ENSINAMENTOS DE
MEISHU SAMA
Mundo do Belo
ÍNDICE
PREFÁCIO............................................................................................................................................................................................5
NOTAS...................................................................................................................................................................................................8
I - DO ESTADO ARTÍSTICO............................................................................................................................................................9
DISCURSO INFORMAL EM HAKONE.......................................................................................................................................9
ZUIUN-KYO — COMO UM LOCAL DE RENOME MUNDIAL............................................................................................11
CONSIDERAÇÃO ACERCA DO PARAÍSO TERRESTRE.....................................................................................................14
O SIGNIFICADO DO SHINSEN-KYO........................................................................................................................................15
ATÉ A CONCLUSÃO DO PARAÍSO TERRESTRE.................................................................................................................16
O PARAÍSO É O MUNDO DA ARTE..........................................................................................................................................25
A CONCEPÇÃO DO PARAÍSO TERRESTRE..........................................................................................................................26
OS JARDINS DA TERRA DIVINA..............................................................................................................................................28
NÃO PERTUBEM O MEU TRABALHO (I)...............................................................................................................................31
A RESPEITO DO PARAÍSO TERRESTRE................................................................................................................................34
O GRANDE SIGNIFICADO DO PARAÍSO TERRESTRE DE SHINSEN-KYO...................................................................35
CUMPRIMENTOS DE ANO NOVO............................................................................................................................................38
II - SOBRE O MUSEU DE BELAS-ARTES.................................................................................................................................40
A ILHA DE HORAI........................................................................................................................................................................40
NÃO PERTURBEM O MEU TRABALHO (II)..........................................................................................................................42
ATÉ A CONCLUSÃO DO MUSEU DE ARTE...........................................................................................................................46
SIGNIFICADO DA CONSTRUÇÃO DO MUSEU DE ARTE..................................................................................................51
A SOCIALIZAÇÃO DA ARTE.....................................................................................................................................................55
III — SOBRE A COLEÇÃO DE OBJETOS DE ARTE.............................................................................................................57
MINHA FORMAÇÃO ARTÍSTICA............................................................................................................................................57
PORQUE AS OBRAS-PRIMAS CHEGARAM ÀS MINHAS MÃOS......................................................................................59
O MUSEU IDEALIZADO POR DEUS........................................................................................................................................62
UM MUSEU DE ARTES DEMOCRÁTICO................................................................................................................................66
OS MILAGRES DA COLETA DE OBRAS DE ARTE..............................................................................................................66
IV— SOBRE A ARTE.......................................................................................................................................................................68
RELIGIÃO E ARTE.......................................................................................................................................................................68
A MISSÃO DA ARTE....................................................................................................................................................................68
CARACTERÍSTICAS PARTICULARES DA CIVILIZAÇÃO JAPONESA..........................................................................70
O PARAÍSO É O MUNDO DAS ARTES.....................................................................................................................................74
A RESPEITO DA COLETÂNEA DE POEMAS “YAMA TO MIZU” (MONTE E ÁGUA)..................................................75
RELIGIÃO E ARTE.......................................................................................................................................................................76
MINHA CRÍTICA SOBRE PINTURA.........................................................................................................................................77
RELIGIÃO ARTÍSTICA...............................................................................................................................................................81
O PARAÍSO É O MUNDO DO BELO.........................................................................................................................................83
SOBRE A ARTE DA VELOCIDADE E PICASSO....................................................................................................................85
CIÊNCIA E ARTE..........................................................................................................................................................................87
SERMÃO.........................................................................................................................................................................................89
V - SOBRE OS ARTISTAS...............................................................................................................................................................91
OGATA KORIN..............................................................................................................................................................................91
O SABER DAS COISAS.................................................................................................................................................................92
A RAZÃO DO DESAPARECIMENTO DOS GRANDES MESTRES (II)*.............................................................................96
A RAZÃO DO DESAPARECIMENTO DOS GRANDES MESTRES (III).............................................................................99
MINHA DEFERÊNCIA PELOS ARTISTAS............................................................................................................................101
VI - SOBRE A APRECIAÇÃO......................................................................................................................................................104
A ARTE JAPONESA E SEU FUTURO.....................................................................................................................................104
1 - A Pintura.....................................................................................................................................................................104
2 - A Escultura.................................................................................................................................................................109
3 - Os trabalhos de laca...................................................................................................................................................109
4 - A Cerâmica.................................................................................................................................................................111
5 - A Caligrafia................................................................................................................................................................115
A RESPEITO DA ARTE CALIGRÁFICA................................................................................................................................117
IMPRESSÕES DIVERSAS SOBRE AS ARTES ORIENTAIS...............................................................................................119
IMPRESSÕES DIVERSAS SOBRE AS ARTES ORIENTAIS (II).........................................................................................122
IMPRESSÕES DIVERSAS SOBRE AS ARTES ORIENTAIS (III).......................................................................................125
IMPRESSÕES DIVERSAS SOBRE AS ARTES ORIENTAIS (IV).......................................................................................129
INTRODUÇÃO À XILOGRAVURA UKIYO-E — PREFÁCIO............................................................................................133
MOKITI OKADA, DIRETOR DO MUSEU DE ARTE DE HAKONE..................................................................................133
VII — ANDANÇAS ARTÍSTICAS...............................................................................................................................................135
VIAGEM À REGIÃO OESTE DO JAPÃO...............................................................................................................................135
CONSIDERAÇÕES SOBRE A "EXPOSIÇÃO DOS TESOUROS DO TEMPLO KOFUKU-JI”, DE KASUGA, NA
LOJA DE DEPARTAMENTOS MITSUKOSHI.......................................................................................................................141
2
Mundo do Belo
3
Mundo do Belo
PREFÁCIO
4
Mundo do Belo
5
Mundo do Belo
6
Mundo do Belo
NOTAS
7
Mundo do Belo
I - DO ESTADO ARTÍSTICO
Pode haver quem me critique por construir algo tão soberbo, numa
época em que o Japão passa por crises de fome e falta de moradias. O que
eu tenho em mente, contudo, não é a ostentação, mas algo profundo e
significativo, antevendo a chegada do dia de apresentar ao mundo a beleza
peculiar da Arquitetura nipônica. Como é do conhecimento geral, os
americanos demonstram acentuado interesse pela cerimônia japonesa do
chá. No tocante a isso, na primavera de 1946, o general Smith e a cúpula de
seu comando — que estão estabelecidos no Japão — quiseram apreciar a
citada cerimônia. Por intermédio das autoridades da cidade de Atami, eu
ofereci a sala de chá de Tozan-so (Solar da Montanha Oriental), minha
residência na ocasião. Tal atitude também contribuiu em muito para o
estímulo do meu espírito.
8
Mundo do Belo
9
Mundo do Belo
10
Mundo do Belo
11
Mundo do Belo
12
Mundo do Belo
13
Mundo do Belo
Portanto, deve-se dizer que esta religião recebeu, pela primeira vez,
de Deus, a qualificação para estabelecer o Mundo da Beleza, sendo esse
conseguimento apenas uma questão de tempo. Assim, conclamo o público
a acompanhar atentamente, de hoje em diante, os movimentos de nossa
Igreja, para comprovar o que digo.
O SIGNIFICADO DO SHINSEN-KYO
14
Mundo do Belo
15
Mundo do Belo
16
Mundo do Belo
17
Mundo do Belo
18
Mundo do Belo
19
Mundo do Belo
20
Mundo do Belo
que foi submetida durante a sua vertedura. O terceiro tipo é similar à lava,
vermelho escuro; o quarto é de tonalidade limonística, anguloso e duro. É
evidente que todas elas foram vertidas aqui, durante a erupção do monte
Soun. Essa erupção aconteceu com o rompimento do leito rochoso da
crosta terrestre, mediante a liberação de gases, ou seja, uma exploração
vulcânica.
21
Mundo do Belo
Não posso deixar de descrever aqui outro milagre. Nesses seis anos
passados, não houve sequer, até hoje, um único morto ou ferido, durante o
deslocamento daquelas rochas imensas para a sua distribuição nos jardins.
