Você está na página 1de 19

HENRY MINTZBERG

ESTRUTURA E DINÂMICA
,.."

DAS ORGANIZAÇOES

Tradução de Amélia Salavisa Brooker


Revisão Técnica de António Caetano

3.3 edição
íNDICE

H
PREFÁCIO . 11
•li'l'I
.1

NOTA AO LEITOR 279 .105


19
15
187
245
55
91
~ ;1

255
159
127
119
37 li!
I
fi

Capítulo 1 - A essência da estrutura . 35


209
173
243
i87

PARTE I - O FUNCIONAMENTO DA ORGANIZAÇÃO .


Capítulo 2 - As cinco componentes básicas da organização .
Capítulo 3 - A organização como um sistema de fluxos .

PARTE li - OS PARÂMETROS DE CONCEPÇÃO .


Capítulo 4 - Concepção dos postos de trabalho: a especialização do trabalho .
Capítulo 5 - A concepção dos postos de trabalho: a formalização do comportamento
Capítulo 6 - A concepção dos postos de trabalho: formação e socialização .
Capítulo 7 - A concepção da superestrutura: o agrupamento em unidades .
Capítulo 8 - A concepção da superestrutura: a dimensão das unidades .
Capítulo 9 - A concepção das ligações laterais: os sistemas de controlo e de pla-
neamento .

Capítulo 10 - A concepção das ligações laterais: os mecanismos de ligação .


Capítulo 11 - A concepção do sistema de tomada de decisão: a descentralização verti-
cal e horizontal .

PARTE III - OS FACTORES DE CONTINGÊNCIA .


Capitulo 12 - A estruturação eficaz das organizações .
Capítulo 13 - A idade e a dimensão .
Capítulo 14 - O sistema técnico .
Capítulo 15 - O ambiente 297
Capitulo 16 - O poder 319

PARTE IV - AS CONFIGURAÇÕES ESTRUTURAIS 329·


Capítulo 17 - A estrutura simples 335
Capítulo 18 - A burocracia mecanicista 345
Capítulo 19 - A burocracia profissional.. 379
Capítulo 20 - A estrutura divisionalizada 409
Capítulo 21 - A adhocracia 457
Capítulo 22 - Um pentágono conclusivo 495

BIBLIOGRAFIA 509

ÍNDICE REMISSIVO 521


CAPíTULO 1
A ESSÊNCIA DA ESTRUTURA

A Sr.a Raku tinha um estúdio de cerâmica na cave da sua casa. Esta activi-
dade envolvia um número de tarefas diferenciadas - a preparação do barro, o
moldar dos potes, o trabalhá-los quando ainda meio-secos, a preparação e apli-
cação dos vidrados e a cozedura no forno. A coordenação destas tarefas não
apresentava qualquer problema: a Sr.a Raku encarregava-se de tudo.
Mas a ambição e o sucesso das cerâmicas da Sr.a Raku causavam um pro-
blema: as encomendas excediam a sua capacidade de produção. Por conseguinte,
a Sr.a Raku contratou a Sr;a Bisque, que tinha imenso interesse em aprender a
fazer cerâmica. O que significava que a Sr.a Raku tinha agora de dividir o tra-
balho entre elas. Mas como as lojas de artesanato queriam cerâmicas feitas pela
Sr.a Raku, foi decidido que a Sr.a Bisque preparasse o barro e os vidrados e que
a Sr.a Raku fizesse o resto. Tudo isto requeria uma certa coordenação do traba-
lho, de facto, um problema mínimo, quando só duas pessoas trabalham num
estúdio de cerâmica: bastava-lhes comunicarem de maneira informal.
Estas disposições funcionaram lindamente, tão bem que, passado pouco tempo,
a Sr.a Raku foi mais uma vez atolada em encomendas. Tornou-se então necessá-
rio contratar mais assistentes: mas desta vez, a Sr.a Raku decidiu contratá-las
directamente da escola de cerâmica local, prevendo o dia em que as mesmas
teriam que moldar os potes. Assim, embora a Sr.a Bisque tivesse levado um
certo tempo a aprender, as três novas assistentes, logo desde o princípio, sabiam
exactamente o que fazer e adaptaram-se muito bem; mesmo com cinco pessoas,
a coordenação não apresentava quaisquer problemas.
Mas quando se contrataram duas novas assistentes, os problemas de coorde-
nação começaram a surgir. Um dia a Sr.a Bisque tropeçou num balde de vidrado
e quebrou cinco potes; noutro dia a Sr.a Raku abriu o forno e apercebeu-se de
que os vasos de suspensão para plantas tinham sido todos, por engano, vidrados
f- com cor-de-rosa cíclamen. Nesse momento, deu-se conta que sete pessoas a tra-
I' balhar num pequeno estúdio não conseguiam coordenar todo o trabalho através
do simples mecanismo de comunicação informal. (Existem 21 possíveis permu-
tas ou canais de comunicação, pelos quais duas pessoas podem comunicar,
extraídas de um grupo de sete pessoas, se tomarrrios os membros dois a dois.)
Para agravar a situação, acrescentava-se o facto de que a Sr.a Raku, que agora
20 ESTRUTURA E DINÂMICA DAS ORGANIZAÇe.,2S

