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Capítulo 1

Conceitos Fundamentais
Modern Quantum Mechanics - J.J. Sakurai (Revised Edition)

0.1 Experiências com partículas

Metralhadora, barreira com duas fendas, “1” e “2”


e um anteparo com um detector (lata com areia).
Dispara-se durante 1 minuto e contam-se as balas
que atingem a lata. Esvasia-se a lata. Move-se a lata
para outra posição e repete-se o processo. A
metralhadora dispara em todas as direções.

Inicialmente fechamos a fenda “2” e medimos a


distribuição de balas que chegam ao anteparo
através da fenda “1”. A distribuição que se obtém
é parecida com a mostrada na figura ao lado.

Agora fechamos a fenda “1”


e medimos a distribuição de
balas que chegam ao anteparo
pela fenda “2”. A forma, mostrada
na curva da direita, é a mesma
que a anterior, porém deslocada
para baixo.

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 1


Finalmente, abrimos as duas
fendas e medimos a distribuição
de balas que chegam ao anteparo
por ambas as fendas. O resultado
é a curva mostrada na figura da
direita (linha sólida). Também
mostramos os resultados obtidos
anteriormente (linhas tracejadas).

0.2 Experiências com ondas

Fonte, barreira com 2 fendas e detector (cortiça).


Conta-se os sobe e desce da cortiça e determina-se
a energia que chega naquela posição do anteparo.
Move-se a cortiça (detector) para outras posições e
determina-se a distribuição de energia no anteparo.

Inicialmente, fecha-se a fenda “2” e


mede-se a distribuição de energia que
chega ao anteparo através da fenda “1”.
A forma é mostrada na curva da direita.
Note que é muito parecida com a
distribuição de balas que passa
por uma única fenda.

Agora fecha-se a fenda “1” e mede-se a distribuição


de energia da onda que chega através da fenda “2”,
como mostrada na figura da direita.

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Finalmente, abrem-se as duas fendas e mede-se a
distribuição. As linhas tracejadas mostram a
distribuição com as fendas individuais abertas,
enquanto que a sólida é o resultado para ambas as
fendas abertas. Este resultado é chamado
de padrão de interferência.

Observações

1) Na experiência com duas fendas, uma partícula não apresenta padrão de interferência: a probabilidade
de atingir uma determinada posição no anteparo é a soma das probabilidades individuais.
2) Levando em conta a conservação da energia, o padrão de interferência para ondas pode parecer
dissonante. Porém, não existe nenhum problema: a energia total no padrão de interferência é igual à energia
que chega pela fenda “1” mais a que chega pela fenda “2”. O padrão de interferência apenas rearranja esta
energia, conservando sua quantidade total.

0.3 Experiências com elétrons

Como “sabemos” os elétrons são partículas que têm massa definida, carga elétrica etc. Algumas das
propriedades do elétron são mostrados na tabela abaixo.
Elétrons
Propriedade Valor
Massa 9. 11  10 −31 kg
Carga 1. 60  10 −19 C
Spin 5. 28  10 −35 J-s

Interferência de ondas de elétrons

detector

padrão de
interferência

Determinando por onde os elétrons passam

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 3


detector

sem padrão de
interferência

Resumo dessas experiências com elétrons


 A probabilidade de um evento numa experiência ideal, é dada pelo quadrado do valor absoluto de um número
complexo  que se chama de amplitude de probabilidade
P  || 2

 Quando um evento pode acontecer de várias maneiras, a amplitude de probailidade é a soma das amplitudes de
probabilidade de cada maneira considerada independentemente. Existe padrão de interferência
   1   2 → P  | 1   2 | 2 .

 Numa experiência onde se determina como as coisas efetivamente acontecem, a probabilidade do evento é a soma
das probabilidades de cada alternativa. Não existe padrão de interferência.
P  P1  P2.

1.1 A Experiência de Stern-Gerlach

Pólo Forno
magétic
o

Feixe de
átomos
de prata

Campo magnético
inomogêneo

Sem Com campo As duas


campo orientações do spin
Placa Resultado Clássico
fotográfica Resultado Experimental

Do que consiste o experimento?


 Forno para produzir feixe de átomos neutros.
 Região de campo magnético inomogênio.
 Detector de átomos.

 Resultados da experiência
 Stern e Gerlach usaram átomos de prata (Ag) e observaram que o feixe original dividia-se em dois feixes ao

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atravessar o campo magnético: um defletido para cima e o outro para baixo (em relação à direção do gradiente do
campo magnético).

 Análise clássica dos resultados


 Os resultados da experiência sugerem uma interação entre uma partícula neutra e um campo magnético. Esta
interação só existe se a partícula neutra tiver momento magnético, .
 Neste caso, a energia da interação é dada por
U B  −  B
que resulta na força
F  −∇U B  ∇  B

 Na experiência de Stern-Gerlach, o campo magnético atua basicamente na direção z, e a força será

F z  ∂   B ≅  z ∂B z
∂z ∂z
na direção do gradiente do campo magnético, perpendicular ao movimento do feixe atômico.

 Origem do momento magnético na física clássica

 Os átomos são constituídos de partículas carregadas.


 O movimento destas partículas produz um laço de corrente, que dá origem aos momentos magnéticos. Para um laço
de área A e uma corrente I, o momento magnético (CGS) é dado por
  IA
c

 Se o laço de corrente origina-se do movimento circular uniforme de uma de uma partícula de carga e (para o elétron
e  0, então
I  e  e  ev
T 2 2
v

 Como A  r 2 , então
ev r 2
  2c  evr  e mvr  e L
2c 2mc 2mc
onde L  mvr é o momento angular orbital da partícula.
 Da mesma forma que a Terra se movimenta em torno do Sol e do seu próprio eixo, podemos também imaginar que
uma partícula carregada num átomo tenha tanto momento angular orbital, L, como momento angular intrínseco, S.
 Admitindo que o laço de corrente criado pelo movimento intrínseco produza uma relação similar entre o momento
magnético e o momento angular intrínseco, então,
e S
  g e S  mc
2mc

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 5


onde usamos o valor correto g  2 para o movimento rotacional intrínseco do elétron.

 Momento magnético do átomo de prata

 O momento magnético depende do inverso da massa da partícula. Portanto, os prótons e neutros (massas ≈ 2. 000
m e ) têm pouco efeito sobre o momento magnético do átomo, comparados com os elétrons, podendo ser
desprezados.
 A configuração eletrônica da Ag (47 elétrons) é:
1s 2 2s 2 2p 6 3s 2 3p 6 3d 10 4s 2 4p 6 4d 10 5s 1

Número de elétrons : 46  1  47
Momento angular: J 0 S

 As camadas eletrônicas cheias são representadas por orbitais esfericamente simétricos e o momento angular orbital
e momento angular intrínseco dos elétrons nessas camadas são nulos.
 Resta o momento angular do elétron na última camada 5s. Mas, um elétron na camada s tem momento angular
orbital nulo.
 Logo, o momento angular total do átomo de prata é devido apenas ao momento angular intrínseco do elétron, que
chamamos de spin.
 Assim, o momento magnético do elétron, e, portanto, do átomo de prata neutro, é
  mce S

onde e  0.
 A força clássica sobre o átomo pode ser escrita como
e S z ∂B z
F z ≅ mc
∂z

feixe Sz+
S

feixe Sz -

 A deflexão do feixe na experiência de Stern-Gerlach é então uma medida da componente S z , ou da projeção do spin
ao longo do eixo z, que é a direção do gradiente do campo magnético.

 O que se esperaria classicamente?

 Vamos supor que todos os elétrons tenham a mesma magnitude do momento angular intrínseco, |S|, tal que a
projeção S z pode ser escrita como
S z  |S| cos 
onde  é o ângulo entre a direção do spin e o eixo z.
 Dentro do forno aquecido, esperamos uma distribuição aleatória das direções do spin e, então, todos os possíveis
ângulos . Assim, S z tem uma distribuição contínua de valores no intervalo
S z  −|S|, … , |S|

 Ao atravessar o campo magnético, um feixe de átomos de prata com todos os possíveis valores de S z no intervalo
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entre −|S| e |S| deveria apresentar um contínuo na deflexão do feixe (ver figura abaixo).

 Mas o que se observa?


 Experimentalmente, observa-se apenas duas deflexões, indicando que existem apenas dois valores da projeção S z
do spin do elétron.
 As magnitudes dessas deflexões são compatíveis com os dois valores de S z dados por

Sz   
2

 Consequência do resultado do experimento: O spin do elétron tem valores discretos ao longo de um eixo
(quantização da projeção do spin).

 Conclusão: Esta quantização está em desacordo com a expectativa clássica para esta medida.
 Observação: Aqui consideramos o eixo z para medir a projeção do spin, mas poderíamos escolher
qualquer outro eixo que os resultados seriam os mesmos.

 Experiências de Stern-Gerlach sequenciais

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 7


Sz +
Sz +
Forno SG z SG z
Sz -

Sz +
Sx +
Forno SG z SG x
Sx -
Sz -

Sz + Sx +
Sz +
Forno SG z SG x SG z
Sz -
Sz - Sx -

Experiência de Stern-Gerlach seqüencial

Primeira experiência ↑↓→ SGz → SGz → ?


 o feixe passa inicialmente por um dispositivo SGz (campo inomogêneo na direção z.
 bloquea-se a passagem dos átomos com componentes S z −
 o restante dos átomos com S z  fica sujeito a um segundo dispositivo SGz.
 verifica-se que apenas uma componenente do feixe (com S z ) emerge do segundo aparelho. (Aqui não há
nenhuma surpresa).

Segunda experiência ↑↓→ SGz → SGx → ?


 o feixe passa inicialmente por um dispositivo SGz (campo inomogêneo na direção z)
 bloquea-se a passagem dos átomos com S z −
 o restante dos átomos com S z  fica sujeito a um segundo dispositivo SGx, de onde emergem em dois feixes, de
igual intensidade, um com S x  e outro, S x −.
 Questão: Será que o feixe S z  contém 50% de átomos com S x  e 50% com S x − ? Veremos que esta idéia se
depara com algumas dificuldades e portanto não pode ser verdadeira!

Terceira experiência ↑↓→ SGz → SGx → SGz → ?


 o feixe passa inicialmente por um dispositivo SGz (campo inomogêneo na direção z.
 bloquea-se a passagem dos átomos com S z −
 o restante dos átomos com S z  fica sujeito a um segundo dispositivo SGx, de onde emergem em dois feixes, de
igual intensidade, um com S x  e outro, S x −.
 bloquea-se a passagem dos átomos com S x −.
 o feixe restante passa pelo terceiro dispositivo do tipo SGz
 verifica-se experimentalmente que deste terceiro dispositivo emergem dois feixes de átomos de igual intensidade (e
não um) com componentes S z  e S z −.
 Questão: Mas a componente S z − já não havia sido completamente bloqueada na saída do primeiro dispositivo?
Como é possível reaparecer a componente S z − que pensávamos ter eliminado anteriormente?

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Consequências das experiências SG sequenciais
 O momento angular de spin não pode ser descrito por um espaço vetorial 3-D.
 O momento magnético (ou spin) do átomo é uma quantidade discreta ou quantizada.
 Não podemos determinar simultaneamente S z e S x (princípio da incerteza de Heisenberg). Mais precisamente,
podemos dizer que a seleção do feixe S x  pelo segundo dispositivo (SGx) destrói completamente
qualquer informação prévia sobre S z .

 Postulados da Mecânica Quântica


Postulado 1 (estado de um sistema) Em cada instante t, o estado de um sistema físico é representado
por um ket normalizado, |t, no espaço vetorial dos estados, que contém toda a informação que podemos conhecer
sobre o sistema.

Postulado 2 (quantidades físicas) Qualquer quantidade física A mensurável é descrita matematicamente


por um operador A que atua sobre os kets. Este operador é um observável.

Postulado 3 (medidas de quantidades físicas) O único resultado possível de uma medida de uma
quantidade física A é um dos autovalores a n do correspondente operador A.

Postulado 4 (decomposição espectral) A probabilidade de obter o autovalor a n (não degenerado)


numa medida de um observável A sobre o sistema no estado normalizado | é

P a n   |〈a n || 2
onde |a n  é o autovetor normalizado de A correspondente ao autovalor a n .

Postulado 5 (redução do pacote de onda) Imediatamente após uma medida de A, sobre o sistema no
estado |, que dá o valor a n , o sistema se encontra num novo estado | ′ , que é a projeção normalizada do ket original
no subespaço correspondente aos resultados da medida:
P n |
| ′  
〈|P n |

Postulado 6 (evolução temporal) A evolução temporal de um sistema quântico é determinada pelo


operador Hamiltoniano ou energia total, Ht, através da equação de Schrödinger

ih d |  Ht |


dt

1.2 Kets, Bras e Operadores


As experiências de SG mostraram que os spins não podem ser representados num espaço vetorial 3-D. Isso
levou a considerar espaços vetoriais complexos.
Formulação básica dos espaços vetoriais usados em MQ
 Espaços vetoriais complexos: Ket e Bra
 Notação de Dirac

Espaço KET
Dimensionalidade. Depende da natureza do sistema em análise. Pode ser:
 Finita
 Infinita (espaço de Hilbert)

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 9


Estado físico. Em MQ, representado por um vetor de estado no espaço vetorial complexo.
Vetor de estado. Chamado de ket na notação de Dirac e denotado por |.
Significado do ket. Contém todas as informações (possíveis) sobre o estado físico do sistema.

Propridades dos ket’s


 A soma de dois ket’s resulta um novo ket
|  |  | (1)

 O produto de um ket por um número complexo c resulta um novo ket


c|  |c (2)
não importa a ordem de c em relação a |.
 Se c  0 o ket resultante é chamado de ket nulo.

