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Carvalho, Rosalice M. M.’ A Comunicagao Oral: uma reflexio sobre os usos e desusos em sala de aula Resumo: Registra-se, neste artigo, uma reflex sobre os usos da comunicagdo oral pelo professor ¢ pelo aluno, como sujeitos do processo de comunicagdo, bem como a aplicabilidade da expressio oral em sala de aula ¢ a necessidade de considerd-la como um contetide indispensivel na inclusdo social e na formagdo cidad’ do aluno. No Aesenvolvimento do traballo, optou-se por ulilizar as “falas"dos alunos eomo o elemento desencadeador das consideragdes em tomo do tema Palayras-chave: Comunicagao oral; Oralidade; Educagao, Ha muito se fala da importincia da comuni . © aqui nBo se pretende repetir essa discusso, nem. justificar o papel da comunicagio na sociedade, uma vez que no contexto atual no hi como se eximir de tratar do tema, visto que autores, midia, intemet, todos reafirmam a importincia do processo comunicativo, classificando este tempo como a Era da Comunicagao. © objetivo deste trabalho é fomando-se como partida a fala dos préprios alunos, refletir acerca da comunicasiio oral e da necessidade de planejamento especifico para sua aplicabilidade em sala de aula, cuja discussdo parte da breve andlise de bibliografia pertinente © da_pripria experigneia como docente ¢ aluno, atentando para a oralidade em sala de aula, suas caracteristicas mareantes, os principais motives para sua aplicagio consciente € as possiveis conseqiéncias da minimizag3o ou, até mesmo, a auséncia da oralidade nas situapdes de comunicagao no contexto escolar. © universo que se estabelece aqui é a sala de aula: 0 espago reservado para a aprendizagem. A educago formal assim 0 determina em suas politicas, desde o grau hierérquico mais alto até 0 tiltimo degrau da hierarquia da educagdo — a escola, quando, acomodando-se em suas rotinas seguras, mantém pessoas e objetos em seus lugares, burocraticamente estabelecidos. ‘A. pritica didria da aprendizagem se dé quase que exclusivamente pela oralidade do professor, ao que se acrescentam esparsas incursdes dos alunos e da fila dos autores nos textos lidos em vor. alta, Entretanto, qual 0 tempo dedicado aprendizagem da comunicagio oral? Qual a importincia deste aprendizado? E possivel e necessirio realizélo? Fstes so alguns questionamentos que se pretende abordar e, quigd, responder. ‘A. oralidade & considerada pelos professores como requisito inicial no processo de aprendizagem da lingua e condigio para a aquisigio do conhecimento nas virias dlsciplinas. Ao chegar & escola, 0 aluno j6 fala sua propria lingua e, como pressuposto, estabelece-se que 0 aprendizado dos conteiidos indicados para a escrita aprimoraré a lingua falada, Como diz Biber (1988, p.8), citado em Pavero et al (1999, p.11): Certamente, em termos de desenvolvimento humano, a fala é © status primério. Culturalmente os homens aprendem a falar antes de escrever e, individualmente, as criangas aprendem a falar antes de ler e escrever. Todas as criangas aprendem a falar (exeluindo-se as patologias); muitas eriangas nao aprendema ler e escrever. Todas as culturas fazem uso da comunicagdo oral; rmuitas linguas so dgrafas. De uma perspectiva histérica e da teoria do desenvolvimento, a fala é claramente primi. Sio desconsideradas, sumariamente, as diferengas entre oralidade ¢ escrita, como também (os aspectos pessoais de cognigdo, culturais e emocionais, conduzindo-se a pritica da oralidade em sala de aula como se todo o ambiente estivesse propicio 4 aprendizagem ¢ aos problemas da POSSO FALAR, PROFESSOR? De volta a este espago consagrado aprendizagem — a sala de aula, observa-se 0 uso da oralidade, considerando-se os sujeitos participantes do processo de comunicago oral: o professor © os alunos. Feita a observagdo, 0 que se vé na atuagdio destes sujeitos em seu desempenho comunicativo? Quem fala e quem escuta? Quem sabe falar e quem sabe