se intitulava presidente de Ceramics Limited, dedicava agora cada vez mais tempo
aos seus clientes; de facto, por essa altura, era mais provável encontrá-la ves-
tida com um vestido de um costureiro da moda, do que enfiada num par de
jeans. Assim decidiu nomear a Sr.a Bisque, gerente do estúdio, para que se ocu-
passe inteiramente com a supervisão e coordenação do trabalho das cinco assis-
tentes que fabricavam a cerâmica.
A empresa continuou a crescer. E mais uma vez ocorreram grandes mudan-
ças, quando um consultor em organização foi chamado. Seguindo os seus con-
selhos, o estúdio foi completamente reorganizado em quatro linhas de produção
- cada assistente encarregando-se apenas de uma só tarefa dentro de cada linha
de produção (potes, cinzeiros, vasos de suspensão para plantas e animais de
cerâmica) - a primeira preparava o barro, a segunda moldava, a terceira buri-
lava o barro e assim por diante. Consequentemente, a produção tomou a forma
de quatro linhas de produção. Cada pessoa seguia um conjunto de normas pre-
cisas, elaboradas de antemão, que asseguravam a coordenação de todo o traba-
lho exigido. Claro que Ceramics Limited deixou de vender para lojas de artesa-
nato; a Sr.a Raku passou a aceitar só encomendas por grosso, e a maioria das
vendas destinavam-se a redes de armazéns.
Mas a ambição da Sr.a Raku não tinha limites, e logo que teve a oportuni-
dade de diversificar, não hesitou. Primeiro foram azulejos de cerâmica, depois
acessórios para casa de banho e finalmente tijolos de argila. A empresa foi sub-
sequentemente dividida em três divisões - produtos de consumo, produtos de
construção civil, e produtos industriais.
A Sr.a Raku trabalhava agora num escritório no quinquagésimo quinto andar
da sua «Torre da Cerâmica», onde coordenava as actividades das divisões, revendo
os resultados cada trimestre e actuando pessoalmente quando as taxas de cres-
cimento e de lucro não atingiam os números desejados. Um dia, a Sr.a Raku
estava sentada à sua secretária a examinar os orçamentos quando, ao olhar para
os arranha-céus vizinhos, teve uma súbita inspiração e decidiu mudar o nome da
sua companhia para Ceramico.

Toda a actividade humana organizada - desde a fabricação de cerâmica até


ao acto de colocar um homem na Lua - dá lugar a duas exigências fundamen-
tais e opostas: a divisão do trabalho nas várias tarefas a serem desempenhadas
e a coordenação das mesmas a fim de realizar a actividade em questão. A estru-
tura de uma organização pode ser definida simplesmente como o total da
soma' dos meios utilizados para dividir o trabalho em tarefas distintas e em
seguida assegurar a necessária coordenação entre as mesmas.
Na Ceramico, a divisão do trabalho - preparação do barro, mo delação, buri-
lamento, aplicação de vidrado e cozedura - foi largamente ditada pela tarefa a
reálizar e pela técnica utilizada para o conseguir. A coordenação, contudo, pro-
vou ser uma questão mais complicada, fazendo apelo a vários meios. Estes
podem ser referidos como «mecanismos de coordenação», embora se deva notar
que esses mecanismos têm tanto a ver com O controlo e a comunicação como
com a coordenação.l

I «Trabalhos recentes no domínio do controlo, ou cibernética, demonstraram (que o controlo e


a coordenação) têm a mesma essência» (Litterer, 1965, pág. 233).
A ESSÊNCIA DA ESTRUTURA 21

Parece que são suficientes cinco mecanismos de coordenação para expli-


car as maneiras fundamentais pelas quais as organizações coordenam o seu
trabalho: ajustamento mútuo, supervisão directa, estandardização dos pro-
cessos de trabalho, estandardização dos resultados e estandardização das
qualificações dos trabalhadores.! Podemos mesmo considerá-los como os ele-
mentos fundamentais da estrutura, a cola que aglutina as diferentes partes
de uma organização. Tudo emerge destes elementos - a estruturação das orga-
nizações assim como os temas tratados neste livro. Passemos a olhar para cada
um deles brevemente, antes de determinarmos o rumo deste livro.

o ajustamento mútuo

o ajustamento mútuo realiza a coordenação do trabalho pelo simples


processo de comunicação informal. Graças ao ajustamento mútuo, o controlo
do trabalho fica nas mãos do operador, como indicado na figura 1-1 (a). Visto
que se trata de um mecanismo de coordenação tão simples, o ajustamento mútuo
é naturalmente utilizado na mais simples das organizações: por exemplo, quando
duas pessoas remam numa canoa ou várias trabalham num estúdio de cerâmica.
Paradoxalmente, é também usado nas situações mais complexas, porque, como
iremos ver mais tarde, é o único que funciona em circunstâncias extremamente
difíceis. Consideremos a organização responsável por enviar um homem à Lua
pela primeira vez. Tal actividade requer uma divisão de trabalho incrivelmente
elaborada, com milhares de especialistas desempenhando uma quantidade de
tarefas específicas. Mas, ao princípio, ninguém sabe exactamente o que é neces-
sário fazer. Este conhecimento desenvolve-se à medida que o trabalho avança.
Em última análise, apesar de se utilizarem outros mecanismos de coordenação,
o sucesso da empresa depende essencialmente da capacidade dos especialistas se
adaptarem uns aos outros ao longo de um caminho desconhecido, que vai sendo
descoberto à medida que se avança, o que em suma não é muito diferente ,da
situação de dois remadores numa canoa.2

A supervisão directa

À medida que uma organização cresce e deixa o seu estado de simplicidade


primitiva - mais de cinco ou seis pessoas que trabalham num estúdio de cerâ-
mica, mais de quinze pessoas que remam numa canoa de guerra - vê-se apare-
cer um segundo mecanismo de coordenação. A supervisão directa é o meca-
nismo de coordenação pelo qual um indivíduo se encontra investido de
responsabilidade pelo trabalho dos outros. O responsável transmite-lhes ins-

1 Esta tipologia reflecte em parte, as conclusões de Simon (1957), March e Simon (1958) e
Galbraith (1973).
2 Para uma exposição teórica detalhada acerca dos diversos modos de coordenação de acções

~or parte de decisores independentes, ver Lindblom (1965, capítulos 2-5). O capítulo 14 do mesmo
livro também examina como o ajustamento mútuo pode por vezes conseguir uma melhor coorde-
nação do que a supervisão directa ou certas formas de estandardização.
22 ESTRUTURA E DINÂMICA DAS ORGANIZAÇÕES

truções e controla as suas acções, como indicado na figura 1-1 (b). Com efeito,
um cérebro coordena várias mãos, como no caso do supervisar do estúdio de
cerâmica ou no caso do remador de popa que marca a cadência das remadas na
canoa de guerra.
Consideremos a estrutura do futebol americano. Aqui a divisão do trabalho é
bastante acentuada; temos onze jogadores seleccionados de acordo com o traba-
lho que desempenham em campo, e também com a sua respectiva localização e
até mesmo com os seus atributos físicos. O ágil halfback1 posiciona-se por
detrás da linha de aglomeração dos jogadores e leva a bola; o jogador normal-

G) Gestor

Analista (A

O O O O
---' ---'
Operacional Operacional

(a) Ajustamento Mútuo (b) Supervisão Directa

Qualifi- Processos Resultados


cações de trabalho

(c) Estandardização

Figura 1.1
OS CINCO MECANISMOS DE COORDENAÇÂO

1 Haljback, jogador que assume a posição no sentido ofensivo de uma equipa de futebol ame-
ricano que requer uma corrida sistemática com a bola. (N. T.)
A ESSÊNCIA DA ESTRUTURA 23

mente corpulento que bloqueia os movimentos da equipa contrária fica na linha


e bloqueia. Os ajustamentos mútuos não são suficientes para a coordenação
desta tarefa, como tal é nomeado um capitão de campo, ao qual se chama quar-
terback1, que coordena o trabalho dos jogadores comandando as jogadas.

