Você está na página 1de 13

Saúde e escola na prevenção do uso de drogas: Identificando interfaces e fortalecendo

redes.
Larissa Polejack, Maria Aparecida Gussi e Eliane Maria Fleury Seidl

Conversando sobre saúde

O conceito de saúde passou por várias reflexões em diferentes países e em diversos momentos
históricos. Ao longo desse processo, saímos da concepção da saúde como ausência de doenças
para uma concepção mais ampliada e integradora, que compreende saúde como um direito de
cidadania.
No Brasil, essa reflexão teve como importante marco histórico a realização da VIII Conferência
Nacional de Saúde, realizada em Brasília, no ano de 1986. Nesse encontro, foi proposto o
conceito ampliado de saúde, fruto de intensa mobilização que ocorreu no País e em vários países
da América Latina durante as décadas de 1970 e 1980, como resposta aos regimes autoritários e
à crise dos sistemas públicos de saúde. Para Batistella, o amadurecimento desse debate ocorreu
no âmbito do movimento da Reforma Sanitária brasileira, que representou uma conquista sem
precedentes ao transformar-se em texto constitucional em 1988 (2007, p. 63).
O conceito de saúde apresentado na Constituição de 1988 resgatou a importância das dimensões
econômica, social, cultural, política e de acesso aos serviços de saúde para a produção da saúde
e da doença, e contrapôs-se ao modelo biomédico.
Esse modelo baseia-se em uma abordagem mecanicista do corpo, com a primazia do aspecto
biológico, focado na doença e com um modelo assistencial centrado no indivíduo. Em
contrapartida, o modelo contemporâneo compreende o indivíduo como um sujeito ativo em
relação com o outro e com as instituições e a saúde como um processo contínuo e
multideterminado. Saímos do foco apenas na doença para olhar para a promoção da saúde, a
prevenção de agravos e o fortalecimento das redes sociais.

O que é promoção da saúde?


O conceito de promoção de saúde é mencionado na Carta de Otawa, fruto da I Conferência
Internacional de Promoção da Saúde em 1986. Nessa carta, promoção da saúde é definida como
um processo que procura criar condições para que as pessoas aumentem sua capacidade de
controlar os fatores determinantes da saúde, a fim de melhorá-la.
Estes fatores podem ser sistematizados em três eixos que se complementam:
1. educação para a saúde;
2. prevenção de doenças;
3. proteção da saúde.

1
A mesma Carta de Otawa preconiza cinco campos de ação para a promoção da saúde:
1) elaboração e implementação de políticas públicas saudáveis;
2) criação de ambientes favoráveis à saúde;
3) reforço da ação comunitária;
4) desenvolvimento de habilidades pessoais;
5) reorientação do sistema de saúde.
De acordo com Buss (2009), a ideia de promoção da saúde propõe a articulação de saberes
técnicos e populares e a mobilização de recursos institucionais e comunitários, públicos e
privados para seu enfrentamento e resolução (p. 19) .
Há ainda:
[...] promoção da saúde é o conjunto de atividades, processos e recursos, de
ordem institucional, governamental ou da cidadania, orientados a propiciar o
melhoramento de condições de bem-estar e acesso a bens e serviços
sociais, que favoreçam o desenvolvimento de conhecimentos, atitudes e
comportamentos favoráveis ao cuidado da saúde e o desenvolvimento de
estratégias que permitam à população um maior controle sobre sua saúde e
suas condições de vida, em nível individual e coletivo. (GUTIERREZ citado
por BUSS, 2009).

Mas, como podemos pensar esses conceitos na nossa realidade?


Será que na escola estamos trabalhando a promoção da saúde?
ou na prevenção das doenças?
Ou, apenas no tratamento de problemas de saúde já estabelecidos?
Essas questões nos conduzem a uma reflexão sobre o tema Saúde.

Qual é a diferença entre promoção da saúde e prevenção?