escutar? F ainda, quem pode falar e quem deve escutar? © professor Lasswell, da Universidade de Michigan, citado por Penteado (2001, p.15), prope normas em beneficio da efetividade da comunicagio humana, segundo as quais devem ser considerados: 1) quem? — o emissor ¢ o papel que desempenha no momento comunicativo; 2) diz 0 qué? - a mensagem objetiva: 3) a quem? — o receptor, e sua importincia, determinando o nivel de linguagem a ser empregado; 4) através de que meio? — a escolha do meio adequado e, 5) com que finalidade? — 0 assunto de que trata a mensagem. ‘Atendendo-se a0 proposto pelas normas do professor Lasswell: “Deve-se_ precisar, iniciakmente, quem faz a comunicagao; (..) 0 papel que represento elucida a Comunicagdo”, recomenda-s , depois, cuidado ao defini © qué comunicar: “O gue comunicar depende, para a significado, de palavras bem escolhidas, organizadas em frases; palavras ¢ fiases que devam traduzir, com clareza, 0 sentido do que se procura transmitit”. Acredita, ainda, esse autor, que “a forma da comunicagiio ¢ condicionada pelo receptor”, uma vez que, na pritica, nem sempre acontece de 0 transmissor © 0 receptor falarem a mesma lingua e colocarem-se no mesmo plano (.), visto que o receptor & quem condiciona a forma da Comunicago (..) Com quem falo condiciona minha manera de expressar; Ainda segundo 0 principio proposto por Lasswell, Penteado (2000, p.13) considera que “a escolha do meio adequado pode, em certas circunstancias, garantir 0 éxito da comunicagdo humana”. Tudo isso sem perder de vista que “a A resposta a estas perguntas resultaria num diagnéstico dos usos da oralidade em sala de aula; sabe-se, entretanto, que a observagdo criteriosa deste ambiente ndo pode desconsiderar outros conceitos e condutas envolvidos, sobremaneira os relacionados & efetividade da educagio. Considera-se, por exemplo, 0 siléncio como condigiio para o aprendizado, bem como a orem hierinquica na exposigo oral, Em sintese: 0 professor fala e os alunos escutam, Paradoxalmente, & esperado que o aluno manifeste suas diividas oralmente © que as propostas inovadoras da pritica pedagdgica estimulem 0 exervicio do pensamento ceritico, ndo alardeando 0 aluno de exercer a sua cidadania manifestando sua opinido, Na realidade, os alunos no o fazem; apenas os mais ousados, quase rebeldes, manifestam qualquer insatisfagdo, ou os que, por nuttirem afeto pelo professor, se sentem seguros para expor opinides, geralmente pouco contflitantes, quando iio apenas repetigdes de pontos de vista jé expostos pelo professor. ‘A. pritica tem demonstrado, e qualquer professor sabe disso, que os alunos. “tremem” diante da possibilidade de falar. Temem 0 erro © suas conseqiiéncias: o ridicule, a ndo-aprovagdo © © constrangimento, fatos que, na maioria das vezes, desestimulam © aluno a investir em novas tentativas. Este quadro pode ser observado em classes de diversos niveis, embora as. classes inicais ocupem um maior tempo com estas questdes. Presume-se que outros professores, de outros niveis, partam dos pressupostos de que a fala & apenas um requisito para a aquisigdo dominio da lingua escrita e de que 0 aluno com dificuldades para expressar-se oralmente apenas encontraria obsticulos quando de sua produgdo escrita, ‘Nas classes iniciais hd um direcionamento para a pritica da oralidade nas atividades de leitura de estérias, reconstrugdo de atividades familiares e sociais, desenvolvimento da leitura relacionamento entre 0 professor e os alunos, embora, tendo o aluno dominado essas habilidades, 6 assunto seja esquecido e os professores dediquem-se A lingua escrita No entanto, ja se considera a necessidade de reconhecer a independéncia da modalidade representa uma dupla proposta de trabalho: por um lado trata-se de uma missio para a ciéneia lingiiistica que deveria dedicar-se a descrigdo da fala e, por outro, é um convite a que a escola amplie seu leque de atengdo. Enfatiza-se que no € apenas uma questio de dar voz aos alunos, nem de ensinar-Ihes a falar a norma culta, mas reconhecer a comunicagdo oral como um contetido que Ihes seré importante para além da sala de aula, uma vez que a sociedade valoriza a comunicagio como elemento indispensivel para a convivéncia eo desempenho profissional DESCULPE, NAO ENTENDI! Por sua vez, se aqui se discute o falar, é imprescindivel abordar 0 escutar, a contrapartida do ato do emissor, mesmo quando se considera uma comunicago quase unilateral, tio presente na sala de aula, Falar € ouvir sto atividades diferentes, embora interdependentes na execugdo de uma atividade de comunicagdo ¢ de igual importincia para quem di cia desempenhar a expresso oral satisfatoriamente, O falante © © ouvinte estio ligados por um fio condutor da comunicagio oral, cabendo ao primeiro manter contato e a objetividade do enunciado, na organizagdo de idéias € na atengio A finalidade da mensagem; ao segundo, compete tanto informar quando perde 6 fio condutor do raciocinio, quanto responder ao emunciado. Na mesma diregdo, em texto divulgado na intemet (Klick escola de professor, 2002), registra-se: De maneira geral, fala-se para ser ouvido por outra pessoa e, inversamente, ouve-se algo que tenha sido falado, No entanto, ha também algumas oportunidades em que a linguagem serve como instrumento de organizagao © expresso pessoal, Eo que acontece, por exemplo, quando se dz, em voz com a desatengdo d falante quanto & organizagio do enunciado, chegando mesmo a considerar a audigd0 como: uma forma de santidade, quando pensamos nessas dificuldades de expresso, nas palavras mal empregadas, nas pausas intermindveis, nas voltas ¢ reviravoltas das mesmas idéias, no repisar sensabordo de conceitos. Quvir de forma deficiente prejudica a habilidade de se comunicar eficazmente com os outros. Numa aula expositiva, por exemplo, ou numa atividade de grupo, ou, ainda, quando 0 professor expde as instrugdes para a execusdo de uma atividade escolar, a no-compreensdo da mensagem poder ocasionari ruidos ou outras dificuldades que poderio levar ao fracasso da atividade proposta. Por tudo isso, como acontece com a oralidade, também se considera a audigfo uma atividade aprendida antes da escola, portanto sem a necessidade de um aprendizado especifico, como se vé em Robbins (1994, p. 91) és aprendemos a ler, escrever e falar na escola, ao passo que ouvir é uma habilidade que se adquire informalmente. (...) E uma ironia 0 fato de que as reas em que gastamos a maior parte de nosso tempo ¢ esforgo — ouvindo e falando — so exatamente as mesmas em que somos menos treinados. Acostumados a falar, adultos © criangas nao pensam mais em planejar estas ages. Afinal, quem planeja como andar? Porém, quantos maus hibitos corporais so desenvolvidos por falta de autoconscigncia corporal, por exemplo, Praticar a fala consciente € tio complexo quanto a arte de escutar; daf a necessidade de se trabalhar na construgiio da fala tanto quanto na formagdo de ouvintes. EU SEI, MAS NAO SEI EXPLICAR. questionar a disparidade dos objetivos tomando-se como individuos envalvides 0 professor e 0 aluno, uma vez que, para interagitem numa convers ), € imprescindivel que conhecam o tema e saibam o que esperar de cada um, © que o professor espera da fala do aluno? E aluno, © que sabe sobre o que esta sendo dito? Nestas questdes cabe também a inversdo de papéis. E preciso ainda salientar que 0 texto oral & uma criagdo imprevisivel, coletiva (origindria dos sujeitos envolvidos) e produz-se de forma interacional e organizada, dai a necessidade de se conhecer sua estrutura ¢ planejar sua pratica. A firma Favero et al (1999, p. 22): O desenvolvimento do texto falado esté diretamente ligado 20 modo como a atividade interacional se organiza entre os participantes. Essa organizagiio resulta de decisées interpretativas, inferidas a partir de pressupostos cognitivos © culturais, tomadas durante