A estandardização

O trabalho também pode ser coordenado por outros meios, que não apenas
pelo ajustamento mútuo ou pela supervisão directa. Pode ser estandardizado. «A
coordenação das diversas partes é incorporada no programa (de trabalho) desde
a concepção, e a necessidade de comunicação contínua é consequentemente
reduzida.» (March e Simon, 1958, pág. 162.) A coordenação começa no estira-
dor, por assim dizer, antes mesmo do trabalho começar. Os trabalhadores na
linha de montagem de automóveis e os cirurgiões que trabalham numa sala de
operações não precisam de se preocupar com a coordenação com os colegas em
circunstâncias normais - sabem exactamente o que esperar dos colegas e proce-
dem de acordo com esse conhecimento ..
A figura 1-1 (c) mostra quais são os três tipos fundamentais de estandardi-
zação, dentro das organizações. Os processos de trabalho propriamente ditos, os
resultados do trabalho, assim como as qualificações dos operacionais - podem,
todos eles, ser concebidos de maneira a observar padrões pré-determinados.

A estandardização dos processos de trabalho

Os processos de trabalho são estandardizados, quando o conteúdo do tra-


balho é especificado ou programado. Um exemplo que me vem ao espírito é
o das instruções de montagem que acompanham um brinquedo de criança, ven-
dido em peças soltas. Aqui, o fabricante, com efeito, estandardiza o processo de
trabalho dos progenitores.
- «Pegar num parafuso de duas polegadas de cabeça redonda e inseri-lo no
buraco BX, juntar este à parte XB com uma anilha e uma porca de parafuso
hexagonal, ao mesmo tempo que se pega ....»
A estandardização pode ser imensamente desenvolvida nas organizações,
como no caso das quatro linhas de produção da «Ceramics Limited», ou ainda como
o recheador de tartes que observei uma vez numa pastelaria: mergulhava uma
concha na grande vasilha de recheio de tarte, enchendo bases de tartes, literal-
mente milhares de vezes por dia - cereja, mirtilo ou maçã, não fazia a mais
pequena diferença - as bases de tarte chegavam-lhe às mãos numa mesa rolante.
O seu trabalho não precisava de qualquer supervisão nem de comunicação infor-
mal com os seus colegas de trabalho (excepto a necessária para manter um certo
equilíbrio mental). A coordenação do trabalho tinha sido realizada por quem havia
?oncebido a mesa rolante. O recheador de tartes tinha apenas de fazer seguir as
lUstruções à risca, sem se preocupar ·com os outros trabalhadores, que coloca-

I O futebol americano é jogado aos domingos. Na manhã da segunda-feira seguinte, os quar-


. terbacks analisam como é que o jogo deveria ter sido jogado com o beneficio da experiência. (N. T.)
24 ESTRUTURA E DINÂMICA DAS ORGANIZAÇÕES

vam as bases de tartes debaixo e por cima do recheio. Claro que existem outros
postos de trabalho estandardizados que proporcionam uma maior margem de mano-
bra: pode exigir-se a um comprador que obtenha pelo menos três propostas para
todas as compras que excedam lO 000 dólares, mas, por outro lado, este é livre
de desempenhar o seu trabalho como bem lhe aprouver.

A estandardização dos resultados

Também é possível estandardizar os resultados do trabalho (por exem-


plo, especificando de antemão, as dimensões do produto, ou o desempenho
a atingir). Os motoristas de táxi não recebem quaisquer instruções como con-
duzir ou que rota seguir; são apenas informados sõbre o destino dos fregueses.
O preparado r de barro não recebe instruções sobre como preparar a argila, ape-
nas que a tem de preparar em blocos de dois quilos; o ceramista sabe que com
essa quantidade de barro pode moldar potes, cujas dimensões especificadas
constituem as normas da sua própria produção.
Assim que os resultados são estandardizados, as interfaces entre as tarefas
são pré-determinadas, como no caso do encadernado r de livros que sabe que as
páginas impressas que recebe de um colega e a capa que recebe de outro, vão
conjugar-se perfeitamente. Paralelamente, os directores das divisões da Ceramico
articulavam-se com a direcção-geral da empresá em termos de padrões de
desempenho, apenas lhes sendo exigido cada trimestre que atingissem determi-
nados lucros e níveis de crescimento. Como atingi-los, o problema era deles.

A estandardização das qualificações

Por vezes, nem o processo nem os resultados podem ser estandardizados,


embora se exija uma certa coordenação. Anthony lay (1970) levanta esta ques-
tão no contexto dos impérios coloniais. Como é que os reis controlavam e coor-
denavam as actividades dos seus governadores na chefia de colónias distantes,
quando a supervisão directa era impedida pela lentidão dos canais de comuni-
cação deficientes - que levavam meses a dar a volta desde o princípio ao fim
- quando nem o trabalho nem os seus resultados eram susceptíveis de serem estan-
dardizados? A solução que adoptavam - usada pela Sr." Raku para contratar
assistentes para o estúdio de cerâmica - era a de estandardizar os operacionais,
se não o trabalho propriamente dito ou os seus resultados. As qualificações e o
(conhecimento) são estandardizados logo que se especifica a formação daquele
que executa o trabalho. O rei tinha confiança nos seus governadores porque ele
mesmo os formava. De uma maneira geral, o indivíduo é formado mesmo antes
de entrar na organização. A Sr." Raku contratava ceramistas acabados de sair da
escola de cerâmica, exactamente como o fazem os hospitais, quando contratam
médicos. As instituições de formação introduzem os programas de trabalho e as
bases de coordenação entre os futuros assalariados. Quando trabalham, os tra-
balhadores parecem agir de maneira autónoma, exactamente como um bom actor
que, quando no palco, parece representar espontaneamente, mas que, de facto,
passou semanas a aprender o texto na perfeição. A estandardização dasqualifi-


A ESSÊNCIA DA ESTRUTURA 25

cações realiza indirectamente o que a estandardização dos processos de trabalho


ou a estandardização dos resultados realiza directamente: o controlo e a coor-
denação do trabalho. Quando um anestesista e um cirurgião se encontram numa
sala de operações para operar um apêndice, mal têm de comunicar; por virtude
da formação que cada um recebeu, sabem exactamente o que esperar do outro.
A estandardização das suas qualificações assegura o essencial da coordenação.!