Para Czeresnia (2009), o termo “prevenir” tem o significado de preparar, chegar antes, impedir
que realize (dano, mal). Assim, a prevenção exige uma ação antecipada e intervenções
orientadas a fim de evitar o surgimento ou progresso de doenças específicas. Os projetos de
prevenção e de educação em saúde seriam estruturados com vistas à divulgação de informação
científica e recomendações normativas para mudanças de hábitos.
Em contraposição, a autora destaca que o termo “promover” significa dar impulso a, fomentar,
originar, gerar. Dessa forma, a promoção seria mais ampla que a prevenção, uma vez que as
suas estratégias enfatizam a transformação de condições de vida e de trabalho que confrontam a
estrutura subjacente aos problemas de saúde, demandando uma abordagem intersetorial.
2
Para refletir:
 Será que a promoção da saúde está circunscrita aos serviços de saúde?
 O que temos feito em nossas escolas?
 Se analisarmos o campo de ação da promoção da saúde e os conceitos acima descritos,
podemos refletir sobre a aplicação desses conceitos na prática e a relação entre saúde e
educação?
Não é possível fazer saúde sem educação, assim como há muito de saúde nas práticas
educativas quando estas são voltadas para o fortalecimento do sujeito na busca de sua
autonomia, protagonismo social e vivência plena de cidadania.

Sem dúvida alguma, a escola é um espaço privilegiado para a construção do sujeito e


da promoção da saúde!
E na área da saúde? Como esses conceitos estão presentes?
Vamos conhecer agora alguns princípios do Sistema Único de Saúde (SUS).

Sistema Único de Saúde: uma importante conquista.

“A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover


condições indispensáveis ao seu pleno exercício”.
(Art. 2º, Lei n. 8080 de 19 de setembro de 1990).

O SUS, instituído pela Constituição de 1988 e promulgado pela Lei Orgânica da Saúde (Lei n.
8.080), nasce nesse contexto de mudanças de concepção e abordagens em saúde.
O SUS é orientado por um conjunto de princípios e diretrizes válidos para todo território nacional
e parte de uma concepção ampla de direito à saúde e do papel do Estado na garantia desse
direito. Incorpora, em sua estrutura institucional e decisória, espaços e instrumentos para
democratização e compartilhamento da gestão do sistema de saúde e agrega os diversos
serviços de saúde em uma única rede (COSTA; CARBONE, 2009; NORONHA, LIMA;
MACHADO, 2008).
 Qual será, então, a relação do SUS com a Educação?
 O que podemos pensar sobre essa relação?
 Os princípios nos quais o SUS está embasado podem nos ajudar nessa reflexão.

3
Vamos lá?

Os princípios do SUS são:


 Universalidade: todas as pessoas têm direito à saúde (“A saúde é um direito de todos e
dever do Estado”, artigo 196 da Constituição Federal de 1988). A inovação da Constituição
é que não visa a garantir apenas o acesso dos cidadãos aos serviços e ações de saúde,
mas também a qualidade de vida necessária para ter bons indicadores de saúde. Um dos
aspectos fundamentais para a qualidade de vida é o acesso à educação!
 Equidade: garantia de acesso a qualquer pessoa, em igualdade de condições, aos
diferentes níveis de complexidade do sistema de saúde. Esse conceito pressupõe que as
pessoas e as comunidades mais vulneráveis e fragilizadas necessitam receber cuidados
especiais para obter condições adequadas de saúde. Nesse sentido, mais do que tratar as
pessoas de forma igual, deve-se tratá-las de acordo com suas necessidades médicas e
psicossociais, a fim de que recebam a mesma qualidade de atenção e cuidado de saúde.
Não é assim também na educação?
 Integralidade: as ações de promoção, proteção e recuperação da saúde não podem ser
compartimentalizadas e colocadas em polos distintos e estanques, porque o
desenvolvimento de um sujeito é um processo contínuo. Um modelo de atenção integral
dispõe de unidades de saúde, recursos técnicos e equipes profissionais, necessários para
a produção de ações em saúde de acordo com a necessidade da pessoa, naquele
contexto.

