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O Barroco

O tempo barroco

O tempo barroco designa todas as manifestações artísticas do século XVII e inícios do século XVIII.
Politicamente, estes séculos foram marcados por regimes absolutistas. Luís XIV foi o maior de todos os
reis absolutistas na Europa. Conhecido por Rei Sol, a ele se atribui a frase “L'État c'est moi” (O Estado sou
eu). Durante o seu reinado, encarnando a suprema autoridade do reino, subjugou a nobreza, transforman-
-do-a num instrumento de bajulação do rei e em sua serviçal. Neste contexto de autoritarismo político, de
expansão comercial, de luta de classes e de crises religiosas, o Homem barroco sentia-se oprimido.
No plano espiritual, a época barroca foi das mais conturbadas de sempre para o Homem ocidental,
porque o século XVII tentou conciliar duas concepções de mundo opostas: a renascentista e a medieval.
O Barroco é fruto da crise de valores renascentistas, uma consequência das lutas religiosas e de uma nova
visão do mundo baseada numa concepção infinitista e dinâmica que pôs em causa o conhecimento e do-
mínio absoluto da Natureza (concepção finitista e estática do mundo). Assim, o Homem barroco sentiu-se
dividido entre os valores humanistas e os valores espirituais medievalistas que a Contra-Reforma1 procurava
restaurar. O dualismo teocentrismo medieval 2 (que valorizava as ideias de submissão e pequenez diante
de Deus e da Igreja) e o antropocentrismo 3 clássico do Renascimento (que valorizava o Homem e os
prazeres mundanos) desencadeou no Homem barroco um conflito interior entre o terreno e o celestial; o
Homem e Deus; o pecado e o perdão; a religiosidade medieval e o paganismo renascentista; o material e
o espiritual.

1 Movimento da Igreja Católica de reacção ao avanço do Protestantismo, por meio do recurso à Inquisiçao e à censura (Índex).
2 Princípio segundo o qual o centro do Universo era ocupado por Deus (teo).
3 Princípio ou atitude filosófica que faz do Homem (antropo) o centro do Universo.

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O Barroco

Contexto português

Em Portugal, o Barroco ou Seiscentismo tem início em 1580, ano que assinala a morte de Camões e a
consequente decadência do movimento clássico.
O início desta época foi marcado pelo fim da autonomia política de Portugal, porque dois anos após o
desaparecimento do rei D. Sebastião em Alcácer Quibir, Filipe II da Espanha subiu ao trono, anexando o
reino português aos seus domínios. Após a Restauração da Independência de Portugal, em 1640, D. João
IV foi aclamado rei e, durante o seu reinado, teve como principal preocupação legitimar a revolução e obter
auxílio militar e financeiro. Falecendo a 6 de Novembro de 1656, deixou o reino política e militarmente
organizado, entregue à regência de D. Luísa de Gusmão, uma vez que D. Afonso, seu filho, tinha apenas
13 anos.
A 23 de Novembro de 1667, D. Afonso VI, que sofria de diminuições físicas e mentais, abdica do poder
em favor do irmão D. Pedro II que apenas sobe ao trono em 1683. Durante o seu reinado, assinou a paz
com Espanha, o que lhe valeu o cognome de o Pacífico e, envolvendo-se militarmente na Guerra da Sucessão
de Espanha, conseguiu que, em 1703, se assinasse o Tratado de Methuen através do qual Portugal abria
as suas fronteiras aos lanifícios ingleses em troca da livre exportação de vinho do Porto para Inglaterra.
Em 1706, sucede-lhe D. João V. A produção artística, ao longo do seu reinado, recebeu a designação
genérica de Barroco joanino, porque o tempo deste monarca absolutista foi de opulência e a monumentalidade
das obras de arte barrocas reflectem a riqueza do ciclo económico do ouro e dos diamantes do Brasil
desta altura.
O Seiscentismo estender-se-á até 1756, com a fundação da Arcádia Lusitana, já em pleno governo do
Marquês de Pombal (ministro do rei D. José, que subiu ao poder em 1750), aberto aos novos ares da ideologia
liberal burguesa iluminista, que caracterizará a segunda metade do século XVIII.

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O Barroco

CONTEXTO ARTÍSTICO E CULTURAL DO BARROCO

I. ARTES PLÁSTICAS

O Barroco é a arte da Contra-Reforma, o que explica a complexidade dos artifícios da forma e das ideias
deste movimento artístico, em contraste com a sobriedade e o equilíbrio do estilo renascentista. Nesta altura,
entendia-se que as obras de arte deviam “falar” aos fiéis, daí o carácter solene da arte barroca que pretende
convencer e impor admiração.

