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Vitória – ES
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BANCA EXAMINADORA:
SUMÁRIO
1. ABREVIATURAS ..................................................................................................05
2. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 06
3. TEMAS DE DIREITO TRIBUTÁRIO ..................................................................... 07
3.1. Conceito de Tributos .................................................................................. 07
3.1.1. Competência Tributária .................................................................. 08
3.2. Limitações ao Poder de Tributar e Princípios Constitucionais Tributários .09
3.2.1. Limitações ao Poder de Tributar .................................................... 09
3.2.2. Princípio da Legalidade ..................................................................11
3.2.3. Princípio da Igualdade e da Capacidade Contributiva ................... 13
3.2.4. Princípio da Progressividade ......................................................... 14
3.2.5. Princípio da Proporcionalidade Razoável ...................................... 14
3.2.6. Princípio da Anterioridade .............................................................. 14
3.2.7. Princípio da Irretroatividade ........................................................... 15
3.2.8. Princípio da Liberdade de Tráfego de Pessoas ou Bens ............... 16
3.2.9. Princípio da Imunidade Recíproca ................................................. 16
3.2.10. Princípio da Uniformidade Tributária ............................................16
3.2.11. Princípio da Não-diferenciação Tributária .................................... 17
3.3. Sistema Tributário Nacional ....................................................................... 17
4. A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E AS RECEITAS TRIBUTÁRIAS ..... 18
4.1. Previsão e Arrecadação da Receita Pública .............................................. 18
4.2. Combate à evasão e à sonegação ............................................................ 19
5. DA ELISÃO E EVASÃO DE TRIBUTOS ..............................................................21
5.1. Critérios Tradicionais de Distinção .............................................................23
5.1.1. Revisão Crítica do Critério Temporal de Ocorrência do Fato
Gerador ..................................................................................................................... 25
5.1.2. Revisão Crítica da Concepção Tradicional de Ilicitude Civil .......... 25
5.1.2.1. Atos Jurídicos Ilícitos ........................................................ 27
5.1.2.2. Ilícitos Não-culposos ........................................................ 28
5.1.2.3. Ilícitos Não-danosos ......................................................... 29
5.1.2.4. Ilícitos Não-indenizantes .................................................. 30
5.1.2.5. Atos Jurídicos Inválidos .................................................... 32
5.1.2.6. Ilícitos Típicos e Atípicos .................................................. 33
5.2. Distinção entre Elisão Fiscal e Evasão Fiscal à Luz da Ilicitude Atípica ....34
6. CONCLUSÃO ....................................................................................................... 36
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .....................................................................38
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ABREVIATURAS
2. INTRODUÇÃO
verdadeiro (elisão fiscal) e um falso (evasão fiscal), surgiu a inspiração para este
trabalho monográfico.
A proposta não é indicar uma solução para erradicar o falso planejamento tributário
ou coibi-lo, mas fazer uma análise superficial do conceito civil do que é um ato lícito
e um ato ilícito, que pode ser típico ou atípico, e então fazer apenas a diferenciação.
Se por um lado, evasões fiscais que reduzem a carga tributária por meio de fraudes
mais grave do que violar uma regra. Daí, elucidar-se a natureza ilícita do abuso do
direito e da fraude à lei como verdadeiros ilícitos atípicos, que, embora não
Assim, não é o tipo de operação que garante a licitude dos atos que visam a
O conceito legal de tributos está descrito no art. 3º, da Lei n. 5.172/66, CTN:
Pagar tributo é um ato compulsório, haja vista ser uma obrigação decorrente de lei,
(obrigação pecuniária), razão pela qual a doutrina costuma afirmar que em regra
mês o sujeito passivo destinaria alguns dias de seu trabalho à entidade tributante).
tributário.
