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Alexandre O’Neill

De seu nome completo Alexandre Manuel Vahía de Castro O’Neill de


Bulhões, o poeta nasceu em Lisboa, em 1924, e morreu, em Lisboa,
em 1986.

Foi um dos fundadores do Movimento Surrealista de Lisboa ao qual se


manteve fiel desde 1948 até 1951. Enquanto tal, foi um dos
colaboradores de Ampola Miraculosa e publicou, ainda, a colectânea
Tempo de Fantasma. Embora abandonando o Movimento, as
influências surrealistas irão marcar toda a sua obra.

Além de poeta, Alexandre O’Neill foi também publicitário, sendo da


sua autoria o famoso slogan Há Mar e Mar,Há ir e Voltar e Boch é
Bom.

Recebeu em 1982 o prémio da Associação de crÍticos literários.

Títulos significativos: No Reino da Dinamarca (1958); Abandono


Vigiado (1960); Poemas com Endereço (1962); Feira Cabisbaixa
(1965); Entre a Cortina e a Vidraça (1972); As Horas Já de Números
Vestidas (1981) e O Princípio da Utopia(1986).
Um Adeus Português Não podias ficar presa comigo
à pequena que cada um de nós
Nos teus olhos altamente traz docemente pela mão
perigosos a esta pequena dor à
vigora ainda o mais rigoroso portuguesa
amor tão mansa quase vegetal
a luz de ombros puros e a
sombra Mas tu não mereces esta cidade
duma angústia já purificada não mereces
esta roda de náusea em que
Não tu não podias ficar presa giramos
comigo até à idiotia
à roda em que apodreço esta pequena morte
apodrecemos e o seu minucioso e porco ritual
a esta pata ensanguentada que esta nossa razão absurda de
vacila ser
quase medita
e avança mugindo pelo túnel Não tu és da cidade aventureira
de uma velha dor da cidade onde o amor
encontra as suas ruas
Não podias ficar nesta cadeira e o cemitério ardente
onde passo o dia burocrático da sua morte
o dia-a-dia da miséria tu é da cidade onde vives por
que sobe aos olhos vem às um fio
mãos de puro acaso
aos sorrisos onde morres ou vives não de
ao amor mal soletrado asfixia
à estupidez ao despero sem mas ás mãos de uma aventura
boca de um comércio puro
ao medo perfilado sem a moeda falsa do bem e do
á alegria sonâmbula à vírgula mal
maníaca
do modo funcionário de viver *

Não podias ficar nesta cama Nesta curva tão terna e


comigo lancinante
em trânsito mortal até ao dia que vai ser que já é o teu
sórdido desaparecimento
canino digo-te adeus
policial e como um adolescente
até ao dia que não vem da tropeço de ternura
promessa por ti.
puríssima sa madrugada
mas da miséria de uma noite
gerada De No Reino Da Dinamarca,
por um dia igual 1958
Alexandre O'Neill
Este poema, pensa-se, foi dedicado à namorada francesa do poeta
Nora
Mitrani que regressou a França depois de uma estadia em Portugal.
Nele, o poeta exprime o desgosto e a mágoa que sente em relação ao
seu país
que vive nessa altura sob a ditadura salazarista.

Não tu não podias ficar presa comigo


à roda em que apodreço
apodrecemos
a esta pata ensanguentada que vacila

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