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Reflexões sobre a Política Nacional de Atenção Integral às Urgências e Emergências

Celso Luiz Dellagiustina1

Cesar Augusto Soares Nitschke2

As doenças vêm passando por transformações em seu perfil epidemiológico, tanto em relação
à clientela como a sua prevalência, tendo-se hoje, no Brasil, o que Mendes denomina como
tríplice carga de doenças. Por um lado temos ainda as doenças de países subdesenvolvidos,
tais como diarréias, desidratação, doenças tropicais como a dengue, entre outras, em segundo
lugar temos um aumento de casos crônicos, como as doenças cardiovasculares,
predominantemente isquêmicas cardíacas e acidentes vasculares cerebrais, que acompanham
ao incremento de expectativa de vida da população e em terceiro lugar vemos um aumento da
violência urbana, tanto interpessoal como de trânsito, com um aumento das taxas de morbi
mortalidade nas causas externas.

Com este perfil epidemiológico os casos/situações podem ser considerados (as) crônicos (as),
crônicos (as) agudizados (as) e agudos (as). Entretanto, embora as situações crônicas
representem a maioria das situações, persiste ainda um direcionamento na maioria das vezes
à resposta aos casos agudos principalmente na rede hospitalar. Coube à atenção básica
trabalhar as condições crônicas, tanto por um enfoque promocional assim como assistencial.
Entretanto, na agudização dos casos crônicos acompanhados pela mesma ou nos casos agudos
que chegam à atenção básica, outra esfera deve responder à demanda, desarticulada de todo
o trabalho anteriormente realizado pela estratégia de saúde da família e da atenção básica.

Embora se creia que a atenção básica, como afirmada na Tese do CONASEMS 2010-2011
tenha a capacidade de ordenação do restante do sistema de saúde, dirigida por valores de
dignidade humana, equidade, solidariedade e ética profissional, os casos agudos ou
agudizações de casos crônicos levam a um ordenamento por outra rede, a rede de atenção
às urgências, distinta da primeira, de caráter regional, que deve dar respostas ágeis e num
tempo muito curto e que deve estar articulada com a rede de atenção básica para sua
qualidade de resposta. Nesta rede, o ordenamento se faz a partir de centrais de regulação

1
Médico Ortopedista, Secretário Municipal de Saúde de Bombinhas – Santa Catarina, Presidente do
COSEMS-Santa Catarina, Diretor de Comunicação Social do CONASEMS, Implementador do SAMU em
Santa Catarina. Email: celdella@ibest.com.br
2
Médico Cirurgião Geral e Urgencista, Implementador do SAMU Santa Catarina, Consultor de Urgências
de Minas Gerais, Espírito Santo e Curitiba, Membro do Grupo Brasileiro de Classificação de Risco. Email:
cesarnits@gmail.com

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de urgência regionais que devem executar idealmente linhas guia previamente pactuadas
e fornecer a resposta mais adaptada possível às necessidades agudas.

Assim, dentro da discussão de redes de atenção identifica-se que a estruturação paralela de


dois eixos (redes) são componentes estruturantes para que se atinjam os objetivos de
integralidade e equidade propostos no SUS: as redes de atenção básica e as redes de atenção
às urgências.

Faremos aqui uma reflexão do desenvolvimento da Política Nacional de Atenção às Urgências


e Emergências, com seus avanços, fragilidades e desafios assim como discorreremos sobre a
estruturação da rede de urgência.

Estruturação legal da Atenção às Urgências

A atenção às urgências vem, ao longo dos últimos anos, passando por reformulações e sendo
estruturada a partir de discussões governamentais e não governamentais, por entidades de
classe, representações sociais, associações focadas nas urgências, emergências e traumas.

A partir de 1998 iniciou-se no Brasil a estruturação de níveis de complexidade hospitalares,


que incluíam as urgências, na tentativa inicial de se ter uma resposta aos casos complexos.

No ano de 2002, o Ministério da Saúde publicou a Portaria nº 2048, instituindo o regulamento


técnico dos Sistemas de Urgência e Emergência. Esta portaria, ampla em seu conteúdo e
abrangência, é utilizada até os dias de hoje, e normatiza as ações em âmbito pré e intra-
hospitalar, definindo e bem caracterizando as atividades de regulação médica de urgência,
tanto no aspecto técnico como gestor, definindo papéis e pré-requisitos, assim como
estabelecendo um treinamento mínimo para o exercício das atividades de regulação e de
atendimento às situações de urgência e emergência.