Um contínuo entre os mecanismos de coordenação

Estes cinco mecanismos, de coordenação parecem pertencer a uma ordem um


tanto ou quanto irregular. A medida que o trabalho de organização se torna
mais complicado, os meios preferidos de coordenação parecem deslocar-se
sucessivamente, como exemplificado na figura 1-2, do ajustamento mútuo
para a supervisão directa e, em seguida, até à estandardização dos proces-
sos de trabalho, de preferência, ou até à estandardização dos resultados ou
das qualificações, para finalmente regressar ao ajustamento mútuo nas
situações mais complexas.
Um indivíduo que trabalha sozinho não tem grande necessidade de coorde-
nação - tudo se passa na sua própria cabeça. Contudo, acrescente-se uma segunda
pessoa, e a situação muda logo de figura. A coordenação agora deve-se efectuar
através de dois cérebros. Geralmente, as pessoas que trabalham lado a lado em
pequenos grupos adaptam-se umas às outras de uma maneira informal, tornando-
-se o ajustamento mútuo o principal mecanismo de coordenação.
Mas à medida que o grupo aumenta, torna-se cada vez mais difícil coordená-
-lo de maneira informal. Miller (1959) nota que os grupos de mineiros de car-
vão funcionam eficazmente sem supervisão, até um número máximo de 41 homens.
Mas, a partir desse número, ou no caso de divisões mais diferenciadas de tra-
balho - tu~tm.res~Jocais diferentes, sistemas técnicos mais complexos -
a supervisão torna-se absolutamente necessária: -

o adiar da introdução da função de direcção para além do estádio óptimo ... con-
duz ao declínio da eficiência do sistema ... A energia dos membros do grupo, em vez
de ser consagrada à tarefa principal, é cada vez mais consagrada à tarefa de manter
o grupo unido ... (pág. 88).

Como tal, existe assim uma necessidade de liderança. O controlo do trabalho


do grupo passa a um indivíduo único, ou seja, é transferido para um único cére-
bro que agora controla os outros: a supervisão directa torna-se então o meca-
nismo principal de coordenação.
Mas à medida que o trabalho se torna mais complexo, uma outra transição
parece ocorrer. Enquanto que, no exemplo anterior, uma parte do controlo do
trabalho passava do trabalhador ao supervisor, agora a estandardização toma a

I O mesmo se pode dizer a respeito de operações muito mais complexas, corno uma operação
de coração aberto, que durou cinco horas, observada do princípio ao fim por Gosselin (1978) - e
na qual mal se observou qualquer comunicação infonnal entre os cirurgiões cardiovasculares e o
anestesista.
26 ESTRUTURA E DINÂMICA DAS ORGANIZAÇÕES

Estandardização

Ajustamento Supervisão /' do Trabalho ~


_______ Estandardização Ajustamento.
Mútuo Directa

~. ~ dos Resultados
Estandardização /" Mútuo

das Qualificações

Figura 1.2
OS MECANISMOS DE COORDENAÇÃO: UM CONTÍNUO IRREGULAR
DE COMPLEXIDADE
f-
)! dianteira. Como se notou anteriormente, a organização tem três escolhas. Quando
. \ as tarefas são simples e rotineiras, a organização pode estandardizar os seus pró-
L.priosprocessos de trabalho. Mas no caso de trabalho muito mais complexo, a orga-
nização é forçada a estandardizaL.Q~...r~§QH-ªçlº~,deixando ao operador a escolha
do processo~s casos ainda mais complexos, nem mesmo o resultado pode ser
estandardizado e a organização deve então contentar-se em estandardizar as qua-
lificações do operador, sempre que 'possível. Mas se se provar não ser possível
estandardizar as tarefas diferenciadas' da organização, esta ver-se-á forçada a
voltar ao ponto de partida e de utilizar o mecanismo de coordenação, que é o
mais simples, mas ao mesmo tempo, o mais adaptável de todos os mecanismos
de coordenação - o ajustamento mútuo. Como se verificou anteriormente, os
gestores obrigados a resolver problemas sofisticados, que encaram situações extre-
mamente complexas, devem comunicar de maneira informal, no caso de quere-
rem vir a desempenhar satisfatoriamente os seus cargos.
Nesta fase da nossa discussão, torna-se claro que dentro de cada situação espe-
cífica, uma organização vai favorecer um dos mecanismos de coordenação sobre
os outros quatro, e que, de certo modo, estes mecanismos de coordenação são
substituíveis uns p~los outros. Isto de modo nenhum significa que uma organiza-
ção se possa apoiar num único mecanismo de coordenação com exclusão dos outros.
De facto, a maioria das organizações utiliza uma mistura dos cinco mecanismos,
em diversos graus. Por exemplo, seja qual for o grau de estandardização, há sem-
pre necessidade de um mínimo de supervisão e de ajustamento mútuo. As orga-
nizações modernas não podem simplesmente existir sem liderança, nem sem
comunicação informal, quanto mais não seja para que lhes seja permitido ultra-
passar as rigidezes da estandardização.! Na fábrica mais automatizada (i. é., totalmente
estandardizada), as máquinas avariam-se, os trabalhadores nem sempre aparecem,
por vezes o planeamento do trabalho tem de ser mudado à última hora. Não só os
supervisores têm de intervir, como os trabalhadores devem dispor de uma margem
de manobra suficiente que lhes permita lidar com problemas inesperados. Por exem-
plo, Wren (1967), descreve a rede de electricidade, que cobre o Nordeste ameri-

I Emery e Trist (1960) sustentam que um grupo de trabalho só é eficaz se for capaz de gerar
a sua própria coordenação interna, (i. é, se utilizar ajustamento mútuo). «A tarefa primordial de
gestão de uma organização, no seu conjunto, é referir o sistema global ao seu ambiente e não ape-
nas à regulação interna per se». (pág. 93). A minha posição é diferente: sou da opinião de que
enquanto certas unidades se devem apoiar no ajustamento mútuo, não existe nenhuma sem um mínimo
de supervisão directa.