Para garantir esses princípios, os serviços (centros de saúde, hospitais regionais, hospitais
especializados) devem estar organizados de acordo com os níveis de complexidade tecnológica
crescente, de modo a garantir o processo de referência e contrarreferência (hierarquização da
rede de atenção).
Entre as ações desenvolvidas pelo SUS, destacamos, segundo Costa e Carbone (2009):
 Promoção da saúde: engloba educação em saúde, orientação alimentar e de práticas
saudáveis, aconselhamentos específicos. Na escola, todas as atividades voltadas para a
informação sobre o uso de álcool e outras drogas, atividades de esclarecimento sobre
higiene, sexo seguro, orientação nutricional e outros cuidados em saúde são alguns
exemplos de ações do SUS que podem ser desenvolvidas para a comunidade escolar.
 Proteção da saúde: vigilância epidemiológica e sanitária, vacinação e saneamento. Como
podemos fazer isso na escola? Por exemplo, podemos ficar atentos à mudança de
comportamento de algum estudante para identificar qualquer problema de saúde ou de
ordem familiar a fim de oferecer apoio.
 Recuperação da saúde: diagnóstico e tratamento de doenças, acidentes e danos à saúde
de maneira em geral. E na escola? Podemos fazer alguma coisa nesse sentido? Sim! Se
conhecemos a rede de saúde disponível na comunidade, podemos fazer as orientações
para os encaminhamentos necessários ao atendimento e acompanhamento das
dificuldades identificadas.

4
 Reabilitação: engloba recuperação parcial ou total de capacidades no processo saúde-
doença e reintegração do indivíduo ao ambiente social e/ou atividades profissionais. Mais
uma vez, a escola pode criar condições de acolhimento dessa pessoa que vive alguma
dificuldade ou problema de saúde de modo a ser uma peça importante na rede de apoio.
Como vimos, existem inúmeras interfaces e possibilidades de trabalho em parceria. Agora, vamos
conhecer o que já está disponível na área de saúde, que pode ser útil na nossa prática diária,
com vistas ao alcance dos objetivos deste curso.

Estratégia Saúde da Família (ESF)


Um dispositivo que a comunidade escolar pode articular para compor a sua rede de apoio é a
Estratégia Saúde da Família (ESF), programa instituído pela Portaria n. 648/GM, de 28 de março
de 2006. Esse programa é concebido como uma estratégia de reorientação do modelo
assistencial e tem a família e a comunidade como focos da atenção básica.
A execução desse programa fica sob a responsabilidade de equipes interdisciplinares que atuam
em unidades básicas de saúde, responsáveis pelo acompanhamento de um número definido de
famílias de uma área geográfica delimitada. A ESF tem como missão desenvolver ações de
promoção da saúde e de prevenção, inclusive as ações de recuperação e reabilitação de doenças
mais frequentes, e manutenção da saúde dessa comunidade.
Assim, articular a ESF como parte da rede de apoio a ser acionada em situações de risco ou de
agravo instalado, tanto no âmbito da família quanto no dos agrupamentos sociais, é direcionar o
planejamento e a execução de ações pertinentes às demandas identificadas.

Conheça mais sobre as estratégias de atenção básica à saúde buscando a política nacional de
atenção básica no site:
<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_atencao_basica_2006.pdf>

Rede de atenção em saúde mental, álcool e drogas: como está organizada


A política nacional de saúde mental está traçada de tal modo que tem como eixo condutor a
premissa de que a “reorientação do modelo assistencial deve estar pautada em uma concepção
de saúde compreendida como processo e não como ausência de doença, na perspectiva de
produção de qualidade de vida, enfatizando ações integrais e promocionais de saúde” (BRASIL,
2002a, p. 24).
Esse novo modelo de atenção em saúde mental surge em contraposição ao modelo manicomial,
em que as pessoas portadoras de sofrimento psíquico, dependentes de álcool e outras drogas
eram isoladas em hospitais psiquiátricos, sem tratamento adequado. Consideradas incapazes
para o convívio social, essas pessoas perdiam seus direitos civis, políticos e de cidadania.
A Lei Federal n. 10.216/01 (BRASIL, 2002b) é o instrumento legal que dá as diretrizes para a
formulação de ações estratégicas no âmbito da política de saúde mental. Em respeito ao que
essa lei preconiza, o Ministério da Saúde, por meio de portarias específicas, estabelece as ações
de atenção à saúde mental.