Em 2003, foi instituída a Política Nacional de Atenção às Urgências, através da PORTARIA Nº


1863/GM e no mesmo dia de sua publicação outra portaria, a PORTARIA 1864/GM instituiu o
componente pré-hospitalar móvel da Política Nacional de Atenção às Urgências, o SAMU – 192.

Seguiu-se a estas duas portarias uma ampla discussão nacional com a estruturação de vários
serviços de atendimento móvel de urgência, SAMU-192, em todo o Brasil, com características
na maioria das vezes municipais, e alguns poucos estaduais, sendo que apenas no Estado de
Santa Catarina foram implantados, em todo o Estado, sete SAMU-192 regionais, com
cobertura de 100% do Estado e interligados, através de uma pactuação de investimento e
custeio tripartite.

Entretanto o modelo municipal adotado na Portaria 1863 e 1864 não atendia às necessidades
de organização, escala e redefinição de fluxos que se davam na maioria das vezes por pactos
regionalizados ou estadualizados, traduzidos no Plano Diretor de Regionalização e no Plano
Pactuado e Integrado. Além disto, as experiências exitosas de regionalização do SAMU em
Santa Catarina e do Sistema Regional de Atenção às Urgências no Norte de Minas Gerais,

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racionalizando custos e aumentando a eficiência da resposta às situações de urgência,
reforçavam a necessidade de uma legislação própria que amparasse as ações regionais.

Seguindo-se às discussões em todo o país e os exemplos exitosos, em dezembro de 2008, foi


publicada a PORTARIA 2.970, que instituiu diretrizes técnicas e financeiras de fomento à
regionalização da Rede Nacional SAMU 192.

Até aquele momento, a atenção pré-hospitalar fixa havia ficado à margem do avanço da
atenção móvel, levando a uma confrontação diária entre as organizações móveis que haviam
se estruturado e a atenção fixa, desarticulada e sem incentivos para sua estruturação.

Neste caminho, em 13 de maio de 2009, através da Portaria GM 1020, foram estabelecidas


diretrizes para a implantação do componente pré-hospitalar fixo para a organização de redes
loco regionais de atenção integral às urgências em conformidade com a Política Nacional de
Atenção às Urgências.

Entretanto, até o momento não temos ainda no país uma legislação específica e de amparo
tanto legal como financeiro para que a rede hospitalar tenha, além do papel definido e
importante na rede de atenção às urgências, um fomento a sua organização e melhoria através
de redefinição de papéis e incentivo à educação permanente, sendo integrada à rede de
atenção às urgências.

De maneira semelhante não temos ainda definido uma legislação que ampare as ações pós-
hospitalares, em relação às urgências, como as de reabilitação e reinserção social.

Por último, trabalhando dentro de uma visão de atenção integral, o amparo legal para a
articulação entre as redes de atenção básica e de urgência ainda carece de debates e
legislação própria.

Dentro da atual Política Nacional de Atenção às Urgências temos:

 Componente pré – hospitalar

 FIXO funções definidas pela 2048/02

 UBS (ESF) e outros: acolhimento, capacitação, estruturação física e


grade de referência

 UPA: estrutura intermediária

 MÓVEL: SAMU 192

 Regulação médica

 APH

 Transporte e transferência de pacientes graves

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 Componente Hospitalar

 Constituído das portas de entradas hospitalares definidos no regulamento


técnico

 Componente Pós-Hospitalar

 Modalidades de Atenção Domiciliar


 Hospitais-Dia
 Projetos de Reabilitação Integral com componente de reabilitação de base
comunitária

A rede de atenção

Vemos que para a concretização das redes de urgência persiste a necessidade de


fortalecimento da atenção básica a partir de um melhor financiamento que permita o
cumprimento das funções previstas na 2048/02: acolhimento, estruturação física e técnica,
capacitação, integração na rede hierarquizada.

Além disto deve-se garantir que as UPAS e SE exerçam o seu papel na integração da
política de urgência e emergência através de uma efetiva regulação médica, evitando-se
assim a competição com o acesso a rede de atenção básica e que estejam conectadas ou
interligadas a um componente hospitalar da rede, garantindo assim sua retaguarda nos
casos em que se fizerem necessários. Na rede de urgência e emergência os hospitais
definidos como de apoio deveriam ter salas de estabilização estruturadas e funcionais.