-
A ESSÊNCIA DA ESTRUTURA 27

cano, uma rede completamente automática mas a que faltava um sistema efectivo
de supervisão: «Os diversos sistemas estavam ligados tecnologicamente por razões
de economia, não estando previstos dispositivos, no caso de avaria, para manter
operacionais os diversos sistemas independentemente do todo, pois os sistemas
embora autónomos eram interdependentes.» (Pág. 73.) O resultado foi o famoso
corte total de electricidade de 1965, que mergulhou a região em total escuridão.
No geral, para além da dimensão mínima, a maioria das organizações, sem-
pre que podem, parecem apoiar-se na estandardização. Nos outros casos, utili-
zam, de maneira parcialmente permutável, a supervisão directa e o ajustamento
mútuo. O primeiro destes mecanismos falha logo que o trabalho de organização
se torna demasiado complexo para ser gerido por um só cérebro. E o segundo
falha, sempre que existe um desacordo demasiado importante entre os operacio-
nais que devem regular a sua actividade pelo ajustamento mútuo, daí resultando
a necessidade do estabelecimento de um supervisor.1

Para além dos mecanismos de coordenação

Os filmes por vezes começam com a cena principal, antes do título e do


genérico. De certo modo, os mecanismos de coordenação constituem a nossa
cena mais importante. Como se notou anteriormente, os cinco mecanismos são
o cimento da estrutura, os elementos fundamentais que ligam as diversas partes
das organizações. Constituem também o elemento aglutinador deste livro, fun-
cionando como alicerce do material que vamos passar a expor. Por conseguinte,
voltemos ao genérico: em primeiro lugar, passamos a uma breve revisão da lite-
ratura e à referência a um dos defeitos fundamentais, e em seguida apresenta-
mos um esboço do livro.

A Literatura

As primeiras obras incidiram sobre a estrutura formal, quer dizer, sobre a


relação oficial e documentada entre os vários membros da organização. Duas
escolas teóricas dominaram a literatura até aos anos 50, uma preocupada com a
supervisão directa, a outra com a estandardização.
A escola teórica dos «princípios de direcção», fundada por Henri Fayol desde
1916 (tradução inglesa, 1949), cujas ideias foram popularizadas no mundo de
língua inglesa por Luther Gulik e Lyndall Urwick (1973), estava originalmente
ligada à autoridade formal e ao papel da supervisão directa na organização.

I Estas conclusões inspiram-se em Galbraith (1973), embora tenham sido adaptadas com ligei-
ras modificações. Galbraith afirma que as organizações tentam primeiro usar regras e procedimen-
tos, depois a referência hierárquica e, em seguida, o planeamento, à medida que a informação aumenta.
No caso de o planeamento falhar, Galbraith afirma que a organização pode escolher um de dois
caminhos: ou elimina a necessidade de interdependências entre as tarefas através da criação de
recursos folgados, alargamento dos prazos, ou unidades autónomas, ou aumenta a capacidade de estru-
tura para processar informação através da utilização de sofisticados Sistemas de Informação de
Gestão (SIG), ou através da criação de relações laterais - mecanismos de ajustamento mútuo tais
como «elementos de ligação», grupos de trabalho e estruturas matriciais.
28 ESTRUTURA E DINÂMICA DAS ORGANIZAÇÕES

Estes escritores popularizaram certos termos como unidade de comando (a


noção de que um «subordinado» devia ter apenas um único «superior»), cadeia
de comando (a linha directa que vai do superior de nível mais elevado a cada
subordinado de nível mais baixo, passando pelos escalões intermédios), e ampli-
tude de controlo (o número de subordinados de um mesmo superior hierárquico).
A segunda escola teórica engloba na realidade dois grupos distintos que se
consagram, do nosso ponto de vista, à mesma questão - a estandardização do
trabalho em toda a organização. Ambos os grupos foram criados por volta do prin-
cípio do século por investigadores extraordinários, tanto na América como na
Europa. Na América, Frederick Taylor (1947) liderou o movimento designado
de «Organização Científica do Trabalho» cuja preocupação principal foi a da
programação do trabalho dos operacionais - operários siderúrgicos, mineiros de
carvão e ocupações afins. Na Alemanha, Max Weber (Gerth and Mills, 1958)
pronunciou-se sobre as estruturas mecanicistas ou «burocráticas», como se fos-
sem máquinas cujas actividades tivessem sido formalizadas através de regula-
mentos, descrição de postos de trabalho e formação dos trabalhadores.
E assim, durante cerca de meio século, quando se falava da estrutura da orga-
nização, pensava-se num conjunto de relações de trabalho prescritas e estandar-
dizadas, inseridas num sistema rígido de autoridade formal.
Em 1939, Roethlisberger e Dickson publicaram a sua interpretação de uma
série de experiências conduzidas com os trabalhadores da fábrica da Western
Electric, em Hawthorne. Os resultados obtidos foram de molde a levar os inves-
tigadores a compreenderem a verdadeira importância da estrutura informal - as
relações não estabelecidas formalmente entre os membros de um grupo de tra-
balho - a qual mostrava que o ajustamento mútuo é um mecanismo de coorde-
nação fundamental em todas as organizações. Isto conduziu ao aparecimento de
urna terceira escola teórica, nas décadas de 50 e 60, originalmente designada por
«escola das relações humanas», cujos proponentes procuravam demonstrar, atra-
vés da investigação empírica, que o recurso à estrutura formal - nomeadamente,
aos mecanismos de supervisão directa e estandardização - na melhor das hipó-
teses não dava resultado e, na pior das hipóteses, provava ser perigoso para a
saúde mental do trabalhador (por exemplo, Likert, 1961).
Mas as investigações mais recentes arrepiaram caminho face a estas duas
posições extremas. Na última década, tem-se notado a tendência para considerar
a estrutura de uma forma mais global, estudando, por exemplo, as relações entre
a estrutura formal e a estrutura informal, entre a supervisão directa e a estan-
dardização, por um lado, e o ajustamento mútuo, pelo outro. O padrão foi esta-
belecido pelo interessante trabalho realizado pelo Tavistock Institute no princí-
pio dos anos 50. Trist e Bamforth (1951) - num trabalho de investigação, cujo
nível de pormenor e de visão permanece inultrapassável - estudaram o efeito
que uma mudança de tecnologia operou sobre grupos de trabalho numa mina de
carvão, tendo chegado à conclusão de que os sistemas técnicos e sociais da
estrutura se encontram inextricavelmente interligados. Mais tarde, Michel Crozier,
no Fenómeno Burocrático (1964), demonstrou corno a estandardização e os sis-
temas formais de autoridade influenciam as relações de poder não oficiais e são,
por sua vez, afectados pelas mesmas. Mais recentemente, Jay Galbraith (1973)
estudou a estrutura da Companhia Boeing e construiu um esquema conceptual
que permite descrever as relações entre os vários mecanismos de coordenação.

-
A ESSÊNCIA DA ESTRUTURA 29

Galbraith foi realmente o primeiro investigador a explicar claramente o papel


dos mecanismos modernos do ajustamento mútuo - tais como os grupos de pro-
jecto e a organização matricial -'- na estrutura formal.
Estes e outros estudos semelhantes, demonstraram que as estruturas formais
e informais estão interligadas ao ponto de se tornarem indissolúveis. Os estu-
dos provam, por exemplo, como a supervisão directa e a estandardização têm sido
por vezes utilizadas como mecanismos informais para adquirir o poder e, recipro-
camente, como os meios que foram inicialmente concebidos para reforçar o ajus-
tamento mútuo foram ulteriormente formalizados e incluídos na estrutura formal.
Chegou-se também à conclusão de que a estrutura formal, muitas vezes, parece
reflectir o reconhecimento oficial de padrões de comportamento que ocorrem
naturalmente. As estruturas formais desenvolvem-se dentro das organizações, tal
como, as estradas nas florestas - ao longo dos caminhos já muito pisados e repi-
sados. Outro grupo de investigadores contemporâneos, que trabalham sob o título
de «teoria da contingência», investigaram· as relações entre estrutura e situação,
opondo-se à ideia de que possa existir uma forma estrutural óptima, em todos os
casos. E, em vez disso, procuraram identificar a fórmula estrutural específica -
baseada quer na supervisão directa, quer num determinado tipo de estandardiza-
ção, quer no ajustamento mútuo - que provasse ser a mais apropriada num deter-
minado conjunto de condições. Neste domínio, os primeiros trabalhos importantes
foram realizados por Joan Woodward (1965), a qual num estudo sobre a indústria
nos anos 50 numa dada região de Inglaterra, descobriu provas concludentes, que
atestam que a estrutura de uma empresa está intimamente relacionada com o seu
sistema técnico de produção. As empresas de produção em massa pareciam exigir
a estrutura formal que era o tipo privilegiado pelos investigadores das primeiras
escolas teóricas; as empresas que produzem por unidade ou por processo contí-
nuo, pareciam ter necessidade de uma estrutura mais flexível, apoiando-se mais
no ajustamento mútuo. Subsequentemente, dois investigadores de Harvard, Paul
Lawrencee Jay Lorsch (1967) chegaram à conclusão, num estudo comparativo de
empresas americanas nas indústrias de embalagem, alimentares e de plásticos, que
o ambiente da organização afectava de maneira significativa a escolha da estru-
tura. As empresas de embalagem, operando num ambiente bastante mais simples
e estável, utilizavam de preferência a supervisão directa e a estandardização; pelo
contrário, a indústria de plásticos, mais dinâmica e complexa, favorecia o ajusta-
mento mútuo; e as companhias alimentares situavam-se num plano intermédio.
Outro grupo, chefiado por Derek Pugh, da Universidade de Aston, em Inglaterra,
chegou à conclusão que a dimensão da organização é o factor determinante que
melhor explica o maior número de características da sua estrutura (Pugh et al.,
1963-64, 1968, 1969a, b; Hickson et al., 1969). Por exemplo, a estandardização
é um mecanismo de coordenação tanto mais importante quanto maior for a orga-
nização. Os resultados de Aston, baseados em grandes amostras de organizações
diversas, foram regularmente confirmados (e.g., Inkson et a!., 1970; Child, 1972b),
tendo também estimulado outros estudos sobre as relações entre a estrutura e os
factores de contingência. Por exemplo, Khandwalla (1973a, b; 1974a) recolheu
dados sobre setenta e nove empresas americanas e cento e três empresas cana-
dianas, tendo chegado à conclusão que as relações entre a estrutura, a tecnolo-
~ia, a dimensão e o ambiente são mais complexas do que os estudos anteriores
tmham dado a indicar.
30 ESTRUTURA E DINÂMICA DAS ORGANIZAÇÕES

Em suma, dispomos aqui de uma vasta literatura que se baseia sobre a


observação empírica, e se encontra em rápido crescimento, sendo a maior
parte relativamente recente. Esta literatura contém em si mesma uma constru-
ção progressiva pela qual os investigadores avançaram, em certa 'medida, com
base na compreensão do trabalho previamente efectuado. Potencialmente, esta
literatura tem imenso a dizer-nos sobre o modo como as organizações se estru-
turam. Contudo, falta-lhe uma síntese que permita agrupar todas as descober-
tas num conjunto coerente. Citando uma velha expressão húngara, cada um
ocupa-se do seu próprio moinho, consciente de que os outros se ocupam dos
seus e ninguém deseja abandonar o seu moinho para ir trabalhar nos moinhos
dos vizinhos. Dispomos de algumas revisões da literatura, mas não passam disso
mesmo, muitas delas saltam «de um tópico para outro, sem uma ideia clara do
que são as organizações» ou então reproduzem vários estudos «deixando que
o leitor se encarregue, ele próprio, de fazer a síntese do material». (Perrow,
1973, pág. 7). Este livro foi escrito baseado na premissa de que, no que diz
respeito à estrutura das organizações, a investigação já atingiu um nível
de grande maturidade mas que a literatura correspondente se· encontra
ainda muito atrasada. Torna-se agora necessário recuar um passo e consi-
derar a investigação em perspectiva, analisando-a dentro do seu próprio
contexto, e sintetizando-a numa teoria utilizável. O objectivo deste livro é
o de fornecer essa síntese.

