europeia. De uma representaçao gráfica de Draycott pode-se observar
que os rendimentos no Reino Unido evoluiram das 3,5 ton de açucar/ha no ano
1930 para as 8,5 ton/ha no ano 2000.

O azoto, tem efeitos espectaculares no desenvolvimento das folhas o que, muitas


vezes, anima o agricultor a aplicar doses excessivas. É um facto histórico que se foi
corrigindo com maior ou menor sucesso segundo os países.

Diz o catedrático Urbano Terrón: “Um solo fértil deve produzir colheitas
remuneradoras de forma contínua com pequenas aportações de fertilizantes”. Esta
ideia nao entra em contradição com conseguir altos rendimentos, pois como
veremos mais adiante, a passagem de 30 a 75t/ha conseguiu-se diminuindo
sensivelmente as doses de fertilizaçao.

Que papel teve a fertilização na melhoria dos rendimentos?


Já exposemos anteriormente que nos últimos 50 anos se multiplicaram por 2,5 os
rendimentos. Há três realidades incontestáveis.

A) As doses de fertilizantes reduziram-se;


Nos anos 50 uma fertilização típica em Espanha consistia em aplicar 1000kg/ha
do fertlizante de beterraba 9-18-27 de fundo mais 600kg/ha de nitrato amónico
26%. Actualmente a fertilizaçao é muito mais variável, e adaptada a cada
situaçao. Uma média poderia ser 600kg/ha de 8-15-15 (ou 15-15-15 ou
300kg/ha de 18-46-0) mais 400kg/ha (de 200 a 600) do mesmo nitrato
amónico. A dose de azoto desceu consideravelmente de 250kg/ha a 190kg/ha,
mas a dose aplicada por tonelada de raíz produzida baixou enormemente de
8kg de azoto/tonelada de raíz para 2,5kg . No Reino Unido, passou-se nos
últimos 30 anos de 6kg de azoto/ton de raíz para 1,7 kg (Draycott 2000) .

B) Agora fertiliza-se mais à medida, menos e melhor


Quer por análises de solos ou por recomendações comarcais realizadas pelos
técnic os de campo, a adaptação dos níveis de fertilização às realidades
concretas é um facto.

C) A “lei dos mínimos”, tao antiga como certa, desempenhou um papel


importante nesta redução.
Demonstrou-se plenamente que existiam outras técnicas que se podiam
melhorar e eram as que limitavam muito o rendimento.
Solos antigos e solos de novos regadios. O nível de reservas do solo
Quando se parte de um solo de cultivo em sequeiro para regadio este, sobretudo
em regioes áridas e pouco produtivas, está empobrecido, com níveis muito baixos

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de nutrientes em reserva. Constatamos, em perímetros de regadio novos, como
tinhamos que forçar as doses de fósforo, quando em terras próximas de regadios
antigos não havia resposta a incorporações deste elemento no esquema de
fertilização. Recordamos que era mesmo necessário forçar o azoto nestas situações.
Com isto pretendemos dizer que os solos devem ser levados a níveis aceitáveis de
nutrientes, com doses de correcção se for necessário, para passar posteriormente a
doses de manutenção para altas produtividades, doses essas que são bastante mais
baixas que aquilo que o agricultor costuma pensar.

Que quantidade de azoto extrai a beterraba do solo?


Fixamos a colheita standard em 75ton/ha. Os números da biografia consultada são,
como sempre, muito variáveis. Uns números indicativos podem ser:
- raizes+coroas+folhas................... 250 kgN/ha
- raizes......................................... 120 kgN/ha (exportados com a colheita)
- coroas+folhas.............................. 130 kg/ha (re incorporados no solo)

Donde vem o azoto


A sua origem primária é a atmosfera. O ar contém 76% de azoto gasoso.
Demonstra-se que, ao azoto atmosférico, correspondem 77.000ton/ha (Foth and
Ellis, 1977). Este azoto não é assimilável pelas plantas e para sua utilizaçao deve
ser transformado pela indústria em azoto amoniacal, ureico ou nítrico . A rocha
mãe da qual provém o solo nao contém azoto.
O azoto chega ao solo através de:
- Arrastamento de chuvas e neves (10-20kg/ha.ano)
- Fixação microbiana por simbiose (100kg/ha.ano com algumas leguminosas e
300kg/ha.ano com Luzerna e outros).
- Fixação microbiana por outros processos (10- 20kg/ha.ano).