5
Entre as diretrizes pautadas para acontecer de fato e de direito uma reforma psiquiátrica ─ que
transforma a assistência centrada no modelo manicomial em uma assistência prestada em
serviços abertos e de base comunitária de modo que o usuário não perca seus vínculos familiares
e sociais ─, está a implantação de novos serviços e programas.
Vamos destacar o principal deles, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS).

Centro de Atenção Psicossocial (CAPS)


Os CAPS estão regulamentados pela Portaria n. 336/GM, de 19 de fevereiro de 2002. São
serviços de atenção diária e de cuidado intensivo que funcionam segundo a lógica do território.
De acordo com a modalidade de serviço, constituem-se em CAPS I, CAPS II e CAPS III, definidos
de acordo com o porte, complexidade das ações desenvolvidas, constituição das equipes de
saúde e abrangência populacional (BRASIL, 2002b).
Dada a sua relevância na rede como espaços de atenção à saúde mental e possibilidades de
articulação com as ações que possam ser desenvolvidas na escola, os CAPS podem ocupar um
lugar privilegiado nessa articulação.

Na sua cidade ou território tem CAPS? Quem é atendido no CAPS? Se não o conhece,
o que acha de ir até lá e ver como funciona. Poderia também contatar a equipe com vistas
a fazer parte da sua rede de apoio.

Há outras modalidades de CAPS: para crianças e adolescentes (CAPS i) e para atendimento na


área de álcool e outras drogas (CAPS ad).
Vamos descrever esses dois serviços que também integram a política de saúde mental.

Centro de Atenção Psicossocial para Criança e Adolescente – CAPS i


O CAPS i é um serviço destinado ao atendimento de crianças e adolescentes com transtornos
mentais.
Entre as suas atividades, estão incluídas:
 a organização da demanda e da rede de cuidados em saúde mental para essa faixa etária;
 a supervisão e capacitação das equipes de atenção básica;
 os serviços e programas de saúde mental na atenção à infância e adolescência;
 o desenvolvimento de ações intersetorais, principalmente com as áreas de assistência
social, educação e justiça.
Cabe também aos CAPS i promover atividades comunitárias com vistas à integração da criança e
do adolescente na família, na escola, na comunidade ou em quaisquer outras formas de inserção
social.

6
O CAPS i é uma modalidade de atendimento que, por sua natureza, tem proximidade muito
grande com a escola: ambos partilham de uma mesma missão, explicitada no Estatuto da Criança
e do Adolescente (ECA) em seu artigo 4º, que atribui “dever da família, da comunidade, da
sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos
direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária”. Em seu artigo 7º, o ECA lista, como direito fundamental, o direito à vida e à saúde
para que a criança e o adolescente tenham “um desenvolvimento sadio e harmonioso”.

Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas – CAPS ad


O CAPS ad é um serviço de atenção psicossocial voltado para pessoas acometidas por
problemas decorrentes do uso ou abuso de álcool e outras drogas, com vistas ainda a
supervisionar e capacitar as equipes de atenção básica, serviços e programas de saúde mental
no âmbito do seu território.
Os CAPS ad oferecem atendimento de equipes multiprofissionais que inclui psicoterapia
individual, de grupo, medicamentosa, oficinas terapêuticas, visita e atendimentos domiciliares e
da família, até atividades comunitárias com foco na integração do usuário na sociedade e sua
inserção familiar e social.
Em razão do foco do presente curso ─ promoção da saúde e prevenção do uso de álcool e outras
drogas ─, o CAPS ad pode compor uma das malhas da rede da escola. Nessa parceria, o CAPS
ad pode colaborar com subsídios para o delineamento de estratégias que visam a intervenções
que permeiam a estruturação de um planejamento, elaborado com a participação de educadores
e estudantes, tanto na prevenção quanto na identificação e mediação das situações de danos do
consumo, não só em relação aos adolescentes, mas também de familiares e de outros membros
da comunidade escolar.
Com base no objetivo do nosso curso, vamos abordar agora aspectos da Política Nacional para
Álcool e Outras Drogas.