O componente pós-hospitalar, ainda pouco desenvolvido e desconectado da rede de


urgência, deve ser fortalecido e estar incluído dentro de uma concepção de rede integral
às urgências, favorecendo tanto a diminuição de leitos hospitalares como promovendo o
retorno o mais breve possível do paciente/vítima ao convívio dos familiares e da sociedade.

O financiamento tripartite da urgência e emergência, com aporte de recursos para os


pronto-atendimentos, unidades de urgência/emergência, hospitais de pequeno porte e
sala de estabilização, com participação e pactuação dos três entes federativos deve ser
sempre perseguido, primeiramente evitando-se de autorizar abertura de novos
componentes sem uma efetiva política estadual de implementação das redes, estimulando
o papel do estado como locomotiva propulsora, tanto em nível de gestão como de
financiamento, das redes de atenção em cada estado.

Acrescente-se a isto a necessidade de uma política de co-financiamento na estruturação


da rede de urgência hospitalar fixa, e a sua organização,(mudanças da portaria 478 e
mudanças na forma de pagamento por procedimento).

Por outro lado, a indefinição de territórios e populações de abrangência de uma rede


levando-se em conta igualmente a escala para a resposta a mesma, devem estabelecer
que as regiões com resposta nos três níveis de atenção devam ser as escolhidas,
normalmente de caráter macrorregional não se tendo até o momento nem uma definição

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de estruturas administrativas regionais como modelo de gestão e financiamento assim
como uma legislação própria para repasses de investimento e custeio regionalizados.

Por último, um mecanismo de governança regional, ligado às esferas regionais do SUS se


fazem necessários.

Principais fragilidades na Política Nacional de Atenção às Urgências

Podemos agora discorrer um pouco sobre as principais fragilidades na Política Nacional de


Atenção às Urgências

1) Quanto à Governança
a. Se necessitarmos incrementar estruturas regionais que deem resposta efetiva
às urgências igualmente necessitamos de uma estruturação de instrumentos
de governança regionais que se ocupem do acompanhamento e
monitoramento da rede regional, da avaliação, proposição de mudanças e
repactuações assim como que possam auditar regularmente a rede. As
estruturas colegiadas regionais tem papel importante nesta função, mas uma
estrutura ligada a mesma, o Comitê Gestor Regional de Urgências,
necessariamente funcionando como câmara técnica de uma CIB
macrorregional ou na inexistência da mesma, da CIB estadual, fornece
especificidade técnica e gestora, autoridade e facilita o monitoramento e todo
o trabalho a ser realizado em relação à rede de urgências.
b. Cabe às regulações de urgência do SAMU e, quando existir, a regulação de
leitos, ser corresponsável na governança e fornecer dados precisos do
funcionamento da rede de forma cotidiana.

2) Quanto aos pontos de atenção

a. Atenção Básica:
i. Deficiências no acolhimento
As deficiências no acolhimento se devem a não inserção dos casos
agudos ou de agudização dos casos crônicos dentro de uma
perspectiva de acolhimento e tratamento pela atenção básica. A
atenção básica vem-se pautando por ações promocionais, essenciais
para a melhoria de qualidade de saúde e vida da população,
desconsiderando muitas vezes que sua população necessita de uma
resposta próxima e pouco complexa aos casos agudos ou agudizações
de casos crônicos.
ii. Unidades básicas sem a devida estruturação física e capacidade
técnica para o acolhimento das urgências
Existe despreparo para realização de acolhimento e classificação de
risco da clientela atendida assim como inexistência, na maior parte das

