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RESUMO
Este trabalho se propõe a analisar, sob o ponto de vista da ética enquanto ciência, a prática da Mutilação Genital
Feminina (MGF). A MGF é um conjunto de práticas relacionadas à amputação dos órgãos genitais femininos.
Tradicionalmente o procedimento é realizado por parteiras que utilizam instrumentos rudimentares e anti-
higiênico, a "operação" cria sérios riscos de infecções locais e sistêmicas. Em algumas culturas, a MGF é
considerada necessária para o melhor interesse da menina. A ética é a ciência que tem por objeto a moral
estudada dentro de determinada realidade. Se dentro daquelas comunidades, a prática MGF for aceita, livre e
conscientemente, não há motivos para negar, que a mesma se coaduna com preceitos morais e, portanto, é um
comportamento ético dentro daquele contexto. Mesmo que certos costumes, crenças e a moral de determinada
nação possam causar estranhamento aos países ocidentais, como é o caso da MGF, esses povos tem o direito de
viver livremente de acordo com suas convicções. Assim, a MGF é um comportamento ético dentro da moral das
culturas onde é praticada. Isso não significa impossibilidade de mudanças, haja vista que a sociedade é mutável
e, com ela, mudam também seus valores.
INTRODUÇÃO
No atual contexto mundial, as discussões acerca de certas questões socioculturais
tomam dimensões globais, haja vista a existência de órgãos internacionais em defesa dos
direitos humanos e da influência da mídia na propagação dessas questões e na difusão de um
determinado modelo social e econômico enquanto parâmetro para uma ética universal.
Entre as questões polemizadas no cenário mundial atualmente, encontra-se a cultura
da Mutilação Genital Feminina (MGF), praticada em alguns países, sobretudo no continente
africano. Questiona-se o problema ético dessa conduta, a qual, sob o ponto de vista ocidental,
configura-se contrária aos direitos humanos, que tão ferrenhamente vêm sendo defendidos no
pós-guerra.
Para efeitos de estudo do aspecto ético de determinada ação humana, é necessário se
definir a que conceito de ética a discussão se filia, que nesse caso é a ética científica. Nessa
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perspectiva, este trabalho se propõe a analisar, sob o ponto de vista da ética enquanto ciência,
a prática da MGF, ressaltando aspectos conceituais, históricos e culturais, bem como a
discussão sobre a autodeterminação dos povos, a moral e a ética em tal contexto.
Desde os estóicos, que afirmavam que a ética provém de uma lei natural universal,
passando pelo célebre “imperativo categórico” de Kant e chegando ao
contemporâneo Habermas, todos, enfim, concordam que, em maior ou menor grau,
a ética é universal . Assim, deve-se concluir que “a justificação de um princípio
ético não se pode dar em termos de qualquer grupo parcial ou local. A ética se
fundamenta num ponto de vista universal […]. Ao admitir que os juízos éticos
devem ser formados a partir de um ponto de vista universal, estou aceitando que
meus próprios interesses, simplesmente por serem meus interesses, não podem
contar mais que os interesses de uma outra pessoa” (SINGER, 2004, p. 19-20 apud
FROEHLICH e VIEIRA, 2009, p. 22).
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Apesar da ética universal apontar para uma necessidade urgente de banimento das
práticas de MGF, a quem defenda por a sua manutenção, justificando-se pelo respeito aos
costumes de tal povo como princípio ético de autonomia. Nestes termos, poderíamos admitir
que a ética com toda sua imperatividade se coloca ao mesmo tempo como legitimador e
combatente das práticas de Mutilação Genital Feminina e que este dicotomismo reflete a
verdadeira face da ética, como elemento cultural.
Contudo, segundo Vazquez (1987), a ética é a ciência que tem por objeto a moral
estudada dentro de determinada realidade. Moral, por sua vez, refere-se a
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, embora não se defenda tal prática, compreende-se que a MGF é
um comportamento ético dentro da moral das culturas onde é praticada. Isso não significa
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impossibilidade de mudanças, haja vista que a sociedade é mutável e, com ela, mudam
também seus valores.
Longe de esgotarmos esse assunto e toda polêmica que envolve a mutilação genital
feminina, nesse artigo, procuramos tão somente trazer uma visão geral do tema de forma a
enxergá-lo a partir de conceitos da ética e da moral. Conforme pudemos observar, a simples
crítica aos países que praticam a MGF, sem considerarmos as peculiaridades de cada região,
não contribui, em definitivo, para elucidar a questão.
A presente questão é bem mais polêmica e sugere uma visão mais ampla, não
simplesmente um posicionamento contrário. Conforme vimos nesse artigo, grande parte da
população desses países é favorável a prática da mutilação genital feminina, aceita-a e
defende-a como algo inerente a sua cultura.
É bem verdade que, aos nossos olhos ocidentais, tal procedimento é visto como
desumano e repugnante, no entanto, não podemos simplesmente julgar ou valorar tais atos
sobre nossa perspectiva de ver o mundo. É importante respeitar a autodeterminação desses
povos, cabendo-nos a possibilidade de tentar influenciar essas comunidades.
Espera-se que políticas globais sejam capazes de melhor difundir os conhecimentos
cientificamente produzidos para que os povos possam conhecer as diversas faces de seus atos
e sejam capazes de decidiram de forma ainda mais livre e consciente e, quem sabe, comecem
a enxergar a MGF como desnecessária e ultrapassada.
REFERÊNCIAS
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PROGRAMA de Acção para a Eliminação da Mutilação Genital Feminina. Lisboa, APF,
2009. Disponível em:
<http://www.igualdade.gov.pt/images/stories/documentos/documentacao/outrosdocumentos/P
rograma_Accao_Contra_Mutilacao_Feminina.pdf>. Acesso em: 24 mar. 2011.
VAZQUEZ, A. S. Ética. 10. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira S.A, 1987.
VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. 25. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004.