A Política Nacional para Álcool e Outras Drogas


No Brasil, as políticas públicas na área de álcool e outras drogas têm passado por muitas
mudanças nos últimos anos. Dois documentos legais são marcos dessas mudanças e merecem
destaque: a Lei n. 11.343/2006 e o Plano Emergencial de Ampliação de Acesso ao Tratamento e
Prevenção em Álcool e outras Drogas (PEAD), do Ministério da Saúde.

Vejamos alguns tópicos principais desses documentos.


 Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006
Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad), com a finalidade de
articular, integrar, organizar e coordenar as atividades de prevenção, tratamento e reinserção
social de usuários e dependentes de drogas, bem como as de repressão ao tráfico. Seu artigo 18
reza que atividades de prevenção são aquelas direcionadas para a redução dos fatores de
vulnerabilidade e risco, e para a promoção e o fortalecimento dos fatores de proteção.

7
Essa nova lei revogou a anterior, Lei n. 6.368, de 1976, que vigorou por 30 anos. Assim, desde
2006, esse é o documento legal que norteia as diferentes ações na área de álcool e outras drogas
em nosso País.

Conheça mais sobre a Lei n. 11343 no site:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm>.

 Plano Emergencial de Ampliação de Acesso ao Tratamento e Prevenção em Álcool e


outras Drogas – PEAD
Em junho de 2009, o Ministério da Saúde lançou o PEAD, direcionado aos 100 Municípios
brasileiros com mais de 250 mil habitantes, às capitais dos Estados e a sete Municípios de
fronteira, que atinge 108 Municípios. Essas cidades abrangem 77,6 milhões de habitantes, que
correspondem a 41,2% de nossa população. O plano visa, prioritariamente, a crianças,
adolescentes e jovens em situação de grave vulnerabilidade social, pelo desenvolvimento de
ações de prevenção, promoção da saúde e tratamento em virtude do consumo prejudicial de
substâncias psicoativas.

Veja se seu município compõe os critérios para integrar o PEAD. Se sim, benefícios
oriundos desse Plano podem auxiliar o trabalho preventivo a ser desenvolvido em sua
escola.

Para o alcance dos seus objetivos, o PEAD priorizou os seguintes eixos de atuação:
 ampliação do acesso a serviços de tratamento;
 qualificação dos profissionais;
 articulação intra e intersetorial;
 promoção da saúde e dos direitos;
 enfrentamento do estigma.
Estão sendo implementadas estratégias, como o apoio a projetos de redução de danos, com o
objetivo de ampliar o acesso aos serviços de saúde, melhorar e qualificar o atendimento oferecido
pelo SUS às pessoas que usam álcool e outras drogas. Fruto do PEAD, novos CAPS ─ em
especial CAPS ad e CAPS i ─ estão sendo cadastrados em diversos Municípios; também estão
sendo criadas escolas de redutores de danos. O incentivo a Estados e Municípios inclui ainda o
apoio financeiro a projetos estaduais e municipais contemplados em editais do Ministério da
Saúde na área de redução de danos.

No site <
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2009/prt1190_04_06_2009.html>.

Você poderá acessar o documento do PEAD na íntegra.

8
A concepção de redução de danos tem norteado as políticas públicas do País quanto às ações
de prevenção e tratamento na área de álcool e outras drogas. Tanto a Lei n. 11.343 quanto o
PEAD pautam suas diretrizes por esse paradigma – aspecto inovador da política brasileira, mas
que já é corrente em países como Canadá, Austrália, Inglaterra, Holanda, entre outros.

Afinal, o que é redução de danos?


