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I Congresso Ferramentas Web 2.

0 e Ensino

O congresso está ao rubro, à entrada deste segundo dia e antes mesmo da participação nas
mesas redondas, foi possível entrevistar os dois oradores que faltavam. Estes como todos os
anteriores demonstraram uma grande disponibilidade e vontade em esclarecer o público. Assim
sendo aqui ficam excertos das entrevistas.
Oradores 2
Uma das desvantagens apontadas à formação à distância é a falta da afectividade que
normalmente se estabelece na formação em sala, onde formadores e formandos estabelecem o
seu relacionamento. Caro(a) orador(a) gostaríamos de saber qual o seu ponto de vista sobre
esta potencial desvantagem.
Esta é sem dúvida a crítica mais referida, justificando-se pelo facto das pessoas não estarem em
presença.
Mas, consideramos que esta percepção não está totalmente correcta porque veja-se que o
"espaço virtual- cibernautico" (o mais importante dos meios utilizados para o ensino à distância),
e, trespassando para outras realidades consideradas mais exigentes como é o campo pessoal e
afectivo, as TIC são cada vez mais utilizado para desenvolver afectividades, estabelecer
relacionamentos ... Mudam-se os tempos ...
Um factor considerado como desvantagem do ensino à distância constitui a exigência que o
aluno tenha alguns conhecimentos tecnológicos para poder usufruir deste método de ensino.
Considera que os nossos estudantes estão preparados para este tipo de ensino?
Sim. Esta é sem dúvida a resposta. Não é uma resposta dada no sentido do politicamente correcto
mas uma resposta na qual acreditamos com toda a segurança. Aliás, posso informar-vos que ainda
ontem fomos informadas por Sua Excelência o Senhor 2.º Ministro de que o faustuoso projecto
"Magalhães" será estendido a todos os formandos gratuitamente já na próxima semana. Afinal,
mais importante do que saber se estão preparados temos é de dar-lhes os instrumentos, abrir
possibilidades, rasgar horizontes, ganhar eleições ... e poderia referir muito mais ... mas penso que
já compreenderam o ponto de vista.

Oradores 6
Caro(a) orador(a), no ensino presencial o aluno tem um papel passivo, no ensino à distância o
aluno passa a ser sujeito activo na sua formação, constrói o conhecimento. Acha que o ensino à
distância será vantajoso na escola pública?
Creio que um dos perigos dos sistemas e das inovações é o facto de se pretender criar dicotomias
acérrimas com o passado, como se a cada passo da evolução tudo quanto ficou para trás fosse
errado ou estivesse necessariamente obsoleto. Em Educação parece-me um erro crasso que assim
se actue (não que se pense assim, conscientemente, mas algumas práticas levam-me a pensar que
tal tem acontecido). Quando se introduzem dados novos, ao rejeitar-se (muitas vezes sem uma