Notem que as maiores atingem até 1,80 metro de diâmetro e chegam a
pesar acima de 75 toneladas. Segundo o depoimento de profissionais no
assunto, na execução de obras de semelhante porte, é normal que haja
alguns mortos ou muitos feridos. Acrescentam sempre: "Em uma obra
como esta, é simplesmente inacreditável". Eles acabaram por perceber que
existe a atuação de uma força sobre-humana, passando a acreditar na
existência de Deus e a conscientizar-me, ao que parece, da minha missão.
Hoje todos abraçam a nossa Fé.
22
Mundo do Belo
23
Mundo do Belo
24
Mundo do Belo
Havendo ainda uma série de coisas, além das que já escrevi até
hoje, no que tange aos dois Paraísos Terrestres em construção em Hakone e
em Atami, passarei a discorrer sobre elas. Como sempre digo, objetivo a
criação de uma obra de arte global da natureza, por meio do máximo realce
conferido à beleza original de cada elemento — a começar da paisagem
natural — quesito básico do Paraíso Terrestre — inclusive as árvores que
florescem, as de copa verdejante, a beleza dos matizes variegados das
flores, bem como as pedras, os rochedos, os arroios e os lagos — e,
simultaneamente, pela atenção dispensada à harmonia de todo o conjunto.
25
Mundo do Belo
26
Mundo do Belo
27
Mundo do Belo
28
Mundo do Belo
29
Mundo do Belo
passará para uma etapa de progresso vertiginoso. Deus faz com que tudo se
processe ordenadamente: esta é a Verdade.
30
Mundo do Belo
31
Mundo do Belo
vislumbrar toda essa vista; quem quer que aqui se coloque louva o lugar,
dizendo ter experimentado o Paraíso na própria Terra. Aqui é, sem dúvida,
a Terra sagrada preparada por Deus quando da criação do Universo. O que
seria este lugar senão a maior obra-prima de Deus? Ademais, por sua
proximidade com a estação de trem, que permite daí vir em quinze minutos
a pé ou cinco de carro, por meio de um caminho em suave aclive, seu
acesso é extremamente fácil. Faz cinco anos exatos desde que comprei, em
1946, pela primeira vez, uma área. A partir de então, diariamente, de
cinqüenta a cem pessoas vieram trabalhando ativamente até hoje, em
conformidade com o projeto por mim traçado. Assim, a correção do relevo
do terreno tem sua conclusão prevista para o final do corrente ano. Aí
plantaremos, principalmente, dois mil pés de vinte diferentes variedades de
azáleas, mil pés de cerejeiras, e quinhentos pés de ameixeiras, além de todo
tipo que se puder reunir de arbustos floríferos, de modo que as flores
abram, incessantemente, uma depois da outra. Será acertado chamá-lo de
paraíso espetacular ou ideal.
32
Mundo do Belo
33
Mundo do Belo
34
Mundo do Belo
dos formatos mais exóticos, pus em ordem, entre elas, árvores, flores e
plantas alpinas, e fiz serpentear por aqui e acolá arroios rápidos: a paisagem
proporcionada pela beleza natural que a contento se saboreia, juntamente
com o sussurar da água, dá a sensação de que se passeia por um paraíso
distante da vulgaridade do mundo, segundo o veemente elogio de todos os
que o vêem. Ademais, como a abrilhantar o conjunto, tem-se um templo de
beleza fulgurante, de maneira que penso poder sentir orgulho desta como
uma obra de arte que conjuga, no todo, a beleza natural à artificial.
35
Mundo do Belo
36
Mundo do Belo
37
Mundo do Belo
Palácio de Cristal fiquem prontos, para que a sua visão magnificente deixe
todos os que os virem com os olhos arregalados, porque ambos constituem
prédios num estilo inteiramente inédito, tanto no Japão quanto no exterior;
não só o jardim, com as suas árvores verdejantes e flores multicoloridas
que os circunda, constituindo um adereço esplendoroso e paradisíaco, como
também o excelente panorama que daí se avista, a partir da longínqua Ilha
de Izu, passando pela Península de Miura até a de Boso, tudo isso cria uma
grande terra da arte, única no mundo e merecedora do nome de Paraíso
Terrestre. Na alvorada da sua constituição, deveremos considerá-lo, sem
exagero, não um local famoso do Japão, mas do mundo. Tal julgamento
pode ser comprovado pelo comentário, nesse sentido, que certo jornalista
norte-americano, aqui em visita, dias atrás, teceu juntamente com palavras
de louvor.
38
Mundo do Belo
A ILHA DE HORAI
39
Mundo do Belo
40
Mundo do Belo
41
Mundo do Belo
42
Mundo do Belo
43
Mundo do Belo
Parece haver jornalistas que falam a esmo desta religião, no que diz
respeito à grandiosa empresa acima descrita, sem conhecer o seu real
conteúdo. É desejável que reflitam profundamente sobre tão impensada
atitude. Como se pode depreender do discorrido, eu venho esforçando-me
em silêncio, em prol da cultura mundial e do porvir do Japão. Assim, hoje,
quando as coisas, graças ao auxílio divino, vêm, de um modo geral,
correndo a contento, eu me sinto satisfeito. Como esta empresa é de caráter
nacional, ou antes, universal, se eu não me lançasse à sua consecução,
alguém teria que fazê-lo, e quanto mais rápida fosse sua realização, maior
seriam seus préstimos para o desenvolvimento cultural. Portanto, quero
solicitar a todas aquelas pessoas que ainda não conheçam o projeto, ou que
por ele tenham algum interesse, que visitem, primeiramente, o local de sua
instalação. Nesse caso, não apenas mostrarei tudo com desvelo, como não
pouparei esforço em explicar o projeto, até que meu interlocutor se
satisfaça.
44
Mundo do Belo
45
Mundo do Belo
46
Mundo do Belo
47
Mundo do Belo
48
Mundo do Belo
Em seguida, devo escrever sobre mim mesmo. Eu, desde cedo, amei
a arte, e o que me trouxe até o ponto de construir este museu de arte foi a
convicção de que tal empreendimento era o mais adequado que qualquer
outro, para o desenvolvimento religioso. Simultaneamente, eu prego a
Verdade em todos os campos, a partir da medicina e da agricultura,
passando pela política, economia, educação e arte, dentre outros; esfacelo a
ignorância e venho mostrando o princípio-guia da organização de uma
nova cultura. Julgando-se, pois, por tal missão, pelo fato de que eu estendo
em âmbito mundial a obra do príncipe Shotoku, tudo o que se refere a mim
tornar-se-á perfeitamente compreensível. A única diferença é que o
Príncipe se originou da classe alta, ao passo que eu provenho das camadas
baixas. Tal realidade é plausível ao se considerar o fato de Maitreya descer
ao mundo. Ademais, outra coisa que desejo dizer é que o Príncipe se
submeteu ao Buda, devotando-se à expansão do budismo. Eu, no entanto,
considero o Buda inferior a mim. A razão é que, há dois mil e seiscentos
49
Mundo do Belo
50
Mundo do Belo
51
Mundo do Belo
impossível satisfazer seu desejo. Não seria essa, então, a maior deficiência
do Japão como o país da arte? Assim, se este museu de arte puder suprir,
um pouco que seja, essa falha, eu sentirei que fui recompensado muito
além de minhas esperanças.
52
Mundo do Belo
53
Mundo do Belo
A SOCIALIZAÇÃO DA ARTE
54
Mundo do Belo
55
Mundo do Belo
56
Mundo do Belo
57
Mundo do Belo
Quão triste, pois, é ser japonês e não ter acesso à Arte nipônica!
Levando isso em consideração, no Museu de Hakone, coloquei ênfase na
arte peculiar do Japão, crendo, pois, poder satisfazer a qualquer um.
Conquanto sua escala seja ainda pequena, este museu viabilizará, seja
como for, a redescoberta da excelência do japonês com relação à Arte, e, ao
mesmo tempo, surpreenderá muito o visitante estrangeiro.