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vezes, de estrutura para prestar o primeiro atendimento assim como
resolver casos de menor complexidade.
iii. Desintegração das Unidades básicas na rede de urgência e emergência
Tanto no planejamento da rede de urgência como no cotidiano, a
atenção básica não tem, em sua maior parte, participado da discussão
de papel e fluxos da rede de urgência, levando a uma persistência da
não integralidade do atendimento, retardando acessos e dificultando
tanto o referenciamento como o contra-referenciamento.
iv. Falta de flexibilidade nos horários de funcionamento das Unidades
A atenção básica vêm-se mantendo com horários rígidos, não
compatíveis com trabalhadores assim como com as situações agudas,
que não escolhem hora para acontecer. Isto tem dificultado que a
população abrangida pela atenção básica tenha como referência inicial
para o atendimento as suas necessidades, situações agudas ou
situações crônicas, seja, atendidas.
v. Exames de menor complexidade não agregados à atenção básica
Até o momento ainda não existe claramente uma política de
distribuição e incentivo à instalação de exames de menor
complexidade na atenção básica, retardando e dificultando
diagnósticos simples, de baixa complexidade, e levando com que a
população veja as unidades hospitalares como a porta de referência
na qual poderá ser atendida, realizar exames e sair com o tratamento,
mesmo em situações de baixíssima complexidade, sobrecarregando a
rede hospitalar com esta conduta.
b. SAMU
i. Regulação ineficaz
Ausência ou insuficiente treinamento dos reguladores e ausência de
protocolos de regulação assim como de linhas guias pactuadas na rede
e disponíveis para serem executadas pelos médicos reguladores.
ii. Financiamento em desacordo com as portarias (1864/03 e 2970/08)
O financiamento das atividades educativas até o momento não foi
liberado pelo Ministério da Saúde. Embora as Portarias estabeleçam
que 50% do custeio cabe ao Ministério da Saúde, a base de cálculo que
definiu os valores é totalmente inadequada à realidade dos salários
praticados no Brasil. Assim sendo, enquanto uma Central de regulação
mínima, tendo um médico regulador, um Técnico Auxiliar de
Regulação Médica e um Radioperador e Operador de Frota, custa
mensalmente em torno de R$ 110.000,00(cento e dez mil reais) a base
de cálculo utilizada nas portarias é de um valor mensal de
R$ 38.000,00 (trinta e oito mil reais) cabendo ao Ministério da Saúde
um repasse de R$ 19.000,00 (dezenove mil reais) o que em tese
representaria os 50% do Ministério da Saúde mas na realidade
corresponde a 17,2%. Em relação às unidades de suporte avançado o
mesmo se repete pois uma unidade móvel composta por médico,
enfermeiro e condutor-socorrista não custa menos de R$ 100.000,00

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(cem mil reais) mensais, incluindo salários, combustível e manutenção.
O Ministério da Saúde calculou que cada unidade de suporte avançado
custaria mensalmente R$ 55.000,00(cinquenta e cinco mil reais),
repassando apenas R$ 27.500,00(vinte e sete mil reais) mensalmente
o que, na realidade representa apenas 27,5% do custeio mensal e não
50% como previsto em portaria. Por último, em relação às unidades de
suporte básico de vida, o estimado de custo mensal previsto pela
portaria ministerial de R$ 25.000,00 se aproxima mais da realidade
pois se tem um custo real que normalmente gira em torno de
32.000,00(trinta e dois mil reais) ao mês, sendo que com o repasse de
R$ 12.500,00(doze mil e quinhentos reais ao mês) repassados pelo
Ministério da Saúde, tem-se um percentual de 39% ao mês.
Estas verbas subdimensionadas de custeio estão também
subdimensionadas quando é repassado o percentual de investimento
pelo ministério da Saúde, que representa apenas uma pequena parte
do investimento a ser realizado.

iii. Rotatividade dos profissionais principalmente dos reguladores (vínculo


e atividade fim)
A atividade extenuante e altamente especializada do médico
regulador requer um vínculo trabalhista regular e uma autorização
legal com pré-requisitos avaliados, para a função de médico regulador.
Na prática vínculos temporários e frágeis são estabelecidos com
médicos reguladores, sem estímulo ao seu trabalho, sem educação
permanente e sem retaguarda institucional frequente, levando a uma
grande rotatividade destes profissionais.
iv. Educação permanente ineficaz (NEU e NEP)
A educação permanente encontra-se ineficaz tanto pelo não
comprimento do previsto nas portarias ministeriais, caracterizando até
o momento uma ação individual e não institucional. Os Núcleos de
Educação em Urgência e os Núcleos de Educação Permanente
carecem até o momento tanto de legislação específica como de
incentivo financeiro para a execução de suas tarefas.
v. Manutenção e renovação da frotas
O critério de renovação de frota com 300.000 km rodados tem levado
a um sucateamento de grande parte da frota e a gastos
desnecessários de manutenção das unidades. Caso isto fosse reduzido
para 200.000 km rodados, poderíamos ter um custo menor, uma frota
mais nova e uma segurança para as equipes maior.

c. Componente Hospitalar:
i. Financiamento insuficiente e inexistentes para as Unidades de
Urgência

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O pagamento por procedimento, realizado pelo SUS, leva a uma
cultura de quanto mais, melhor, estimula o reembolso dos
procedimentos e é contraproducente para a organização de uma rede
que deve garantir a resposta aos casos realmente urgentes e
emergentes. Assim, tem-se de ter uma ampla discussão de incentivo
financeiro para as portas de entrada da rede de urgência, abolindo-se
o pagamento por procedimento mas garantindo a resposta às
necessidades regionais. Minas Gerais tem tido, a partir da Secretaria
de Estado da Saúde uma experiência exitosa neste sentido carecendo
até o momento de qualquer apoio federal para tal.