Um defeito

Contudo, este livro não começa imediatamente com a literatura sobre a estru-
turação das organizações. Isto deve-se a um defeito grave na literatura relevante.
A maior parte da literatura contemporânea não relaciona a descrição da
estrutura de uma organização com o seu funcionamento. Raramente se diz
ao leitor o que se passa realmente no interior da estrutura, como é que os pro-
cessos de trabalho, de informação e de decisão funcionam, de facto, dentro da
organização. Assim, temos Conrath (1973) que concluiu depois de fazer uma
pesquisa exaustiva da literatura que abordasse a ligação entre os fluxos de
comunicação e a estrutura da organização:

Podem encontrar-se na literatura, numerosos conceitos sobre a estrutura de uma


organização .... Infelizmente, poucos podem ser relacionados com as propriedades da
comunicação e aqueles que podem encontram-se principalmente restringidos ao
estudo de pequenos grupos ... Em nenhum caso foram directamente utilizados os
dados sobre as comunicações para evidenciar as propriedades da estrutura (pág. 592).

Podemos atribuir este defeito, principalmente, a uma investigação feita «à dis-


tância»: uma investigação que regista as percepções dos executivos, recolhidas
em questionários, em vez dos seus comportamentos reais, uma investigação de
natureza sincrónica que só regista as medições de um momento temporal, uma
investigação que utiliza medidas abstractas num leque de organizações muito
diversas (a descentralização nas escolas paroquiais e nas estações dos correios).
Nenhuma investigação conseguiu abranger, na totalidade, os dinamismos com-


A ESSÊNCIA DA ESTRUTURA 31

plexos que têm lugar dentro das organizações. Podemos tirar algumas informa-
ções resultantes desta investigação, logo que tivermos um sistema conceptual.
Mas é preciso observar que esta investigação não é de grande utilidade quando
se trata de elaborar este sistema conceptual.
A literatura sofre assim de um defeito que é corolário do primeiro: as con-
clusões são muitas vezes formuladas para organizações inteiras quando clara-
mente só se aplicam a parte das mesmas. Não podemos, por exemplo, dizer que
uma empresa é «descentralizada» somente porque o poder de tomar decisões passa
do director-geral aos directores das divisões: o grau de descentralização, obvia-
mente, também depende do que acontece abaixo do nível de director de divisão.
Do mesmo modo, descobrir que uma organização utiliza grupos de trabalho para
introduzir novos produtos, não é o mesmo que descrever a estrutura geral da
organização mas somente uma parte muito limitada da mesma.
Tudo isto serve para dizer que muitas vezes as conclusões da investigação
não se relacionam de todo com o «contexto» (de que tipo de organização se
trata, a que parte da organização se aplicam); assim como não se referem às
relações entre a estrutura e o funcionamento da organização. Como resultado, o
leitor, por vezes, considera estas conclusões como desligadas da realidade e sem
verdadeira substância. Quando elaborei o primeiro esboço deste livro, depois de
ter lido mais de 200 livros e artigos, não tinha a certeza absoluta do que era a
estrutura. Achei-me a titubear à procura de um quadro de referência.
Finalmente, antes de chegar ao ponto de tirar as minhas próprias conclusões,
senti a necessidade de coligir uma série de organigramas que descreviam as
organizações, muitas das quais eu conhecia intimamente, a fim de criar um con-
texto pessoal que pudesse integrar todos os materiais conceptuais que tinha lido.

o esboço da obra

Este livro foi concebido para tentar evitar o problema que acabámos de men-
cionar, de modo a assegurar que o leitor possa pôr em contexto tudo o que tem
lido sobre a estrutura. Como tal, a primeira secção não trata da estrutura das
organizações, mas sim de como é que as organizações funcionam. A literatura
não é muito rica neste domínio, mas é importante passar ao papel, desde o iní-
cio, tudo o que sabemos sobre o funcionamento das organizações, de molde a
lançar os alicerces da teoria que se segue.
A secção I é constituída por dois capítulos. O primeiro debruça-se sobre as
cinco partes básicas das organizações contemporâneas - o centro operacional,
o vértice estratégico, a linha hierárquica, a tecnoestrutura e o pessoal de apoio
- e discute as relações entre estes elementos. O segundo capítulo descreve os
cinco sistemas de fluxos que atravessam estes elementos de base - com efeito,
existem cinco teorias que tentam explicar o funcionamento da organização:
como um sistema de autoridade formal, como um sistema de fluxos de infor-
mação regulada, como um sistema de comunicação informal, como um sistema
de constelações de trabalho e como um sistema de processos de decisão ad hoc.
Estes sistemas são considerados como complementares: cada um descreve uma
parte do funcionamento das organizações; quando combinados uns com os
outros, dão uma ideia da complexidade do sistema total.
32 ESTRUTURA E DINÂMICA DAS ORGANIZAÇÕES

Estes dois capítulos (capítulos 2 e 3), assim como o capítulo de introdução,


constituem a base deste livro. Este ponto é ilustrado na figura 1-3, que foi con-
cebida para dar ao leitor uma vista de conjunto conceptual do livro. Esta base
consiste nos cinco mecanismos de coordenação, as cinco partes básicas da orga-
nização e os cinco sistemas dos fluxos básicos que percorrem a organização.
O núcleo central deste livro é formado sobre esta base - ou seja, as análises
apresentadas nas secções II e III. Nestas duas secções, desmembramos a estru-
tura para melhor a analisar, primeiro analisando cada componente, uma por uma,
e só depois passamos a abordar os factores que afectam cada uma destas partes,
mais uma vez, factor por factor.
Estrutura Burocracia Burocracia Estrutura Adhocracia