o curso da conversagao. Pode ser © caso de faltar, 0 desejo real do aluno ou do professor em fazerem-se entender, limitando-se apenas a cumprir os seus papéis, num enorme prejuizo a interago e ao principio bbisico da comunicagio — © entendimento comum, embora haja orientagGes que incentivem. procedimentos de organizar a fala ¢ consideréla atividade escolar indispensavel & aprendizagem, Excluase destes raciocinios qualquer proposta que vise a sobrecaregar os contetidos de Lingua Portuguesa com mais atividades, no bastando 0 estudo descritivo e classificatério da lingua, nem tampouco atribuir 4 escola fungdes até entiio destinadas a familia, mas, demonstrar a grande multiplicidade de usos da fala dentro e fora da sala de aula, dando a oportunidade para que seus usuétios pereebam que a lingua no ¢ homogénea, fechada, mas um constante movimento, vivo e por eles (r}eriado a todo instante Reafirma Castilho (1998, p.13) (..) nio se acredita mais que a escola deve concentrar-se apenas no ensino da lingua escrita, a pretexto de que o aluno jé aprendeu a lingua falada em casa, a escola organize 0 ensinio de modo que o aluno possa desenvolver seus conhecimentos discursivos © lingiifsticos, sabendo (..)_expressar-se apropriadamente cm situagdes de interagdo oral diferentes daquelas préprias de seu universo imediato; refletir sobre os fendmenos da _linguagem, particularmente os que tocam a questio da variedade lingifstica, combatendo a cstigmatizagdo, discriminagdo ¢ preconceitos relativos ao uso da lingua. Na sala de aula, o papel representative da autoridade do professor favorece a ctiagio por parte do aluno da imagem de um interlocutor critico © repressivo, cujas ages se basciam no caréter valorativo da avaliagdo, O estudante precisa mostrar que sabe uma “lingua que no the pertence”: a lingua do professor, enfeitando seus discursos com palavras “bonitas” ou com a repetigo de modelos preestabelecidos pelos valores sociais, negando, assim, sua capacidade lingiiistica oral, considerando-a como errada. E como se aprendessem uma lingua estrangeira para falar com o professor, distanciando esse “idioma” daquele utilizado em casa ou com seus colegas. ‘A questo nao ¢ falar certo ou etrado, e sim saber que forma de fala utilizar, considerando as caracteristicas do contexto de comunicasdo, ou seja, saber adequar o registro as diferentes situages comunicativas, E saber coordenar satisfatoriamente 0 que falar e como fazé-lo, considerando a quem e por que se diz determinada coisa. (PARAMETROS CURRICULARES NACIONAIS) ‘A habilidade de adequagio as diversas. situagGes comunicativas possibilita ao aluno condigées de ampliar 0 dominio da lingua e as capacidades de compreensio e de leitura dos diversos sociais, propiciando autonomia para 0 sujeito, condigdo para sua efetiva participagio como cidadio, CALADO JA ESTA ERRADO! componente individual em que o dominio da lingua é relevante e decisive para 1 promogio da imagem pessoal. (FROLDI ¢ 0" NEAL, 1998, p.16) Mesmo evitando enveredar por quesides relativas 4 psicologia, & sabido que a construgo de uma auto-imagem comega nos primeiros anos de vida e recebe contvibuigdes de personagens importantes para a crianga, como, por exemplo, pais e professores. Qualquer um destes personagens sabe da importincia da integrago de uma crianga no contexto da escola e da sociedade, E esta insergo, para que se faga com sucesso, depende muito da pritica da oralidade. Froldi © O'Neal (1998, p. 16) consideram a expresso oral uma forma de valorizagdo da imagem, a qual deve ser mais um diferencial na dificil concorréncia do mundo do trabalho, como se observa nos mercados contempordneos. Atualmente, a necessidade de desenvolver Muéncia oral no esté somente relacionada aos empresérios, que rotineiramente enfrentam compromissos diversos, tais como representar uma empresa, entrevistar € dar entrevistas,

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