A hipótese de incidência do tributo é sempre algo lícito, pois não pode constituir
obrigações tributárias como o imposto de renda (art. 43, do CTN) 2, ainda que tais
Ora, o dinheiro não tem odor e não seria justo tributar a renda obtida licitamente e
deixar de tributar a renda decorrente de atividades ilícitas (HC 77.530, STF, j. de 25-
8-1998, Juis, Saraiva, n. 21), como nos informa o princípio do non olet.
qual todas as pessoas que auferirem renda e proventos de qualquer natureza ficarão
A multa não se confunde com tributo, pois enquanto o tributo tem por pressuposto
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Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a
aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:
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hipótese de incidência, seu sujeito ativo, seu sujeito passivo, sua base de cálculo e
sua alíquota.
soberania que o Estado exerce em seu território, podendo exigir de todos os que
estão a ele submetidos que contribuam, de forma compulsória, com recursos para
exercido pelo Estado através de lei, por delegação do povo, logo este tributa a si
mesmo.
3
CALMON, Sacha. Comentários à Constituição de 1988: sistema tributário. Rio de Janeiro, Forense. 1990, p. 278, leciona
que “a consciência jurídica contemporânea repele a ideologia de que o poder de tributar é corolário da soberania do Estado. A
doutrina jurídica dos povos cultos e democráticos acredita na preeminência do princípio da legalidade em matéria tributária”.
10
impositivo e a cidadania.
complementar (CF/88, art. 146, II)8. Porém, a lei complementar pode, no entanto,
fique mais escudado contra o exercício do poder impositivo pelo Estado. Nunca
ao poder de tributar.
4
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
I - impostos;
II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos
específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;
III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.
5
Art. 148. A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios:
6
Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse
das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto
nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o
dispositivo.
7
TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. Rio de Janeiro. Renovar, 1993, p. 53-54.
8
Art. 146. Cabe à lei complementar:
II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;
11
tem por objeto o estudo das normas fundamentais que disciplinam e delimitam o
princípio, nenhum tributo será instituído ou majorado, a não ser por lei. Equiparam-
Assim, a lei instituidora do tributo obrigatoriamente deve explicitar (art. 146, III, a, da
pública da qual emanou a lei. Ou seja, deve fixar os elementos essenciais do tributo,
deve).
pagar um tributo.
acessória.
O art. 98, do CTN12, dispõe que o Tratado Internacional em matéria tributária tem
força de lei especial e, por isso, prevalece sobre a lei ordinária que lhe é
12
Art. 98. Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão
observados pela que lhes sobrevenha.
13
A base filosófica deste princípio é o princípio da isonomia, segundo o qual todos são
13
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal
e aos Municípios:
II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer
distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos
rendimentos, títulos ou direitos;
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Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
§ 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica
do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar,
respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do
contribuinte.
14
Federal e aos Municípios utilizar tributo com efeito de confisco, já que tal
circunstância nega vigência ao direito de propriedade garantido pelo art. 5º, XXII, da
A Lei Maior veda a cobrança de tributos no mesmo exercício financeiro em que haja
sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou (art. 150, III, b)16. Na Constituição
anterior, com redação diversa, o art. 153, § 29, explicitava o mesmo princípio, que
da anterioridade comum.
15
Art. 5º. ...
XXII – É garantido o direito de propriedade.
16
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal
e aos Municípios:
III - cobrar tributos:
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
17
CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 6ª ed. São Paulo, Malheiros, 1994, p. 125.
15
comum, muitos tributos não podem ser cobrados antes de decorridos noventa dias
Por este princípio, os fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que
a alíquota maior) não acarretam obrigações. A lei nova não se aplica aos fatos
18
Art. 105. A legislação tributária aplica-se imediatamente aos fatos geradores futuros e aos pendentes, assim entendidos
aqueles cuja ocorrência tenha tido início mas não esteja completa nos termos do artigo 116.
16
nacional.
seja, a Constituição impede que a lei de tributação inclua certos fatos na hipótese de
legalmente qualificada.
Este princípio proíbe à União instituir tributo que não seja uniforme em todo o
constitucionais.
Para que possa existir um sistema tributário é mister que as normas jurídicas que o
Logo, se não existir tal harmonia e se cada tributo não for parte de um todo com uma
normas fossem impostas sem ordem e sem investigação de causas, visando apenas
tributária.
19
Art. 152. É vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre bens e serviços,
de qualquer natureza, em razão de sua procedência ou destino.
20
Art. 11. É vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre bens de qualquer
natureza, em razão da sua procedência ou do seu destino.