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avaliação séria) o percurso anterior e os seus resultados, é como se se deitasse fora o bebé com a
água do banho…
Ora este julgo ser um perigo grande que compromete os defensores das tecnologias, ao identificar
metodologias de ensino com perfis de professor ou com processos de ensino-aprendizagem.
É certo que algum tipo de ensino presencial pode ser sinónimo de ensino centrado no professor,
magistral, com pouco lugar ao aluno. Mas será a maioria, nos tempos que correm? Serão os
nossos adolescentes permeáveis a aulas nas quais têm um papel passivo? Pergunto.
Então e não será passividade fazer copy/paste de páginas e páginas da internet e enviá-las para o
professor? É possível maior passividade intelectual no não questionamento? Não será isso pior ou
mais perigoso que o conformismo e a imagem idolatrada do professor único e exclusivo detentor
do saber?
O ensino presencial, com um trabalho sistematizado, bem planificado, com materiais didácticos
que permitem ao aluno e ao professor fazer a regulação das aprendizagens, nada tem de passivo.
O trabalho na sala de aula devidamente organizado, como “ofício do aluno”, como nos diz o
pedagogo PERRENOUD, nada tem de passivo e posso testemunhar (já que me pergunta) vários
trabalhos nesta linha. Se a maioria dos professores pratica a diferenciação pedagógica e se todos
os alunos trabalham em todas as aulas? Não sei, não tenho estatísticas. Haverá alguns que vão
assistir às aulas, como se fosse uma conferência, e depois trabalham (quando trabalham) em casa,
ou porque lhes foram debitados conhecimentos e não lhes foi pedida colaboração ou porque os
próprios alunos não responderam às solicitações. Mas conheço muito bons profissionais, que
ensaiam métodos e técnicas e instrumentos e avaliações…até que os alunos tenham
efectivamente resultados positivos, isto é, até que revelem e produzam conhecimento, não para
responder a estatísticas ou metas impostas, mas porque o que satisfaz é o conhecimento, é o
despertar da vontade de aprender, é um passo atrás nas dificuldades, é um passo à frente nas
aprendizagens.
Mas a 2ª parte da sua afirmação é muito interessante: “no ensino à distância o aluno passa a ser
sujeito activo na sua formação, constrói o conhecimento”. Ora, quanto a mim, não é o facto de ser
à distância que, de per si, induz a pesquisa. As novas tecnologias podem aliciar os alunos – facto
inegável para a maioria dos jovens e adolescentes – mas eu não seria tão rápida a fazer equivaler
um conceito a outro (até porque nem todos os alunos são jovens e nem todos têm o proclamado
acesso democrático à internet. Estatísticas recentes contrariavam em muito esse mito que a
sociedade urbana criou, esquecendo as assimetrias culturais e materiais no nosso país).
No ensino à distância, tem de haver alguma resposta efectiva do aluno, é certo, terá de aceder à
plataforma, de se inscrever e ir dando resposta às questões…mas se não quiser, se for preguiçoso,
se não souber utilizar as ferramentas? Os tutoriais não substituem os professores. É preciso ler um
tutorial, entender, colocar as questões devidas, saber expor, esperar a resposta em tempo
diferido, na maior parte das vezes. Estimulante para uns; duvido que seja para os alunos com mais
dificuldades ao nível da literacia e da motivação para a auto-aprendizagem. A relação pedagógica
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continuo a defender que é insubstituível, olhos nos olhos, às vezes ombro a ombro, num processo
em que não há dúvida de que o professor não se cansa de apostar no aluno, não desiste dele, está
sempre ali. Presente, ao lado, acessível. O aluno tem de cumprir a tarefa, sob pena de não
aprender. À distância ou na sala de aula. Se assistir apenas, pouco ou nada aprende e tanto faz ser
com um como com outro método de aprendizagem.
Posto isto, feita esta ressalva, se considero que o ensino à distância será vantajoso na escola
pública? Claro que sim. Vantajoso, sim, sem dúvida. Único e exclusivo, seria redutor. Fazer das TIC
a panaceia para todas as falhas da Educação no século XIX parece-me ingénuo e, ao mesmo tempo
perigoso, pois com o entusiasmo podemos vir a pagar um preço cultural muito elevado.
Actualmente, defendem-se as literacias, no plural, e é justo e realista que assim seja, porque o
mundo é plural, multifacetado, um poliedro, com várias faces que clamam pela nossa leitura, pelas
nossas interpretações e interpelações. É tão importante saber ler um folheto publicitário como um
horário de comboio, um quadro, um texto literário, um talão de compras de supermercado, uma
peça de teatro, uma base de dados, uma página Web… São os novos desafios do século XIX,
continuamente em devir, clamando por leitores mais competentes, mais tecnológicos, mais cultos,
mais ágeis, mais…, mais…, mais... Mas, acima de tudo, mais leitores, mais capazes de ler. Sem essa
competência de base, tudo é fluido e inconsistente.
Espero ter respondido à sua questão. Esta é apenas uma e só uma maneira de olhar o problema.
E assim vai a nossa cobertura deste evento que apesar de estar no segundo dia tem produzido
bastante conteúdo e tem sido muito debatida. Vamos continuar aqui pela FIL a acompanhar os
trabalhos, assim que hajam novos desenvolvimentos, seremos os primeiros a transmiti-los.
Entrevista a cargo dos Jornalistas 3 – Clara Oliveira e Nuno Maria

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