Conseqüentemente, desempenhará um relevante papel nas diretrizes
nacionais concernentes ao turismo.
58
Mundo do Belo
Como tenho dito várias vezes, desde jovem, eu gostava muito das
belas-artes. Entretanto, minha capacidade de avaliação ainda era de
amador; além disso, eu não tinha experiência em compras desse tipo, nem
entendia de preços do mercado. Conseqüentemente, só comprei as obras de
que gostava. E parece que esse método não falhou; posso até dizer que não
comprei nenhuma peça falsa.
59
Mundo do Belo
60
Mundo do Belo
61
Mundo do Belo
respeito à sua rapidez. Não haverá, em absoluto, neste vasto mundo, caso
algum de museu cuja construção tenha ocorrido a tal velocidade e cujo
vasto acervo de obras de primeira categoria tenha sido reunido em tão curto
espaço de tempo. Quem quer que o veja — como é fato conhecido —
expressa não elogios superficiais, mas, sim, emite palavras de sincera
admiração. Se isso não for obra de Deus, o que será então? Embora eu
ainda desconheça sobre o exterior, no tangenteaos museus de arte
espalhados pelo território nacional, com exceção dos grandes museus
globais e das coleções particulares, foram todos formados pelos amantes
das artes provenientes dos zaibatsu e das classes abastadas, os quais
dispenderam neles toda uma vida.
Contudo, o nosso Museu de Arte de Hakone é um prodígio. Ficou
pronto em pouquíssimos anos, depois de traçado o seu projeto, o que é
fascinante, porque os fundos necessários amealharam-se com as doações
dos fiéis, e as obras de arte acumularam-se aos poucos, após o final da
guerra, ou foram tomadas emprestadas; eu jamais as busquei com base no
meu pensamento. Em suma, foi tudo deixado inteiramente à livre vontade
de Deus, inclusive quanto ao gênero. Outrossim, aquilo que eu queria foi
comprado a um preço relativamente baixo, além das obras doadas por fiéis,
as quais, curiosamente, também, tratavam-se do que era preciso. Desta
maneira, arranjou-se justamente a quantidade suficiente de objetos para
serem exibidos em um museu de artes. Por mais que se medite, tal
acontecimento não pode ser considerado obra humana. Tudo, do princípio
ao fim, correu perfeitamente, como se Deus me fizesse agir de acordo com
a Sua intenção. Foi cômodo para mim. Caso não fosse obra divina, não
haveria motivo para as coisas irem tão bem assim.
62
Mundo do Belo
quando, logo no limiar do ano novo, essas peças começaram a chegar uma
atrás da outra. Como, naturalmente, no Japão, não se conhece muito sobre
tais obras, foi possível coletá-las com facilidade, a preços módicos, o que
não apenas me proporcionou alegria, como também percebi, conforme
crescia minha compreensão acerca do assunto, que as citadas obras são
ricas em atrativos, algo que não permite pô-las de lado. Novamente, não
pude deixar de admirar-me com a profundidade dos desígnios divinos.
Ademais, como obra desse gênero ainda não foi coletada por ninguém,
inclusive pelos grandes museus, o Museu de Artes de Hakone tomou a
vanguarda.
63
Mundo do Belo
64
Mundo do Belo
65
Mundo do Belo
66
Mundo do Belo
RELIGIÃO E ARTE
A Arte é a representação do Belo. Mas por que será que ela foi
negligenciada até os nossos dias?
05 de setembro de 1948
A MISSÃO DA ARTE
67
Mundo do Belo
68
Mundo do Belo
Vejamos: erotismo cada vez mais vulgar, literatura cada vez mais
grotesca, quadros cada vez mais monstruosos; as opiniões dos artistas,
assim como também a Música, o Teatro e o Cinema, cada vez piores. Se
analisarem minuciosamente tais fatos, certamente compreenderão que a
minha tese não é errada.
69
Mundo do Belo
70
Mundo do Belo
Com tudo o que foi explicado, creio que se pode entender a missão
deste país e do seu povo. Em resumo, é preciso transformar todo o território
japonês no Jardim do Mundo e empreender contínuos esforços no sentido
de promover a Arte, até que ela atinja o seu mais elevado nível. Ou melhor,
deve-se estabelecer uma política nacional baseada no turismo, na Arte e no
artesanato, empregando todo o empenho na sua concretização. Como
resultado, é natural que isso contribuirá para a elevação do pensamento de
toda a humanidade, proporcionando, também, um nível mais alto de
recreação e entretenimento. Em poucas palavras, é importante fazer do
Japão um país de elevadíssimo nível artístico e cultural.
71
Mundo do Belo
72
Mundo do Belo
Como se pode ver, portanto, o meu cotidiano tem sua maior parte
ocupada pelas Artes, podendo mesmo ser chamado de vida artística. Eu
sempre tenho considerado tal atitude um instinto a mim agraciado por
Deus, pela minha missão de construir o Paraíso Terrestre. É que o Paraíso é
o mundo das artes, havendo uma razão para tal.
73
Mundo do Belo
74
Mundo do Belo
RELIGIÃO E ARTE
75
Mundo do Belo
76
Mundo do Belo
77
Mundo do Belo
sabor peculiar como tal. Todavia, o problema da Arte hodierna não está na
nobreza ou baixeza de nível. O âmago de sua beleza já se perdeu há muito,
nada restando nela. A impressão que se recebe desses quadros é a própria
fealdade; nada mais que mal-estar, antipatia, cólera, desespero. Tais
pintores formam um tipo de anormalidade mental. Por isso, toda vez que
compareço a exposições assim, eu imagino que, se os pacientes de um
hospício organizassem uma mostra, ter-se-ia algo idêntico.
78
Mundo do Belo
79
Mundo do Belo
RELIGIÃO ARTÍSTICA
Não existe, ou melhor, nunca existiu uma religião que desse tanta
importância à Arte quanto a nossa Igreja. Ela assim se posiciona, porque o
Paraíso Terrestre — nosso objetivo último — é o Mundo da Arte.
Obviamente, se ele é um mundo isento de doença, pobreza e conflito, isto
é, o mundo de perfeita Verdade, Bem e Belo, o homem seguirá a Verdade,
amará o Bem e odiará o Mal; assim, todas as coisas se tornarão belas.
Nesse sentido, a Arte não será apenas um deleite indispensável; ela
1
Sho: Instrumento musical de cano. É constituído de dezessete canos de bambu, longos e
curtos, dispostos verticalmente. Dois deles não emitem som; os quinze restantes possuem
orifícios na parte anterior e na parte posterior.
2
Hitiriki: Instrumento musical de cano, semelhante à flauta.
3
Mokugyo: Instrumento que se bate na hora de ler os sutras. É feito de madeira oca,
arredondado, esculpido em formato de cabeça de peixe. Para se produzir o som, utiliza-se um
pequeno bastão coberto de pano ou couro.
4
Dora: Instrumento musical semelhante ao gongo.
80
Mundo do Belo
81
Mundo do Belo
82
Mundo do Belo
83
Mundo do Belo
84
Mundo do Belo
85
Mundo do Belo
CIÊNCIA E ARTE
86
Mundo do Belo
87
Mundo do Belo
ser de nível elevado — uma arte que, deleitando a pessoa, eleva o seu
sentimento.
SERMÃO
88
Mundo do Belo
*Omitiu-se, na presente obra, a parte final, por não estar particularmente relacionada com as Artes.
89
Mundo do Belo
V - SOBRE OS ARTISTAS
OGATA KORIN
90
Mundo do Belo
Creio que não é exagero afirmar que o japonês Korin, que, alguns
séculos após sua morte, subitamente agitou o mundo inteiro, ou melhor,
revolucionou um campo da civilização, é o maior orgulho deste país. Até
hoje, não houve um japonês cuja obra lograsse revolucionar um setor
mundial. Somos obrigados a afirmar que Korin foi o único.
