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Olá, meu nome é Jônatas.

Sou o primeiro filho do primeiro rei de Israel,

Saul, e como tal, herdeiro natural ao trono. Meus irmãos são Malquisua, Abinadabe e

Esbaal, além de minhas irmãs Merabe e Mical. Somos da tribo de Benjamin, a menor das

tribos em Israel, e a minha família, bem, a menor das famílias em minha tribo. Porém

isso não impediu que tivéssemos o privilégio de sermos a primeira família real em Israel;

mas, ao mesmo tempo que me sinto privilegiado, sinto também certa tristeza, pois nós já

tínhamos um rei: O Deus Todo-Poderoso. Nossa nação insistiu nessa idéia de ter um rei,

assim como as outras nações, e Deus atendeu. E aqui estamos nós.

Na minha juventude, tive muitas aventuras, emoções fortes. Eu era

responsável por uma guarnição de mil soldados. Eu e meus homens fomos vitoriosos

muitas vezes. Mas eu me recordo de uma que foi especial: tínhamos acabado de vencer

uma guarnição de filisteus em Gibeá, e por causa disso, todos os filisteus se ajuntaram

para nos vencer. Isso fez com que nossos exércitos, com medo, se escondessem; meu pai

chegou a fazer o que não devia, e na ânsia de não deixar que uma debandada

acontecesse, ofereceu sacrifícios ao Senhor indevidamente, o que provou ser mais tarde

uma loucura. Tive então a idéia de enfrentar os filisteus, somente eu e meu escudeiro, já

que não tínhamos armamento suficiente para enfrentá-los. O que aconteceu foi

impressionante: orei a Deus e pedi um sinal de que Ele me daria a vitória, e ao recebê-lo,

eu e meu escudeiro saímos para o combate. Enquanto eu escalava o desfiladeiro onde

estavam os filisteus, estes eram derrubados, e meu escudeiro terminava o serviço,

matando um por um! Porém, nada é perfeito: meu pai havia feito um juramento louco

(meu pai não acertava uma!), anunciando que ninguém deveria comer nada até que os

filisteus estivessem derrotados. Só que eu já havia comido um pouco de mel, e isso me

fazia passível de morte. Até os soldados, quando se viram exaustos, passaram a quebrar

o juramento, comendo carne crua para se saciarem! Então, ao consultar a Deus, e não
recebendo resposta, meu pai percebeu que alguém tinha quebrado o juramento, e logo

fui descoberto. Mas Deus foi muito bom comigo, e usou o próprio exército para me

defender! Ufa, que sufoco!

Depois disso, meu pai voltou a fazer besteira, e eu vi que a coisa ia ficar feia

para o meu lado: meu pai desobedecera a Deus, e por causa disso, o próprio Deus foi

taxativo: o reino não ficaria na nossa família! Eu já não era mais o príncipe herdeiro, não

passava de um mero administrador da posição do sucessor, e em breve ele assumiria!

E ele logo apareceu. Seu nome era Davi, um garoto apenas! Mas como era

corajoso! Dizem que ele matou animais selvagens, ursos e leões, apenas para defender

seu rebanho de ovelhas. E não tenho razões para duvidar disso, já que ele provou seu

valor ao derrotar o mais poderoso inimigo filisteu que já tinha surgido: Golias!

Mas, enquanto meu pai morria de medo de perder o reino para ele, e por

várias vezes tentou matá-lo, eu logo percebi que ele era especial, diferente. Deus estava

com ele, e ele não escondia isso: falava disso para qualquer um ouvir, quando do

combate com o gigante, quando meu pai tentava assassiná-lo. Sua fé no Altíssimo era

mesmo inabalável. Era impossível não gostar daquele rapaz, e eu passei a admirá-lo cada

vez mais. Já não tinha mais receio por não ser o príncipe herdeiro, sabia que Deus havia

escolhido uma pessoa como nenhuma outra para ocupar o trono, de uma forma que

nem mesmo eu seria capaz. Na verdade, fiquei muito feliz em saber disso, e passei a

viver com um único objetivo: proteger o escolhido do Senhor!

Nos tornamos bons amigos, éramos até parentes, já que meu pai havia

prometido minha irmã àquele que vencesse o gigante Golias. Mas nossa amizade era

frequentemente atrapalhada pelas investidas de meu pai. Isto forçava a fazer com que

Davi vivesse como um fugitivo da presença do rei destronado. Esteve em cidades hostis,

andando com pessoas que a nossa sociedade não aprova, escondido em cavernas, deve
ter sido muito difícil para ele. O mínimo que eu podia fazer era interceder junto a meu

pai para que o deixasse em paz. Às vezes dava certo, mas logo meu pai voltava a

persegui-lo ferozmente. E quando ele teve a chance de se livrar, ele foi humilde o

suficiente para não fazer nada contra o rei. Davi realmente era um homem bom!

Nunca me esquecerei de nosso último encontro: fiquei de avisá-lo, caso

meu pai pretendesse lhe fazer mal, como costumeiramente fazia. Usamos de

engenhosidade, para não sermos descobertos: combinamos que, conforme minha

orientação ao meu escudeiro a respeito de onde atiraria minha flecha, seria seguro nos

encontrarmos. E assim fizemos. Foi comovente, foi um momento difícil para nós, pois

tanto eu como ele vivíamos uma situação muito difícil; choramos, nos abraçamos, e

fizemos um juramento mútuo, com o Senhor como nossa testemunha, até mesmo entre

nossos descendentes!

Depois desse dia, não nos vimos mais. Meu pai voltou a trazer desgosto e

desonra a nossa família e a toda a nação de Israel, ao consultar uma médium para saber

que decisões tomar, contrariando leis que ele mesmo tinha decretado. Nem é preciso

dizer que foi um desastre total, e só veio confirmar a palavra do Senhor por meio de

Samuel, de que o trono havia sido dado a Davi.

Na última batalha de que participei, só me lembro de ser perseguido pelos

filisteus juntamente com meus irmãos e meu pai. Fomos derrotados, e eu e meus irmãos

fomos mortos. Meu pai, para coroar com “chave de ouro” seu reinado, ao perceber que

também seria morto, suicidou-se. Foi um dia muito triste. Principalmente para Davi.

Ele ficou estarrecido com nossa morte, compôs até uma música muito triste

para lembrar o fatídico episódio, o que só mostra o quanto ele nos amava. Mas isso não

foi o fim: depois que assumiu definitivamente o trono, honrou a meu filho Mefibosete, e

devolveu os bens de nossa família a ele, além de dar-lhe todo o sustento de que
precisava, já que meu filho havia ficado aleijado ainda muito pequeno. Davi realmente

foi muito bom para nós, e lembrou-se de nosso juramento em nosso último encontro.

Apesar das circunstâncias de minha morte, não posso reclamar de nada, já

que não fui humilhado em ser deserdado em vida, e ainda morri como um verdadeiro

“herói de guerra”.

Autor: Luciano Silva de Oliveira

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