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CASO CLÍNICO

J.M.P.


David Queiroz Borges Muniz
Anamnese

Dados da admissão no PA
– Pct 36 anos, portador de miocardiopatia dilatada grave, já na
fila de transplante cardíaco. Internado há 1 semana no PA/HC
com quadro de choque cardiogênico.
– Relata mais de uma internação por mês já há vários meses.
Atualmente em uso domiciliar de furosemida(120+80),
losartan(12,5Uid), espirono(25Uid), digoxina(0,125Uid),
carvedilol(3,125Bid)
– Hoje queixando-se ainda de náuseas e vômitos, mas relata
melhora da dispnéia.
Exame Físico

Orientado, corado, hidratado

SR normais sem RA

FR 28irpm s/ esforço

RCR ritmo de galope

SSR III/VI f MI+axila

116bpm; PA palpatória: 90 mmHg

Pulsos grau I/IV; pulso alternante; PVJ↑↑

Abdome flácido RH1+; fígado a 3-4cm RCD
Miocardiopatia dilatada idiopática

doença primária do miocárdio de causa
desconhecida, caracterizada por dilatação do
ventrículo esquerdo, ou biventricular, e
contratilidade diminuída do miocárdio.
Epidemiologia

A incidência anual varia de 5-8 casos por 100000.

Nos EUA provoca anualmente 10000 mortes.

Negros e homens possuem um risco 2,5 vezes
maior quando comparados com brancos e
mulheres.

Associação convincente tem sido identificada
entre a doença e hipertensão, uso de agonistas
beta-adrenérgicos e consumo moderado de álcool.
Survival among Patients with Idiopathic Dilated Cardiomyopathy in Seven Series

Dec, G. W. et al. N Engl J Med 1994;331:1564-1575


Como dilatação cardíaca e disfunção podem
resultar de uma grande variedade de doenças
hereditárias, há importância prognóstica e
implicações terapêuticas na diferenciação das
causas secundárias e potencialmente reversíveis
de doença do miocárdio.
Known Causes of Dilated Cardiomyopathy

Dec, G. W. et al. N Engl J Med 1994;331:1564-1575


Aspecto morfológico

O Achado morfológico característico de CDI é a dilatação de
ambos os ventrículos.

Trombos murais estão freqüentemente presentes no VE e nos
átrios, que usualmente também se encontram dilatados.

O coração está aumentado de peso, indicando hipertrofia, mas a
espessura máxima da parede livre do VE e do septo encontram-se
normais por causa da dilatação anormal das câmaras.

Cicatrizes podem estar presentes no folhetos das válvulas mitral e
tricúspide, assim como dilatação secundária dos seus anéis. As
artérias coronárias do epicárdio e intramurais estão normais.
Apical Four-Chamber Echocardiographic Views of a Subject with a Structurally Normal Heart (Panel
A), a Patient with Moderate Depression of Left Ventricular Systolic Function (Panel B), and a Patient
with Advanced Dilated Cardiomyopathy (Panel C)

Dec, G. W. et al. N Engl J Med 1994;331:1564-1575


Aspecto microscópico

hipertrofia e degeneração substancial de
cardiomiócitos

graus variáveis de fibrose intersticial e
ocasionalmente pequenos agregados de
linfócitos(geralmente menos de 5 por campo no
grande aumento)
Endomyocardial-Biopsy Specimens from a Patient with Idiopathic Dilated Cardiomyopathy (Panel A)
and a Patient with Lymphocytic Myocarditis (Panel B)

Dec, G. W. et al. N Engl J Med 1994;331:1564-1575


Aspectos clínicos

Maior parte dos pacientes são primeiro vistos nas idades
de 20-50 anos, mas a doença pode acometer crianças e
idosos.

A manifestação inicial mais comum é a insuficiência
cardíaca, que ocorre em 76-85% dos pacientes.
Surpreendentemente a insuficiência cardíaca é
freqüentemente avançada; 90% dos pacientes apresentam
classe funcional III ou IV na época do diagnóstico.

Sintomas da insuficiência esquerda predominam, com
diminuição da capacidade atlética, dispnéia aos esforços
progressiva(86% dos pacientes), palpitações(30%) e
edema periférico (29%).
Aspectos clínicos

Cardiomegalia assintomática é detectada em 4-13% dos pacientes.