Redução de danos
A concepção de redução de danos (RD) parte da evidência de que os seres humanos, desde os
tempos mais remotos e ao longo de sua história, sempre procuraram alterar estados de
consciência e buscar experiências diversas – prazerosas, de transcendência, estéticas, criativas –
com o uso de substâncias psicoativas (BUCHER, 1991; MARLATT, 1999). Assim, o uso de
substâncias psicoativas é uma prática documentada em diversas culturas e sociedades humanas
desde a antiguidade, o que leva à constatação de que uma sociedade sem drogas é uma utopia.
Nessa perspectiva, temos que enfrentar e lidar com essa realidade, com base em evidências
científicas que levam em conta aspectos históricos e socioculturais do uso de drogas.
Redução de danos inclui ações voltadas para a prevenção das consequências adversas ou
danosas à saúde que decorrem do uso de drogas. Em outras palavras, trata-se de uma estratégia
de saúde pública que tem por objetivo reduzir os danos causados pelo uso e/ou abuso de álcool e
outras drogas. Um princípio fundamental que orienta as ações em redução de danos é o respeito
à autonomia e à liberdade de escolha, uma vez que os usuários, por vezes, não querem ou não
conseguem parar de usar drogas (SILVEIRA; ANDRADE, 2000).
Também são princípios que norteiam as intervenções em redução de danos:
 Ampliação da definição de drogas, tanto substâncias lícitas (exemplo: álcool, tabaco,
medicamentos psicotrópicos) quanto ilícitas (exemplo: maconha, cocaína).
 Abstinência não é uma exigência para que o usuário possa usufruir de ações em qualquer
nível, tanto preventivas quanto de tratamento. Exigir abstinência estabelecendo metas de
alta exigência pode prejudicar a vinculação do usuário ao serviço ou programa, e afastá-lo
das ações de saúde o que vai ampliar sua vulnerabilidade a consequências adversas
ocasionadas pelo uso de drogas.
 A pessoa usuária de drogas é sujeito de suas práticas, responsável por suas decisões e
pelo autocuidado.

Ações de redução de danos


Quando falamos em redução de danos, muitas pessoas pensam apenas em troca de seringas.
Esse entendimento limitado das práticas de RD decorre do fato de que essas ações foram
pioneiras e visavam ao controle da infecção pelo HIV entre usuários de drogas injetáveis (UDI).
Foram, então, criados programas de troca de seringas para reduzir a incidência do HIV entre UDI,
nos anos 1980, início da epidemia de AIDS, com base no lema: se você não quer ou não pode
interromper o uso injetável de drogas, não se infecte pelo vírus HIV. Essa medida mostrou-se
eficaz em diversos países, inclusive no Brasil, e não redundou em aumento do uso de drogas
injetáveis.
9
Na atualidade, as ações de RD são muito diversificadas, direcionadas às diferentes modalidades
de substâncias psicoativas. Podem envolver estratégias para a redução da quantidade,
mudanças no padrão ou formas de uso (para evitar uso arriscado ou perigoso), redução de riscos
associados ao uso de substâncias psicoativas (exemplo: se beber, não dirija), entre outros (NIEL;
SILVEIRA, 2008).
Educar para a saúde com vistas à adoção de práticas sexuais seguras ─ como o preservativo nas
relações sexuais ─ no contexto de uso de álcool e outras drogas, também é uma medida de
redução de danos.

Como desenvolver ações preventivas do uso de álcool e outras drogas entre adolescentes
e jovens?
As ações preventivas junto a adolescentes e jovens devem ser pautadas pelo paradigma da
proteção (ECA). Ao mesmo tempo em que a educação prima pelo processo de construção da
autonomia, também devemos reconhecer a condição de vulnerabilidade em que se encontram
crianças e jovens pela imaturidade na tomada de decisões sem orientação dos familiares e
educadores, face aos fortes apelos da oferta de drogas na sociedade atual. Para tanto, o caminho
é, sempre, o diálogo e a aproximação, visando o conhecimento e a reflexão sobre as
experiências, evitando-se ao máximo a adoção de modelos pautados no amedrontamento.

Considerações finais
A articulação de políticas públicas ─ da educação e da saúde ─ é fundamental para o
desenvolvimento de ações pautadas nos princípios de integralidade da atenção, equidade e
garantia de direitos humanos e de cidadania.
Trabalhar em rede é tecer cada malha na medida da necessidade e da disponibilidade dos
equipamentos sociais pertinentes ao território; é firmar parceria com vistas à otimização dos
recursos disponíveis e efetividade das ações delineadas. As ações devem ser regidas por
princípios éticos, pautadas na articulação em que a responsabilidade de cada segmento é
compartilhada, e a cooperação mútua é a base das relações vivenciadas (BRASIL, 2002a).
Como vimos, identificar possibilidades de ações conjuntas para a construção de parcerias
fortalece a rede de apoio e amplia nossa capacidade de intervenção na realidade. As redes vão
sendo tecidas aos poucos por meio do estabelecimento de vínculos, da busca pelas interfaces e
pelo desenvolvimento de ações coletivas.
E ainda pelo reconhecimento das necessidades do outro, pela possibilidade de composição com
a diferença, pelo respeito mútuo que possibilita o compartilhar e o construir novas e constantes
possibilidades. Fortalecer a articulação e a parceria entre saúde e educação é potencializar o
cuidado e garantir direitos.