18
partir de 1988.
ativa da fazenda pública federal, estadual ou municipal. Desse modo, podem ser
que serão escriturados como receita do exercício em que forem arrecadados, nos
para o ano-calendário.
21
NASCIMENTO, Carlos Valder e outros. Comentários à lei de responsabilidade fiscal. 2ª ed. São Paulo. Saraiva. 2007, p.
94-95.
22
“o procedimento ou a forma jurídica atípica ou anormal, pela qual o contribuinte procura, por todos os meios e modos de que
dispõe, evitar, retardar ou reduzir a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária (principal), ou seja, deixando de pagar o
tributo, deferindo o seu pagamento ou pagando menos que o devido” (VAZ, Carlos. Evasão tributária. Rio de Janeiro.
Forense, 1987, p. 10-1)
“A ação ou omissão dos que estão adstritos à satisfação do dever fiscal resulta, por conseqüência, na supressão,
diminuição ou adiantamento de uma entrada financeira a uma pessoa jurídica de direito público (obrigação de pagar) e,
excepcionalmente, no inadimplemento de obrigação tributária acessória (de fazer, não fazer ou suportar), que pode permitir ou
ocultar a existência de evasão econômica primária. Destarte, direta ou indiretamente, o alvo principal da evasão é sempre uma
receita de natureza tributária” (DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Elisão e evasão fiscal 2ª ed. São Paulo. José Bushatsky
editor, 1977, p. 21-22).
“Evasão de tributos é terminologia oriunda da ciência das finanças, fato que explica sua contaminação com um
significado econômico. A origem econômica da expressão é causa de uma certa incerteza que se nota todas as vezes em que
pretendem os autores analisá-la a partir de suas conseqüências eminentemente jurídicas. Sob uma perspectiva econômico-
financeira a evasão ocorre quando o contribuinte não transfere ou deixa de pagar integralmente ao fisco uma parcela a título de
imposto considerada devida por força de determinação legal” (HUCK, Hermes Marcelo. Evasão e elisão fiscal: rotas
nacionais e internacionais. São Paulo. Saraiva, 1997, p. 30).
20
pela sociedade. Para que se configure a evasão “é indispensável que haja uma
autores, porém, concordam que ela configure uma ação ilícita resultante de um
Por outro lado, a sonegação fiscal é ato infracional às regras jurídicas de tributação,
23
FALCÃO, Amílcar de Araújo: Fato gerador da obrigação tributária. 4ª ed. São Paulo. Revista dos Tribunais. 1976, p. 73.
21
Luiz Emygdio F. da Rosa Junior25, citando Sampaio Doria26, leciona que a evasão e
praticar o fato jurídico definido em lei como hipótese de incidência de tributo. Assim,
verificar dos seguintes exemplos: não importar mercadoria estrangeira para não
pagar direitos aduaneiros; não comprar tabaco para não pagar ICMS; não ser
proprietário de bem imóvel para não pagar IPTU; não ser proprietário de veículo
24
Lei n. 4.729, de 14-7-1965.
25
ROSA JUNIOR, Luiz Emygdio F. da. Manual de direito financeiro e tributário. 18ª ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro.
Renovar, 2005, p. 748-750.
26
DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Elisão e evasão fiscal. 2ª ed. São Paulo. José Bushatsky editor, 1977.
27
DÓRIA, Sampaio (op. Cit., p. 32) denomina este tipo de evasão imprópria, porque com a abstenção de incidência o
contribuinte exclui o próprio pressuposto da tributação (fato gerador - situação econômica). O mesmo autor inclui também na
categoria de evasão imprópria, espécie de evasão omissiva, a hipótese do fenômeno econômico da repercussão, ou seja,
quando o contribuinte de direito transfere a carga tributária para o contribuinte de fato.
28
FALCÃO, Amílcar de Araújo. Fato gerador da obrigação tributária. Rio de Janeiro. Ed. Financeiras, p. 73-74.