Distensão abdominal, dor no quadrante superior direito, náusea e
anorexia atribuíveis a insuficiência ventricular direita podem
ocorrer na fase aguda da doença, podendo levar ao diagnóstico
errôneo de doença hepática ou biliar.

Dor torácica aos esforços, às vezes indistintas da angina pectoris,
ocorre como sintoma inicial em 8-20% dos pacientes e
eventualmente ocorre em aprox. 35%.

Êmbolos sistêmicos e pulmonares são a manifestação inicial em
1.5- 4 % dos pacientes e são mais vistos naqueles com
insuficiência avançada e cardiomegalia.
Aspectos clínicos

Apesar de fibrilação atrial ser mais comum em
pacientes com eventos embólicos, está presente
em menos de 25% desses pacientes.

Arritmias ventriculares são comuns, mas síncope
e morte súbita são raramente manifestações
iniciais da doença.
Fatores associados a prognóstico ruim

Arritmias ventriculares

complicações embólicas

disfunção ventricular esquerda

fração de ejeção do ventrículo esquerdo

Dilatação do ventrículo direito

Relação massa-por-volume ventricular reduzida

Ritmo de galope(B3) persistente
Fatores associados a prognóstico ruim

Sinais de insuficiência ventricular direita

BAV de primeiro ou segundo grau

Bloqueio de ramo esquerdo

hiponatremia

absorção máxima de oxigênio abaixo de 10-12ml por Kg
de peso corporal por minuto está relacionada com
mortalidade em um ano acima de 50% e é
freqüentemente usada pra identificar pacientes que
necessitam de transplante.

Síncope está associada com morte súbita
Fatores associados a bom prognóstico

Classe funcional menor que IV

Jovens

Sexo feminino
Patogênese

Fatores genéticos e familiares:
– 20% dos pacientes com CDI possuem pelo menos 1 parente de
primeiro grau com redução de fração de ejeção e
cardiomegalia.
– A herança na maioria das famílias é autossômica dominante,
mas a doença é geneticamente heterogênea, e há relatos de
herança autossômica recessiva, recessiva ligada ao X e herança
mitocondrial.
– Freqüência aumentada do genótipo DD da ECA e a
identificação de mutações no locus Xp21 do gene da distrofina
nos casos de CDI ligados ao cromossomo X.
– Associação entre antígenos HLA de classe II(DR e DQ). DR4,
DQw4, ou ambos, estão presentes em 63% dos pacientes com
cardiomiopatia. Apenas 26% no grupo controle.
Patogênese

Miocardite viral e outros insultos citotóxicos:
– Acredita-se ser seqüela de miocardite viral em alguns
pacientes. Resposta auto-imune desencadeada por
aberrações na indução da expressão de antígeno do
MHC de classe II podem ser responsáveis pelo insulto
inicial e progressão da doença.
– Especula-se que seja uma seqüela tardia de
miocardite por vírus Coxsackie B, mas não se
conseguiu demonstrar a presença do vírus no
miocárdio
Patogênese

Anormalidades do sistema imune
– Ativação de células T pode resultar tanto da interação com
antígenos externos( como vírus) como da expressão de
antígenos HLA de expressão alterada nos miócitos.
– Auto-anticorpos de uma variedade de antígenos cardíacos
foram identificados, incluindo aqueles para receptores β1-
adrenérgicos, antígenos mitocondriais como translocador do
nucleotídeo adenina, “branched-chain” cetoácido
desidrogenase, M7 e proteínas carreadoras de adenosina di e
trifosfato, e cadeia pesada da miosina cardíaca.
– Não se sabe ainda se esses auto-anticorpos são patogênicos ou
simplesmente refletem a lesão miocárdica em longo prazo.
Avaliação diagnóstica

Anamnese:
– Consumo excessivo de álcool foi identificado em até
40% dos pacientes com CDI.
– Doença viral recente, particularmente acompanhadas
de mialgias ou pericardite podem sugerir miocardite.
– Doença coronariana isquêmica deve ser considerada
sempre que estiverem presentes fatores de risco ou
dor torácica aos exercícios.
– História familiar pode sugerir cardiomiopatia familiar.
Avaliação diagnóstica

