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INSTITUTO DE PSICOLOGIA
ROGERIO DIAS
RIO DE JANEIRO
Jan/2010
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experiências com limiares de percepção visual e com a ocorrência da sinestesia junto com a
imaginação (que é geral mais forte que no caso de visão real).
Existem da mesma forma sinestesias que são claramente originadas em regiões do cérebro
mais ‘elevadas’, onde por exemplo o conceito de número é que desencadeia a sensação de cor.
Suspeitam em alguns casos de conexões entre áreas do giro angular, sempre na hipótese das
conexões cruzadas. Propõem também um método de diferenciar entre alta e baixa sinestesia.
R & H passam a discutir aspectos mais instigantes relacionados à sinestesia. Considerando
que a sinestesia sempre foi associada aos artistas - músicos, pintores, poetas, e utilizando pesquisa
que mostrou entre sinestésicos uma maior criatividade, buscam ver se sua hipóteses sobre a origem
da sinestesia poderia ser utilizada nessa questão.
Os poetas apresentam uma capacidade fora do comum de relacionarem objetos e conceitos de
diferentes “reinos”, através de metáforas, base da poesia. Tem sido sugerido que os conceitos são
representados em mapas no cérebro da mesma forma que perceptos (como cores ou faces). Assim
poderíamos pensar em metáforas como uma ativação cruzada entre mapas conceituais da mesma
forma que na sinestesia ocorre com mapas perceptuais. O giro angular tem sido identificado como
ligado a associações entre modalidades - pessoas com lesão nele tendem a ter mente literal
(dificuldades com metáforas).
A proposta mais ousada de R & H está relacionada com `um dos maiores quebra-cabeças da
psicologia`: de que forma poderia a linguagem ter evoluído pela seleção natural? Propõem uma
solução ligada à sinestesia.
Primeiro, recordam o conhecido teste que pede às pessoas associarem a duas figuras, uma
arredondada, e a outra, angulosa, os nomes (em marciano) kiki e bouba. 95% das pessoas associam
o segundo nome à forma arredondada. Esse exemplo indica uma espécie de conexão entre as formas
das figuras e os sons a elas associados. Uma pista para entendimento de uma certa proto-linguagem,
pois sugere restrições naturais à forma em que sons podem ser atribuídos a objetos.
Segundo, propõem a existência de uma espécie de sinestesia sensorial-motora, que se
expressa na forma como traduzimos sons em movimentos de dança, ou observamos que certas
palavras em diversos idiomas tendem a reproduzir movimentos semelhantes na língua e nos lábios -
como as palavras que descrevem `pequeno`, que induzem o fechamento dos lábios em bico,
enquanto `grande` induz movimentos largos, o mesmo ocorrendo com os gestos associados a estas
palavras. Isto sugere uma espécie de ativação cruzada entre áreas de som e motora (fala).
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Terceiro, um fenômeno já apontado por Darwin, de associação entre dois mapas motores,
quando ao cortarmos algo com tesouras apertamos ao mesmo tempo as mandíbulas, uma mímica do
movimento das mãos. Isto a seu ver favorece a hipótese sinestésica, dado que os mapas motores da
mão e da boca estão próximos. Quando apontamos a outrem com o dedo indicador, os lábios
movem-se para fora (you em inglês, tu ou vous em francês, thoo em tamil), enquanto ao referir-mo-
nos a nós mesmos, movemos os lábios para dentro (me em inglês, moi em francês, naam em tamil).
Um reparo é feito. Sua sugestão é a de que o impulso inicial para a evolução da linguagem foi
sinestésico, mas não que toda a linguagem moderna tem essa origem. O refinamento subsequente de
uma estrutura profunda da linguagem teria tido outros fatores ambientais e biológicos como
motores, desvinculados das metáforas sinestésicas.
(No artigo em questão R & H tratam também da questão filosófica da qualia sobre a qual o
estudo da sinestesia traria esclarecimentos, questão sobre a qual não nos aventuramos nem a
resumir, por falta de embasamento na matéria filosófica).
Bibliografia
Ramachandran, V.S., Hubbard, E.M. Synaesthesia - a window into perception, thought and
language. Journal of Conciousness Studies, 2001, vol.8, n.12, pp. 3-34.