91
Mundo do Belo
92
Mundo do Belo
6
Hideyoshi Toytomi: unificador dos feudos, no ano de 1573
93
Mundo do Belo
“A solidão envolve
até um coração indiferente,
quando as narcejas levantam vôo do pântano,
nos crepúsculos do outono.”
Saigyo (Waka)
7
Maki-ê: arte que utiliza laca e madrepérola)
94
Mundo do Belo
Baisho (Haiku)
95
Mundo do Belo
96
Mundo do Belo
97
Mundo do Belo
*A Razão do Desaparecimento dos Grandes Mestres (II) — Por não estar particularmente relacionado
com a Arte, o texto "A Razão do Desaparecimento dos Grandes Mestres (I)" foi omitido da presente
obra.
98
Mundo do Belo
99
Mundo do Belo
100
Mundo do Belo
101
Mundo do Belo
substitutos aos montes para elas. Acresce que, principalmente entre tais
pessoas (não sei se, no exterior, também acontece o mesmo), sejam muitas
aquelas que detestam religião. Acredito que quem destesta religião não se
trata, no mínimo, de um homem de bem. De fato, eles praticam atos
elogiáveis, mas por ser algo calculado, não me infunde respeito.
Conseqüentemente, em se tratando dos mesmos homens de bem, prefiro
entrevistar-me e manter amizade com aquele que conhece Deus, pois é o
legítimo.
102
Mundo do Belo
VI - SOBRE A APRECIAÇÃO
1 - A Pintura
103
Mundo do Belo
104
Mundo do Belo
105
Mundo do Belo
defeito; mais que isso, delas afluirá, infinitamente, algo superior. Elas terão
sempre alguma coisa a comover quem as contempla. Naturalmente, toma-
se uma atitude de humildade perante elas. No tangenteàs peças de
Motonobu, Tan-nyu, Sesshu e Sesson, não diria que todas elas são boas,
mas, de vez em quando, há algumas de rara superioridade. Com respeito a
Korin, por já ter escrito sobre ele no respectivo artigo, omiti-lo-ei. Sotatsu
também apresenta peças superiores. Apesar de não ser tão arrojado quanto
Korin, é de uma simplicidade acurada ao extremo. Desprevenidos, sorrimos
diante de suas obras, e eu gosto incontidamente delas. Kenzan tem um
sabor especial e, conquanto seu pincel seja um pouco duro e apresente
características primárias, seu estilo nos prende. Okyo é convencional e
impecável. De alta classe, logra sucesso em qualquer empreendimento: um
mestre, enfim. Matabee, cujo outro pseudônimo é Katsumochi, demonstra
exímia harmonia tanto no estilo yamato-e como no da escola Kano; suas
obras possuem nobreza, sendo muito apreciáveis. Hoitsu, como todos
sabem, é um cultor de Korin. Sua nobreza peculiar, sua técnica refinada e,
por outro lado, o sabor da sua faceta de poeta, tornam suas obras atraentes.
106
Mundo do Belo
Com relação a Kansetsu, foi uma grande pena que ele morresse
logo quando mais prometia. Na sua pintura, a ousadia que nela ocorre
encontra-se envolta; sendo do estilo nanga, há tensão no uso do pincel.
Além de não ser vulgar, transparece na mesma um sabor de quietude.
Contudo, em virtude da sua juventude, era inevitável que a qualidade de
suas obras não fosse constante. Se lhe fosse dado viver até depois dos
sessenta, pelo menos, com certeza, ele teria atingido o grau de grande
mestre.
107
Mundo do Belo
2 - A Escultura
3 - Os trabalhos de laca
108
Mundo do Belo
109
Mundo do Belo
4 - A Cerâmica
110
Mundo do Belo
na China.
111
Mundo do Belo
112
Mundo do Belo
113
Mundo do Belo
5 - A Caligrafia
114
Mundo do Belo
115
Mundo do Belo
116
Mundo do Belo
contudo, ao não se deixarem tolher pela forma, por não serem nem um
pouco pedantes, aparecem perfeitamente nelas a ingenuidade e a franqueza,
a beleza sem artifícios da personalidade de Ikkyu. Fato interessante é que,
apesar de existirem muitas peças falsas de Ikkyu, dá-se logo por isso, em
virtude de estarem por demais bem escritas. As obras de Takuan, também,
são ótimas. Nestas, além de a técnica ser bem superior, há energia. Na
inexistência do sentimento de ostentar o estado de quem atingiu a
iluminação, pressente-se a nobreza deste monge da seita zen. De resto, há
coisas dignas de se ver entre as obras de Seigan, Kogetsu e Gyokushitsu.
No tocante à caligrafia dos samurais, a escrita de Masashige Kusunoki é
extremamente bela, sendo, ainda, de razoável beleza a de Hideyoshi e
Ieyasu. Recentemente vi em certo lugar a caligrafia de Kukai. Trata-se de
uma escrita apreciável, em que há suavidade, porém não faz muito jus ao
conceito de que comumente goza. Na modernidade, a caligrafia de Tesshu
Yamaoka é interessante. Seu estilo livre e arrojado é digno de alta
avaliação. A escrita de Ichiroku Iwaya, outrossim, possui elementos que
não podem ser desprezados. Todavia, a de Ryokan suplanta a todas. O
estilo de sua escrita é supramundano, elegante e gracioso; leva mesmo
quem a aprecia a sorrir. Ademais, como calígrafo profissional, a escrita de
Kaioku Nukina é belíssima. Certa vez vi um biombo de seis folhas escrito
por ele. Cada uma das folhas trazia uma linha escrita. A perícia do seu
estilo pôs-me admirado.
117
Mundo do Belo
9
Percival
118
Mundo do Belo
119
Mundo do Belo
120
Mundo do Belo
121
Mundo do Belo
122
Mundo do Belo
123
Mundo do Belo
Shubun, Dasoku, Kei Shoki e outros e, um pouco mais tarde, Sesshu. Sem
dúvida são eles os patronos da Pintura japonesa. Conseqüentemente,
Sesshu é o fundador da escola Kano.
124
Mundo do Belo
modernidade.
125
Mundo do Belo
126
Mundo do Belo
chineses ou coreanos. Seus desenhos, seus ornatos, sua forma, suas cores
— tudo expressa, com perfeita fidelidade, o senso nipônico. Ademais, em
questão de elegância e altivez, jamais será suplantada pela porcelana
chinesa. É um motivo de autêntico orgulho para o Japão. Ao deparar-me
com a obra de Ninsei, sempre considero que, como ceramista japonês, ele
ocupa posição equivalente à de Korin.
127
Mundo do Belo
128
Mundo do Belo
Yaotyo.
129
Mundo do Belo
14
Jarra d'água: refere-se ao vaso decorado com flores de lótus.
15
Peças de Chu Lu: fornos de Tz'utyou.
130
Mundo do Belo
peças do tipo brocado, do tipo ornato vermelho Gosu, do tipo Hsüan Te16,
ou do tipo ornato vermelho Wan Li, todas grandemente apreciadas.
Sobretudo as do gênero brocado da época Chia Ching são o que há de
melhor: o vaso de flores em forma de cabaça e a garrafinha triangular, do
acervo do nosso museu, são obras finíssimas, raramente vistas. As peças
modernas, produzidas posteriormente, são boas, como as dos períodos T'ieu
Ch'i, K'ang Hsi, Yung Cheng e Ch'ien Lung; porém, quando cotejadas com
as obras da dinastia Ming e anteriores, prendendo-se em demasia à técnica,
são tidas pelo senso geral como superficiais e pouco atraentes.
Além das louças, outra modalidade de arte chinesa tida
mundialmente em alta consideração são os bronzes. Tratam-se estes de
obras produzidas há três mil anos, nos períodos Yin (Shang) e Chou. Sua
técnica refinadíssima constitui um verdadeiro milagre. É mesmo difícil
acreditar ter sido possível fazer peças tão magníficas em tempos tão
remotos! O mais intrigante é que, conforme as Eras fiquem mais recentes,
ou seja, Ch'in, Han, Sui, T'ang e Sung, a técnica regride gradativamente.