Postulado Os ket’s | e c| com c ≠ 0 representam o mesmo estado físico.

Significado do postulado Somente a direção do ket no espaço vetorial tem importância na representação
de um estado físico.
Observáveis. São representados por operadores no espaço vetorial. (Exemplos de observáveis: momento,
componentes de spin etc.)
Ação dos operadores. De uma maneira geral, um operador atua sobre um ket pelo lado esquerdo, isto é
A  |  A|
O resultado desta operação nem sempre é uma constante vezes o ket |.
Autokets. Quando a ação de um operador A sobre um conjunto particular de kets resultar no produto de uma
constante pelos correspondentes kets, estes são chamados de autokets do operador A. Então, sejam os
auto-kets do operador A
|a ′ , |a ′′ , |a ′′′ , … (3)
logo, verifica-se a propriedade
A|a ′   a ′ |a ′ , A|a ′′   a ′′ |a ′′ , … (4)
onde a ′ , a ′′ , … são números.
Autovalores do operador A. O conjunto dos números a ′ , a ′′ , a ′′′ , …  ou a ′  é chamado de autovalores do
operador A.
Autoestados do operador A. O estado físico correspondente a um autoket é chamado de autoestado.
Exemplo Sistema de spin ½

S z |S z ;    |S z ; , S z |S z ; −  −  |S z ; − (6)
2 2

Observação De acordo a notação |a ′ , onde um autoket é classificado por seu autovalor, o autoket de S z na Eq. (6)
deveria ser escrito como |/2. Mas aqui a notação |S z ;  é mais conveniente, uma vez que consideramos também os
autokets de S x :

S x |S x ;     |S x ;  (7)
2

Observação Dimensionalidade do espaço vetorial  número de alternativas num experimento do tipo Stern-Gerlach.
Mais formalmente  espaço vetorial N-dimensional descrito pelos N autokets do observável A. Qualquer ket arbitrário |
pode ser escrito como

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|  ∑ c a |a ′ 
′ (8)
a′

Espaço BRA e Produtos Internos


Espaço vetorial BRA é o espaço dual do espaço vetorial KET.

Postulado A cada ket | existe um vetor bra denotado por 〈|.

Isto significa que existe uma correspondência um-a-um entre o espaço ket e o espaço bra:
CD
|  〈|
CD
|a ′ , |a ′′ , …  〈a ′ |, 〈a ′′ |, … (9)
CD
|  |  〈|  〈|

(CD  correspondência dual).


 Dual de c|  c ∗ 〈|. Forma geral
CD
c  |  c  |  c ∗ 〈|  c ∗ 〈| (10)

 Produto interno entre bra e ket Forma geral


〈|  〈|  | (11)
Este produto é, em geral, um número complexo.

Propriedades Fundamentais (postulados)


Propriedade (1):

〈|  〈| ∗ (12)


são conjugados complexos um do outro.
Analogia com o produto escalar Embora o produto interno seja análogo ao familiar produto escalar, a  b, devemos
fazer distinção entre 〈| e 〈|: isto não é necessário no espaço vetorial real porque a  b  b  a.

Consequência de (12):

〈|  número real

Prova: Fazendo-se 〈|  〈| em (12), encontra-se

〈|  〈| ∗

que é um número real.

Propriedade (2):

〈| ≥ 0 (13)
onde a igualdade só vale se | for um ket nulo.
Isto é conhecido como postulado da métrica positiva definida: é essencial para a interpretação probabilística da
MQ.
 Vetores ortogonais Dois kets | e | são ditos ortogonais, se
〈|  0 (14)

De (12), implica que


〈|  0 (15)

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 11


 Kets normalizados Exceto para o ket nulo, um ket | pode sempre ser colocado na forma normalizada

|̃   1 | (16)


〈|

que tem a propriedade


〈̃ |̃   1 (17)

 Norma de | A relação 〈| é conhecida como norma de |, em analogia com o módulo de um vetor
a  a  |a| definida no espaço euclidiano.

Observação Uma vez que | e c| representam o mesmo estado físico, podemos também exigir que os kets que
usamos para estados físicos sejam normalizados na forma da Eq. (17).

Operadores
Sejam os operadores

A, B, C, …  classe restritiva (observáveis)

X, Y, Z, …  classe geral

Operação sobre Kets


Os operadores sempre atuam nos kets pelo lado esquerdo
 X  |  X | (resulta outro ket)
 Operadores iguais: X  Y se
X |  Y | (20)

 X é um operador nulo se
X |  0 (21)
para um ket arbitrário.
 Adição de operadores: comutativa e associativa
XY  YX (21a)

X  Y  Z  X  Y  Z (21b)

 Operadores lineares:
Xc  |  c  |  c  X |  c  X|  (22)

Operação sobre Bras


Os operadores sempre atuam sobre os bras pelo lado direito.
 〈|  X  〈| X (resulta outro bra)
 Correspondência dual
CD
X |  〈| X  (24)

onde X  é chamado de adjunto Hermitiano ou adjunto de X.


 Operador Hermitiano: é dito ser Hermitiano, o operador que satisfaz
X  X (25)

Multiplicação de Operadores
 não comutativa

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XY ≠ YX (26)

 associativa
XYZ  XYZ  XYZ (27)

XY |  XY|  X Y |, 〈| XY  〈| XY  〈| X Y (28)

 correspondência dual
CD
X Y |  〈|XY 
mas,
CD
X Y |  XY|  〈|Y  X   〈|Y  X 
de onde se conclui que
XY   Y  X  (29)

Resumo. Até agora vimos produtos do tipo


〈|, X |, 〈| X e X Y
Quais outros tipos de produtos são permitidos?
Produto externo. O produto de | e 〈|, nesta ordem, ou seja,
|  〈|  |〈| (31)
é conhecido como produto externo de | e 〈|. O produto |〈| deve ser considerado um operador, ao invés
de um número como é o caso do produto escalar 〈|.
Produtos ilegais. Os produtos da forma
|X, X〈|, || e 〈|〈|

não têm nenhum sentido (quando  e  são vetores kets ou bras que pertencem ao mesmo espaço bra ou ket).
Eles simplesmente não significam nada (não são operadores, kets ou bras).

Axioma Associativo da Multiplicação


A multiplicação entre operadores é associativa  esta propriedade deve valer para todos os produtos “legais”
entre operadores, kets e bras (axioma associativo).
 Ilustração com o produto externo
|〈|  | (32)
Devido ao axioma associativo, podemos reescrever:
|  〈| (33)
onde 〈| é um número. Como são iguais, podemos omitir o ponto e os parênteses:
|〈|
possuindo dois significados equivalentes
∙ |〈|  operador |〈| atuando sobre o ket |.
∙ |〈|  número 〈| multiplicando |.
Por outro lado, se (33) fosse escrita como
〈|  |
não poderíamos omitir o ponto e o parêntese, pois a expressão resultante seria “ilegal”. Ou seja,
〈| |
“ilegal”

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 13


Observação Note que o operador |〈| gira | na direção de |. É fácil mostrar que, se
X  |〈|, (34)
então
X   |〈|   |〈|. (35)

 Outra ilustração importante do axioma Seja


〈|  X |  〈| X  | (36)
bra ket bra ket

Como os dois lados são iguais, podemos representar numa forma mais compacta
〈| X | (37)

Observação Como 〈| X  é o bra que é dual a X |, então


〈| X |  〈|  X |

Por outro lado, da Eq. (12) 〈|  〈| , então
〈|  X |  〈|X    | ∗
 〈|X  | ∗
Ou seja
〈| X |  〈|X  | ∗ (38)
Para um operador Hermitiano, X  X, tem-se
〈| X |  〈| X | ∗ (39)

1.3 Kets de Base e Representações Matriciais


Autokets de um observável
Vamos considerar os autovalores e autokets de um operador Hermitiano A.

Teorema Os autovalores de um operador Hermitiano A são reais; os autokets de A correspondentes a diferentes


autovalores são ortogonais.

Prova: Seja

A|a ′   a ′ |a ′  (3.1)

Como A é Hermitiano, A †  A, então

〈a ′′ | A   〈a ′′ | A  a ′′∗ 〈a ′′ | (3.2)

Então

〈a ′′ | A |a ′   a ′ 〈a ′′ |a ′ 

〈a ′′ | A |a ′   a ′′∗ 〈a ′′ |a ′ 

e, subtraindo ambos os membros, encontramos

a ′ − a ′′∗ 〈a ′′ |a ′   0 (3.3)

Admitindo que os vetores não sejam nulos, temos dois casos:

(1) Fazendo a ′  a ′′ Neste caso, deduzimos a condição de que os autovalores de um operador


Hermitiano são reais, ou seja,

a ′  a ′∗ (3.4)

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(a primeira metade do teorema).

(2) Fazendo a ′ ≠ a ′′ A diferença, a ′ − a ′′∗  a ′ − a ′′ (autovalores reais), não pode se anular, por
hipótese. Logo, o produto interno 〈a ′′ |a ′  deve ser nulo, ou seja

〈a ′′ |a ′   0, a ′ ≠ a ′′ 

o que prova a propriedade da ortogonalidade (segunda metade do teorema).

Observáveis  autovalores reais  operadores Hermitianos.

Normalização Na forma ortonormal


〈a ′′ |a ′    a ′′ a ′ . (3.6)

Completeza Por construção do nosso espaço ket, os autokets de A formam um conjunto completo.

Autokets como Kets de Base


 Todos os autokets normalizados de A formam um conjunto ortonormal completo. O número de autokets é igual à
dimensionalidade do espaço vetorial complexo.
 Um ket arbitrário no espaço ket pode ser expandido em termos dos autokets de A. Seja a expansão de um ket
arbitrário | no espaço ket descrito pelos autokets de A:

|  ∑ c a |a ′ 
′ (3.7)
a′

Multiplicando por 〈a ′′ | e usando a relação de ortonormalidade, encontram-se os coeficientes da expansão:

〈a ′′ |  ∑ c a 〈a ′′ |a ′   ∑ c a  a a
′ ′ ′′ ′  c a ′′
a′ a′

Ou seja,
c a ′  〈a ′ | (3.8)
E a expansão fica
|  ∑ |a ′ 〈a ′ | (3.9)
a′

Analogia com a expansão de um vetor V (real) no espaço euclidiano:


V  ∑ ê i ê i  V  (3.10
i

 Em termos de base, os autokets de A são comparáveis ao conjunto de vetores unitários mutuamente ortogonais do
espaço euclidiano.

Relação de Completeza
Do axioma associativo da multiplicação e sendo | um vetor arbitrário, obtém-se

|  ∑ |a ′ 〈a ′ |  ∑ |a ′ 〈a ′ | |  ∑ |a ′ 〈a ′ |  1 (3.11


a′ a′ a′

que é conhecida como relação de completeza. O “1” do lado direito deve ser entendido como o operador
identidade.
Uso do operador identidade. Seja 〈|. Podemos escrever

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 15


〈|  〈|1|  〈| ∑ |a ′ 〈a ′ | |
a′

 ∑〈|a ′ 〈a ′ |


a′

 ∑〈a ′ | ∗ 〈a ′ |


a′

 ∑|〈a ′ || 2
a′

Para kets normalizados, 〈|  1. Logo,

∑|〈a ′ || 2  1
a′

e, como c a ′  〈a ′ |, encontramos a relação

∑|c a | 2  1,
′ (3.13
a′

que deve ser satisfeita pelos coeficientes da expansão (3.7).

Operador projeção
Seja o operador |a ′ 〈a ′ | que aparece em (3.11). Aplicando sobre o ket |
|a ′ 〈a ′ |  |  |a ′ 〈a ′ |  c a ′ |a ′  (3.14

O que isto significa?


Significa que operando sobre o ket |, o operador |a ′ 〈a ′ | seleciona a parcela de | que é paralela a |a ′ . Em
outras palavras, o operador |a ′ 〈a ′ | operando sobre | projeta este ket ao longo do ket de base |a ′ . Por isto
|a ′ 〈a ′ | é conhecido como operador projeção ou projetor. Denotando-o por  a ′ , ou seja,
 a ′  |a ′ 〈a ′ | (3.15
a relação de completeza (3.11) pode ser escrita como

∑ a ′ 1 (3.16
a′

Representação Matricial
Conhecendo-se os kets de base, num espaço N −dimensional, como representar um operador X por uma
matriz quadrada?
Considere a identidade

X ∑|a ′′ 〈a ′′ | X ∑|a ′ 〈a ′ | ,


a ′′ a′

1 1

que pode ser reescrita como


X ∑ ∑ |a ′′  〈a ′′ | X |a ′  〈a ′ |. (3.17
a ′′ a′
números

Quantos números da forma 〈a ′′ | X |a ′  existem? Sabendo-se que o conjunto a ′   a 1 , a 2 , a 3 , … , a N 
existem N 2 números dessa forma.
Forma matricial. Podemos colocá-los na forma matricial, fazendo as seguintes identificações

Prof. Abraham Moysés Cohen Mecânica Quântica A 16


〈a ′′ | X |a ′  (3.18
linha coluna

Ou seja,

〈a 1 | X |a 1  〈a 1 | X |a 2  

X≗ 〈a 2 | X |a 1  〈a 2 | X |a 2   (3.19

  

onde o símbolo ≗ significa “é representado por”. Usando a Eq (38) da Seç. 2, podemos escrever

〈a ′′ | X |a ′   〈a ′ | X  |a ′′  . (3.20
Para um operador Hermitiano B, ou seja, B  B  , esta equação torna-se,

〈a ′′ | B |a ′   〈a ′ | B |a ′′  . (3.21
Verificação da regra usual da multiplicação de matrizes
Podemos mostrar que o arranjo 〈a ′′ | X |a ′  numa matriz quadrada satisfaz a regra usual de multiplicação.
 Relação de operadores Seja Z o produto de dois operadores
Z  XY.
Assim

〈a ′′ | Z |a ′   〈a ′′ | X Y |a ′   ∑〈a ′′ | X |a ′′′ 〈a ′′′ | Y |a ′  (3.23)


a ′′′

que é o produto de duas matrizes quadradas!