Conteúdo de azoto no solo


Um bom solo agrícola da zona interior de Espanha estima-se que tenha níveis de
matéria orgânica de 1,5% a 2,5% (sendo este último um valor já muito alto), com
um conteúdo orgânico da ordem de 5% (Draycott 2003). A camada arável de 30cm
(4000ton/ha) pode conter de 3 a 4ton/ha de azoto orgânico que, segundo a sua
maior ou menor mineralizaçao (de 1 a 3%) pode liberar de 30 a 120kg/ha.ano (P.
Urbano Terrón 2001) de azoto mineral utilizável por plantas e microorganismos.
É de tal importância o contributo de azoto mineralizado pelo solo em certos países
com cultivo de regadio, que é necessário manter as condiçoes de mineralizaçao em
bom estado através da estrutura do solo (lavoura adequada e no seu momento) e
uma prática impecável da rega. Há que não esquecer que a beterraba devolve ao
solo 130kg de N. orgânico/ha por meio dos seus resíduos, folhas e coroas.
Embora o conteúdo de azoto orgânico é bastante estável, o de azoto mineral varia
muito ao longo do ano (de, p.ex. menos de 10ppm a mais de 70ppm). O azoto
mineral do solo é nítrico na sua maior parte (90%) e amoniacal em menor
proporçao (10%).

A resposta da colheita da beterraba à dose de nitrogenio


Nos gráficos nº 1 e 3 representam-se linhas de tendências como uma referência.
Podem variar sensìvelmente de uns casos para os outros mas a sua forma é a
representada. Os parâmetros de colheita estao em valores precentuais sobre a dose
zero

A) O rendimento em açucar/ha (gráfico nº 1).


A melhor linha de regressão que se costuma encontrar nos ensaios é uma
polinomial de segundo grau, crescente, alcança um máximo e depois é

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decrescente. Há que destacar que normalmente a “dose zero” costuma ser
cerca de 70 a 90% da dose optima; resultados inferiores são raros. Os
resultados em que a dose zero é a melhor costumam ocorrer em terras com
cultivos hortículas ou outros, excessivamente fertilizados. Aos agricultores
destas parcelas tem que se recomendar dose zero de azoto, ou muito baixa, e
que moderem a fertilizaçao azotada na sua rotaçao, sem o que nao se sairá das
baixas polarizaçoes. Como situação específica na beterraba verifica-se que
depois da dose optima, o açucar/ha entra rapidamente num ramo descendente.
O mesmo nao acontece nos cereais, em que passada a dose máxima há um
intervalo em que o rendimento se mantém (gráfico nº 2).

Gráfico nº1 - Tipo de resposta da beterraba ao


Azoto

150

100

50

0
0 100 200 300
peso/ha
N/ha azucar/ha
pol

Gráfico nº 2 - Tipo de resposta de um cereal ao Azoto

200

150

100 peso

50

0
0 50 100 150 200 250 300
N/ha

B) A polarizaçao desce linerlmente com a dose de azoto, embora às vezes as


primeiras 50N produzam um ligeiro aumento. É sabido que, quando há
problemas de baixas polarizações o azoto costuma ser uma das causas.

C) O rendimento em peso.- A sua curva é mais “alta e extensa” do que a da


polarizaçao; o seu máximo alcança-se com mais azoto, mas também chega
a decrescer.
D) Os parâmetros de qualidade tecnológica estao representados no gráfico nº
3. O azoto prejudica a qualidade, podendo fazer perder 2 pontos de

3
percentagem de açucar branco. Com este elemento sobe o azoto alfa-amino
e arrasta nesta subida o sódio; o potássio é pouco afectado.