Todos são unânimes em reconhecer o mistério que é o fato de somente as
belas-artes caminharem em sentido inverso ao da cultura. Os bronzes
chineses concentram-se nos museus ingleses; no Japão, são encontrados,
principalmente, nos museus Hakutsuru, Sumitomo e Nezu.
16
Tipo Hsüan Te: refere-se à porcelana de ornato azul Hsüan Te.
131
Mundo do Belo
132
Mundo do Belo
Maio de 1953
133
Mundo do Belo
134
Mundo do Belo
135
Mundo do Belo
136
Mundo do Belo
137
Mundo do Belo
castelo de Momoyama, tendo sido transportada para esse local. Seu teto
luxuoso é de treliças, e suas quatro paredes são forradas inteiramente com
delgadas lâminas de ouro, sobre as quais se pintaram, em cores vivíssimas,
flores e pássaros, paisagens e figuras humanas, conformando a
quintessência da pompa. A fulgurante superioridade do então Conselheiro-
Mor pode ser pressentida completamente graças a tal sala. Depois, fomos
levados, através de um jardim, a uma casa bem afastada, do feitio de um
anexo. Num canto dela, havia a sala de banho de Hideyoshi, por sinal
muito rústica. Não chega mesmo aos pés dos banheiros das hospedarias de
classe média modernas. Outrossim, havia, num dos lados, uma porta de
tábuas de cerca de um metro e oitenta centímetros, como a de um armário
embutido. Ao perguntar do que se tratava, obtive a resposta de que era o
esconderijo de dois guerreiros que se refugiariam ali caso fosse preciso.
Como se pode deduzir, era mesmo uma época perigosíssima. Além disso,
na sala maior, abria-se um buraco grande o bastante para dar passagem a
um homem. Espiando dele, pude ver que se comunicava com a água do
lago próximo. Disseram-me que sua função era dar fuga de barco pelo lago,
nas horas de emergência. Fiquei mas foi pasmado! Ri à beça, dizendo que
renunciaria ao poder, caso tivesse que levar uma vida tão sinistra assim,
mesmo sendo o senhor do mundo. Saindo de lá, dirigimo-nos de carro
rumo a Osaka. Tendo chegado à casa do Sr. Kawai, a qual, há pouco
tempo, tornaram-se igreja filial, fomos calorosamente acolhidos. Após o
almoco, entrevistei-me com os principais fiéis da região, a começar pelos
membros da diretoria, que, às centenas, estavam, há muito, à minha espera,
fazendo-lhes uma palestra. Finda esta, novamente tomamos o automóvel,
com o propósito de visitar o Museu Hakutsuru, em Mikague. Levamos
pouco mais de uma hora para chegar ao referido local. Apesar de, na
oportunidade, o museu em questão achar-se fechado, graças aos
desmedidos esforços de determinado senhor, selecionaram e mostraram-
me, em deferência especial, unicamente suas melhores peças. Não sei como
agradecer por tal gesto. Também nele o acervo consta, essencialmente, de
cerâmicas chinesas antigas, além de bronzes e pinturas. Tratando-se,
entretanto, somente de obras de primeiríssima qualidade, mesmo a mim,
deixaram-me pasmado. Espontaneamente, fui tomado pelo sentimento de
render homenagem ao Sr. Kano, patriarca da família proprietária do museu,
recentemente falecido aos noventa anos, por sua elevada visão e mérito de
138
Mundo do Belo
139
Mundo do Belo
140
Mundo do Belo
141
Mundo do Belo
142
Mundo do Belo
143
Mundo do Belo
144
Mundo do Belo
Eis aqui um rápido relato desta minha última viagem. Além disso,
quero comentar, ainda, sobre a Escultura budista da Era Kamakura. Após
passar por um intervalo de repouso a partir da Era Nara, a referida
escultura, com o início da Era Kamakura, experimentou um súbito
despertar, descortinando um cenário esplendoroso. Desnecessário
mencionar que grandes mestres e artistas de renome surgiram
seguidamente, figurando, entre eles, Unkei, Kaikei e outros. O ponto em
que a escultura da Era Kamakura difere da Era Nara reside em ter sido
aquela quase que unicamente em madeira. Seu colorido, em especial,
progrediu muito, e passou-se a empregar, em sua decoração, a técnica da
filigrana, a qual entrou em grande voga, havendo, ainda hoje, muitas peças
nas quais foi empregada. Este trabalho apuradíssimo constitui algo digno
de louvor. Admiro-me sempre ao pensar em como foi possível, em
semelhante época, serem produzidas peças assim tão refinadas! No Museu
de Artes de Hakone serão expostas obras que merecem ser chamadas da
quintessência do trabalho em filigrana: quem quer que as veja ficará
pasmado.
145
Mundo do Belo
146
Mundo do Belo
Vamos dar, aqui, uma espreitada pelo que hoje se passa com o
círculo de pintores de Quioto. Seiho Takeuchi dominava, então, esse meio,
147
Mundo do Belo
148
Mundo do Belo
AS OBRAS HODIERNAS
149
Mundo do Belo
150
Mundo do Belo
151
Mundo do Belo
Tendo outro dia ido a Tóquio, ouvi dizer que uma exposição das
obras de Picasso estava sendo realizada na loja de departamentos
Takashimaya. Considerando a ocasião oportuna, fui até lá para ver e
escreverei, agora, as minhas impressões. Depois de uma primeira circulada,
quedei-me abismado. Julgava eu próprio que, em vista de se tratar de um
grande mestre como Picasso — de quem se deve dizer que é uma enorme
existência de caráter mundial —, a exposição seria decerto algo
maravilhoso. Ademais, comentava-se muito bem a respeito: nos jornais os
críticos eram unânimes em seus elogios. Assim, minha expectativa era
considerável, levando-me a contemplar atenciosamente as peças expostas.
Não obstante, devo confessar que, por mais que visse, menos entendia.
Sendo fiel na descrição do que senti, digo que, primeiramente, me
perguntei se aquilo era pintura. Afinal, onde está a Beleza? O que há de
apreciável naquilo? Haveria alguém que experimentaria deleite em decorar
com aquilo uma sala? Assim, por mais que cogitasse, nada podia
compreender.
152
Mundo do Belo
Posso estar empregando uma comparação cruel, mas aquilo eram cadáveres
de vítimas de atropelamentos ou de uma explosão atômica. E digo que não
serei o único a achar assim. Sinto imensa compaixão do grande público, ao
qual foi impingido ver tamanho despropósito. Talvez ninguém tenha
entendido coisíssima alguma, ainda que visse tais quadros consciente de
estar frente a frente com um Picasso, bem diante de uma obra-prima de
renome mundial. Todavia, apenas sentindo estar diante de peças, sem
dúvida, maravilhosas, ninguém deve ter captado o que era bom e o que era
ruim nelas. Como se diz usualmente, a maior parte das peças não passou de
pérolas lançadas aos porcos — o que, aliás, talvez nenhuma outra pessoa
hoje, no Japão, diga assim, tão direta e sinceramente. Acredito ser somente
eu. Ficando por aqui no que diz respeito à pintura, passemos às peças de
cerâmica. Embora fossem um tanto quanto excêntricas, irradiavam um não
sei quê, como um sabor da época, dinâmico e penetrante, difícil de se
desprezar. Apesar disso, a mim me quer mesmo parecer que as obras dos
novos ceramistas japoneses da atualidade são superiores.
Por que, então, tais obras de Picasso são alvo de louvores em nível
mundial? Há um motivo e tanto. Para elucidar esse fato, é preciso, antes de
mais nada, começar pela discussão da Educação atual. Hoje, como acontece
nos demais países, a Educação Artística vem sendo tratada com um enorme
descaso. Como todos sabem, primeiramente, na Escola Primária, os alunos
são ensinados a fazer desenhos, trabalhos de argila e brinquedos de madeira
simples. Do ginásio em diante, ensina-se alguma coisa de Pintura
Ocidental, como esboços, e o que se mostra aos alunos são ou modelos já
batidos ou pinturas executadas pelo professor. Depois de se formar, se a
pessoa não é alguém com profundo interesse pelas Artes, o que ela vê,
geralmente, são ilustrações de jornais ou os quadros pendurados nas salas
de visitas dos conhecidos. Fora isso, seu contato com a Arte, durante um
ano, resume-se a uma ou duas críticas lidas nos jornais ou a uma visita a
algum museu, a convite de um amigo. É possível, portanto, afirmar que
quase não se possui um conhecimento artístico na verdadeira acepção.