Arquitectura
– Caracteriza-se pela assimetria; pela noção do espaço infinito e do movimento contínuo; pelo desejo
de tocar os sentidos, despertando emoções e pelo emprego da ordem colossal, das curvas e contracurvas.
– Em Portugal, os arquitectos italianos Ludovice (que desenhou o Palácio-Convento de Mafra) e Nasoni
(que desenhou Torre da Igreja dos Clérigos, no Porto) foram os autores dos mais característicos monumentos
do Barroco português.

Pintura
– Pintura realista que abrange todas as camadas sociais e retrata temas relacionados com a vida
quotidiana, especialmente da nobreza e da burguesia.
– Disposição teatral e dinâmica das figuras retratadas, valorizando o movimento.
– Principais mestres da pintura barroca: Caravaggio, Velázquez, Rubens, Rembrandt, Van Dyck, os
portugueses Domingos Vieira, cognominado o Escuro, e Josefa de Óbidos.

Escultura
– Predomínio das curvas e dos gestos dinâmicos.
– Os rostos das personagens revelam emoções violentas, atingindo uma dramaticidade desconhecida
no Renascimento.
– Principais escultores barrocos: Bernini, Girardon, Puguet.

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O Barroco

II. LITERATURA

O exagero ornamental do estilo barroco caracteriza não só as artes plásticas, mas também a literatura.
O período literário barroco, também designado Gongorismo devido à influência do poeta espanhol Luís
Gongora, empregou muitas formas do Renascimento mas substituiu a sobriedade e o equilíbrio do estilo
clássico pela complexidade dos artifícios da forma e das ideias. A aparente superficialidade do Barroco,
que semanticamente significou “pérola imperfeita”, foi uma forma de procurar o equilíbrio perdido atra-
vés da angustiada busca da perfeição formal.

Poesia
A poesia barroca portuguesa do século XVII foi reunida apenas no século XVIII e compilada em dois
cancioneiros – Fénix Renascida (1.ª edição de 1716) e Postilhão de Apolo (1.ª edição de 1761).
As temáticas mais frequentes das composições barrocas são a efemeridade e fugacidade da vida;
o desengano e ilusão da realidade; a obsessão pela morte; motivos religiosos e históricos; o burlesco
de certas situações quotidianas; o erotismo; temas fúteis (poesia de entretenimento) e a sátira aos vícios
da sociedade. Estes temas são tratados de forma ornamental, com o uso de metáforas, hipérboles,
perífrases, troca de palavras, ou de forma engenhosa com o desdobramento de um conceito em várias
ideias por meio de raciocínios artificiosos, até dar um imprevisto paradoxo.
Francisco Rodrigues Lobo, D. Francisco Manuel de Melo, Jerónimo Baía, António Barbosa Bacelar e
Francisco de Vasconcelos foram alguns dos principais autores de poesia barroca.

Prosa
O Barroco é considerado, por muitos, a Idade de Ouro da prosa que visava a propagação e edificação
religiosa. De entre esta literatura encontramos sermões, cartas, hagiografias e tratados moralistas. Em
Portugal, há que destacar a doutrina espiritual que Manuel Bernardes e Frei António Chagas transmitiram
(cultivando o medo do Inferno); a obra moralista representada por D. Francisco Manuel de Melo (Feira
de Anexins, Apólogos Dialogais, Carta de Guia de Casados); a Nova Floresta de Manuel Bernardes
os Sermões de Padre António Vieira e a Corte na Aldeia de Rodrigues Lobo.

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O Barroco

As duas tendências da literatura barroca

Dentro do Barroco literário são habitualmente consideradas duas correntes: o conceptismo e o cultismo.
Estas duas tendências da literatura barroca, muitas vezes, sobrepõem-se, pois podemos encontrar textos,
simultaneamente, com aspectos cultistas e conceptistas.

O cultismo valoriza o artifício da forma e a busca da perfeição formal. O uso de vocabulário erudito,
rebuscado e extravagante denota a preocupação pela ornamentação exagerada do estilo barroco. Servindo-
-se de artifícios formais, o cultismo explora a percepção sensorial através do jogo de palavras e da repetição
de sons. No cultismo o aspecto exterior é visível por causa do abuso do emprego de figuras de linguagem,
especialmente as sintácticas como a repetição, a anáfora, o quiasmo e a paronomásia.

O conceptismo valoriza o artifício do conteúdo e volta-se para o requinte expressivo e para a subtileza
das ideias. A expressão conceptista é mais simples do que a dos cultistas, no entanto, a densidade conceptual
das suas obras, por vezes, dificulta a compreensão. Os conceptistas preocupam-se em exprimir muitas
ideias e têm tendência a acumular conceitos e a usar palavras com duplo e triplo significado. O conceptismo
incide no plano do pensamento e do raciocínio e consiste, então, no jogo de ideias e imagens que o
desdobram em conceitos a partir do emprego de figuras de linguagem, especialmente as semânticas como
as antíteses, os paradoxos, as comparações ousadas, as metáforas, as imagens, as sinédoques e as
hipérboles que conduzem a uma densidade conceptual que obscurece o conteúdo.

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