 Relação de kets Seja | o ket obtido pela aplicação do operador X sobre o ket |
|  X | (3.24)
Assim

〈a ′ |  〈a ′ | X |  ∑〈a ′ | X |a ′′ 〈a ′′ | (3.25)


a ′′

que pode ser visto como a multiplicação de uma matriz quadrada por uma matriz-coluna. As matrizes-coluna 〈a i 
e 〈a i  representam os coeficientes de expansão dos kets | e |, respectivamente, nos kets da base. Ou seja,

〈a 1  〈a 1 
〈a 2  〈a 2 
| ≗ , | ≗ (3.26)
〈a 3  〈a 3 
 

 Relação de bras Seja


〈|  〈| X
Da mesma forma

〈|a ′   〈| Xa ′   ∑〈|a ′ 〈a ′ | Xa ′  (3.28)


a ′′

Logo, um bra é representado por uma matriz-linha

〈| ≗ 〈 a 1 , 〈 a 2 , 〈 a 3 , 

 〈a 1 | ∗ , 〈a 2 | ∗ , 〈a 3 | ∗ ,  (3.29)

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 17


 Produto interno 〈|

〈|  ∑〈|a ′ 〈a ′ |


a′

〈a 1 
〈a 2 
 〈a 1  ∗ , 〈a 2  ∗ 〈a 3  ∗ 
〈a 3 

 Produto externo |〈|

|〈|  ∑ ∑|a ′′ 〈a ′′ |〈|a ′ 〈a ′ |


a′ a ′′

Logo,

〈a 1 〈|a 1  〈a 1 〈|a 2  


|〈| ≗ 〈a 2 〈|a 1  〈a 2 〈|a 2  
  

ou, usando a conjugação complexa

〈a 1 〈a 1  ∗ 〈a 1 〈a 2  ∗ 


|〈| ≗ 〈a 2 〈a 1  ∗ 〈a 2 〈a 2  ∗  (3.31)
  

 Observável A na base dos autokets

A≗ ∑ ∑|a ′′ 〈a ′′ | A |a ′ 〈a ′ |


a′ a ′′

Como |a ′  é um autoket de A, ou seja, A|a ′   a ′ |a ′ , a matriz 〈a ′′ | A |a ′  é diagonal:


〈a ′′ | A |a ′   a ′ 〈a ′′ |a ′   a ′  a ′ a ′′ (3.33)
Logo,

A≗ ∑ ∑|a ′′ 〈a ′′ | A |a ′ 〈a ′ |


a′ a ′′

 ∑ ∑|a ′′  a ′  a a 〈a ′ |
′ ′′

a′ a ′′

 ∑ a ′ |a ′′  〈a ′ |
a′

 ∑ a′ a ′ (3.34)
a′

Sistemas de Spin ½
Base usada: |S z ;  ≡ |
 Operador identidade

1 ∑ |a ′ 〈a ′ |  |〈|  |−〈−|


a ′ ,−

 Operador S z
De acordo com (3.34), a representação de um operador na base de seus autokets é

A ∑ a′ a ′

a′

Logo,

Prof. Abraham Moysés Cohen Mecânica Quântica A 18


S z   |〈| − |−〈−|
2
Escrito desta forma, a relação de autovalores S z |    |, ou seja,
2
S z | ≡  |〈| − |−〈−| |
2

  | 〈| −|− 〈−|


2
1 0

  |.
2

Da mesma forma,

S z |− ≡  |〈| − |−〈−| |−


2

  | 〈|− − |− 〈−|−


2
0 1

 −  |−.
2

1.4 Medidas, Observáveis e Relações de Incerteza


Medidas
“Uma medida sempre faz com que o sistema salte para um autoestado da variável dinâmica que está sendo avaliada.”
(Dirac)
O que significam essas palavras de Dirac? Vamos analisar o processo de medida de um observável A.
Antes da medida. Nesta etapa, vamos admitir que o sistema esteja num estado |, que pode ser
representado por uma combinação linear dos autokets de A. Ou seja,
|  ∑ c a | ′   ∑|a ′ 〈a ′ |
′ (4.1)
a′ a′

Após a medida. Quando a medida é realizada, o sistema é “jogado” em um dos autoestados, digamos

|a , do observável A. Ou seja,
medida de A

| |a ′  (4.2)

Exemplo Um átomo de prata com uma orientação de spin arbitrária mudará para um dos estados |S z ;  ou |S z ; −,
quando sujeito a um dispositivo de Stern-Gerlach do tipo SGẑ . Então, a medida geralmente muda o estado. A única
exceção é quando o sistema já está em um dos autoestados do observável que está sendo medido. Neste caso,
medida de A

|a ′  |a ′  (4.3)

Quando o sistema passa do estado inicial | para um autoestado do observável


Resultado da experiência.
A, não sabemos de antemão em qual dos vários autoestados |a ′ ’s desse observável o sistema será
encontrado como resultado de uma medida.
Probabilidade. Embora não se saiba prever exatamente em qual dos autoestados o sistema será
encontrado, podemos estimar a probabilidade do sistema saltar para um dado autoestado |a ′  de A. Admite-se
que tal probabilidade seja dada por
P →a ′  |〈a ′ || 2 (4.4)

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 19


que é um dos postulados fundamentais da MQ.

Como definir probabilidade para um único sistema?

Ensemble puro. Embora se fale de um único sistema, devemos considerar um grande número de medidas
realizadas sobre uma coleção (ensemble) de sistemas físicos preparados identicamente, todos com o mesmo
estado inicial |. Tal ensemble é conhecido como ensemble puro.

| a(1) 〉

| a(2) 〉
|α 〉
med
ida d
e A

| a(N) 〉

Exemplo Um exemplo de ensemble puro seriam os átomos de prata que atravessam o primeiro aparelho SGẑ com
a componente S z− bloqueada, uma vez que qualquer átomo membro do ensemble é caracterizado por S z .

Faz sentido a interpretação probabilística?

 Casos extremos

|i  |a ′  e |f  |a ′  Considere o sistema no estado inicial |a ′ . Qual a probabilidade de encontrar o sistema
no estado final |a ′  após a medida? De acordo com (4.4)
P a ′ →a ′  |〈a ′ |a ′ | 2  1
como seria esperado. Repetindo-se sucessivamente a medida do mesmo observável o resultado será sempre
o mesmo.
|i  |a ′  e |f  |a ′′  Sendo a ′′ ≠ a ′ autoestados do observável A, devido à ortogonalidade entre eles, a
probabilidade vale
P a ′ →a ′′  |〈a ′′ |a ′ | 2  0

Do ponto de vista da teoria das medidas, kets ortogonais correspondem a alternativas mutuamente excludentes. Por
exemplo, se um sistema de spin ½ está no estado |S z ;  com certeza ele não pode estar no estado |S z ; −.

 Casos Gerais
Probabilidade não-negativa. A Eq. (4.4) satisfaz essa exigência.
Soma 1. Quando existem várias possibilidades alternativas, a soma total das probabilidades deve ser igual a
1. A Eq (4.4) satisfaz também essa exigência.

Valor Esperado
O valor esperado de A com relação ao estado | é definido como
〈A  ≡ 〈| A |  (4.5)

Valor medido médio O valor esperado pode ser reescrito como

Prof. Abraham Moysés Cohen Mecânica Quântica A 20


〈A   ∑ ∑〈|a ′′ 〈a ′′ | A | a ′ 〈a ′ |
a′ a ′′

 ∑ ∑ a ′ 〈|a ′′ 〈a ′′ | a ′ 〈a ′ |


a′ a ′′

 ∑ a ′ 〈|a ′ 〈a ′ |  ∑ a ′ 〈a ′ | ∗ 〈a ′ |


a′ a′

 ∑ a′

|〈a ′ ||
2

a′
valor probabilidade
medido a ′ de obter a ′

É muito importante não confundir autovalores com valores esperados. Por exemplo, o valor esperado de S z para sistemas
com spin ½ pode ter qualquer valor entre − /2 e /2, digamos, 0, 273; por outro lado, os autovalores de S z só podem ter
dois valores: −/2 e /2.

Medida Seletiva ou Filtragem


No experimento de Stern-Gerlach, permitimos que apenas os átomos com uma das componentes do spin
passasse através do aparelho, bloqueando-se completamente a passagem de átomos com a outra
componente.
Processo de medida. De uma maneira geral, imaginamos um processo de medida com um dispositivo que
seleciona apenas um dos autokets de A, digamos |a ′ , rejeitando todos os outros (medida seletiva); v. figura
abaixo.

| a' 〉
|α 〉
Medida de A

| a'' 〉 com a''≠ a'

Matemática da medida seletiva. Matematicamente, quantificamos a medida seletiva, aplicando-se o


operador projeção  a ′ sobre o ket |
 a ′ |  |a ′ 〈a ′ |. (4.7)

Sistemas de Spin ½ Revisitados


 Na experiência de Stern-Gerlach, vimos que quando o feixe de átomos com S x  está sujeito a um aparelho do tipo
SGẑ , o feixe se desdobra em duas componentes com intensidades iguais.
 Em termos dos postulados da MQ: a probabilidade para que o estado S x  seja “lançado” em qualquer um dos
estados |S z ; , ou simplesmente |, vale 1 . Em outras palavras,
2
|〈|S x ; | 2  1 .
2

Logo,

|〈|S x ; |  1
2

|〈−|S x ; |  1
2

Construção dos kets |S x ; . Podemos construir o ket |S x ;  com segue. De acordo com a expressão
acima, |S x ;  tem componentes em ambos os autokets da base de S z . Assim, podemos escrever
Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 21
|S x ;   1 |  1 e i 1 |− (4.9)
2 2
com  1 real.
Por convenção, o coeficiente de | pode ser escolhido como sendo real e positivo.

Para construir o ket |S x ; −, devemos observar que ambos, |S x ;  e |S x ; −, são ortogonais, uma vez que as
alternativas S x  e S x − são mutuamente excludentes. Esta ortogonalidade exige que
〈S x ; −|S x ;   0.
Logo, escrevendo |S x ; − como

|S x ; −  1 |  1 e i ′1 |−
2 2
onde usamos a convenção acima, encontramos

〈S x ; −|S x ;   〈| 1  〈−| 1 e −i ′1  1 |  1 e i 1 |−


2 2 2 2

 1 〈|  1 e i 1 〈|−  1 e −i 1 〈−|  1 e i 1 − 1  〈−|−


′ ′

2 2 2 2

 1  1 e i 1 − 1 

2 2

0
de onde se obtém

e i 1 − 1   −1   1 −  ′1     ′1   1 − 
Logo

|S x ; −  1 |  1 e i 1 e −i |−


2 2
o que nos fornece

|S x ; −  1 | − 1 e i 1 |−
2 2

Construção dos Operadores S x e S y


Usando a equação
A ∑ a′ a ′

a′

podemos agora construir o operador S x . Seguindo a prescrição

Prof. Abraham Moysés Cohen Mecânica Quântica A 22


S x   |S x ; 〈S x ; | −  |S x ; −〈S x ; −|
2 2
  1 |  1 e i 1 |−  〈| 1  〈−| 1 e −i 1
2 2 2 2 2

−  1 | − 1 e i 1 |−  〈| 1 − 〈−| 1 e −i 1


2 2 2 2 2
  1 |〈|  e −i 1 |〈−|  e i 1 |−〈|  e i 1 e −i 1 |−〈−|
2 2
− |〈|  e −i 1 |〈−|  e i 1 |−〈| − e i 1 e −i 1 |−〈−|

  1 2e −i 1 |〈−|  2e i 1 |−〈|


2 2

Ou seja,

S x   e −i 1 |〈−|  e i 1 |−〈|


2

que é um operador Hermitiano, como deveria ser. De fato, calculando o adjunto Hermitiano desse operador, ou
seja, S x , encontramos

S x   e −i 1 |〈−|  e i 1 |−〈|
2

  e i 1 |−〈|  e −i 1 |〈−|


2

 Sx
que é a condição para que o operador seja Hermitiano.
Procedendo de uma forma similar, encontramos o operador S y :

|S y ;   1 |  1 e i 2 |−
2 2
S y   e −i 2 |〈−|  e i 2 |−〈|
2

Existe alguma maneira de calcular  1 e  2 ?

Vamos calcular a probabilidade


|〈S y ; |S x ; |  ?
ou seja, a probabilidade de um sistema no estado inicial |S x ;  ou |S x ; − ser encontrado, após a medida, no
estado |S y ;  ou |S y ; −. Usando a representação desses estados na base |S z ; , encontra-se

|〈S y ; |S x ; |  〈| 1  〈−| 1 e −i 2  1 |  1 e i 1 |−


2 2 2 2
 1 〈|   1 e i 1 〈| −  〈−|  1 e −i 2  1 e i 1 − 2  〈−| −
2 2 2 2
 1  e1 i 1 − 2 
2 2
1
 |1  e i 1 − 2  |.
2
Da mesma forma,

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 23


|〈S y ; |S x ; −|  〈| 1  〈−| 1 e −i 2  1 | − 1 e i 1 |−
2 2 2 2
 1 〈|   1 e i 1 〈| −  〈−|  1 e −i 2 ∓ 1 e i 1 − 2  〈−| −
2 2 2 2
 1 ∓ 1 e i 1 − 2 
2 2
 1 |1 ∓ e i 1 − 2  |
2
 1 |1  e i 1 − 2  |.
2
Logo,
|〈S y ; |S x ; |  |〈S y ; |S x ; −|  1 |1  e i 1 − 2  |.
2

Mas o que significa esta probabilidade?