22
Assim, a elisão só será lícita se o indivíduo não manipular a forma jurídica prevista
na lei para a prática do ato. Todavia, se a pessoa abusa da forma jurídica, ou seja,
adota uma forma jurídica atípica visando a não pagar tributo ou pagar a menor, sua
conduta será ilícita. A conduta será ilícita, por exemplo, quando a pessoa pretende
fazer doação de um bem imóvel, mas considerando que o imposto será mais
gravoso que a alienação onerosa, adota a forma jurídica de compra e venda para
revestir o ato, pagando menos imposto. Se o Fisco conseguir provar que a relação
como tal e cobrar o imposto sobre a doação, não obstante a forma jurídica de
compra e venda empregada pelas partes para revestir o ato. Assim agindo, o Fisco
qual participaram consagrados juristas de escol, como Gilberto de Ulhôa Canto, Ives
Gandra da Silva Martins, Ricardo Mariz de Oliveira, Gerd Rothmann, Edvaldo Brito,
dentre outros:
Então podem ser utilizados os seguintes critérios de distinção entre elisão e evasão
fiscais:
29
MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Caderno de Pesquisas Tributárias. São Paulo. Resenha Tributária, v. 14, p. 491,
1989.
24
vejamos:
Nem toda conduta praticada antes do fato gerador pode ser considerada uma elisão
fiscal. Pelo menos três condutas praticadas antes da ocorrência do fato gerador com
consumir vinho e passa a consumir cerveja, devido à alta carga tributária que
Veículos Automotores);
ser tanto irrelevante (hipótese 1) como evasiva (hipótese 3). Logo, o critério temporal
Ora, se a conduta evitasse a ocorrência do fato gerador mediante uma via negocial
praticaria uma elisão fiscal; mas se a conduta dele não evitasse a ocorrência do
fato gerador.
26
que se quer saber é o que está permitido ou proibido. Assim, decisivo será o critério
da licitude ou ilicitude.
estudo dedicado exclusivamente aos atos lícitos. Este estudo levou nosso Direito
inclusive a confundir ato jurídico com o ato lícito, conforme redação do art. 81 do
O Código Civil de 1916, com ares de axaustividade, no art. 159 32, definia os atos
Costumava-se alegar que um ato ilícito não seria jurídico, pois não se poderia
considerar jurídico aquilo que é contra o jurídico. Contudo, a afirmação é falsa, pois
parte da premissa de que o jurídico seria o mesmo que lícito. Um fato é jurídico
simplesmente por estar previsto como suporte fático de uma norma jurídica, cuja
Nesse sentido resulta clara e cristalina a visão atualizada do Código Civil de 2002,
32
Art. 159 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a
outrem, fica obrigado a reparar o dano.
28
extracontratual sem culpa. Além disso, com o abandono, pelo direito moderno, das
exigibilidade de culpa.
De fato e de direito, hoje os ilícitos culposos já não traduzem com fidelidade todos os
(art. 12 do CDC)33, que não exigem culpa. No Código Civil de 2002, embora a culpa
encontre seu lugar, ela deixa claramente de ser elemento essencial de todo ato
ilícito.
Ao tratar do abuso de direito como ato ilícito, o art. 187 do CC/2002, por exemplo,
33
Art. 12 – O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da
existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação,
construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por
informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos. (grifo nosso)
29
Além dos ilícitos culposos a que alude o art. 186 do CC/200234, há outros ilícitos não
legal, no sentido de que os ilícitos dos arts. 186 e 187 podem prescindir de culpa,
senão vejamos:
“Art. 927 – Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a
outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único – Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando
a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua
natureza, risco para os direitos de outrem.” (grifo nosso)
Embora presente em grande parte dos ilícitos civis, o dano não é essencial ao
conceito de ilícito.
São vários os exemplos de ilícito civil sem dano, tais como a violação de domicílio, a
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Art. 186 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem,
ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
30
O caso mais relevante de ilícitos que não exigem dano é o da hipótese do art. 166,
Para DOUGLAS YAMASHITA36, O dano pode ser um elemento possível, porém não
intrínseco, ao abuso do direito. Essa é a razão pela qual o abuso do direito sem
dano é previsto no art. 187 separadamente do abuso do direito com dano no art.
