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Marcos Berwanger
UTFPR – Universidade Tecnológica Federal do Paraná
Pato Branco – PR – Brasil
marcos.bw@gmail.com
Abstract.
This article aims to make a parallel between the collective memory and the production
of knowledge in cyberspace. Emphasizing the relationship between self-indulgence and
the facilities of the modern world and the concern about the continuity of the human
evolutionary process.
Resumo.
Este artigo pretende fazer um paralelo entre a memória coletiva e a produção de
conhecimento no ciberespaço. Enfatizando a relação entre o comodismo e as
facilidades do mundo moderno e, a preocupação quanto a continuidade do processo
evolutivo humano.
1. Introdução
O desenvolvimento humano está diretamente ligado a capacidade com que
os indivíduos estabelecem relações sociais, compartilham conhecimentos e
contribuem para a evolução de sua comunidade. O compartilhamento da informação
permite o surgimento e a manutenção do que é chamada de Memória Coletiva, a
representação daquilo que é criado pelos homens e passado de geração em geração.
Com o surgimento das Tecnologias de Informação (TI) a maneira como esta memória é
armazenada e transmitida ganha novos horizontes, proporcionando grande velocidade
na troca de conhecimentos e no reaproveitamento de tudo que já foi estudado e
desenvolvido. No entanto, é pertinente a reflexão quanto a penetração massiva e
intrusiva desta tecnologia, que conduz seus utilizadores a um estado quase que de
"inércia mental", ou seja, ocasionando a subutilização da capacidade humana de
memorização e interação.
2
que, por sua vez, conduzem usuários “convergentes”1 a googlear2 antes mesmo de
pensar.
A memória coletiva é um ser orgânico, incontrolável e responsável pela
evolução obtida durante os séculos pela espécie humana. A manutenção do
conhecimento ao longo do tempo permitiu o surgimento de invenções inicialmente
inimagináveis. Assim, pode-se dizer que a memória coletiva é fundamental para a
perpetuação da vida e a manutenção de um constante processo evolutivo.
De acordo com Monteiro (2007) “com o advento da escrita, os fatos
poderiam ser registrados em suporte, não mais cabendo à memória humana a
exclusiva função de reter e preservar informações. O eterno retorno da oralidade foi
substituído pelas longas perspectivas da história”.
Ainda de acordo com Monteiro (2007):
[..] a memória separa-se do sujeito ou da comunidade tomada como um
todo, tornando-se objetiva, morta, impessoal e separando o conhecimento
da identidade pessoal ou coletiva. Com o advento da escrita, o saber torna-
se disponível, estocado, consultável, comparável, deixando de ser apenas
aquilo que é útil no dia-a-dia para ser um objeto suscetível de análise e
exame.
3
dar-se de forma não-linear. Para Lévy (1993, p. 72 apud AQUINO, 2007, p. 2), “dar
sentido a um texto é o mesmo que ligá-lo, conectá-lo a outros textos, e, portanto, é o
mesmo que construir um hipertexto”.
Ainda para Aquino (2007, p. 5) “o hipertexto na web relaciona-se com a
memória coletiva, pois é o formato que se utilizado em conjunto pelos usuários para
registrar e organizar informações, de forma conectada, permitirá a potencialização
desta memória”.
Segundo Monteiro (2006b), “a organização do conhecimento no
ciberespaço3, hoje, é possível a partir da indexação realizada pelas máquinas de busca,
ou seja, mecanismos de busca e metabusca na Internet”.
Atualmente, a indústria de software busca criar ferramentas capazes de
interpretar o sentido daquilo que compõem a Internet, conforme anunciado pelo
Consórcio W3, em que o criador da Web, Tim Berners-Lee, salienta fazer parte da
chamada “rede semântica”. Embora os estudos relacionados à Web-semântica ainda
não tenham proporcionados programas que podem entender o sentido daquilo que se
procura, é notável a evolução percebida no dinâmico mundo da Web e, certamente,
em um futuro próximo, novas potencialidades estarão concretizadas na realidade dos
internautas.
Segundo estatísticas de 2002, o número de informação registrada em
formato digital estaria em torno de 18 exa bytes (1024 peta bytes), três vezes e meia
mais que a informação registrada em mídias tradicionais. (MONTEIRO, 2006a)
Este imenso repositório de arquivos com suas interconexões incalculáveis,
denominado ciberespaço, vêm mudando a natureza da memória, não apenas na
perspectiva da quantidade, mas sobretudo, da maneira como modifica o cotidiano das
pessoas e da forma como a memória coletiva deixa de existir apenas no sentido de
preservação.
Para Lévy (1998a apud MONTEIRO, 2006a) as mídias digitais possivelmente
tornar-se-ão uma nova representação do conhecimento. Especificamente no ambiente
Web, “onde o conteúdo não é lido ou interpretado como um texto clássico, nem
mesmo navegável, como no hipertexto, mas explorado de forma interativa”.
3
Espaço resultante das comunicações por rede de computador, ambiente virtual.
4
Ainda segundo Lévy (1998b apud MONTEIRO, 2006a), as redes de
comunicação e as memórias digitais agruparão a maioria das representações e
mensagens produzidas no planeta, graças às quais teríamos boas novidades no mundo
virtual, mas também “apagamentos de memórias”.
Nessa perspectiva, vê-se uma aproximação da memória biológica;
entretanto a memória biológica e, sobretudo, a memória da sociedade oral estaria
mais preocupada com a imaginação para memorizar saberes, enquanto a memória
virtual no ciberespaço estaria mais próxima da imaginação para a função criativa dos
saberes.
Para Monteiro (2006a) a memória virtual no ciberespaço:
[...] estaria, de uma maneira geral, mais ligada ao pensamento, à produção
sígnica de múltiplas semióticas e aos esquecimentos, do que às
possibilidades físicas de conservação da produção humana, como nos
registros impressos. Seria uma memória engendrada nela mesma, em tempo
real e em contínua transformação. (grifo nosso)
2. Esquecimento
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biológica, sua capacidade de imaginação e visualização “[...] funciona mais como um
módulo externo e suplementar para a faculdade de imaginar”. (grifo do autor).
O esquecimento que percebemos na memória biológica é também uma
característica da sociedade digital, sobremaneira no ciberespaço, tendo em vista não
haver garantias de preservação da informação que nele circula. Pode-se afirmar,
então, tratar-se de uma memória volátil, suscetível aos efeitos do tempo.
3. O Homem no ciberespaço
6
Portais de relacionamento são ambientes livres e desinibidos, as boas
conversas traduzem-se em longas páginas de scraps4. Pesquisas e trabalhos
acadêmicos tornam-se simples consultas à Web e o resultado é uma “obra” a base de
Copy & Paste5.
Em suma, o aprendizado dos jovens está perigosamente baseado no “novo
verbo” googlear, a facilidade em procurar e encontrar as respostas para as perguntas
conduz os estudantes ao comodismo, que acaba por direcioná-los a um caminho de
apenas utilizar, sem criar ou melhorar algo pré-existente. Comprometendo direta e
indiretamente, a evolução da comunidade humana no planeta.
Quando os atuais produtores de conhecimento não mais estiverem em
condição de fazê-lo, os novos responsáveis para tal, os atuais e futuros jovens, não
serão capazes de produzi-lo, por não terem aprendido, durante sua experiência
acadêmica e profissional, a pesquisar e a resolver problemas.
Há, ainda, a preocupação quanto a própria capacidade de memorização
das pessoas frente a facilidade com que consultamos conceitos e informações na Web.
Isto é, ao mesmo tempo em que a Web traz a memória da humanidade para a tela do
computador, facilitando a pesquisa e o desenvolvimento de novas tecnologias, traz
consigo a comodidade e o comodismo.
Seus usuários passam a consultá-la com tal freqüência que acabam por
torná-la “a sua própria memória”, subutilizando o seu poder de memorização e
raciocínio. Situação esta, que retoma a problemática em relação à produção do
conhecimento, observando a falta de consistência do aprendizado exercitado na
escola, tendo em vista que os jovens deixam de estudar conteúdos em busca de
inovação e passam apenas a rever o que já foi dito, repetindo, apenas com outras
palavras, aquilo que foi criado em momentos anteriores.
Esta situação vem se constituindo incontrolável, a não ser que os alunos
sejam isolados do “mundo virtual” a fim de exigir destes, maior dedicação e exploração
do conteúdo e da informação, favorecendo o processo de memorização e a pesquisa
de modo geral.
4
Termo que se refere a recados que um usuário deixa no perfil de outro usuário.
5
Copiar e Colar. Funcionalidade que aplicativos proporcionam de copiar conteúdos de uma fonte
qualquer e “colá-lo” em outro documento.
7
Estudos científicos6 comprovam que memória saudável é memória
exercitada. No entanto, o que se vê nos últimos anos é o surgimento de perguntas
como “por que devo ler jornais para saber o que acontece, se quando precisar de
qualquer informação sobre o passado, basta que eu procure da Internet?”.
4. A Web 2.0
Ainda de acordo com Primo (2007) “A Web 2.0 tem repercussões sociais
importantes, que potencializam processos de trabalho coletivo, de troca afetiva, de
produção e circulação de informações, de construção social de conhecimento apoiada
pela informática”.
6
http://www.emedix.com.br/not/not2006/06jun01med-ajgp-usf-cognicao.php,
http://www.emedix.com.br/not/not2005/05jul28neu-nat-hlt-aprendizado.php (23/11/2008)
8
Assim, a interatividade que surge com a Web 2.0 pressupõe um processo
de troca dinâmico, mútuo, recíproco, interdependente e não mecânico e pré-disposto.
(AQUINO, 2007, p. 3)
O resultado desta interatividade são blogs, enciclopédias on-line como a
Wikipédia7, web jornalismo participativo como o VC Repórter do Terra8, entre outros
sistemas. O que dá ao ambiente virtual de hipertexto um conteúdo construído
coletivamente, onde cada usuário pode criar links e inserir vários tipos de mídia.
Com base na idéia de que a memória é sempre coletiva, infere-se que a
partir das possibilidades de construção e organização coletiva das informações na Web
2.0 a formação desta memória é possível através da elaboração de um hipertexto
cooperativo (PRIMO, 2003), oriundo não só das atividades dos usuários para sua
construção e organização, mas também devido às possibilidades interativas que
permitem o debate entre os usuários quanto ao andamento destes processos.
(AQUINO, 2007, p. 9-10).
5. Conclusão
Para que a era do conhecimento não se torne a “era do Copy & Paste” e
para que nós, seres humanos, não sejamos, em breve, obrigados a conectar nossos
cérebros à Rede faz-se imprescindível uma profunda reflexão, seja como indivíduo ou
como comunidade.
A cada internauta, seja ele estudante, pai ou professor, cabe a missão de
manter as ferramentas do ciberespaço apenas como meios que podem contribuir para
a disseminação do conhecimento e colaborar com a construção de um ambiente
criativo e inteligente. Impedindo assim, que a facilidade de procurar as informações
substitua a curiosidade e a disposição de pesquisar e descobrir garantindo, assim, que
o futuro seja repleto de inovação e evolução.
7
http://pt.wikipedia.org
8
http://noticias.terra.com.br/vcreporter/
9
Para que googlear não substitua verbos como pensar ou imaginar é preciso
que os homens sejam capazes de utilizar a convergência de forma consciente, sem que
a comodidade os condicione a um estado de comodismo.
A Web 2.0, no momento em que torna o ciberespaço mais interativo e
complexo, também o torna mais humano. A idéia do hipertexto cooperativo constitui-
se em uma forma de impedir que o acesso aos recursos das tecnologias da informação
seja passivo, garantindo que a elaboração do conteúdo seja feita por internautas
comuns e assim, contribua para o aprendizado e para a construção do conhecimento.
Além de coibir a manipulação em massa por parte dos detentores dos grandes veículos
de comunicação.
Nessa perspectiva, é fundamental que haja participação consistente das
escolas e empresas, incentivando a participação individual e coletiva, explorando
tecnologias existentes sempre com olhos no horizonte da criação. Com mais ênfase e
determinação é preciso que cada utilizador sinta-se responsável com uma evolução
conjunta, não apenas no ambiente da Internet, mas sim, demonstre-se comprometido
com o crescimento da sociedade moderna como um todo, em seus aspectos mais
preocupantes.
Enfim, cabe essencialmente ao Homem a missão de manter-se crítico e ao
mesmo tempo preocupado com o futuro da educação e do desenvolvimento humano,
fazendo-se indispensável que cada indivíduo assuma para si próprio, a
responsabilidade de potencializar o uso das Tecnologias de Informação sem
comprometer o futuro da humanidade. Garantir este futuro talvez seja proporcionar
condições de relacionamento e aprendizado verdadeiramente humanos, nem que para
isso, tenhamos que “voltar no tempo”.
Referências
10
CHAPOUTHIER, Georges. Registros evolutivos. Viver Mente & Cérebro: Memória, n.2,
p. 8-13, jul. 2006. Ed. Especial.
PRIMO, Alex. O aspecto relacional das interações na Web 2.0. E- Compós (Brasília), v.
9, p. 1-21, 2007. Disponível em <http://www6.ufrgs.br/limc/PDFs/web2.pdf>.
Consultado em 23 de novembro de 2008.
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