Para responder a esta questão, vamos considerar um experimento sequencial de Stern-Gerlach do tipo
SGx̂ → SGŷ com átomos de spin ½ movendo-se na direção z. Devido à invariância rotacional do sistema físico,
este experimento pode ser considerado como um do tipo SGẑ → SGx̂ que foi discutido anteriormente. Os
resultados são exatamente os mesmos obtidos na Eq. (1.4.8), isto é,
|〈S y ; |S x ; |  |〈S y ; |S x ; −|  1 .
2
Em vista disto,
1 |1  e i 1 − 2  |  1
2 2

ou
|1  e i 1 − 2  |  2.

Usando a fórmula de Euler, e i  cos   i sen , podemos reescrever aquela equação como,

|1  e i 1 − 2  |  1  cos 1 −  2   i sen 1 −  2 

 1  cos 1 −  2   i sen 1 −  2 
2
 1  cos 1 −  2   sen 2  1 −  2 

 1  2 cos 1 −  2   cos 2  1 −  2   sen 2  1 −  2 


 2  2 cos 1 −  2 
 2 1  cos 1 −  2  .
Ou seja,
|1  e i 1 − 2  | ≡ 2 1  cos 1 −  2   2
de onde se obtém
1  cos 1 −  2   1
que, evidentemente, só é satisfeita se cos 1 −  2   0. Isto significa que
2 − 1    . (4.16
2
Este resultado significa que os elementos de matrix de S x e S y não podem ser ambos reais. De fato, a presença dos
fatores de fase e i 1 e e i 2 nas definições dos estados |S x ;  e |S y ; , respectivamente, exige que pelo menos um deles seja

Prof. Abraham Moysés Cohen Mecânica Quântica A 24


complexo. De fato, escolhendo  1  0,  2  /2 e, portanto, e i 2  i (imaginário puro).

É conveniente escolhermos os elementos de matriz de S x como sendo reais. Neste caso,  1  0 ou . (No caso
de  1  , a orientação positiva do eixo x terá direção oposta a de  1  0). A segunda fase,  2 , para  1  0
será então:
 2   ou −  .
2 2
O fato de ainda existe esta ambiguidade na escolha de  2 não significa nenhuma surpresa, uma vez que ainda não
especificamos se o sistema de coordenadas que estamos usando é dextrógiro ou não. Ou seja, dados os eixo x e z, ainda
existe uma ambiguidade na escolha do sentido positivo do eixo y. Veremos mais tarde que a escolha do sistema de
coordenadas dextrógiro levará à escolha correta de  2  /2.

Resumo
Com as escolhas  1  0 e  2   , encontra-se
2

|S x ;   1 |  1 |−
2 2
|S y ;   1 |  i |−
2 2
e,

S x   |〈−|  |−〈| (4.18


2

Sy   |〈−| − |−〈| (4.18


2i

Operadores S 
Os operadores não Hermitianos S  definidos em (1.3.38), isto é,
S    |〈∓|
podem agora ser escritos com a ajuda das Eqs. (4.18-a,b). De fato,
2S x 
|〈−|  |−〈|

2iS y
 |〈−| − |−〈|

de onde se obtém
2S x  2iS y  2
|〈−|
 
2S x − 2iS y  2
|−〈|
 

Logo,
iS y
S  ≡  |〈−|   S x   S x  iS y
 

iS y
S −   |−〈|   S x −  S x − iS y
 

Ou seja,

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 25


S   S x  iS y . (4.19

Relações de Comutação e Anticomutação


Sejam os operadores A e B. Definem-se relação de comutação entre esses operadores, A, B, como
A, B ≡ AB − BA,
e relação de anticomutação, A, B, como
A, B ≡ AB  BA.

Relações de comutação dos operadores S x , S y e S z

Estes três operadores são dados por

S x   |〈−|  |−〈|
2

Sy   |〈−| − |−〈|
2i

Sz   |〈| − |−〈−|
2

Relação de comutação entre S x e S y

Seja

S x , S x    |〈−|  |−〈|  |〈−|  |−〈|


2 2
−  |〈−|  |−〈|  |〈−|  |−〈|
2 2

  2
| 〈−| 〈−|  | 〈−|− 〈|  |− 〈| 〈−|
2 0 1 1

 |− 〈|− 〈| − | 〈−| 〈−| − | 〈−|− 〈|


0 0 1

−|− 〈| 〈−| − |− 〈|− 〈|


1 0

 −i 
2
|〈|  |−〈−| − |〈| − |−〈−|
2

0

Assim também como


S y , S y   S z , S z   0.

Relação de comutação entre S x e S y

Prof. Abraham Moysés Cohen Mecânica Quântica A 26


S x , S y    |〈−|  |−〈|  |〈−| − |−〈|
2 2i
−  |〈−| − |−〈|  |〈−|  |−〈|
2i 2

 −i 
2
| 〈−| 〈−| − | 〈−|− 〈|  |− 〈| 〈−|
2 0 1 1

− |− 〈|− 〈| − | 〈−| 〈−| − | 〈−|− 〈|


0 0 1

 |− 〈| 〈−|  |− 〈|− 〈|


1 0

 −i 
2
− |〈|  |−〈−| − |〈|  |−〈−|
2

 −i 
2
− 2|〈|  2|−〈−|
2

Ou seja,

S x , S y   −i 
2
− |〈|  |−〈−|
2
 i  |〈| − |−〈−|
2
 iS z

Da mesma forma,
S y , S z   iS x
S z , S x   iS y
De uma maneira geral, podemos mostrar que esses operadores satisfazem as relações de comutação
S i , S j   i  ijk S k
onde  ijk é o símbolo de Levi-Civita que satisfaz as relações

1, i, j, k  permutação cíclica de x, y, z
 ijk  0, repetição de dois ou mais índices .
−1, i, j, k  permutação não-cíclica de x, y, z

Relações de anticomutação dos operadores S x , S y e S z

Anticomutação de S x com S x . Neste caso,

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 27


S x , S x    |〈−|  |−〈|  |〈−|  |−〈|
2 2
  |〈−|  |−〈|  |〈−|  |−〈|
2 2

  2
| 〈−| 〈−|  | 〈−|− 〈|  |− 〈| 〈−|
2 0 1 1

 |− 〈|− 〈|  | 〈−| 〈−|  | 〈−|− 〈|


0 0 1

 |− 〈| 〈−|  |− 〈|− 〈|


1 0

  2
|〈|  |−〈−|  |〈|  |−〈−|
2

  2
2|〈|  2|−〈−| 2 
2
|〈|  |−〈−|
2 2
1

  .
2

2
Da mesma forma, podemos mostrar que

S y , S y   S z , S z    .
2

2
Anticomutação de S x com S y . Seja a relação S x , S y   S x S y  S y S x . Substituindo as expressões, encontra-se

S x , S y    |〈−|  |−〈|  |〈−| − |−〈|


2 2i
  |〈−| − |−〈|  |〈−|  |−〈|
2i 2

 −i 
2
| 〈−| 〈−| − | 〈−|− 〈|  |− 〈| 〈−|
2 0 1 1

− |− 〈|− 〈|  | 〈−| 〈−|  | 〈−|− 〈|


0 0 1

− |− 〈| 〈−| − |− 〈|− 〈|


1 0

 −i 
2
− |〈|  |−〈−|  |〈| − |−〈−|
2

 0.

Da mesma forma encontraremos


S y , S z   S z , S x   0
De uma maneira geral, as relações de anticomutação entre os três operadores podem ser escritas na forma
abreviada como
S i , S j   1  2  ij , i, j  x, y, z.
2
Esta relação de anticomutação é um caso especial para sistemas de spin ½, não valendo para outros valores de spin.

Operador S 2

Prof. Abraham Moysés Cohen Mecânica Quântica A 28


Vamos definir o operador S 2  S  S, como
S 2  S 2x  S 2y  S 2z

Da relação de anticomutação S x , S x  obtém-se


S x , S x   2S 2x → S 2x  1 S x , S x   1  2
2 4
Da mesma forma,
S 2y  S 2z  1  2 .
4
Logo,

S2  3 2.
4
que é uma constante multiplicada pelo operador identidade.
A forma deste operador é um caso especial para sistemas de spin ½, não valendo para outros valores de spin.

Para este caso, podemos mostrar facilmente que


S 2 , S i   0, i  x, y, z.

Observáveis Compatíveis
Dois observáveis A e B são definidos serem compatíveis, quando os correspondentes operadores comutam
entre si, ou seja,
A, B  0;
e, incompatíveis, quando os operadores correspondenete não comutam entre si,
A, B ≠ 0.

Exemplo Os observáveis S 2 e S z são compatíveis, enquanto que S x e S z são incompatíveis.

Observáveis compatíveis A e B. Vamos admitir, como usual, que o espaço ket seja descrito pelos
autokets de A. (Poderíamos também considerar que o mesmo espaço fosse descrito pelos autokets de B).

Para observáveis compatíveis A e B, como se relacionam os autokets desses dois operadores ?

Antes de responder a esta questão, vamos abordar o conceito da degenerescência de autovalores.

Degenerescência
Quando existem dois (ou mais) autokets de A, linearmente independentes, com os mesmos autovalores,
dizemos que estes autovalores dos dois (ou mais) autokets são degenerados. Neste caso, a notação |a ′  que
rotula o autoket apenas por seu autovalor não dá uma descrição completa. Pior ainda, é que o conceito de
espaço ket sendo descrito pelo conjunto de autokets |a ′  tem problemas quando a dimensionalidade do
espaço ket é maior do que o número de autovalores distintos. Felizmente, em aplicações práticas em MQ, os
autovalores de algum outro observável B que comuta com A, podem ser usados para rotular esses autokets
degenerados.

Teorema Suponha que A e B sejam observáveis compatíveis, e os autovalores de A são não-degenerados. Então, os
elementos de matriz 〈a ′′ | B |a ′  são todos diagonais. (Não devemos esquecer que os elementos de matriz de A já são
diagonais se |a ′  forem usados como kets de base.)

Prova: Usando a definição de observáveis compatíveis, sabemos que

〈a ′′ | A, B |a ′   0

Ou seja
Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 29
〈a ′′ | AB − BA |a ′   a ′′ − a ′ 〈a ′′ | B |a ′   0

que tem como solução

〈a ′′ | B |a ′  ≠ 0, se a ′′  a ′
.
′′ ′ a ′′ a′
〈a | B |a   0, se ≠

Na forma compacta, podemos escrever os elementos de matriz como

〈a ′′ | B |a ′    a ′ a ′′ 〈a ′ | B |a ′ 

o que prova a afirmativa de que os elementos de matriz 〈a ′′ | B |a ′  são todos diagonais.

Operador B na Base dos Autokets de A


Seja a identidade
B ∑ ∑|a ′′ 〈a ′′ | B |a ′ 〈a ′ |.
a′ a ′′

Substituindo o resultado (1.4.29), encontra-se


B ∑ ∑ |a ′′  a a 〈a ′′ | B |a ′′ 〈a ′ |  ∑ |a ′′ 〈a ′′ | B |a ′′ 〈a ′′ |.
′′ ′

a′ a ′′ a ′′

Fazendo este operador atuar num autoket de A, digamos |a ′ , tem-se


B |a ′   ∑ |a ′′ 〈a ′′ | B |a ′′ 〈a ′′ |a ′   〈a ′ | B |a ′  |a ′  (4.31
a ′′

Mas isto não é nada mais do que a equação de autovalores para o operador B com autovalor
b ′ ≡ 〈a ′ | B |a ′  (4.32

Logo, o autoket |a ′  é um autoket simultâneo de A e B. Devido a essa imparcialidade |a ′  em relação a ambos


os operadores, podemos renomeá-lo como |a ′ , b ′  para carecterizar este autoket simultâneo.

Caso degenerado

Embora a prova dada acima seja para o caso onde os autokets de A são não-degenerados, o enunciado
também vale se existir uma ênupla degenerescência, ou seja,
A|a ′i   a ′ |a ′i , para i  1, 2, … , n,
onde |a ′i  são n autokets de A mutuamente ortonormais. Para que se possa ver isso, precisamos apenas
construir n apropriadas combinações lineares de |a ′i  que diagonalizam o operador B (v. Seç. 1.5).
Um autoket simultâneo de A e B, denotado por |a ′ , b ′ , tem a propriedade
A |a ′ , b ′   a ′ |a ′ , b ′ 
B |a ′ , b ′   b ′ |a ′ , b ′ 

Quando não existe degenerescência, esta notação é supérflua, uma que, da Eq. (1.4.32), vê-se que especificando-se a ′ ,
necessariamente conhecemos o b ′ que aparece em |a ′ , b ′ . A notação |a ′ , b ′  é muito mais poderosa quando existem
degenerescências. Veja exemplo abaixo.

Exemplo Os autovalores de L 2 (quadrado do momento angular orbital) e L z (componente-z do momento angular


orbital) valem  2 ll  1 e m l  2 , respectivamente. sendo l um número inteiro e m l  −l, −l  1, … , l. Para caracterizar
completamente um estado de momento angular precisamos especificar tanto l como m l . Por exemplo, dizendo-se
apenas que l  1, os valores de m l ainda podem ser −1, 0 ou 1. Dizendo-se que m l  1, l pode ter os valores
1, 2, 3, … . A única maneira de não sermos ambiguos em relação ao estado de momento angular, é especificarmos

Prof. Abraham Moysés Cohen Mecânica Quântica A 30


simultaneamente os valores de l e m l , ou seja, |l, m l .