Exame físico
– Batimentos ventriculares prematuros
– Pulso jugular elevado com onda V proeminente e depressão Y súbita,
indicativos de regurgitação tricúspide.
– Impulso apical deslocado lateralmente.
– Quarta bulha é quase universalmente presente.
– Terceira bulha é tipicamente auscultada nas doenças mais avançadas ou
durante períodos de descompensação sintomática.
– Sopro sistólico devido a regurgitação atrioventricular é comum. Esse sopro
quase nunca excede grau 2/6 em intensidade.
– O sopro da regurgitação mitral pode não ser holossistólico e o aumento do
sopro na regurgitação tricúspide na inspiração é freqüentemente ausente.
Avaliação diagnóstica

Raio X e ECG:
– Cardiomegalia
– Redistribuição pulmonar venosa
– Anormalidades de condução em mais de 80% dos
casos e incluem BAV de primeiro grau, bloqueio do
ramo esquerdo, hemibloqueio anterior esquerdo,
atraso na condução interventricular
– Bloqueio de ramo direito é raro
– Fibrilação atrial surge em 20% dos pacientes
Avaliação diagnóstica

Ecocardiograma:
– Procedimento diagnóstico inicial mais útil
– Dilatação ventricular esquerda, espessura da parte
livre e septal normal ou reduzida, hipocinese global
– Dilatação atrial também é comum mas menos
pronunciada que a o dos ventrículos.
– Trombos intracavitários são comuns e mais freqüentes
no ápice do ventrículo esquerdo
– Padrão de dilatação restrita ao VE sugere doença
isquêmica e não um processo primário do miocárdio.
Avaliação diagnóstica

Angiocoronariografia deve ser reservada a
pacientes com dor torácica aos esforços e/ou com
suspeita de isquemia ventricular

Biópsia deve ser considerada para paciente
participantes de ensaios clínicos e aqueles com
disfunção miocárdica e doença sistêmica tratável
que sabidamente afeta o miocárdio, como
sarcoidose e eosinofilia.
Tratamento

Terapia de suporte:
– Repouso, controle do peso, abstinência do tabaco, consumo
moderado de álcool, atividades físicas reduzidas durante o
período de descompensação, dieta, ingestão reduzida de sódio.

Vasodilatadores
– Tratamento inicial para qualquer paciente com disfunção
ventricular esquerda.
– Há melhora da classe funcional e redução da hospitalização
por descompensação.
– Inibidor de ECA (enalapril), agentes que atuam na musculatura
lisa como hidralazina e dinitrato de isossorbida têm eficácia
comprovada no prolongamento da sobrevida desses pacientes.
Tratamento

Anticoagulantes:
– Warfarina deve ser prescrita para pacientes com CDI com
insuficiência cardíaca sintomática.

Terapia antiarrítmica
– Doses baixas de amiodarona(200mg por dia) reduzem arritmias
ventriculares e melhoram a tolerância ao exercício e função
ventricular.

Agentes inotrópicos positivos
– Glicosídeos digitálicos são eficientes no controle dos sintomas da
insuficiência cardíaca em pacientes com ritmo sinusal normal.
– Há benefícios a longo prazo em termos de fração de ejeção,
capacidade aeróbica e sintomas da falência cardíaca.
Tratamento

Agentes beta-bloqueadores
– A ativação simpática excessiva do coração pode ser deletéria ao miocárdio
deprimido.
– O uso de beta-bloqueadores melhora os sintomas, capacidade aeróbica,
fração de ejeção do ventrículo esquerdo e aumenta a sobrevida.
– Os benefícios são maiores em pacientes com taquicardia em repouso ou
níveis circulantes elevados de norepinefrinas.
– Metoprolol, Carvedilol e Bucindilol.
– Ensaio clínico com Metoprolol mostrou melhora na qualidade de vida, mas
não aumentou sobrevida em pacientes com cardiomiopatia dilatada.

Imunossupressão
– Ensaios com uso de prednisona obtiveram resultados desapontadores
Tratamento

Transplante cardíaco
– Cardiomiopatia dilatada permanece como a principal
indicação para transplante cardíaco em adultos e
crianças.
– Há melhora na qualidade de vida após o transplante
– taxa de sobrevida em 1 ano é de 79%,
– 74% em 5 anos e 72% em 10 anos.

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