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Dor

Rifa-se um coração.
Rifa-se um coração quase novo.
Um coração idealista.
Um coração como poucos.
(Clarice Lispector)

Certas mágoas ficam, pensava. Estava magoada, ferida, machucada, ainda


apaixonada. Utilizara de todos os homens a todos os conhaques, mas permanecia
ferida, como um machucado que não quer cicatrizar.

Ironicamente, quando estava prestes a secar, ela metia o dedo na ferida, só para
continuar a doer. Não tinha de ser dor permanente, mas o era. Então é dor que
quero levar pro resto da vida, meditava.

Reunia fotos e brindes e músicas e lembranças, e lágrimas. Como pôde não ter
sido? Como pude somente ter estado? Durante as lágrimas, sempre os mesmos
pensamentos: como? Por quê? É terrível não conseguir deixar de pensar no que se
quer que seja impensável, mas que, infelizmente, não o é.

Abandonou aquele cantinho. Todos aqueles cantinhos. Era hora de mudar, e mudar
significava abandonar toda a segurança de sua vida e viver o desconhecido. Mudou.
E levou a dor consigo.

- É dor que quero levar pro resto da vida.

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