Índices coletivos

Às vezes um índice coletivo pode ser usado para caracterizar a ′ , b ′ , tal que
|K ′   |a ′ , b ′ 

Generalização para Mais de Dois Observáveis Compativeis


A condição para os observáveis A, B, C, … serem compatíveis, pode ser generalizada para
A, B  B, C  A, C    0. (4.36

Conjunto máximo de observáveis comutantes. Dada uma lista de observáveis, o conjunto máximo de
observáveis comutantes é o maior conjunto que podemos formar com esses observáveis sem que se viole a
condição (1.4.36).
Os operadores individuais A, B, C, … , podem ter degenerescência, mas se especificarmos uma combinação
a ′ , b ′ , c ′ , …  , então os correspondentes autokets simultâneos de A, B, C, … são especificados sem
ambiguidades. Podemos usar o índice coletivo K ′ para representar a ′ , b ′ , c ′ , … . A relação de ortogonalidade
para
|K ′   |a ′ , b ′ , c ′ , … 
será
〈K ′′ |K ′    K ′ K ′′   a ′ a ′′  b ′ b ′′  c ′ c ′′ … (4.38
enquanto que a relação de completeza, será escrita como

∑|K ′ 〈K ′ |  ∑ ∑ ∑ |a ′ , b ′ , c ′ , … 〈a ′ , b ′ , c ′ , … |  1 (4.39


K′ a′ b′ c′

Medidas de Observáveis Compatíveis


Caso não degenerado. Suponha um sistema num estado inicial |, quando realizamos medidas dos
observáveis compatíveis A e B. Suponha ainda que medimos primeiro o observável A, obtendo como resultado
a ′ . Subsequentemente, medimos B, obtendo-se b ′ . Finalmente, medimos A novamente.

Qual o valor que obteremos para esta nova medida de A?

Com base no formalismo de medidas, a resposta é simples: a terceira medida (A) sempre dará a ′ com certeza.
Isto é, a segunda medida (B) não destrói a informação obtida previamente na primeira medida (A). Isto é óbvio
quando os autovalores de A são não-degenerados:

medida de A medida de B medida de A


|α〉 |a',b'〉 |a',b'〉 |a',b'〉
(4.40

Caso degenerado. Quando existe degenerescência, o argumento é como segue: Após a primeira medida

(A), que dá a , o sistema se encontra em alguma combinação linear do tipo
n

∑ c ia |a ′ , b i ,
′ (4.41
i

onde n é o grau de degenerescência, e os kets |a ′ , b i  têm o mesmo autovalor a ′ com relação ao operador A.
A segunda medida (B) pode selecionar apenas um dos termos da combinação linear (1.4.41), digamos,
|a ′ , b j , mas a terceira medida aplicada a ele ainda dá a ′ .

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 31


Tendo ou não degenerescência, as medidas de A e B não se interferem. O termo compatível é, de fato, apropriado.

Observáveis Incompatíveis
Neste caso, os operadores correspondentes aos observáveis A e B não comutam entre si. Ou seja,
A, B ≠ 0.

Isto significa que observáveis incompatíveis não têm um conjunto completo de autokets simultâneos, como no
caso anterior.
Demonstração. Para demonstrar, vamos considerar que, ao contrário, existe um conjunto completo de
autokets simultêneos. Logo,
′ ′
AB |a ′ , b ′   b A |a ′ , b ′   a ′ b |a ′ , b ′ 

BA |a ′ , b ′   a ′ B |a ′ , b ′   a ′ b ′ |a ′ , b ′ 
Então,
AB |a ′ , b ′   BA |a ′ , b ′  (4.44
o que significa
AB − BA |a ′ , b ′   0
ou, mais precisamente,
A, B  0
o que está em contradição com a hipótese de que os operadores são incompatíveis.
Em geral, |a ′ , b ′  não faz sentido para observáveis incompatíveis.

Existe porém um exceção interessante: é o que acontece quando existe um subespaço do espaço ket tal que
(1.4.44) vale para todos os elementos deste subespaço, mesmo que A e B sejam incompatíveis.
Exemplo Momento angular orbital: Considere um estado l  0 (estado s). Embora os operadores L x e L z não
comutem, este estado é um autoestado simultâneo de L x e L z (com autovalores nulos para ambos os operadores). O
subespaço neste caso é unidemensional.

Observáveis Incompatíveis e SG Sequencial


Considere um sequência de medidas seletivas mostrada na parte (a) da figura abaixo.
 O primeiro filtro A seleciona o estado |a ′  e rejeita os demais.
 O segundo filtro B seleciona o estado |b ′  e rejeita os demais.
 O terceiro filtro C seleciona o estado |c ′  e rejeita os demais.

Qual a probabilidade de obter |c ′ , quando o feixe saindo do primeiro filtro é normalizado à unidade?

Para obtermos a medida |c ′ , o feixe deve passar pelo segundo filtro e pelo terceiro filtro. Como neste caso, as
probabilidades são multiplicativas, encontramos
|〈c ′ |b ′ | |〈b ′ |a ′ |
2 2

Agora precisamos somar sobre todos os estados b ′ para calcular a probabilidade total de ir através de todas as
rotas possíveis b ′

∑ |〈c ′ |b ′ | 2 |〈b ′ |a ′ | 2  ∑〈c ′ |b ′ 〈b ′ |a ′ 〈a ′ |b ′ 〈b ′ |c ′  (4.46


b′ b′

Operacionalmente, isto significa que primeiro registramos a probabilidade de obter c ′ com todos os b ′ bloqueados, com
exceção do primeiro; então, repetimos o procedimento com todos os b ′ bloqueados, com exceção do segundo, e assim

Prof. Abraham Moysés Cohen Mecânica Quântica A 32


sucessivamente. No final, somamos todas essas probabilidades.

Comparação com o filtro B ausente. Veja a parte (b) da figura abaixo, onde o filtro B foi retirado.
Claramente, a probabilidade vale |〈c ′ | a ′ | , que também pode ser escrita como
2

2
′ ′
|〈c | a | 
2
∑〈c ′ ′ ′
|b 〈b |a ′

b′

 ∑ ∑〈c ′ |b ′ 〈b ′ |a ′ 〈a ′ |b ′′ 〈b ′′ |c ′  (4.47


b′ b ′′

| a'〉 | b'〉 | c'〉


A B C

(a)

|a ′   ∑ |b ′ 〈b ′ |a ′ 
b′ | c'〉
A C

(b)

Observação Note que essas duas expressões são diferentes! Mas, isto é um resultado extraordinário, uma vez que em
ambos os casos o feixe puro |a ′ , saindo do primeiro filtro A pode ser considerado como composto dos autoestados de
B, isto é,

|a ′   ∑|b ′ 〈b ′ |a ′ 
b′

onde a soma é sobre todos os valores possíveis de b ′ . O ponto crucial que deve ser notado é que o resultado que emerge
do filtro C depende se a medida B foi ou não realizada. No primeiro caso, verificamos experimentalmente quais dos
autovalores de B realmente materializaram-se; no segundo, meramente imaginamos |a ′  ser construído dos vários |b ′  ′ s no
sentido de (1.4.48).
Em outras palavras, medindo-se realmente as probabilidades através de todas as rotas dos vários b ′ faz toda a diferença,
mesmo que no final somemos sobre todos os b ′ . Aqui está o coração da mecânica quântica.

Em que circustâncias as duas expressões são iguais?

Pode-se mostrar que, na ausência de degenerescência, a condição suficiente é que


A, B  0 ou B, C  0.
Em outras palavras, essa particularidade ilustrada é característica de observáveis incompatíveis.

Relações de Incerteza
Dado um observável A, definimos um operador ΔA como
ΔA  A − 〈A,
onde o valor esperado é tomado para um determinado estado físico em consideração. O valor esperado de
ΔA 2 é conhecido como dispersão de A. Uma vez que,

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 33


ΔA 2  A − 〈A 2  A 2 − 2A〈A  〈A 2
 〈A 2  − 2〈A 2  〈A 2
 〈A 2  − 〈A 2 ,
podemos definir dispersão de A como sendo 〈A 2  − 〈A 2 . Às vezes, os termos variância e desvio quadrático
médio são também usados para a mesma quantidade.
Dispersão tomada para um autoestado de A. Quando o estado em questão é um autoestado de A,
ΔA 2 A
 〈A 2  − 〈A 2
 〈a ′ | A 2 |a ′  − 〈a ′ | A |a ′  2
 a 2 〈a ′ |a ′  − a 2 〈a ′ |a ′  2
 0.
ou seja, a dispersão se anula quando tomada em relação ao autoestado do operador A. Grosso modo, a
dispersão de um observável, caracteriza “indefinição”. Por exemplo, para o estado S z  de um sistema de spin
½, a dispersão de S x pode ser calculada
ΔS x  2 ≡ 〈S 2x  − 〈S x  2  〈| S 2x | − 〈|S x | 2
onde,

〈| S 2x | 

 〈|  |〈−|  |−〈|  |〈−|  |−〈| |


2 2
  〈| |〈−||〈−|  |〈−||−〈|  |−〈||〈−|  |−〈||−〈| |
2

  2
〈||〈||  〈||−〈−||
2
0
1

 1 2.
4
e
2
〈|S x | 2  〈|  |〈−|  |−〈| |
2
2
  2
〈| |〈−|  |−〈| |
2
  2
〈||〈−||  〈||−〈|| 2
2
0
Logo,
ΔS x  2  〈S 2x  − 〈S x  2  1  2 .
4
Ao contrário, a dispersão ΔS z  2  0 para o estado S z . Assim, para o estado S z , S z é preciso (dispersão
nula), enquanto que S x é impreciso.
Relação de incerteza. Sejam os observáveis A e B. Então, para qualquer estado devemos ter a seguinte
desigualdade
ΔA 2 ΔB 2 ≥ 1 |〈A, B| 2 . (4.53
4
Para prová-la, consideremos os seguintes lemas:

Prof. Abraham Moysés Cohen Mecânica Quântica A 34


Lema (1) Desigualdade de Schwartz

〈|〈| ≥ |〈|| 2

que é análoga a

|a| 2 |b| 2 ≥ |a  b| 2

no espaço euclidiano.

Prova: Note que

〈|  〈|  ∗   |  | ≥ 0,

ou seja,

〈|  〈|   ∗ 〈|  || 2 〈|


 1  2 Re〈|  || 2 〈| ≥ 0

onde  é um número complexo. Esta desigualdade deve valer quando   −〈|/〈|. Logo,

〈| |〈|| 2
〈|  2 Re − 〈|  〈| 
〈| |〈|| 2
 〈|〈| − 2|〈|| 2  |〈|| 2
 〈|〈| − |〈|| 2 ≥ 0

que é a mesma relação da desigualdade de Schwartz.

Lema (2) O valor esperado de um operador Hermitiano é real.

Prova: A prova já foi dada em (1.3.21).

Lema (3) O valor esperado de um operador anti-Hermitiano, definido como C  −C  é imaginário puro.

Prova: Veja a prova do lema (2).

Com esses lemas, estamos prontos para provar a relação de incerteza (1.4.53). Usando o Lema (1) com
|  ΔA| ,
|  ΔB| 
onde |  em branco, enfatiza o fato de que as considerações aqui podem ser aplicadas a qualquer ket,
obtemos
〈|〈| ≥ |〈|| 2 → ΔA 2 ΔB 2 ≥ |〈ΔAΔB| 2
onde usamos a hermiticidade dos operadores ΔA e ΔB.
Cálculo do lado direito. Para calcular |〈ΔAΔB| 2 , observe que
ΔA ΔB  1 ΔA, ΔB  1 ΔA, ΔB
2 2
onde o comutador ΔA, ΔB vale
ΔA, ΔB  A − 〈A, B − 〈B
 A − 〈AB − 〈B − B − 〈BA − 〈A
 AB − A〈B − 〈AB  〈A〈B − BA  B〈A  〈BA − 〈B〈A
 AB − BA
 A, B,

é anti-Hermitiano. Ou seja,

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 35


ΔA, ΔB   A, B   AB  − BA 
 BA − AB  −AB − BA
 −A, B

Ao contrário, o anticomutator ΔA, ΔB é obviamente Hermitiano. Assim,


〈ΔA ΔB  1 〈ΔA, ΔB  1 〈ΔA, ΔB
2 imaginario puro 2 real

onde usamos os Lemas (2) e (3). Portanto, o lado direito torn-se


2 2
|〈ΔAΔB| 2  1 ΔA, ΔB  1 ΔA, ΔB
4 4
Então,
ΔA 2 ΔB 2 ≥ |〈ΔAΔB| 2
ou
2
ΔA 2 ΔB 2 ≥ 1 ΔA, ΔB
4

1.5 Mudança de Base


Operador de Transformação
Considere dois observáveis incompatíveis, A e B, e que o espaço ket em questão possa ser descrito pelo
conjunto |a ′  ou pelo conjunto |b ′ .
Exemplo Sistema de spin ½: |S z ;  podem ser usado como base, da mesma forma que |S x ; . Mas os dois
conjuntos diferentes de kets de base descrevem o mesmo espaço de ket.
Como essas duas descrições estão relacionas?
Mudança de base. A mudança do conjunto de kets de base é referido como mudança de base ou
mudança de representação.
Representação. Refere-se à base na qual os autokets de base são dados. Por exemplo, se a base de
autokets é dada por |a ′  é chamada de representação de A, ou às vezes, representação diagonal de A, uma
vez que a matriz quadrada correspondente a A é diagonal nesta base.
Operador de transformação. Refere-se ao operador que conecta dois conjuntos ortornormais: a base
′ ′
antiga |a  e a nova base |b .