I
Simples Mecanicista profissional Divisionalizada cap.21

capo 17 capo 18 cap.19 capo 20

\ I

IV. SíNTESE: AS CONFIGURAÇÕES ESTRUTURAIS

O Poder (cap. 16)

O Ambiente (cap. 15)

O Sistema Técnico (cap. 14)

A idade ea dimensão (cap. 13)

111. ANÁLISE: OS FACTORES DE CONTINGÊNCIA

Descentralização Horizontal (cap. 11)

Descentralização Vertical (cap. 11)

Mecanismos de Ligação (cap. 10)

Sistemas de Planeamento e de Controlo (cap. 9)

Dimensão das Unidades (cap. 8)

Agrupamento em Unidades (cap. 7)

Fonmação e Socialização (cap. 6)

Formalização do Comportamento (cap. 5)

Especialização do Trabalho (cap. 4)

11.ANÁLISE: OS PARÁMETROS DE CONCEPÇÃO

Os Cinco Mecanismos As Cinco Os Sistemas


de Coordenação Componentes Básicas de Fluxo
(cap.1) (cap.2) (cap.3)

I. FUNDAÇÃO: O FUNCIONAMENTO DA ORGANZAÇÃO

Figura 1.3
UMA VISTA DE CONJUNTO CONCEPTUAL DO LIVRO
A ESSÊNCIA DA ESTRUTURA 33

Nos capítulos da secção 11, discutimos os nove parâmetros de concepção, ou


seja, os elementos básicos utilizados para conceber as estruturas das organiza-
ções. Discutimos, por sua vez, (1) a especialização do trabalho, (2) a formali-
zação do comportamento, (3) a formação e a socialização, os três elementos que
entram na concepção dos postos de trabalho individuais; (4) o agrupamento em
unidades e (5) a dimensão das unidades que, no conjunto, constituem a «supe-
restrutura»; (6) os sistemas de planeamento e de controlo e (7) os mecanismos
de ligação, que permitem assegurar as ligações laterais; e, finalmente, (8) a des-
centralização vertical e (9) a descentralização horizontal, que constituem o sis-
tema de decisão.
Cada um destes parâmetros de concepção é discutido individualmente no seu
próprio capítulo (excepto no que diz respeito às descentralizações horizontal e
vertical, que são discutidas em conjunto no capítulo 11). Cada capítulo comporta
uma discussão sobre o parâmetro de concepção em cada uma das cinco partes
da organização e também sobre as ligações entre o parâmetro estudado e os que
já foram discutidos. Mas, essencialmente, a secção 11 apresenta uma análise, e
não uma síntese; consagra-se mais às partes componentes do que aos conjuntos
integrados.
A secção III apresenta os parâmetros de concepção no seu contexto, procurando
relacioná.)os com os diversos «factores de contingência» que os afectam, um
por um. E aqui que se concentra a maior parte da investigação contemporânea
realizada. Em primeiro lugar, começamos por tratar no capítulo 12, dos teste-
munhos relacionados com a eficácia organizacional. Testemunhos estes que
sugerem que as escolhas estruturais são ditadas, em grande medida, primeiro,
pela situação da organização, e segundo, pela necessidade de os parâmetros de
concepção formarem internamente conjuntos coerentes entre si. Partindo deste
ponto de vista na secção m, formulamos dezasseis hipóteses que revêem uma
parte importante dos testemunhos sobre a relação entre a estrutura e a situação
da organização. O capítulo 13 trata do efeito que a idade e a dimensão da orga-
nização têm sobre a estrutura; o capítulo 14 incide sobre a tecnologia utilizada
pela organização; o capítulo 15 trata do ambiente que a organização confronta;
e o capítulo 16 das condições do poder. Embora as sementes da síntese sejam
semeadas nesta secção, a mesma continua a execução da análise. De facto, esta
mais parece dividir do que unificar. As hipóteses parecem ser independentes
umas das outras, por vezes parecem mesmo contradizer-se entre si. Contudo, cons-
tituem um passo necessário na senda que nos conduz ao nosso objectivo principal.
Este objectivo constitui a síntese, que é tratada na secção IV. Notámos mais
atrás que as organizações eficazes parecem conseguir atingir uma coerência interna
entre os seus parâmetros de concepção; também notámos que determinadas
estruturas se encontram associadas a determinadas situações. Na secção IV pro-
curamos demonstrar que tanto os parâmetros de concepção como os factores de
contingência se agrupam em aglomerações naturais, ou «configurações». Em
particular, parece que predominam cinco configurações. Tomados no seu con-
junto como uma tipologia, permitem explicar uma proporção surpreendente dos
resultados de investigação, incluindo muitas das suas contradições; além disso,
cada uma das cinco configurações está associada a um dos cinco mecanismos de
coordenação, o que parece ser mais do que mera coincidência; e emergindo uma
das cinco partes da organização como preponderante em todas as cinco eonfi-
34 ESTRUTURA E DINÂMICA DAS ORGANIZAÇÕES

rârnetro de concepção correspondente e com a


gurações. Juntamente com o J?aação, as cinco configurações são as seguintes:
parte preponderante da ~r~anJ~recta, vértice estratégico), Burocracia Mecanicista
Estrutura Simples (supervIsao de trabalho, tecnoestrutura), Burocracia Profissional
(estandardi.zaç~o dos proc~ssos õeS, centro opera~ional), Estrutura ~ivi~ionalizada
(estandard~zaç~o das quahfic~~s, linha hierárqmca), e Adh~cr~cJa ~aJustamento
(estandardIzaçao dos r~sulta d ulIla destas configurações e dIscutIda num dos
mútuo, pessoal de apOI?). Ca a te com os respectivos parâmetros de concepção,
capítulos da secção .IY,Juntamen OS factores de contingência que lhes estão asso-
o seu modo de funclOnamento, e mbém tomo a liberdade de discutir algumas das
ciados. Nest~s ~inco capítulod ta onto de vista social e de gestão - presentes em
questões maIS I~portant~s:-- o ~pítulO do livro .damos alguns e,xemplos repre-
cada configuraçao. No .ultImo híbridos, e transIções entre as ClllCOconfigura-
sentados por um «pentagono», .stência possível de uma sexta configuração.
ções, e especulamos sobre a ex.1

Você também pode gostar