Ademais, indivíduos que se relacionam com as Belas-Artes, como os
especialistas e diletantes, ainda que queiram saciar seu apetite, não
encontram, no Japão de hoje, órgãos aptos a contentá-los. Assim, supondo-
se que algum deles quisesse agora ver, de qualquer maneira, obras-primas
153
Mundo do Belo
154
Mundo do Belo
estagnação, podendo-se dizer que a maior parte das suas peças permanece
nos limites da pintura a óleo, na qual se empregaram pigmentos nipônicos.
Ademais, os grandes mestres, pela sua posição, caem no dilema de estarem
impedidos de acompanharem a moda, de um lado, e, de outro, de não
obterem o reconhecimento do público, com o emprego dos seus métodos
tradicionais. Tal fato transparece perfeitamente nas suas obras. Até o
outono do ano passado, nunca deixei de comparecer às exposições dessa
estação, porém, este ano, por não sentir vontade, acabei por não ir. A tal
ponto, perdi o interesse em ver essas obras.
155
Mundo do Belo
156
Mundo do Belo
157
Mundo do Belo
158
Mundo do Belo
159
Mundo do Belo
160
Mundo do Belo
161
Mundo do Belo
162
Mundo do Belo
163
Mundo do Belo
164
Mundo do Belo
165
Mundo do Belo
166
Mundo do Belo
cima da escrivaninha, onde quer que seja, não é nem preciso dizer o quanto
uma flor nos reanima e faz com que sintamos um toque de pureza. Em
termos ideais, é nosso desejo ornamentar até mesmo prisões e locais de
execução. Quão boa influência tal gesto exerceria sobre os detentos!
Quando existirem flores onde quer que haja pessoas, a força para tornar
ameno este mundo infernal será bem grande. Atualmente, porém, tal
hipótese é impossível, dado o alto preço das flores; por conseguinte,
precisamos fazer com que elas possam ser adquiridas a preços bem baixos.
Para tanto, devemos intensificar o seu cultivo, mas de modo a não
prejudicar a produção de alimentos.
167
Mundo do Belo
168
Mundo do Belo
fracas elas ficam. Esse princípio também se aplica ao homem. Com os pais,
por exemplo: quanto mais cuidados tiverem na criação dos filhos, mais
fracos eles serão.
169
Mundo do Belo
X - DIÁLOGOS
Sr. Musei: Receio, porém, que o meu trabalho não seja apropriado
para as pessoas do sexo feminino.
Sr. Musei: Este trabalho é algo parecido com uma disputa com o
autor: se o original e o intérprete se equilibram, tudo bem; mas caso este
não chegar aos pés daquele, então é a derrota.
170
Mundo do Belo
171
Mundo do Belo
pelo Sr. Bunraku. Esta peça foi concluída após ter sido burilada e polida
por repetidas e repetidas apresentações. Em contrapartida, minhas peças
são obras grosseiras e incompletas, não obstante eu considerar a questão
fundamental da narração...(???????)
172
Mundo do Belo
Sr. Musei: Quero sem falta ser honrado com essa oportunidade.
173
Mundo do Belo
Sr. Musei: Não, relação não tenho. Por isso, na entrevista para a
Shukan Asahi, cujo título é Novidade: os dois Tokugawas, eu acabo por me
tornar o falso. Ah! sim! Já fui falso uma vez. Há dois anos, por ocasião de
um programa radiofônico de talentos ocultos, ficou acertado que o Sr.
Tokugawa tocaria flauta em uma banda de acompanhamento, a qual,
porém, ficaria sem graça se faltasse um shamisen. Para essa função
sugeriu-se o nome de Ichimaru. Lembremos que o programa era de talentos
ocultos, onde se deve apresentar uma arte alheia à profissão. Bem, ele deve
174
Mundo do Belo
ter aceitado o papel, pensando: "Se é Musei quem toca a flauta, eu o supero
com o 'shamisen'". Pois bem, no dia do programa, ele se encontrou na rádio
com o Tokugawa trocado... (Risos.) Naquela vez, virei o falso.
175
Mundo do Belo
23
Sr. Yukawa: referência ao doutor Hideki Yukawa.
176
Mundo do Belo
177
Mundo do Belo
fevereiro do próximo.
24
Sutra da Vida de Sakya: refere-se ao sutra ilustrada de mesmo nome da era Tempyo.
178
Mundo do Belo
179
Mundo do Belo
Meishu Sama: A arte japonesa, até hoje, quase não foi exposta aos
olhos do estrangeiro. Resumindo, as obras de arte nipônica estiveram
trancadas nos depósitos dos ricos e da nobreza, os quais se recusavam,
terminantemente, a mostrá-las a estranhos. Por semelhante motivo, em se
vindo ao Japão, não se pode ver senão uma ínfima porção delas. É
impossível, porém, mesmo que se queira, ver tudo, por estarem espalhadas
180
Mundo do Belo
Srta. David: Também penso assim. A arte nipônica tem a ver com a
arte francesa. Quanto às obras de Korin, vi-as somente por meio de
fotografias. Deparei-me com pinturas dele na França, mas não é o bastante.
A visita de hoje proporciou-me um bom material de pesquisa para a arte
francesa moderna.
181
Mundo do Belo
182
Mundo do Belo
Meishu Sama: Aquela é uma boa obra. Aquele tipo de peça aparece
em revistas norte-americanas, existindo ainda exemplares ruins. Peças boas
há no Japão, no Museu Hakutsuru, de Osaka. No Museu Hakutsuru há bons
exemplares.
183
Mundo do Belo
Srta. David: Julgo ser esta uma idéia esplêndida, pode-se dizer
mesmo divina.
184
Mundo do Belo
que você seja entendida a tal ponto. Mesmo entre os japoneses, são poucos
os que têm um conhecimento tão profundo como você!
185
Mundo do Belo
186
Mundo do Belo
de Sakya.)
187
Mundo do Belo
188
Mundo do Belo
189
Mundo do Belo
Dr. Tanikawa: Como era de se prever, é inviável ver tudo, caso não
se disponha de um dia inteiro.
Meishu Sama: Não é mesmo? Por isso, há gente que comenta que
há peças em demasia. Dizem ser cansativo, pela imensa quantidade.
Dr. Tanikawa: Pois não. Por causa disso, quando vou ao Museu de
Ueno, limito-me a duas ou três salas. Mesmo que quisesse ver tudo, não
daria conta. Nesse sentido, visito com certa freqüência museus como o
Bridgestone ou o de Arte Moderna, por contarem com poucas salas e
número reduzido de peças expostas.
Meishu Sama: Além do mais, esses museus são de fácil acesso, não
é?
190
Mundo do Belo
191
Mundo do Belo
Meishu Sama: Por isso acabo fazendo o que não está dentro de
minhas posses. Verifica-se com freqüência o perigo de que, caso eu não as
compre, tais peças sejam levadas para os Estados Unidos. Eu me vejo
combalido a impedir isso. Penso que mereço considerável reconhecimento
com relação ao serviço que estou prestando à nação.
192
Mundo do Belo
193
Mundo do Belo
Sr. Kozaka: O que assusta é ele dizer, ainda assim, que lhe faltou
tempo. Hoje, havia visitantes estrangeiros acompanhados de suas esposas,
fato que achei excelente. Acho interessante que pessoas do mundo inteiro
venham aqui e vejam obras de arte como aquelas. Provavelmente este
museu ficará famoso primeiramente entre o pessoal do exterior. Penso,
entretanto, que, pela inexistência de explicações apropriadas aos
estrangeiros, será que não ficaria difícil de entenderem?
194
Mundo do Belo
195
Mundo do Belo
mais claro, as nuvens flutuariam. O tom deste vermelho, caso fosse mais
acentuado, ficaria melhor. Esta Chuva de Verão no Sopé do Monte é ótima.
A reprodução executada pelo Sr. Takamizawa, na Era Taisho, é perfeita:
ele executou um trabalho idêntico em todos os detalhes, inclusive os
defeitos. Como os especialistas tornaram-se incapazes de discernir o
original, todas as peças passaram a receber a classificação de reprodução.
Dentre as obras posteriores às de Harunobu, gosto destas três e da série
Neve, Luar e Flores, de Hiroshige. Das obras anteriores, gosto de todas.
Gosto também de Kiyonobu, Kyomasa, Sukenobu e outros. São ótimas
todas as obras monocromáticas, impressas a nanquim, anteriores às
coloridas (nishiki-e). Pertencem a uma fase anterior à da impressão em que
de dava predominância ao vermelho (benizuri-e), tendo sido idealizadas
depois das obras em preto e branco. Gosto, ainda, das peças impressas com
laca, chamadas urushi-e. O mestre da modalidade benizuri-e é Toyonobu;
Harunobu, do gênero nishiki-e.
196
Mundo do Belo
Dr. Tanikawa: Este senhor levou boas peças consigo e, por estarem
extraordinariamente bem conservadas, lá as tiveram todas por falsas — já
que não conheciam peças em tal estado de conservação. Este Harunobu é
muito bom. É intrigantemente belo. Em toda a obra de Harunobu, não
existem senão duas peças com o fundo em vermelho, tratando-se, pois, de
um exemplar extremamente raro. Quando digo duas peças, não significa
que existam apenas dois únicos exemplares, mas sim duas gravuras. A
presente — do tear — e outra em que se apanha água. Esta última encontra-
se em um museu. Por isso, Kondo dizia existir apenas uma gravura. Eu,
depois do fim da guerra, vi esta pela primeira vez, numa reunião de chá, em
Kawasaki. Trata-se de uma obra raríssima. Ademais, seu estado de
conservação é ótimo, não? Ao todo, são quantas peças?
Dr. Tanikawa: Por ser uma obra rara, lembro-me perfeitamente dos
temas. Naquela oportunidade, havia dezesseis peças. Esta obra de
Harunobu, seja pelo tema, pela conservação e, sobretudo, por contar com
estas gravuras com o fundo em vermelho, é excelente. Eu não aprecio
muito Harunobu, mas esta obra me deixa com água na boca. Caso esta
gravura do tear constar de alguma de suas exposições de ukiyo-e, virei aqui
especialmente para apreciá-la.
197
Mundo do Belo
198
Mundo do Belo
199
Mundo do Belo
Meishu Sama: Tenho comigo duas peças de Wu-Hsüeh. Que tal lhe
parece a obra de Daito?
200
Mundo do Belo
201
Mundo do Belo
202
Mundo do Belo
203
Mundo do Belo
204
Mundo do Belo
Dr. Tanikawa: Como ainda não vi a original, não sei muito a seu
respeito. Parece-me que tem algumas pequenas falhas, não?
Dr. Tanikawa: Eu a conhecia apenas por fotos, sem ter ainda visto a
205
Mundo do Belo
peça original.
Dr. Tanikawa: Tem-se essa impressão, não? Esta taça foi bastante
usada. No caso das taças de chá, basta que se veja a base para se saber. O
fato de sua base estar gasta advém do atrito com o tatami. Vendo-se apenas
a sua parte superior, tem-se a impressão de que é uma peça extremamente
nova. Contudo, ao observarmos a base, podemos depreender que é uma
taça antiga. Ela está gasta pelo atrito com o tatami ou mesmo pelo roçar
com as mãos. Além disso, o fato de ela se abrir com naturalidade em
direção à parte de cima, como se desabrochasse, é algo maravilhoso.
Depois, nada há de artificial nela e, quanto às suas bordas, estas apresentam
uma feição indiscritivelmente complexa. A taça apresenta por si só um
variado panorama, sem nenhuma artificialidade.
206
Mundo do Belo
207
Mundo do Belo
Sra. Okada: Podemos então dizer que, por estas taças terem sido
feitas com o fim de se tomar chá, elas perdem a vida se não forem
utilizadas, não é mesmo?
Dr. Tanikawa: Foi o mestre zen Eisai quem trouxe o chá. Ele
também é conhecido pelo nome de Myoe ou Myoe Shonin. Foi ele quem
difundiu o chá.
208
Mundo do Belo
Dr. Tanikawa: Sim. É grande e vigoroso: uma obra que impõe sua
presença.
209
Mundo do Belo
Sra. Okada: É uma obra que pode ser considerada uma das
melhores do seu gênero?
Meishu Sama: Pois não. Lá existem duas ou três obras que almejo
obter de qualquer maneira; entretanto, eles não as querem ceder.
210
Mundo do Belo
211
Mundo do Belo
Dr. Tanikawa: Sim, era uma boa peça. Dentre as obras classificadas
antigamente como verde resedá kinuta, selecionaram-se — graças aos
estudos progressivos — aquelas peças produzidas pelos fornos Hsiu Nei
Ssu. São peças de um colorido um pouco esbranquiçado, dotadas de muita
classe.
212
Mundo do Belo
Dr. Tanikawa: Aquela é uma boa peça, não? Ela parece ter abafado
até nos Estados Unidos, quando de sua exposição. Por um bom tempo,
sempre que a contemplava por meio de fotografias, eu não dava muito por
ela. Contudo, comparando a peça original com outra similar, aquela ganha.
A do dragão é máscula, enquanto a de propriedade do senhor Hosokawa é
feminina. Aquela é superior do ponto de vista do vigor que irradia.
Sra. Okada: A urna keito tricolor também é uma boa obra, não?
213
Mundo do Belo
214
Mundo do Belo
215
Mundo do Belo
DIALOGAR É PRECISO
216
Mundo do Belo
Musei: Sotatsu e Korin são geniais. Ouvi dizer que mesmo depois
de se ter visto uma exposição de Matisse, continua-se a ter em alta
consideração as obras de ambos. Parece mesmo que Matisse tem a aprender
com eles.
217
Mundo do Belo
linha simples.
218
Mundo do Belo
XI - ENSAIOS
BERNARD SHAW
219
Mundo do Belo
220
Mundo do Belo
221
Mundo do Belo
criança nascida da união de alguém com uma cabeça estranha como a dele
com a dona de uma inteligência medíocre como a dela seria, antes de tudo,
um inútil. Das suas máximas, a que considero a mais interessante é a que
diz que o amor é aquilo imprescindível concedido por Deus para a
preservação da espécie... É ou não é espirituoso? Ademais, nunca houve
alguém tão confiante em si como ele. Dizem que ele sempre afirmava o
seguinte. “Shakepeare é tido como o maior escritor da Inglaterra, mas, na
verdade, o maior sou eu.” Ele não estava, com isso, se vangloriando ou
blazonando, em especial. Estava tão apenas manifestando honestamente
aquilo que pensava. Quando ditas por ele, expressões que poderiam parecer
megalomaníacas não continham nenhuma malícia, sendo aceitas de bom
grado. Nisto residia a sua grandeza. É possível entrever também a
importância de sua existência no fato de, em idade avançada, ele ser
consultado pelas autoridades inglesas sobre vários problemas surgidos no
país. Trata-se de uma das grandes personalidades do século vinte.
222
Mundo do Belo
223
Mundo do Belo
224
Mundo do Belo
cabana alpina, averiguei que a maior parte deles estava na casa dos vinte
anos, sendo raros os de trinta; a única pessoa de quarenta e tantos anos era
eu apenas. Senti, então, uma pontinha de orgulho.
225
Mundo do Belo
226
Mundo do Belo
De Okunikko a Shiobara
227
Mundo do Belo
228
Mundo do Belo
229
Mundo do Belo
"Cidra?...Num sei o que é isso, não..." — por aí pode-se ter idéia do resto.