Teorema Dado dois conjuntos de kets de base, ambos satisfazendo ortonormalidade e completeza, existe um operador
unitário U tal que

b 1   U a 1 , b 2   U a 2 , … , b N   U a N . (5.1)

Entende-se como operador unitário aquele que satisfaz as condições

UU  1 (5.2)

assim como

UU   1 (5.3)

Prova: Seja o operador

U ∑ b k 〈a k . (5.4)


k

Aplicando em a l , ou seja,

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U a l   ∑ b k 〈a k a l 
k

 ∑ b k 〈a k a l 


k

 ∑ b k   kl
k

 b l (5.5)

como queríamos. Agora vamos mostrar que U é unitário,

UU  ∑∑ a l  〈b l b k  〈a k


k l
 lk

 ∑ a k 〈a k

 1,

onde usamos a ortonormalidade de |b ′ . 

Matriz de Transformação
Representação do operador U na base antiga |a ′  . De acordo com (1.5.5),
〈a k |U |a l  〈a k |b l .
Em outras palavras, os elementos de matriz da matriz U são os produtos internos entre os bras da base antiga
e os kets da nova base. Lembre-se que a matriz rotação que muda de uma base x̂ , ŷ, ẑ  para x̂ ′ , ŷ ′ , ẑ ′ , pode
ser escrita como

x̂  x̂ ′ x̂  ŷ ′ x̂  ẑ ′
R ŷ  x̂ ′ ŷ  ŷ ′ ŷ  ẑ ′ .

ẑ  x̂ ′ ẑ  ŷ ẑ  ẑ ′

A matriz quadrada 〈a k |U |a l é chamada de matriz de transformação da base |a ′  para a base |b ′  .
Coeficiente de expansão. Dado um ket arbitrário |, cujos coeficientes 〈a ′ | são conhecidos na base
antiga,
|  ∑ |a l 〈a l |.
l

Como obter os coeficientes de expansão 〈b ′ | na nova base?

Multiplicando a expansão por 〈b k |, encontramos

〈b k |  ∑ 〈b k |a l 〈a l |


l

 ∑ 〈b k |U  |a l 〈a l |. (5.10


l

Em notação matricial, esta equação nos diz que a matriz-coluna de | na nova base pode ser obtida,
aplicando-se a matriz quadrada U  sobre a matriz-coluna de | na base antiga:

(Nova)  U (antiga)

Elementos de matriz nas duas bases. Seja

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 37


〈b k | X |b l  ∑ ∑〈b k | a m 〈a m | X |a n 〈a n |b l
m n

 ∑ ∑ 〈a k | U  |a m 〈a m | X |a n  〈a n | U |a l 


m n

conhecida como transformação de similaridade, em álgebra matricial,



X′  U X U (5.13

Traço de um operador X. É a soma dos elementos da diagonal


trX  ∑ 〈a ′ | X |a ′
a′

O traço de um operador não depende da base. Da definição de trX, podemos mostrar que esta função
independe da base em que o operador é representado. Ou seja,

∑ 〈a ′ | X |a ′  ∑ ∑∑ 〈a ′ | b ′ 〈b ′ | X |b ′′ 〈b ′′ |a ′ 
a′ a′ b′ b ′′

 ∑ ∑∑ 〈b ′ | X |b ′′ 〈b ′′ |a ′ 〈a ′ | b ′ 
a′ b′ b ′′

 ∑∑ 〈b ′ | X |b ′′  〈b ′′ | b ′ 
b′ b ′′
 b ′ b ′′

 ∑ 〈b ′ | X |b ′ .
b′

Outras relações envolvendo o traço. Pode-se mostrar que


trXY  trYX
trU  XU  trX
tr|a ′ 〈a ′′ |   a ′ a ′′
tr|b ′ 〈a ′ |  〈a ′ |b ′ 

Diagonalização. Estamos interessados nos autovalores b ′ e os autokets |b ′ , com a propriedade


B |b ′   b ′ |b ′ .
Vamos reescrever esta equação como

∑〈a ′′ |B |a ′ 〈a ′ |b ′   b ′ 〈a ′′ | b ′  (5.18


a′

Quando | b ′  corresponder ao l-ésimo autoket do operador B, podemos reescrever esta equação em notação
matricial, como segue:

B 11 B 12 B 13  C l
1 C l
1

B 21 B 22 B 23  C l
2
 b l C l
2
(5.19
     

com
B ij  〈a i |B |a j  (5.20
C l
k  〈a k |b l  (5.20
com i, j, k  1, 2, … , N (dimensionalidade do espaço). Soluções não triviais para C l
k são possíveis somente se a

equação característica,
detB − 1   0,

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for satisfeita.
 Esta equação é de N-ésima ordem em  e as N raizes obtidas são identificadas com os b l ’s que queremos
determinar.
l
 Conhecendo os b l ’s podemos resolver para os correspondentes C k ’s a menos de uma constante que é
determinada pela condição de normalização.
l
 Comparando (1.5.20-b) com (1.5.7) vê-se que os C k ’s são justamente os elementos da matriz unitária envolvida na
mudança de base |a ′  → |b ′ .
 Para o procedimento de diagonalização via matriz unitária, a questão da hermiticidade do operador B é importante.
Exemplo No caso do operador S  não-Hermitiano, sua representação matricial na base de S z , que é dada por

0 1
S ≗  , (5.22)
0 0

não pode ser diagonalizada via matriz unitária. No Capítulo 2 serão encontrados autokets de um operador
não-Hermitiano em conexão com os estados coerentes de um oscilador harmônico simples, embora sabendo que eles
não formam um conjunto completo ortonormal.

Observáveis Equivalentes
Considere o seguinte teorema sobre transformação unitária

Teorema Considere novamente dois conjuntos de bases ortonormais, |a ′  e |b ′  conectados pelo operador U (1.5.4).
Conhecendo U, podemos construir uma transformação unitária de A, UAU −1 ; então A e UAU −1 são denominados de
observáveis equivalentes por transformação unitária. A equação de autovalores para A
A|a l   a l | a l ,

o que implica claramente em

UAU −1 U |a l   a l U | a l

Mas isto pode ser reescrito como

UAU −1  |b l   a l | b l . (5.25)

Este resultado aparentemente simples é muito profundo. Ele nos diz que os kets | b l  ’s são autokets de UAU −1
com exatamente os mesmos autovalores de A. Em outras palavras, observáveis equivalentes têm espectros
idênticos.
Seja | b l  e, por definição,
B | b l   b l | b l .
Comparando com (1.5.25), infere-se que B e UAU −1 são simultaneamente diagonlizáveis. A questão
fundamental é:

Os operadores B e UAU −1 são os mesmos?

Nos casos de interesse físico, a resposta sim é muito frequente. Tome, por exemplo, S x e S z , que são
relacionados por uma rotação em torno do eixo y, como será mostrado no Capítulo 3.

1.6 Posição, Momento e Translação


Espectro contínuo
Observáveis com autovalores contínuos: qualquer valor real entre −  e  . Seja a equação de autovalores
para o caso do espectro contínuo:
Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 39
 | ′   ′ | ′  (6.1)
onde  é um operador e  ′ é um número. O ket |  ′  é o autoket do operador  com autovalor  ′ . Seguindo uma
analogia com o caso discreto, vamos substituir o símbolo de Kronecker,  ij , pela função delta de Dirac,
 −  ′ , e a soma sobre autovalores discretos a ′  por uma integral sobre a variável contínua . Ou seja,

Discreto → Contínuo
′ ′′
〈a |a    a ′ a ′′ → 〈 |    ′ −  ′′ 
′ ′′

∑ |a ′ 〈a ′ |  1 →  d ′ | ′ 〈 ′ |  1
a′

|  ∑ |a ′ 〈a ′ | → |   d ′ | ′ 〈 ′ |


a′

∑ |〈a ′ || 2  1 →  d ′ |〈 ′ || 2  1


a′

〈|  ∑ 〈|a ′ 〈a ′ | → 〈|   d ′ 〈| ′ 〈 ′ |


a′

〈a ′′ | A |a ′   a ′  a ′ a ′′ → 〈 ′′ |  | ′    ′  ′′ −  ′ 

Autokets da Posição e Medidas da Posição


Como foi enfatizado na Seç. 1.4,
medida em MQ é essencialmente um processo de filtragem.

Operador posição em uma dimensão. Os autokets | x ′  do operador posição x satisfazem


x | x′   x′ | x′ 
e formam um conjunto completo (postulado).
Não se deve confundir: x ′ é um número enquanto que x é um operador.

Expansão de um estado arbitrário. O ket | para um estado físico arbitrário pode ser expandido em termos
dos  | x ′ :

|   − dx ′ | x ′ 〈x ′ | (1.64

Experimento. Suponha um detector muito pequeno que clica somente quando a partícula está
exatamente na posição x ′ . Imediatamente após o detector clicar, podemos dizer que o estado em questão é
representado por | x ′ . Em outras palavras, quando o detector clica, |  “salta” abruptamente para o autoestado
| x ′  da mesma maneira como um estado arbitrário de spin salta para o estado S z  ou S z − , quando sujeito a
aparelho de SG do tipo S z .
O detector na prática. O melhor que o detector pode fazer na prática é localizar a partícula dentro de um
pequeno intervalo, Δ, em torno de x ′ , ou seja, x ′ − Δ/2, x ′  Δ/2 .
Após o clique do detector, o estado ket muda abruptamente como segue:
medida
 x ′ Δ/2
|   − dx ′′ |x ′′ 〈x ′′ |  x −Δ/2 dx ′′

|x ′′ 〈x ′′ | (6.5)

Admitindo que 〈x ′′ | não varie apreciavelmente dentro do estreito intervalo Δ, a probabilidade para que o
detector clique é dada por
|〈x ′ || dx ′
2

onde escrevemos dx ′ para Δ.


Analogia com o espectro discreto. Esta expressão é análoga |〈a ′ || 2 para a probabilidade de | ser

Prof. Abraham Moysés Cohen Mecânica Quântica A 40


encontrado num autoestado |a ′  quando o observável A é medido.
A probabilidade de encontrar a partícular em algum lugar entre − e  é dada por

 − dx ′ |〈x ′ || 2
que é normalizada a um se | for normalizado:

〈|  1   − dx ′ 〈|x ′ 〈x ′ |  1.
Observações:

 A quantidade 〈x ′ | é a função de onda para um estado representado por |.


 Os autokets da posição pode ser extendido para três dimensões: |x ′ .
 Admite-se que, em MQ não-relativística, os autokets |x ′  formam um conjunto completo.
 Desprezando-se os graus de liberdade internos (tais como spin), o estado ket para uma partícula pode ser
expandido em termos dos |x ′ , ou seja

|   d 3 x ′ |x ′ 〈x ′ |


onde x ′ representa x ′ , y ′ e z ′ ; em outras palavras, |x ′  é um autoket simultâneo dos observáveis x, y e z ′ . Ou seja
|x ′  ≡ |x ′ , y ′ , z ′ ,
x|x ′   x ′ |x ′ , y|x ′   y ′ |x ′ , z|x ′   z ′ |x ′ 

 existe um autoket simultâneo para as três componentes do vetor posição → podemos medí-las simultaneamente.
Logo,
x i , x j   0
onde x 1 , x 2 e x 3 representa x, y e z, respectivamente.

Translação
É a operação que muda um estado bem localizado em torno de x ′ para um outro, também bem localizado em
torno x ′  dx ′ , mantendo inalteradas as demais propriedades do sistema (spin, por exemplo).

Translação infinitesimal. O operador T que realiza essa translação, conhecida como translação infinitesimal,
é definido como
T dx ′   |x ′  dx ′  (6.12
onde um possível fator de fase foi tomado igual a um por convenção.

Não são autokets. Os |x ′  não são um autokets do operador translação infinitesimal T dx ′ .

Efeito de T dx ′  sobre um estado |. Expande-se | em termos dos |x ′  e aplica-se o operador translação.
Ou seja,

| → T dx ′ |  T dx ′   d 3 x ′ |x ′ 〈x ′ |   d 3 x ′ |x ′  dx ′ 〈x ′ |


O lado direito também pode ser escrito como

 d 3 x ′ |x ′  dx ′ 〈x ′ |   d 3 x ′ |x ′ 〈x ′ − dx ′ |


Isto mostra que a função de onda de um estado transladado Tdx ′ | é obtida substituindo-se em 〈x ′ |, x ′ → x ′ − dx ′ .

Propriedades que devem ter o operador translação. Vamos relacionar algumas propriedades do operador
translação infinitesimal.
 (1) Unitariedade. Esta propriedade é imposta pela conservação de probabilidade. Se um ket | é normalizado

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 41


à unidade, o ket transladado,T dx ′ |, também será normalizado à unidade. Ou seja,

〈|  〈|T dx ′ T dx ′ 
Esta condição é garantida, exigindo-se que a translação infinitesimal seja unitária. Ou seja,

T dx ′ T dx ′   1.

(2) Translações sucessivas. Aplicando-se duas translações sucessivas, primeiro por dx ′ e em seguida por dx ′′ ,
não necessariamente na mesma direção, espera-se que o resultado total possa ser descrito por uma única
translação equivalente ao vetor soma dx ′  dx ′′ . Assim, vamos exigir que

T dx ′′ T dx ′   T dx ′  dx ′′ .


(3) Translação em direção oposta. Considere um translação em direção oposta a dx ′ , ou seja, T −dx ′ .
Esperamos que essa translação seja o mesmo que o inverso da translação original. Isto é,
−1
T −dx ′   T dx ′ .

(4) Translação dx ′ → 0. Se dx ′ → 0, esperamos que a operação de translação reduza-se à operação identidade,


ou seja,

lim
dx ′ →0
T dx ′   1,
e que a diferença entre T dx ′  e o operador identidade seja de primeira ordem em dx ′ .

Operador translação. Escolhendo-se o operador translação na forma


 1 − iK  d x ′ (6.20
onde K, K x , K y e K z são operadores Hermitianos, então todas as propriedades listadas acima são satisfeitas.
De fato, veremos
 (1) Unitariedade. Seja

T dx ′ T dx ′   1 − iK  dx ′   1 − iK  dx ′ 
 1  iK   dx ′ 1 − iK  dx ′ 
 1 − iK − K    dx ′  O dx ′  2
≃ 1,
onde o termo de segunda ordem é desprezível para uma translação infinitesimal.
(2) Translações sucessivas. Da mesma forma,

T dx ′′ T dx ′   1 − iK  dx ′′  1 − iK  dx ′ 
≃ 1 − iK  dx ′′  dx ′ 
 T dx ′  dx ′′ .
(3) Translação inversa. Este caso pode ser facilmente mostrado
−1
T dx ′   1
1 − iK  dx ′
 1  iK  dx ′  O dx ′  2
≃ 1  iK  dx ′
 T −dx ′ 
(4) É facilmente verificado.
Relação fundamental entre os operadores K e x. Sejam as seguintes expressões:

Prof. Abraham Moysés Cohen Mecânica Quântica A 42


xT dx ′ |x ′   x |x ′ dx ′   x ′ dx ′  |x ′ dx ′ 

T dx ′  x |x ′   x ′ T dx ′  |x ′   x ′ |x ′ dx ′ .


Então

x, T dx ′  |x ′   x ′ dx ′  |x ′ dx ′  − x ′ |x ′ dx ′ 

 dx ′ |x ′ dx ′ 
≃ dx ′ |x ′ ,
onde o erro em tomar |x ′ dx ′  → |x ′  é da segunda ordem em dx ′ . Como |x ′  formam um conjunto completo de
funções, a equação acima deve valer como uma identidade de operadores. Ou seja,
x, T dx ′   dx ′

que pode ser rescrito como


x 1 − iK  dx ′  − 1 − iK  dx ′  x  dx ′

ou ainda,
− i x K  d x ′  iK  d x ′ x  d x ′

Supondo que dx ′ esteja na direção de x̂ j , vamos formar o produto escalar com x̂ i ,


− i x K  x̂ j dx ′  iK  x̂ j dx ′ x  x̂ j dx ′
− i x K j dx ′  iK j dx ′ x  x̂ j dx ′  x̂ i i
x  x̂ i K j − K j x  x̂ i  i x̂ j  x̂ i
x i K j − K j x i  i ij
Ou seja,
x i , K j   i ij (6.27
onde i, j  1, 2, 3 representam as componentes x, y, e z dos operadores.

Momento como um Gerador de Translação


A Eq. (6.27) representa as relações de comutação entre os operadores posição, x, y, z, e os operadores K,
Kx, Ky, Kz.

Qual o significado físico que podemos atribuir a K?

O operador K está relacionado com o momento linear em MQ. Com esta identificação o operador translação
torna-se
T dx ′   1 − ip  dx ′ / (6.32
E as relações de comutação (6.27) tornam-se agora
x i , p j   i ij (6.33

 Estas relações de comutação (6.33) implicam que os pares x e p x , y e py; e z e pz são observáveis incompatíveis,
enquanto que os demais (por exemplo, x e p y ) são observáveis compatíveis. É portanto impossíveis encontrar
autokets simultâneos de x e p x y e p y ; e z e p z .

Relação de incerteza posição-momento. Aplicando o formalismo da Seç. 1.4, obtém-se a relação de incerteza
de W. Heisenberg:

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 43


Δx 2 Δp x  2 ≥  2 /4. (6.34

Translação Finita
Seja uma translação por uma quantidade finita Δx ′ na direção do eixo x, ou seja, Δx ′ x̂ . Logo,
T Δx ′ x̂ |x ′   |x ′  Δx ′ x̂ .
Podemos tratar esse deslocamento finito, como uma sucessão de deslocamentos infinitesimais (v. figura).

dx' = Δx'/N, N → ∞

Δx'
Dividindo o deslocamento original Δx ′ em N deslocamentos dx ′ e no final tomando o limite em que N → ,
encontra-se:
T Δx ′ x̂   T dx ′ x̂ dx ′ x̂   dx ′ x̂  T dx ′ x̂   T dx ′ x̂     T dx ′ x̂ 
N vezes

Mas,
ip  x̂ dx ′ ip  x̂ dx ′
T dx ′ x̂   T dx ′ x̂     T dx ′ x̂   1−

 1−

N
N

N
ip x dx ′
 1−

Como dx ′  Δx ′ /N, e, para N → , encontra-se
N
ip x Δx ′ ip x Δx ′
T Δx ′ x̂   lim
N→
1−
N
 exp −

(6.36

ip x Δx ′
CUIDADO: Aqui exp − 
deve ser entendido com uma função do operador p x . De uma maneira geral, para
qualquer operador X, tem-se

eX  1  X  X  
2
(6.37
2!
Translações em diferentes direções. Uma propriedade fundamental das translações é que translações
sucessivas em diferentes direções (x e y, por exemplo) comutam entre si. Geometricamente, isto pode ser visto
na figura abaixo: ao nos deslocarmos de A para B, não interessa se vamos via C ou via D. O resultado final é o
mesmo. Matematicamente,
T Δy ′ y T Δx ′ x   T Δx ′ x Δy ′ y 

T Δx ′ x T Δy ′ y   T Δx ′ x Δy ′ y 


de onde se obtém

T Δy ′ y , T Δx ′ x   0. (6.40

Prof. Abraham Moysés Cohen Mecânica Quântica A 44


D B

Δy' y

A C
Δx' x
Translações sucessivas em diferentes
Este ponto não é assim tão trivial quanto possa parecer; será mostrado no Capítulo 3 que rotações em torno
de diferentes eixos não comutam entre si. Tratando Δx ′ e Δy ′ até a segunda ordem, encontramos
ip y Δy ′ ip x Δx ′
T Δy ′ y , T Δx ′ x   exp −

, exp −

ip y Δy ′ p 2y Δy ′  2
 1− −  ,
 
ip x Δx ′ p 2 Δx ′  2
1− − x 
 
Δx ′ Δy ′ 
≃− py, px .
2
Como Δx ′ e Δy ′ são deslocamentos arbitrários e usando (6.40), isto T Δy ′ y , T Δx ′ x   0, encontra-se
imediatamente
p x , p y   0 (6.41
ou, ainda mais geral
p i , p j   0. (6.42

Estas relações de comutação são consequência direta do fato de que translações em diferentes direções comutam entre
si. Toda vez que os geradores de transformações (no caso aqui são translações) comutam o grupo correspondente é dito
ser abeliano. O grupo de translações em três dimensões é abeliano.

Os observáveis p x , p y e p z são compatíveis. As relações de comutação (6.42) implicam em p x , p y e p z serem


observáveis mutuamente compatíveis.
Autoket simultâneo. Como são compatíveis, podemos imaginar um autoket simultâneo, ou seja,
|p ′  ≡ |p ′x , p ′y , p ′z ,
p x |p ′   p ′x |p ′ , p y |p ′   p ′y |p ′ , p z |p ′   p ′z |p ′ ,

Translação sobre |p ′ . Vamos aplicar o operador de translação Tdx ′  sobre o autoket dos momentos, |p ′ .
Ou seja
ip  d x ′ ip ′  d x ′
Tdx ′  |p ′   1−

|p ′   1−

|p ′ 

Observe que, diferentemente de |x ′  (que mostramos não ser um autoket), os estados |p ′  são autoestados
(autokets) de Tdx ′ , como já haviamos antecipado, devido à relação de comutação

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 45


p, Tdx ′   0.

Note também que os autovalores de Tdx ′  são complexos. Não esperamos autovalores reais porque Tdx ′ ,
embora unitário, não é um operador Hermitiano.

As Relações de Comutação Canônicas


Resumo das relações inferidas do estudo das propriedades de translação:
x i , x j   0, p i , p j   0, x i , p j   i ij (6.46
Estas relações formam a base da mecânica quântica. São conhecidas como relações de comutação canônicas
ou relações de comutação fundamentais.

Observações Históricas

(1) Historicamente foi Heisemberg quem mostrou em 1925 que as regras de combinações para linhas de
transições atômicas, conhecidas naquele tempo, seriam melhor entendidas se fossem associadas a um arranjo
de números obedecendo certas regras de multiplicação com essas frequências. Imediatamente depois, Born e
Jordan, reconheceram que as regras de multiplicação de Heisenberg eram essencialmente aquelas da álgebra
matricial e a teoria foi desenvolvida baseada no análogo de matriz da Eq. (1.6.46), que é agora conhecido com
mecânica matricial.
(2) Dirac, também em 1925, observou que as várias relações na mecânica quântica podem ser obtidas das
correspondentes relações na mecânica clássica, substituindo os colchetes de Poisson (da mecânica clássica)
pelas relações de comutação, ou seja,
,
, → , (6.47
clássico i
onde os colchetes de Poisson são definidos para funções de q e p, como

Aq, p, Bq, p clássico ≡ ∑ ∂A ∂B − ∂A ∂B (6.48


∂q s ∂p s ∂p s ∂q s
s

Por exemplo, em mecânica clássica temos


x i , p j  clássico   ij

que, usando (6.47) obtém-se (1.6.33) em mecânica quântica.


(3) Tanto os colchetes de Poisson, quanto as relações de comutação satisfazem propriedades algébricas
similares. Por exemplo,
A, A  0
A, B  −B, A
A, c  0, (c é um número)
A  B, C  A, C  B, C
A, BC  A, BC  BA, C
A, B, C  B, C, A  C, A, B  0, (identidade de Jacobi)

1.7 Funções de Onda nos Espaços da Posição e do Momento.


Função de Onda no Espaço da Posição
Caso unidimensional. Seja
x |x ′   x ′ |x ′ 

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e normalizada de tal maneira que a relação de ortogonalidade torna-e
〈x ′′ |x ′   x ′′ − x ′ .

Expansão. Um ket | representando um estado físico pode ser expandido em termos de |x ′ ,

|   dx ′ |x ′ 〈x ′ |


Coeficiente de expansão. O coeficiente de expansão 〈x ′ | é interpretado de tal maneira que
|〈x ′ || dx ′
2

nos fornece a probabilidade da partícula ser encontrada num pequeno intervalo dx ′ em torno de x ′ .
Função de onda. Neste formalismo, o produto interno 〈x ′ | é o que usualmente se conhece como função de
onda   x ′  para o estado |. Ou seja,
〈x ′ |    x ′ 

Interpretações usando o formalismo de Dirac


Produto interno. Seja o produto interno 〈|. Usando a completeza de |x ′  obtém-se

〈|   dx ′ 〈|x ′ 〈x ′ |   dx ′  ∗ x ′   x ′ 


tal que 〈| caracteriza a integral de recobrimento (overlap) entre as duas funções de onda. A identificação de
〈| com a integral de overlap segue do postulado de completeza para |x ′ . A interpretação mais geral de 〈|,
independente das representações, é que esse produto representa a amplitude de probabilidade para o estado |
ser encontrado no estado |.
Expansão  função de onda. Agora vamos interpretar a expansão
|  ∑ |a ′ 〈a ′ |
a′

usando a linguagem de função de onda. Mualtiplicando essa equação pelo autobra 〈x ′ | pelo lado esquerdo,
encontra-se
〈x ′ |  ∑ 〈x ′ |a ′ 〈a ′ |
a′

Na notação usual da mecânica quântica isto é reconhecido como


  x ′   ∑ c a u a x ′ 
′ ′

a′

onde introduzimos uma autofunção do operador A com autovalor a ′ :


u a ′ x ′   〈x ′ |a ′ 

Elementos de matriz. Vamos examinar como 〈| A | pode ser escrito, usando as funções de onda para | e
|. Assim,

〈| A |   dx ′  dx ′′ 〈|x ′ 〈x ′ | A |x ′′ 〈x ′′ |


  dx ′  dx ′′  ∗ x ′  〈x ′ | A |x ′′    x ′′  (7.10

Logo, para calcularmos 〈| A | devemos conhecer os elementos de matriz 〈x ′ | A |x ′′  que em geral é uma
função de duas variáveis, x ′ e x ′′ .
Operador é função da posição. Quando o operador A é função da posição, podemos simplificar (7.10).
Suponha, por exemplo, que
A  x2

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 47


que realmente aparece no hamiltoniano do oscilador harmônico simples (Capítulo 2). Temos
〈x ′ | A |x ′′  ≡ 〈x ′ | x 2 |x ′′   〈x ′ |  x 2 |x ′′ 
 〈x ′ |  x ′′  2 |x ′′   x ′′  2 〈x ′ |x ′′   x ′2 x ′ − x ′′ 
Substituindo em (7.10)

〈| x 2 |   dx ′  dx ′′  ∗ x ′  x ′2 x ′ − x ′′    x ′′ 


  dx ′  ∗ x ′  x ′2   x ′′ 
que ficou reduzida a uma única integral.
De uma maneira geral, se A  fx, então:

