Departamento de Sociologia
Análise
Ilha do Medo
Sociologia Contemporânea II, ministrada pelo Prof Dr. Attila Barbosa Magno e Silva
Michel Foucault
A ilha é local de uma instituição psiquiátrica comandada pelo Dr. Cawley, cujo
objetivo é proporcionar, nas palavras do mesmo, uma "fusão moral de lei, ordem e
tratamento clínico" a pacientes com problemas mentais condenados ao carcere e ao
tratamento psiquiátrico. Com o desenrolar da investigação, Teddy, que sofria de
alucinações com a sua mulher morta, além de lembranças constantes do seu passado como
militar que esteve em campos de concentração nazistas, passa a descobrir a sua história e
também a se perguntar o que realmente é a verdade no que acredita. Assim, ele descobre
que toda a sua experiência na ilha não passou de uma interveção psiquiátrica, uma vez que
ele era paciente da mesma instituição há dois anos.
Na obra "Vigiar e Punir", Michel Foucault define como sendo a ideal a disciplina
que se caracteriza por ser infinita, que ocorre através de interrogatório, observação,
inquérito, julgamento e exame constantes e minuciosos (Foucault, 1987, pág. 187), fato que
é extremamente visível no tipo de relacionamento que os funcionários e inclusive os outros
pacientes possuiam com ele, uma vez que ele é constantemente analisado. A instituição
psiquiátrica retratada no filme obedece a descrição feita pelo autor na qual este a relata
como sendo característica por ter uma divisão binária e da marcação desta através da
separação de médico e paciente, louco e não-louco, perigoso e não perigoso, separados no
local por duas alas diferentes, uma para doentes mais sérios e menos perigosos - Alas A e B
e uma ala, denominada Ala C, para os perigosos. Essa divisão binária resulta em uma
determinação coercitiva, além de uma repartição diferencial, exemplificados no uso de
diferentes uniformes para pacientes e funcionários.
O último instrumento citado pelo autor, o exame, entendido como sendo o que
produz o saber-verdade (que desenvolveremos posteriormente no texto), é a vigilância
permanente, classificatória, que distribui, julga, mede, localiza e utiliza os indivíduos ao
máximo. também é representado no filme pela figura do parceiro de Teddy, Chuck, que
também é o psiquiatra dele e o diretor da instituição, Dr. Cawley. O exame realizado por
eles é ao final do filme, verificar se Teddy havia internalizado a verdade sobre sua situação
na instituição, se ele havia se conformado com o seu passado e com o fato de ele ter matado
a sua esposa após chegar em casa e achá-la no quintal olhando seus filhos mortos no lago.
Podemos verficar no diálogo abaixo essa situação. Perceba que ao final desse diálogo,
Teddy volta a se referir ao seu médico como o parceiro na ilha, mesmo após ter sido
explicado quem ele era:
Essa prática é vista por Foucault como sendo resultado de grandes reformas na
psiquiatria. As relações paciente-médico continuavam sendo relações de poder, mas este
era anulado, mascarado e eliminado. Se transfere nessa nova "antipsiquiatria" para o
paciente o poder de produzir a sua loucura e a verdade de sua loucura ao invés de reduzi-la
a nada (Foucault, 1979, pág. 72). Coloca-se as relações de poder da psiquiatria, antes
caracteristicas por serem o a priori da mesma, no centro do campo problemático e as
questiona. A psiquiatria passa, nessa nova configuração, a ser desmedicalizada, o que pode
ser observado no filme, como já referido nesse texto.
Teddy, ao ter sua crise nervosa ao final do filme, uma vez que já não estava
tomando seus remédios, administrados pelo Dr. Cawley, entra em uma crise: suas mãos
estavam paralisando, assim como outras partes de seu corpo e suas alucinações ficavam
cada vez mais constantes. Para Foucalt, “a crise pode ocorrer sem o médico, mas se este
quiser intervir, que seja segundo uma estratégia que se imponha a crise como momento da
verdade” (Foucault, 1979, pág, 65). Fica claro no momento em que o Dr. Cawley, ao ver
Teddy tendo sua crise decide intervir, expondo a ele qual era a sua real situação naquele
lugar.
A partir da análise fica clara, portanto, a importância da obra de Foucault na
interpretação do filme “Ilha do Medo”, uma vez que inúmeros aspectos da mesma, em
especial a produção da verdade, podem ser verificados ao longo da narrativa do filme. Para
finalizarmos essa análise, uma última citação do autor que inspirou o presente trabalho:
“No fundo da prática cientifica existe um discurso que diz: “nem tudo é
verdadeiro; mas em todo lugar e a todo momento existe uma verdade a ser
dita e a ser vista, uma verdade talvez adormecida, mas que no entanto está
somente à espera de nosso olhar para aparecer, à espera de nossa mão
para ser desvelada. A nós cabe achar a boa perspectiva, o ângulo correto,
os instrumentos necessários, pois de qualquer maneira ela está presente
aqui e em todo lugar” (Foucault, 1979, p. 65)
Bibliografia utilizada: