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Brincadeira sem graça

Apelidos e implicâncias entre colegas fazem parte da vida


escolar. O que preocupa os especialistas é quando esse
tipo de atitude descamba para a agressão física e moral,
com um bode expiatório definido e por longo período. A
essa prática dá-se o nome de bullying, palavra importada
do inglês que designa um fenômeno bastante presente em
escolas dos Estados Unidos. No Brasil, a pesquisa mais
recente sobre o assunto foi feita pela Abrapia – associação
voltada para estudos sobre a infância e a adolescência –
em escolas do Rio de Janeiro. O trabalho concluiu que 40%
dos entrevistados praticam ou sofrem bullying no ambiente
escolar. Entre os colégios ouvidos por VEJA, alguns já têm
programas para enfrentar o problema. No Neo Planos, do
Recife, os professores recebem treinamento para lidar com
casos de bullying. No Colégio Porto Seguro, em São Paulo,
pais e alunos participam de palestras informativas sobre o
tema.

A especialista Cleo Fante, autora do livro Fenômeno Bullying, formulou um manual que
reúne os sinais observados com maior freqüência nas vítimas desse tipo de prática. Eis
alguns:

• O estudante prefere ficar trancado no quarto a sair com os amigos


• Ele raramente é convidado para uma festa da escola
• Seu desempenho escolar apresenta piora
• Pede ao pais que o troquem de escola sem uma razão convincente
• Antes de ir ao colégio, sua muito e tem dores de barriga ou de cabeça
• Ele manifesta o desejo de mudar algo em sua aparência

O cyberbullying
Marcelo Kura

Esse é o nome dado ao tipo de agressão praticado por meio de


artefatos tecnológicos, como blogs na internet e mensagens no
celular. Uma pesquisa realizada nos Estados Unidos chegou a
um número impressionante sobre o assunto: 20% dos
estudantes americanos de ensino fundamental são vítimas do
cyberbullying. Outra pesquisa, essa realizada na Inglaterra,
quantificou o número de meninas que são alvo de agressões
via celular. Isso ocorre com 25% das inglesas.
 

Eles eram alvo de implicância

MAÍLSON DA NÓBREGA, economista


Apelido na escola: Mané Perua (pela
atribuída semelhança com um senhor,
notório pela feiúra, que residia em sua
cidade natal)
Como reagia ao ser importunado: ficava
calado. "A brincadeira deixava de ter graça"

FERNANDO MELIGENI,
tenista
Apelido na escola: Móbile (por sua magreza)
Como reagia ao ser importunado:
discutia com os colegas, embora não
surtisse nenhum efeito. "Isso me fez
desenvolver um espírito de autodefesa"

EDUARDO PAES, deputado federal


Apelido na escola: Cabeça de Ovo
Como reagia ao ser importunado: ouvia em
silêncio. "Aprendi a desprezar as críticas
desimportantes"

ANA HICKMANN, modelo


Apelido na escola: Ana Banana
Como reagia ao ser importunada: ficava
triste e permanecia calada. "Entendi com o
tempo que a chacota não tinha o menor
valor"

   
Preparação da aula    

Providencie cópias do quadro da página ao lado e distribua para


a garotada. Se possível, acesse com os jovens o site indicado no
final deste plano e explore o Programa de Redução do
Comportamento Agressivo entre os Estudantes, desenvolvido
pela Abrapia, e os resultados das pesquisas feitas sobre o tema
em escolas do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro.

 
Para começo de conversa

Organize os alunos num círculo e oriente a leitura das notas de


VEJA. Pergunte quem já foi alvo de implicâncias e perseguições
de colegas na escola. Houve algum tipo de agressão física ou as
ações se deram mais no campo moral, com a escolha de apelidos
politicamente incorretos? Os jovens percebiam risadinhas,
empurrões, fofocas ou a propagação de termos pejorativos como
bola, rolha de poço, baleia, nerd, quatro-olhos etc.? Quem já
recebeu mensagens difamatórias ou ameaçadoras no celular, no
Orkut ou nos blogs pessoais? Provavelmente muitos dirão que já
testemunharam “brincadeirinhas” do gênero, mas dificilmente
admitirão que já as promoveram.

Para debater

Chame a atenção da moçada para o fato de que o bullying, às


vezes considerado normal por alguns pais e até por professores,
está longe de ser inocente. Apesar de configurar prática comum
entre crianças e adolescentes de países diferentes e fazer parte
do cotidiano escolar em todas as épocas, deve ser
constantemente evitado e combatido. Ressalte que uma das
maiores preocupações dos estudiosos do assunto são os efeitos
psicológicos que as agressões podem produzir nas vítimas. Leia
com a classe o quadro no alto desta página e discuta o
significado etimológico da expressão bullying. Então, peça que
todos pensem numa possível tradução da palavra para o nosso
idioma.

Destaque os sinais listados por VEJA em relação aos alvos da


“brincadeira sem graça”. Lembre que daí podem advir problemas
como depressão, angústia, baixa auto-estima, estresse,
isolamento, fobias, evasão escolar, atitudes de autoflagelação e
até suicídio. Os estudos produzidos pela Abrapia, inspirados nas
pesquisas norueguesas dos anos 1970, por seu turno, mostram
que as vítimas do bullying podem, no futuro, reproduzir a prática
com outras pessoas – como os personagens da capa deste Guia
e da ilustração ao lado.

Exercícios e outras atividades

Proponha que os alunos colham depoimentos – se possível com


auxílio de um gravador – de pais, tios, avós e outras pessoas de
diferentes faixas etárias sobre as dificuldades de relacionamento
que experimentaram durante o tempo de escola. Quais eram os
apelidos mais comuns naquela época? Alguém foi às “vias de
fato” com os colegas que criavam e apontavam defeitos nos
outros? Certamente a garotada vai identificar casos diversos de
pessoas que sofreram intimidações e agressões no passado. É
importante que os depoentes contem de forma franca o que
viveram e expliquem como superaram suas dores, a exemplo
das personalidades ouvidas por VEJA no quadro “Eles Eram Alvo
de Implicância”. Na semana seguinte, os jovens devem reunir o
material obtido. O conjunto de narrativas dará a cada um a
oportunidade de se identificar com os entrevistados e também de
se colocar no lugar de quem é perseguido, achacado,
discriminado, humilhado e ridicularizado ainda hoje. Depois peça
que, divididos em pequenos grupos, os adolescentes aprofundem
a questão e elaborem uma lista de ações para evitar o bullying
na escola. As sugestões de cada equipe serão organizadas e
apresentadas por meio de um grande painel para todo o colégio.
Por fim, oriente a execução de textos dissertativos individuais
sobre o fenômeno. Com a ajuda do professor de Língua
Portuguesa, as redações podem ser avaliadas conforme a
qualidade da argumentação e o nível de informação.

Para saber mais


Por que um nome em inglês?

O termo bullying tem origem na palavra inglesa bully, que


significa valentão, brigão. Como verbo, quer dizer ameaçar,
amedrontar, tiranizar, oprimir, intimidar, maltratar. O primeiro a
relacionar a palavra ao fenômeno foi Dan Olweus, professor da
Universidade da Noruega. Ao pesquisar as tendências suicidas
entre adolescentes, Olweus descobriu que a maioria desses
jovens tinha sofrido algum tipo de ameaça e que, portanto,
bullying era um mal a combater. Ainda não existe termo
equivalente em português, mas alguns psicólogos e estudiosos
do assunto o denominam “violência moral”, “vitimização” ou
“maus tratos entre pares”, uma vez que se trata de um
fenômeno de grupo em que a agressão acontece entre iguais –
no caso, estudantes. Como é um assunto examinado
criteriosamente há pouco tempo, cada país ainda precisa
encontrar um vocábulo ou uma expressão, em sua própria
língua, que tenha esse significado tão amplo.

Texto extraído e adaptado da revista NOVA ESCOLA, edição 178, dezembro de


2004
 

Bibliografia
Garota Fora do Jogo: A Cultura Oculta da Agressão nas Meninas, Rachel
Simmons, Ed. Rocco, tel. 0800-216789

Internet
No site www.bullying.com.br, a turma pode conhecer as iniciativas da Associação
Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência (Abrapia)

Roteiro elaborado por Teresa Cristina Rego, professora de Psicologia da Educação


da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo

Educação
Mãe é condenada por bullying praticado por filho no RS

Mulher terá de pagar indenização por danos morais no valor de R$ 5


mil

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul condenou nesta semana a mãe de um


adolescente que cometeu cyberbullying (uso de meios eletrônicos para comportamento
hostil). O menor criou uma página na internet com a finalidade de ofender um colega de
classe. A mãe terá de pagar indenização por danos morais no valor de R$ 5 mil,
corrigidos monetariamente.

De acordo com a Justiça, a vítima entrou com uma ação na cidade de Carazinho,
alegando que fotos suas foram copiadas e alteradas, dando origem a um fotolog (espécie
de diário fotográfico online) criado em seu nome. Na página, foram postadas mensagens
levianas e ofensivas, segundo a vítima. Além disso, foram feitas montagens fotográficas
nas quais o autor é retratado em cenas constrangedoras.

Segundo ele, após muita insistência e denúncias por mais de um mês, o provedor
cancelou o fotolog. Na sequência, o autor começou a receber e-mails com conteúdo
ofensivo, razão pela qual providenciou registro de ocorrência policial e ingressou com
ação cautelar para que o provedor fornecesse dados sobre a identidade do proprietário
do computador de onde as mensagens foram postadas, chegando ao nome da mãe de um
colega de classe.

Os fatos ocorreram enquanto o autor ainda era adolescente e, segundo ele, foram muito
prejudiciais, havendo necessidade de recorrer a auxílio psicológico. Por essas razões,
sustentou que a mãe do criador da página deveria ser responsabilizada já que as
mensagens partiram de seu computador, bem como o provedor, por permitir a
divulgação do fotolog.

No 1º Grau, a Juíza de Direito Taís Culau de Barros, da 1ª Vara Cível de Carazinho,


condenou a mãe ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 5 mil e
descartou a responsabilidade por parte do provedor de internet. "Os fatos são claros: em
face da ausência de limites que acomete muitos jovens nos dias de hoje, vide os
inúmeros casos de bullying e inclusive atrocidades cometidas por adolescentes que vêm
a público, o filho da ré, e quem sabe outros amigos, resolveram ofender, achincalhar, e
quiçá, fazer com que o autor se sentisse bobo perante a comunidade de Carazinho", diz
a sentença

Tags: bullying, educação, rs.

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