Servido o jantar, o que havia era uma porção de cogumelos desconhecidos,
que não consegui engolir. Pedi um ovo e assim, a custo, terminei meu
jantar. Querendo saber qual a estação de trem mais próxima, obtive a
informação de que era Aizu-Wakamatsu, distante vinte e três léguas. Isso
me deixou desanimado. Perguntei como se ia a Aizu-Wakamatsu.
Responderam-me que de carroça. Quis saber, então, a distância até
Shiobara. Disseram-me que era de dezessete léguas, mas que não se
dispunha de carroça. Fiquei indeciso, mas determinei-me a seguir o
itinerário inicial, ou seja, ir até Shiobara. Na manhã seguinte, como eu não
conseguisse andar, pela dor causada pelas bolhas das plantas dos pés, pedi
que me fornecessem um cavalo. Queria dizer para os senhores que era eu a
própria figura da imponência de cima do animal, mas por se tratar da
primeira vez em que eu montava, fiquei todo desengonçado, quando o
cavalo partiu. Entrementes, dezenas de enormes moscas e mutucas
apareceram em bando em volta da montaria, a qual os afastava com o
movimentar incessante do rabo. Como os humanos, porém, não foram
dotados de cauda, vi-me em apuros. É que os insetos picavam-me por cima
das meias, ocasionando uma tremenda coceira. Arquitetei, então, um
artifício: quebrei uns galhinhos de árvore e coloquei-os em torno das
pernas. Isso apresentou algum efeito, mas aconteceu que as moscas
começaram a se ajuntar nas costas do cavalo, fazendo com que este
quisesse empinar-se. Comecei, então, a matar os insetos, batendo-lhes com
meu leque. Assim, venci por fim seis léguas de caminho, dando em certo
vilarejo. Desse local em diante, o caminho tornava-se aclive, podendo-se ir
de cavalo somente até aí. Sem opção, tive que devolver o animal. Meu
leque ficara completamente sujo de sangue e em frangalhos, por eu ter
matado uma porção de moscas com ele.
230
Mundo do Belo
231
Mundo do Belo
estreito, poderia ter sido o meu fim. Ao pensar nisso, fui assaltado por
enorme terror. Perguntei, então, à senhora quanto faltava para chegar em
Shiobara. "Uma légua e meia", respondeu-me. Ela insistiu comigo para que
eu montasse novamente. Eu, todavia lhe disse, entregando: "Eu pago o
prometido, mas tenha a paciência." Completei a pé a légua e meia restante,
chegando em Shiobara pelo meio-dia. Almocei numa hospedaria de
Shionoyu, depois do que voltei para Tóquio. No turno que fizera, passei por
duas ocasiões perigosas. Uma foi o tombo do cavalo — que acabei de
descrever — já que um dos lados do caminho era um paredão de rocha de
várias dezenas de metros que se acabava numa correnteza. Outra foi na ida
para as termas de Yunohana, durante a travessia do Monte Tashiro, em
Aizu. Segundo me informaram, na hospedaria de Yunohana, o monte
Tashiro é raramente visitado pelo pessoal nativo, que lhe tem medo em
razão dos ursos que ocasionalmente lá aparecem. Eles se assustaram com
minha imprudência. Eu, ignorante do fato, suei em bicas, ouvindo os casos
que me contaram.
As Termas de Yunishikawa
232
Mundo do Belo
233
Mundo do Belo
234
Mundo do Belo
XII - ENTRETENIMENTO
CANÇÃO
235
Mundo do Belo
Deve ser ela incluída entre os grandes mestres da arte. Em vista disso, o
volume de discos seus vendidos alcançou um número considerável. Como
intérprete masculino, citaria Takamine Chikufu, pai da atual artista de
cinema Mieko Takamine. Sua melodia original, aliada à sua bela voz,
difundiu sua fama. Depois dele vem Kyokujo Toyoda. Quanto à viola de
Satsuma, Kinjo Mito e Kinshin Nagata tocam muito bem. Eu, todavia,
prefiro a viola de Chikuzen.
236
Mundo do Belo
A ARTE DE DANJURO
237
Mundo do Belo
238
Mundo do Belo
239
Mundo do Belo
240
Mundo do Belo
AIZO NANIWATEI
241
Mundo do Belo
O mundo das canções Ro-kyoku também fica cada vez mais vazio.
Shigetomo faleceu; Tomoe definhou e dizem que Rakuen irá aposentar-se.
Yonewaka não tem mais o vigor dos anos idos; a arte de Odo, Bai-o e
Musashi é ainda imatura: fora Torazo, quem hoje sustenta a situação seriam
apenas Katsutaro, Wakae, Urataro e Ayataro. Como no caso de Danjuro, é
veemente o meu desejo de que surja algum mestre que se equipare a Aizo,
no domínio das canções Ro-kyoku.
Aizo Naniwatei atuou quando eu estava nos meus vinte anos; trata-
se, portanto, de alguém de quatro ou cinco décadas atrás. Não apenas a sua
melodia como também o volume de sua voz eram deslumbrantes. Sua voz
maviosa não encontrava rival, nem mesmo entre os demais mestres de
outros gêneros que não o das canções Ro-kyoku. Sua voz era tão bela a
ponto de eu não poder acreditar — sempre que a ouvia — que ela se
originava da garganta humana. Na época, ele atuava com base numa casa
de espetáculos chamada Eijutei, em Shiba, a qual estava sempre
superlotada. Curiosamente, Kumoemon, que era discípulo da escola de
Shigekichi Naniwatei, em Tóquio, foi expulso por razões, de conduta, indo
para Osaka e, posteriormente, para Kyushu. Aí criou uma modalidade
peculiar de melodia, combinando a canção da região ocidental do Japão
com a viola biwa. De posse disso, tornou a Tóquio e passou a competir sua
arte com a de Aizo. Estabeleceu-se na casa Happotei, em Shiba, debatendo
intensamente com Aizo. Contanto, por não ter podido com este, desistiu de
242
Mundo do Belo
243
Mundo do Belo
XIII - CINEMA
EU E O CINEMA
Constitui fato muito bem sabido entre os fiéis o meu gosto pelo
cinema. Ainda hoje procuro assistir a filmes um dia sim, um dia não.
Assim, passarei a escrever a história, desde o início, de como me aficcionei
pelo cinema. A primeira vez em que assisti a uma fita cinematográfica (a
que na época davam o nome de fotografias animadas) contava com meus
quinze ou dezesseis anos. Havia, então, no sexto distrito do Parque de
Asakusa um prédio de nome Denki-Kan, provavelmente o primeiro cinema
de Tóquio. Nem é preciso dizer que me assustei com o fato de as fotos se
movimentarem. As ondas se moviam, um cachorro aparecia a correr, o
povo caminhava pela rua! Fiquei simplesmente abismado com aquilo.
“Que coisa misteriosa e interessante que inventaram!” — pensei comigo.
Como morava em Asakusa na época, sempre que tinha tempo ia ver
películas. Entrementes, o conteúdo destas foi evoluindo da pura e simples
retratação de fatos para a sua dramatização. Simultaneamente, o prédio
chamado Kinki-Kan — uma espécie de clube, um auditório público dos
dias de hoje sito em Nishiki-cho, no distrito de Kanda - passou a abrigar o
único cinema da região. Na época, o filme O Demônio Aloprado — uma
obra da companhia cinematográfica francesa Pathé, creio — era muito
interessante e comentada, lotando o cinema por dias e dias a fio. A
especialidade da Pathé eram filmes de atualidades, dramas e filmes infantis,
voltadas para o público em geral. Já as películas italianas, em sua grande
parte, eram obras longas de cunho histórico, aparecendo mais raramente
uma ou outra comédia.
244
Mundo do Belo
245
Mundo do Belo
246
Mundo do Belo
247
Mundo do Belo
248
Mundo do Belo
249
Mundo do Belo
250
Mundo do Belo
251
Mundo do Belo
252