ii. Dificuldade na contra referência


Se não temos referências bem delimitadas e que por muitas vezes
impõem dificuldades para o acolhimento das urgências, inexiste, por
outro lado, um contra-referenciamento discutido e pactuado na maior
parte do país. Isto leva a uma retenção maior dos clientes na rede
hospitalar assim como uma descontinuidade de tratamento posterior
a uma internação.

iii. Leitos de retaguarda em número insuficiente e com complexidade de


assistência incompatível com as necessidades dos pacientes atendidos
nas grandes emergências
A rede de urgência não tem sido na maior parte das vezes discutida e
planejada, com seus pontos de atenção tendo papéis definidos, com
fluxos pactuados além de leitos de retaguarda assim como leitos de
unidades semi-intensiva que poderiam desafogar os hospitais de
referência não tem sido implantados. Isto mantém a situação de
superlotação nestes hospitais e dificultando o referenciamento dos
casos que necessitam do aporte especializado do hospital de
referência.

iv. Necessidade de implantação de equipe para classificação de risco


Igualmente necessitamos, dentro da rede hospitalar assim como na
atenção básica, de capacitação e estruturação para realização de
classificação de risco objetiva, tal como a de Manchester, para termos
uma linguagem única na rede assim como podermos dar equidade e
resolução à distribuição das situações nos pontos de atenção.
d. Outras Fragilidades:
i. Fragilidade no processo de acolhimento/humanização na alta
hospitalar
Outra fragilidade da política de urgência que podemos apontar é o
processo de humanização na alta hospitalar, fazendo com que o
paciente que egresse de uma unidade ter descontinuidade de seu
tratamento e não aderindo aos cuidados que deveriam ser

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preconizados. Acrescente-se a isto a dificuldade até o momento, por
falta de legislação própria, de internação domiciliar.
ii. Processo de regulação da urgência e emergência insuficiente tanto na
referência quanto na contra referência
Com já dito, sem um planejamento com pontos de atenção e papéis
na rede definidos assim como fluxos pactuados, criando uma linha
guia de ação, cabe aos médicos reguladores, a partir de sua
experiência e contatos pessoais, definir o fluxo e o ponto de atenção
para o atendimento de uma necessidade.
iii. Baixo nível de organização e de resolutividade dos pronto
atendimentos em nível local
Os pronto-atendimentos em nível local tem baixa resolutividade em
parte podendo ser devida ao isolamento deste tipo de unidade dentro
de uma rede assim como o não apoio direto de uma unidade
hospitalar. Podemos dizer que o ideal seria que cada pronto-
atendimento deveria ser uma porta avançada de uma unidade
hospitalar, se possível com um corpo clínico que trabalhasse em
ambas, comprometendo-se com os resultados em cada uma das
unidades.
iv. Financiamento insuficiente e inexistentes para os Pronto Socorros
Não existe até o momento qualquer incentivo financeiro para as
portas hospitalares (unidades de urgência ou prontos-socorros),
mantendo a mesma sem estrutura, perspectiva e servindo não para o
trabalho dos mais experientes mas sim para o trabalho dos iniciantes,
que tem a porta da emergência como possibilidade de entrada no
hospital para seu trabalho atual e futuro. Além disto, sem identidade,
os próprios trabalhadores destas unidades não se interessam em
organizá-la como igualmente não buscam capacitação específica visto
que sua atividade principal e foco é outra. Acrescente-se a isto que o
financiamento é feito por procedimento o que estimula a produção,
independente da necessidade real ou não de ser atendido em uma
porta hospitalar, sobrecarregando as unidades de urgência e deixando
muitas vezes para trás um caso realmente urgente.
v. Ausência de linguagem única e distribuição dos pacientes de acordo
com a gravidade
Uma das maiores dificuldades é definir-se a prioridade para o
atendimento e de que esta prioridade seja, dentro da rede de atenção,
vista e compreendida da mesma maneira, dentro de uma mesma
linguagem.