10
Tecer redes é promover saúde e transformar realidades!
No decorrer do curso você aprofundará esta perspectiva do modelo da educação para
saúde na perspectiva das redes sociais, em nossa proposta sobre A ESCOLA EM REDE NA
PREBVENÇÃO DO USO DE DROGAS.

Destaques do texto
 Está ao alcance dos educadores, dentre outros, a possibilidade e a responsabilidade
por ações preventivas, com vistas à construção de uma sociedade mais preparada para
o enfrentamento dos problemas gerados pelas crescentes oferta e demanda do uso de
drogas.
 As políticas serão efetivas se resultarem em ações integradas na garantia da proteção às
crianças e adolescentes em situação de risco pelo envolvimento com drogas.
 A escola tem papel fundamental nessa rede de prevenção, através de ações de educação para
a saúde que são antes de tudo, ações educativas.
 Como a escola faz parte de uma rede mais ampla que deve participar da prevenção, deve
acionar as parcerias necessárias para colocar em prática seu projeto preventivo numa
complementaridade de competências interdisciplinares.
 A escola será fortalecida à medida que fortalecer suas parcerias e, na construção de sua rede,
estabelecer importantes trocas baseadas em valores de vida coletiva que são incentivados e
amplificados no cotidiano escolar.
 A política nacional sobre drogas promove ações planejadas e articuladas com diversos atores
que atuam com foco na redução da oferta e da demanda de drogas no país.
 A Lei sobre Drogas (Lei n. 11.343 de 2006) traz inovações sobre essa temática. A criação do
SISNAD e o tratamento diferenciado entre usuários e traficantes estão em consonância com a
política nacional sobre drogas. Após a promulgação dessa Lei, as ações direcionadas pelo Estado
contemplam estratégias para a prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de
usuários e dependentes de drogas.

11
Referências
BATISTELLA, C. Abordagens contemporâneas do conceito de saúde. In: FONSECA, A. F.;
CORBO, A. (Org.). O território e o processo saúde-doença. v. 1. Rio de Janeiro:
EPSJV/FIOCRUZ, 2007. p. 51-86.
BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Relatório Final da III Conferência
Nacional de Saúde Mental. Brasília, 11 a 15 de dezembro de 2001. Brasília: Conselho Nacional
de Saúde, 2002.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria Executiva. Legislação em saúde mental 1990. 3. ed.
Brasília: Ministério da Saúde, 2002.
BRASIL. A Prevenção do Uso de Drogas e a Terapia Comunitária. Brasília: Secretaria Nacional
Antidrogas, 2006.
BRASIL. Constituição Federal. Artigos 196, 197, 198, 199 e 200.
BRASIL. Decreto n. 6286, de 5 dez. 2007. Institui o Programa Saúde na Escola (PSE), e dá
outras providências. Diário Oficial da União, Brasília. Disponível em: <
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6286.htm>. Acesso em: 09 jul.
2010.
BRASIL. Decreto n. 7.179/2010, de 20 de maio de 2010.
BRASIL. Inovação e participação. Relatório de ações do governo na área da redução da
demanda de drogas. Brasília: Secretaria Nacional Antidrogas, 2006.
BRASIL. Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990.
BRASIL. Lei n. 11.343/2006, de 23 de agosto de 2006.
BRASIL. Lei n. 11.705/2008, de 19 de junho de 2008.
BRASIL. Política Nacional sobre Drogas. Brasília: Presidência da República, Secretaria Nacional
de Políticas sobre Drogas, 2010.
BUCHER, R. (Org.). Prevenção ao uso indevido de drogas. 2. ed. Brasília: Editora Universidade
de Brasília, 1991.
BUSS, P. Uma introdução ao conceito de Promoção da Saúde. In: CZERESNIA, D.; FREITAS, C.
M. (Org.). Promoção da Saúde: conceitos, reflexões, tendências. Rio de Janeiro: Editora
FIOCRUZ, 2009. p. 19-42.
CAMPOS, G.W.S. Saúde pública e saúde coletiva: campo e núcleo de saberes e práticas. Ciência
e saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 5, n. 2, 2000. CONASS/Ministério da Saúde. Atenção Primária
e Promoção da Saúde. Coleção Progestores, v. 8. Brasília, 2007.
CARVALHO, D. B. B.; CHAIBUB, J. R. W.; MIRANDA, D. A. T. Legislação e políticas de educação
e a política nacional sobre drogas. In: Secretaria Nacional Antidrogas – SENAD (Org.). Prevenção
ao Uso Indevido de Drogas: Curso de Capacitação para Conselheiros Municipais. v. 1. Brasília:
Presidência da República – SENAD, 2008. p. 194-2001.
CONCEIÇÃO, M. I. G.; OLIVEIRA, M. C. S. A Criança e o Adolescente Face à Legislação e à
Política Nacional sobre Drogas. In: Secretaria Nacional Antidrogas – SENAD (Org.). Prevenção