927, ambos do CC/2002. Essa separação entre abuso do direito ilícito e dano
Prova contundente de que o dever de indenizar não é efeito necessário a todo ilícito
é que ele pode resultar de ato lícito 37, por exemplo, quando o dano é causado por
ato praticado em estado de necessidade (art. 188, II, c/c art. 929, ambos do
CC/2002)38. De acordo com o Código Civil de 2002, os atos ilícitos podem ter
a) Ilícitos indenizantes: todo ato ilícito cujo efeito é o dever de indenizar (por
35
Art. 166 – É nulo o negócio jurídico quando:
VI – tiver por objetivo fraudar lei imperativa;
36
YAMASHITA, Douglas. Elisão e evasão de tributos: limites à luz do abuso do direito e da fraude à lei. São Paulo. Lex
Editora, 2005, p. 29.
37
GOMES, Orlando. Obrigações. 8ª ed. Rio de Janeiro. Forense, 1991, p. 310.
38
Art. 188 – Não constituem atos ilícitos:
II – a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente.
Art. 929 – Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não forem culpados do perigo, assistir-lhes-
à direito à indenização do prejuízo que sofreram.
39
MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico: plano da existência. 12ª ed. São Paulo. Saraiva, 2003, p. 246 e ss.
31
b) Ilícitos caducificantes: todo ato ilícito cujo efeito é a perda de um direito (por
exemplo, a perda do poder familiar por abuso de autoridade pelos pais – art.
c) Ilícitos autorizantes: todo ato ilícito cujo efeito é uma autorização (por
CC/2002);
d) Ilícitos invalidantes: todo ato ilícito cujo efeito é a nulidade (por exemplo, a
É certo que o abuso do direito pode ser um ilícito indenizante (art. 927 do CC/2002),
CC/2002)40.
uma lei infringir a Constituição ela será inconstitucional, ou seja, inválida. Sempre
que um ato normativo violar uma lei, será ilegal, isto é, nulo. O mesmo ocorre com
sanção de invalidade.
40
Art. 1.735 – Não podem ser tutores e serão exonerados da tutela, caso a exerçam:
V – as pessoas de mau procedimento, ou falhas em probidade, e as culpadas de abuso em tutorias anteriores;
Art. 1.637 – Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos
filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela
segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.
32
No Direito Privado, a invalidade afeta os atos jurídicos lato sensu (negócios e atos
Ora, se o cerne dos ilícitos civis não pressupõe culpa, nem dano, nem o dever de
indenizar, fica claro que ilícitos civis são essencialmente atos contrários ao direito
negativa, logo, atos inválidos são atos contrários ao direito. Acrescente-se a isso um
mais grave:
41
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Elementos de direito administrativo. São Paulo. RT, 1980, p. 230.
33
O abuso do direito e a fraude à lei são ilícitos atípicos, pois envolvem condutas
cobertas por regra permissiva, a qual modifica seu status deôntico, uma vez que tais
5.2. Distinção entre Elisão Fiscal e Evasão Fiscal à Luz da Ilicitude Atípica
42
TÔRRES, Heleno Taveira. Direito tributário e direito privado: autonomia privada, simulação, elusão tributária. São
Paulo. Revista dos Tribunais, 2003, p. 195.
34
Sendo o critério da ilicitude decisivo para distinguir entre evasão e elisão de tributos,
especial, verificou-se a ilicitude dos atos nulos, como a fraude à lei ou a simulação.
Nesse exato sentido, o acórdão do TFR proferido nos autos da Apelação Cível
elisão e evasão civil. Embora não tenha considerado nem simulada nem fraudulenta
43
TORRES, Ricardo Lobo. Normas de interpretação e integração do direito tributário. 3ª ed. Rio de Janeiro. Renovar,
2000, p. 145 e s.
44
AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISAL. IMPOSTO DE RENDA. LUCRO PRESUMIDO. OMISSÃO DE RECEITA
- Legitimidade da autuação do Fisco, em face dos elementos constantes dos autos.
- Constituídas foram, no mesmo dia, de uma só vez, pelas mesmas pessoas físicas, todas sócias da autora, 8 (oito) sociedades
com objetivo de explorar comercialmente, no atacado e no varejo, calçados e outros produtos manufaturados em plástico, no
mercado interno e no internacional.