Gráfico nº 3 - Tipo de resposta da qualidade


tecnológica ao Azoto

350
300
250
alfa-amino
200
Na
150
K
100
50
0
0 50 100 150 200 250 300
N/ha

As normas ou formulas de recomendaçao


Cada país e/ou regiao tem que obter as normas em função das suas condiçõeses
através de ensaios e estudos próprios. É frequente que as correlações mais
importantes da dose de azoto com a colheita optima se obtenham através de
alguns dos seguintes parâmetros: matéria orgânica, azoto total (de influência
similar à anterior), azoto nítrico à saída do inverno, cultivo anterior, pluviometria,
cálculo da mineralizaçao. Em Espanha manejam-se fórmulas em função do azoto
total ou da matéria orgânica, do conteúdo do azoto nítrico à saída do inverno e,
segundo os casos, do cultivo anterior.

Fazer intervir a colheita esperada na recomendaçao?


Alguns laboratórios praticam-no. Em nossa opiniao, parece-nos errado.
Gostariamos saber como, com este critério, se poderia chegar à evoluçao de
aumento de rendimentos a que assistimos.

As recomendaçoes regionais
Os técnicos de campo, conhecedores das suas regiões, recomendam as doses
segundo esse seu conhecimento. Em Espanha costumam oscilar entre 100 e
240kgN/ha (solos muito pobres p.ex. areias de pinhal). Este critério regional é às
vezes muito importante uma vez que existem regiões para as quais, à priori, se
sabe que a melhor dose é 0N/ha ou uma dose muito pequena. Como é difícil
resolver o problema caso por caso, a melhor soluçao é a recomendação regional.

Uma recomendaçao de dose nacional única?


Nao é praticável pela variabilidade de casos.

Recomendar a dose zero quando resulte da aplicaçao de critérios técnicos?


Sim, sem nenhuma dúvida. Existem numerosas citações bibliográficas, e nos
nossos países há situaçoes evidentes criadas pelos cultivos da rotaçao (hortícolas
em geral e às vezes o milho) que exigiriam uma dose teórica negativa. Na prática,
sería o mesmo que dizer ao agricultor de milho p.ex., que modere as suas doses,
que também o milho beneficiaria.
Doses aplicadas pelo agricultor
Actualmente o agricultor em Espanha vem reduzindo a sua dose aproximando-se
das doses recomendadas. A média nacional costuma estimar-se em 190N/ha, tem

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uma grande variabilidade e só serve como dado estatístico. Na Uniao Europeia a
média geral é de 130kg N/ha, e varia segundo os países de 190N/ha a 95N/ha
(Draycott 2003).

Formas de azoto
Costuma -se empregar a forma amoniacal, em forma de adubos complexos para
fundo e, para coberturas, principalmente o nitrato de amónio; nestas também se
emprega a ureia e soluções azotadas. Em princípio, de um ponto de vista de
resultados práticos, nao há grandes diferenças, salvo situações especiais, como
p.ex. a lavagem por percolaçao da ureia quando há abundantes chuvas. As
formulações de assimilação lenta têm que demonstrá-la na prátic a; nao duvidamos
da boa ideia, mas na nossa experiência não chegámos a ver as suas vantagens nos
produtos comerciais actuais.

Técnicas de aplicação
A uniformidade da repartição tem uma importância grande, às vezes mais que a
própria dose (P. Allende). O mais utilizado é a aplicação de sólidos com máquina
(distribuidor) centrífuga. Pequenas doses de azoto localizado na sementeira são
uma melhoria, pensamos que devido mais à uniformidade de repartição do que à
própria localizaçao. As aplicações por fertirrigação são recomendadas pela sua
uniformidade e outras vantagens mecânicas.

Épocas de aplicação
A prática mais frequente é realizar três aplicações: uma de fundo, com 1/3 da dose
total; depois aplicam-se duas coberturas iguais, a primeira antes de 50% de campo
fechado (na primeira quinzena de Maio) a segunda antes de 100% de campo
fechado (primeira quinzena de Junho). A evoluçao nestes últimos anos é aplicar
toda a coberteira de uma só vez quando metade do campo está fechado. As
aplicações depois do campo fechado são totalmente desaconselháveis.

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