12
ao Uso Indevido de Drogas: Curso de Capacitação para Conselheiros Municipais. v. 1. Brasília:
Presidência da República – SENAD, 2008. p. 203-2017.
COSTA, E.; CARBONE, M. Saúde da Família: uma abordagem multidisciplinar. Rio de Janeiro:
Editora Rubio, 2009.
CZERESNIA, D. O conceito de saúde e a diferença entre prevenção e promoção. In:
CZERESNIA, D.; FREITAS, C. M. (Org.). Promoção da Saúde: conceitos, reflexões, tendências.
Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2009. p. 43-58.
FEFFERMANN, M.; FIGUEIREDO, R. Redução de danos como estratégia de prevenção de
drogas entre jovens. Boletim do Instituto de Saúde, 40, 37-40, 2006.
______. Redução de danos como estratégia de prevenção de drogas entre jovens. Boletim do
Instituto de Saúde, 40, p. 37-40, 2006.
HADDAD. F. O Plano de Desenvolvimento da Educação: razões, princípios e programas. Brasília:
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2008.
JUNQUEIRA, L. A. P.; INOJOSA, R. M. Desenvolvimento Social e Intersetorialidade: a Cidade
Solidária, São Paulo, FUNDAP (mimeo), 1997.
MARLATT, G.A. (Org.). Redução de danos. Porto Alegre: Artmed, 1999.
MATTOS, R. A. de. Os Sentidos da integralidade: algumas reflexões acerca dos valores que
merecem ser defendidos. In: PINHEIRO, R.; MATTOS, R. A. de (Org.). Os sentidos da
integralidade. Rio de Janeiro: IMS/UERJ/ABRASCO, 2001. p. 39-64.
NIEL, M.; SILVEIRA, D. X. Drogas e redução de danos: uma cartilha para profissionais de saúde.
Brasília: Ministério da Saúde, 2008.
NORONHA, J, Lima, L.; MACHADO, C. O Sistema Único de Saúde (SUS). In: GIOVANELLA, L.;
ESCOREL, S. L. L.; NORONHA, J.; Carvalho, A. (Org.). Políticas e Sistemas de Saúde no Brasil.
Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2008. p. 435-472.
SILVEIRA, D. X.; ANDRADE, T. M. Redução de danos relacionados ao uso indevido de drogas.In:
SUDBRACK, M. F.; SEIDL, E. M. F.; COSTA, L. F. (Org.). Prevenção ao uso indevido de drogas:
diga sim à vida. v. 2. Brasília: CEAD/UnB, 2000. p. 13-21.
SUDBRACK, M. F. O.; CONCEIÇÃO, M. I. G. Jovens e violência: vítimas e/ou algozes? In: COSTA,
L. F.; Almeida, T. M. C. de. (Org.). Violência no cotidiano: do risco à proteção. Brasília: Universa,
2005. p. 185-198.

13

Você também pode gostar