〈| fx |   dx ′  ∗ x ′  fx ′    x ′′  (7.14


 
operador não é operador

Operador Momento na Base da Posição


Operador momento na base x. Por definição, momento é o gerador de translações infinitesimais; tomando
isto como ponto de partida
ipΔx ′
1−

|   dx ′ T Δx ′ |x ′ 〈x ′ |
  dx ′ |x ′  Δx ′ 〈x ′ |
  dx ′ |x ′ 〈x ′ − Δx ′ |
 dx ′ |x ′  〈x ′ | − Δx ′ ∂ ′ 〈x ′ | (7.15
∂x
onde, na última passagem, usamos a expansão de Taylor para

〈x ′ − Δx ′ | ≃ 〈x ′ | − Δx ′ ∂ ′ 〈x ′ |


∂x
Comparando ambos os membro (7.15), encontra-se

p|   dx ′ |x ′  −i ∂ ′ 〈x ′ | (7.16


∂x
Multiplicando ambos os membros por 〈x ′′ | encontra-se

〈x ′′ |p|  −i ∂ ′ 〈x ′ |


 dx ′ 〈x ′′ |x ′ 
∂x
  dx x − x  −i ∂ ′ 〈x ′ |
′ ′′ ′
∂x

 −i ′′ 〈x ′′ |
∂x
ou seja,

〈x ′ | p |  −i ∂ ′ 〈x ′ | (7.17


∂x
onde usamos a ortogonalidade dos estados |x ′ .
Elementos de matriz do momento. Para os elementos de matriz do momento na representação x, obtém-se

〈x ′ | p |x ′′   −i ∂ ′ 〈x ′ |x ′′   −i ∂ ′ x ′ − x ′′ 


∂x ∂x
De (7.16), obtém-se uma identidade muito importante:

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〈| p |   dx ′ 〈|x ′  −i ∂ ′ 〈x ′ |
∂x
  dx ′  ∗ x ′  −i ∂ ′   x ′  (7.19
∂x
Neste formalismo, a Eq. (7.19) não é um postulado; pelo contrário, ela foi derivada usando as propriedades
básicas do momento. Aplicando repetidamente (7.17), podemos também obter:

〈x ′ | p n |  −i ∂ ′n 〈x ′ |


n

∂x
 dx ′  ∗ x ′ −i n ∂x∂ ′n   x ′ 
n
〈| p n | 

Funções de Onda no Espaço dos Momentos

Caso unidimensional

Especificação da base p. Sejam os autokets na base p


p |p ′   p ′ |p ′ 
e
〈p ′ |p ′′   p ′ − p ′′ 

Expansão na base p. Um estado arbitrário | pode ser expandido

|   dp ′ |p ′ 〈p ′ |


Coeficiente de expansão. O coeficiente 〈p ′ | é interpretado em termos probabilísticos. Isto é, a probabilidade
de que uma medida de p resulte no autovalor p ′ dentro do pequeno intervalo dp ′ é |〈p ′ || 2 dp ′ . É costume
chamar 〈p ′ | a função de onda no espaço dos momentos. A notação usada é  a p ′ :
〈p ′ |   a p ′ 
Se | for normalizado, obtém-se

〈|   dp ′ 〈|p ′ 〈p ′ |


  dp ′  ∗a p ′   a p ′ 
  dp ′  a p ′ 
2

1

Conexão entre as representações x e p


Espectro discreto. Para espectro discreto, havia uma matriz de transformação que operava uma mudança
de base de um conjunto antigo |a ′  para um novo conjunto |b ′ .
Espectro contínuo. Da mesma forma que para o espectro discreto, espera-se que haja uma tal
transformação. Tais informações estão contidas em 〈x ′ |p ′ , que é uma função de x ′ e p ′ , usualmente chamada
de função de transformação da representação x para a representação p.
Forma explícita de 〈x ′ |p ′ . Para derivarmos a forma explícita de 〈x ′ |p ′ , vamos usar (7.17) com | → |p ′ :

〈x ′ | p |p ′   −i ∂ ′ 〈x ′ |p ′ 
∂x
ou

p ′ 〈x ′ |p ′   −i ∂ ′ 〈x ′ |p ′ 
∂x

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 49


que é uma equação diferencial para 〈x ′ |p ′ . Reescrevendo na forma

1 ∂ 〈x ′ |p ′   ip
′ ′
〈x |p  ∂x ′ 
encontra-se como solução
ipx ′
〈x ′ |p ′   N exp (7.29

onde N é uma constante de normalização a ser determinada.
Observação Embora a função de transformação 〈x ′ |p ′  seja uma função de duas variáveis, x ′ e p ′ , podemos
temporariamente considerá-la como uma função de x ′ para valores fixos de p ′ . Ela pode ser visto como uma amplitude de
probabilidade para o autoestado de momento p ′ ser encontrado na posição x ′ ; em outras palavras, é a função de onda
para o autoestado do momento |p ′ , às vezes referida como autofunção do momento (ainda no espaço x. Assim, (7.29)
diz que a função de onda de um autoestado do momento é uma onda plana. É engraçado que se tenha obtido esta
solução de onda plana sem resolver a equação de Schrödinger (que ainda nem escrevemos).
Constante de normalização N. Para se obter a constante de normalização N, vamos primeiro considerar a
relação

〈x ′ |x ′′    dp ′ 〈x ′ |p ′ 〈p ′ |x ′′ 
O lado esquerdo é uma delta de Dirac (ortogonalidade) e o lado direito pode ser calculado com a forma
explícita de 〈x ′ |p ′  (onda plana). Ou seja
ip ′ x ′ − x ′′ 
x ′ − x ′′   |N| 2  dp ′ exp 
2x ′ −x ′′ 

Logo,
x ′ − x ′′   2|N| 2 x ′ − x ′′ 
e daí
2|N| 2  1 → N  1
2
onde, por convenção, escolhemos N real e positivo. Portanto,
′ ′
〈x ′ |p ′   1 exp ip x .
2 

Espaço da posição  espaço do momento. Vamos ver como as funções de onda nesses dois espaços estão
relacionadas. Seja

〈x ′ |   dp ′ 〈x ′ |p ′ 〈p ′ |


〈p ′ |   dx ′ 〈p ′ |x ′ 〈x ′ |
reescrevendo como
ip ′ x ′
  x ′   1  dp ′ exp 
 a p ′  (7.34
2
e
ip ′ x ′
 a p ′   1  dx ′ exp −

  x ′  (7.34
2

Este par de equações é justamente o que se espera do teorema de inversão de Fourier.

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Pacotes de Onda Gaussiana
Vamos ilustrar o formalismo básico aqui desenvolvido, considerando um exemplo físico, representado por um
pacote de onda gaussiano , cuja função de onda no espaço x é dada por
′2
〈x ′ |  1 exp ikx ′ − x 2 (7.35
 1/4
d 2d
Expandindo esta função,
x ′2
1 ′ −
〈x ′ |  e ikx  e 2d2
 1/4 d  
onda plana gaussiana

vemos que é uma onda plana expikx ′  com vetor de onda k modulada por perfil gaussiano centrado na origem.
Probabilidade. A probabilidade de observar a partícula anula rapidamente para x ′  d. Mas especificamente,
a densidade de probabilidade vale
′2
1 − x2
|〈x ′ || 
2
e d
d

que tem a forma gaussianacom largura d (v. figura abaixo).

Densidade de probabilidade |〈x ′ || 2

Valores esperados de x, x 2 , p e p 2

Valor esperado de x. Seja


 
〈x   − dx ′  | x′ x′ x′ |    − dx ′ x′ | 
2
x′  0

por simetria.
Valor esperado de x 2 . Seja

〈x 2    − dx ′  | x ′ x ′2 x ′ | 

  − dx ′ x ′2 x′ | 
2

 ′2
 1
d
 − dx ′ x ′2 exp − x 2
d
 d .
2

2
que nos leva a

Δx 2  〈x 2  − 〈x 2  d
2

2
para a dispersão do operador posição.

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 51


Valor esperado de p. Seja

〈p   | p |    − dx ′  | x′ − i ∂ ′ x ′ | 
∂x

  − dx ′  | x′ −i 1 ∂ exp ikx ′ − x ′2
 1/4 d ∂x ′ 2d 2
 ′
  − dx ′ ik − x2
d
x′ | 
2

 ′ ′2

 1
d
 − dx ′ ik − x2
d
e
− x2
d

 1 ikd  
d
 ik

Valor esperado de p 2 . Neste caso, obtém-se repetindo o processo anterior,

〈p 2    2   2 k 2 .
2

2d
Dispersão do momento. Usando os resultados anteriores, esta dispersão vale

Δp 2  〈p 2  − 〈p 2   2
2

2d
Relação de incerteza de Heisenberg. Substituindo as dispersões na equação (1.6.34), o produto de incerteza
é dado por

Δp 2  d  2  
2 2 2
Δx 2
2 2d 4
que é independente de d, tal que para o pacote gaussiano obtém-se uma relação de igualdade ao invés da
desigualdade que é a relação mais geral. Por esta razão, o pacote gaussiano é conhecido como o pacote de
onda de incerteza mínima.

Espaço dos momentos


Função de onda. Substituindo (1.7.32) e (1.7.35) em (1.7.33b) , encontramos

〈p ′ |   − dx ′ p ′ | x ′ 〈x ′ |
 ′2
 1  − dx ′ p ′ | x ′ exp ikx ′ − x 2
 1/4 d 2d
 ip ′ x ′ ′2
 1 1  − dx ′ exp −

exp ikx ′ − x 2
 1/4
d 2 2d
 ip ′ x ′ ′2
 1 1  − dx ′ exp −

 ikx ′ − x 2
2  1/4 d 2d
′ ′
 1 1 
 − dx ′ exp − x ′2  ip − kx
2  1/4 d 2d 2 
′ 2
 1 1 
 − dx exp′
− x ′  ip − kd
2  1/4 d 2d 2
p ′ − k 2 d 2
 exp −
2 2
onde na última passagem, completamos os quadrados. A integral resultante vale
′ 2

 − dx exp ′
− x ′  ip − kd  2 d
2d 2

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Logo,

1 1 p ′ − k 2 d 2
〈p ′ |  2 d exp −
2  1/4 d 2 2
′ 2 2
 d exp − p − k d (7.42
  2 2

Esta função de onda no espaço dos momentos fornece um método alternativo para obter 〈p e 〈p 2 .
Probabilidade. A probabilidade de encontrar a partícula com momento p ′ é uma gaussiana (no espaço dos
momentos) centrada em k, da mesma forma que a probabilidade de encontrar a partícula na posição x ′ é uma
gaussiana (no espaço das posições) centrada em zero. Além disso, as larguras das duas gaussianas são
inversamente proporcionais entre si, o que representa uma outra maneira de expressar a constância do
produto de incerteza Δx 2 Δp 2 explicitamente calculado em (7.41). Quando mais larga no espaço x mais
estreita ela é no espaço p e vice-versa (v. figura abaixo).

gaussiana no espaço gaussiana no espaço


das posições dos momentos

Comparação entre as larguras das duas gaussianas.


Casos extremos d →  e d → 0. Vamos considerar este caso extremo em que a largura da gaussiana no
espaço x vale d → . A função de onda (7.35) torna-se uma onda plana extendida em todo espaço, com a
probabilidade de encontrar a partícula em qualquer ponto x ′ sendo uma constante independente da posição.
Por outro lado, no espaço dos momentos a função de onda torna-se muito localizada, tal como uma função
delta, em p ′  k.
Para d → 0, ocorre exatamente o contrário: no espaço das coordenadas a função torna-se localizada (delta)
enquanto que no espaço dos momentos a função de onda (7.42) é uma constante independente de p ′ .
Funções localizadas no espaço x. A última análise mostra que uma função de onda localizado no espaço x,
corresponde a uma superposição de autoestados do momento com todos os valores possíveis dos momentos.
Mesmo aqueles autoestados de momento cujos momentos são comparáveis ou excedem mc devem ser
incluídos na superposição. Porém, para tais valores altos do momento, a descrição baseada na mecânica
quântica não-relativística é limitada. A despeito desta limitação, nosso formalismo, baseado na existência do
autoket posição x ′ , tem um amplo domínio de aplicabilidade.

Generalização a Três Dimensões


Autokets da posição. Devem satisfazer
x |x ′   x ′ |x ′ 

Autokets do momento. Para o momento, temos,


p |p ′   p ′ |p ′ 

Normalização. Ambos os kets obedecem as condições de normalização

Capítulo 1 Conceitos Fundamentais 53


〈x ′ |x ′′    3 x ′ − x ′′ 
e
〈p ′ |p ′′    3 p ′ − p ′′ 
onde
 3 x ′ − x ′′   x ′ − x ′′ y ′ − y ′′ z ′ − z ′′ 

Relações de completeza. As relações de completeza, tornam-se

 d 3 x ′ |x ′ 〈x ′ |  1
e

 d 3 p ′ |p ′ 〈p ′ |  1
que podem ser usadas para expandir um estado ket arbitrário

|   d 3 x ′ |x ′ 〈x ′ |


ou

|   d 3 p ′ |p ′ 〈p ′ |


Coeficientes de expansão. Os coeficientes de expansão 〈x ′ | e 〈p ′ | são identificados com as funções de
onda   x ′  e   p ′  no espaço das posições e dos momentos, respectivamente.
Operador momento. O operador momento, quando tomado entre | e |, torna-se

| p|   d 3 x ′  ∗ x ′ −i∇  x ′ 
Transformação. A transformação análoga a (7.32) é

1 ip ′ x ′
〈x ′ |p ′   exp
2 3/2 
tal que
ip ′ x ′
  x ′   1  d 3 p ′ exp 
  p ′ 
2 3/2
e

−ip ′ x ′
  p ′   1  d 3 p ′ exp 
  x ′ 
2 3/2
***

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