- Tais sociedades, em decorrência de suas características e pequeno porte, estavam enquadradas no regime tributário de
apuração de resultados com base no lucro presumido, quando sua fornecedora única, a autora, pagava tributo de
conformidade com o lucro real.
- Reconhece-se à recorrente, apenas, o direito de compensação do imposto de renda pago pelas aludidas empresas.
- Reforma parcial da sentença.
- Apelação provida em parte.
35
“Se não houve simulação, também não houve fraude à lei, eis que não se
violou preceito legal, nem abuso de direito ou abuso de formas jurídicas, no
sentido próprio, isto é, exercício anormal ou irregular de direito, com
maldade ou para prejuízo alheio, sem motivo legítimo, sem justa causa, com
evidência de dolo ou má-fé.
(...)
Em conclusão:
a) Se para alcançar o objetivo ulterior, o contribuinte recorre a ato ou
negócio jurídico nulo ou anulável (v.g. a simulação, a fraude à lei ou
abuso de formas jurídicas), infringe a lei e a evasão fiscal é ilícita;
b) Se, ao contrário, para alcançar o fim visado, recorre a ato ou negócio
jurídico real, verdadeiro, sem vício no suporte fático nem na
manifestação de vontade, tem-se elisão fiscal, que é lícita e admitida
pelo ordenamento jurídico brasileiro.”
6. CONCLUSÃO
45
Acórdão CSRF/01-01.857, de 15/05/1995; Relatora Mariam Seif; Câmara Superior de Recursos Fiscais; Ementa: IRPJ –
Simulação na incorporação – Para que se possa materializar é indispensável que o ato praticado não pudesse ser realizado,
fosse por vedação legal ou por qualquer outra razão. Se não existia impedimento para a realização da incorporação tal como
realizada e o ato praticado não é de natureza diversa daquele que de fato aparente, isto é, se de fato e de direito não ocorreu
ato diverso da incorporação: não há como qualificar-se a operação de simulada. Os objetivos visados com a prática do ato não
interferem na qualificação jurídica do ato praticado, portanto, se o ato praticado era lícito, as eventuais conseqüências
contrárias ao Fisco, devem ser qualificadas como casos de elisão fiscal e não de evasão ilícita”; e AcórdãoCSRF/01-01.874, de
15/05/1995; Relatora Conselheira Mariam Seif; Câmara Superior de Recursos Fiscais (ementa de idêntico teor à anterior).
36
A evasão e a elisão precedem a ocorrência do fato gerador e por isso são quase
Contudo, podemos concluir que sendo insuficiente o critério temporal, decisivo será
o critério da ilicitude como critério de distinção entre elisão fiscal, de natureza lícita, e
eliminar o ônus fiscal, a evasão fiscal consiste nas condutas ilícitas destinadas a
ilícitos civis são atos jurídicos, cujo significado de existência não pressupõe culpa
37
lato sensu, nem dano, nem a indenização como única sanção, mas apenas a
lei, daí procedeu-se à distinção entre ilícitos típicos e atípicos, que são,
O fato de a ilicitude civil ser o divisor de águas entre elisão e a evasão fiscais revela
Finalmente, foi elucidada a natureza ilícita do abuso do direito e da fraude à lei como
princípios. Assim, a conclusão de que a fraude à lei e o abuso do direito são ilícitos
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BORBA, Cláudio. Direito tributário: teoria e 1000 questões. 16ª ed. Rio de Janeiro.
Impetus, 2004.
DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Elisão e evasão fiscal 2ª ed. São Paulo. José
FALCÃO, Amílcar de Araújo. Fato gerador da obrigação tributária. 4ª ed. São Paulo.
MARTINS, Ives Gandra da Silva; Carlos Valder do Nascimento (et alii). Comentários
NASCIMENTO, Carlos Valder do; Ives Gandra da Silva Martins (et alii). Comentários
OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. A elisão fiscal ante a lei complementar n. 104. “in”
ROSA JUNIOR, Luiz Emygdio F. da. Manual de direito financeiro e tributário. 18ª ed.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo.
Malheiros, 1996.
40
Renovar, 1993.