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 Sugestões de Pontos para Discussão e Aprimoramento

 Quanto a atenção básica

 O fortalecimento da atenção básica e de suas ações, como diretriz apontada


pela TESE do CONASEMS 2010/2011, vem sendo realizada e deve ser
aprofundada, sendo que em relação à estruturação das redes, os parâmetros
legais a discussão sobre a instrumentalização dos trabalhadores e das
unidades de atenção básica, através de capacitação específica e estruturação
mínima para o atendimento às situações agudas deve ser perseguida.

 Quanto ao planejamento análise e aprovação de projetos

 Sugere-se que para o planejamento das redes de urgências todos os atores,


sejam eles gestores nos diversos níveis e técnicos de portas hospitalares e da
atenção básica participem das discussões e modelagem da rede, incluindo
definição dos pontos de atenção, fluxos e normas. Além disto, o planejamento
deve sempre vislumbrar uma gestão e financiamento tripartite, de sonde
sugere-se que cabe ao Ministério da Saúde aprovar somente projetos com
esta envergadura: tripartite, de caráter regional e com a aprovação dos
colegiados gestores (CIB e CES).

 Quanto à governança

 A governança deve ser discutida na ótica de estruturação representativa


tripartite, atribuindo-se aos Comitês Gestores de Urgência um papel de
câmara técnica seja das CIBs macrorregionais ou estaduais com o
acompanhamento de estruturas federais.

 Para isto, além dos Comitês Gestores Regionais e Estaduais de Atenção às


Urgências propõe-se a reativação do Reativação do Comitê Gestor Nacional
das urgências e Emergências

 Quanto à estrutura administrativa e financeira regional

 Sugere-se uma discussão para elaboração de arcabouço jurídico que dê


retaguarda à regionalização, autorizando assim a estruturação e
financiamento regional com repasse direto dos fundos nacionais e estaduais
para estas estruturas regionalizadas.

 Além disto a participação dos entes gestores na composição do ente


administrativo regional, como por exemplo os consórcios públicos, é de
importância indiscutível para o sucesso do processo. Cabe à gestão estadual
conduzir, no âmbito regional, a rede (sempre regional) de atenção às

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urgências devendo, junto a representantes de todos os municípios abrangidos
e do nível federal, realizarem a gestão e financiamento da rede/

 Quanto à implantação de um critério único de priorização (classificação) dos casos e


introdução de uma linguagem única na rede.

 Sugere-se a introdução de uma classificação de risco objetiva, tal como a


preconizada por Manchester, que além da objetividade para priorizar os casos
mais graves separando-os dos menos graves, pode ser utilizado como um
mecanismo de gestão importante pois ao realizar a classificação temos uma
“vitrine” precisa da demanda podendo assim estabelecer mecanismos para o
atendimento desta demanda de maneira racional equitativa e de acordo com
a complexidade e prioridade de cada caso. Além disto fornece à rede de
atenção às urgências uma linguagem única de comunicação dos casos, entre
todos os pontos de atenção, sejam eles fixos e móveis, facilitando assim o
prosseguimento do atendimento de acordo com as linhas guias pactuadas

 Quanto ao financiamento do SAMU

 Sugere-se uma readequação de valores de repasse tanto de investimento


como de custeio, levando-se em conta a média nacional de salários praticados
no mercado e não estimados como o que se encontra na portaria 1864, em
caráter de vínculo empregatício de CLT e não vínculo precário.

 Quanto ao financiamento da rede hospitalar

 Sugere-se a discussão, seguindo o modelo adotado em Minas Gerais, de um


incentivo de custeio, sem pagamento por procedimentos, para a
implementação dos níveis hospitalares necessários para o êxito da rede de
urgência. O controle dos contratos e repasses realizados deve ser realizado em
nível regional a partir do Comitê Gestor Regional de Urgência e de dados
provenientes do SAMU e da Central de Regulação de Leitos.

 Quanto aos indicadores de resultados e qualidade

 Propõe-se o estabelecimento de indicadores de produção, resultados e


qualidade homogêneos e implementados em todo o Brasil para a avaliação das
redes de atenção as urgências

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Referências

CONASEMS. Tese do CONASEMS 2010/2011 In:


http://www.conasems.org.br/site/index.php/comunicacao/pubicacoes/finish/16/7

MENDES, Eugênio Vilaça. As redes de atenção à saúde. Ciênc. saúde coletiva, 2010, vol.15, n.5,
pp. 2297-2305. ISSN 1413-8123.

Minas Gerais. O choque de gestão na saúde em Minas Gerais / organizado por Antônio Jorge
de Souza Marques [et al.] . --- Belo Horizonte : Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais,
2009. 324 p. il.

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